O S´eculo do Ego e a relac¸a˜ o com Teorias da Comunicac¸a˜ o Filipe Cunha Oliveira 1
Faculdade de Comunicac˜ao – Universidade de Bras´ılia (UnB)
Abstract. This article aims to make a parallel to how the documentary ”O S´eculo do Ego” has an intrinsic and evident relation with the studies of Communication Theories. Resumo. Este artigo tem como objetivo fazer um paralelo de como o document´ario ”O S´eculo do Ego” possui relac¸a˜ o intr´ınseca e evidente com o estudado nas aulas de Teorias da Comunicac¸a˜ o
1. Introduc¸a˜ o ”O S´eculo do Ego” e´ um document´ario realizado em 2002 e dirigido por Adam Curtis. Televisionado pela BBC Two, a miniss´erie de 4 cap´ıtulos tem como objetivo mostrar como as ideias de Sigmund Freud sobre o subconsciente foram fortes influˆencias para governos e empresas manipularem e controlarem pessoas. O artigo em quest˜ao ser´a dividido em quatro partes, uma para cada cap´ıtulo do document´ario, e envolver´a conceitos ensinados nas Teorias da Comunicac¸a˜ o e seus estudos , como sociedade complexa, historicidade da Comunicac¸a˜ o, Cultura de massa, entre outros elementos.
2. M´aquinas da Felicidade 2.1. Sociedade complexa e Bernays O primeira cap´ıtulo, intitulado ”M´aquinas da Felicidade”, e´ centrado na figura de Edward Bernays. Sobrinho de Sigmundo Freud, Edward e´ considerado uma das 100 pessoas mais influentes no s´eculo XX , de acordo com a revista Life. Bernays combinou as ideias do padrinho sobre desejos reprimidos do inconsciente, com ideias de psicologia de massas, de Gustav Le Bon, e de ”comportamento de manada”, de Wilfred Trotter. Essas ideias associadas levaram Edward a relacionar tais desejos do inconsciente com a necessidade de ter certos objetos de consumo, que at´e ent˜ao n˜ao eram populares ou de grande necessidade da populac¸a˜ o. Desde o s´eculo XIX, houveram profundas transformac¸o˜ es na vida dos homens. Da era tradicional, organizada em torno do soberano, para uma era tecnol´ogica, organizada em torno da atividade econˆomica, a sociedade impˆos ao ser humano uma s´erie de m´aquinas, objetos e conhecimentos. Guy Rocher, em seus estudos sobre tipos social, caracteriza a sociedade complexa como o desprendimento do homem da natureza e a sua necessidade de submeter-se a ela. Com tais necessidades, houve um crescimento acentuado da produc¸a˜ o de bens de consumo para adaptar a` s mais novas condic¸o˜ es que essa sociedade impunha. E com tal superproduc¸a˜ o, veio a necessidade de desenvolver o com´ercio. E´ portanto, evidente que as ideias de Bernays se relacionaram muito bem com o momento social na qual a sociedade se encontrava. Se essas ideias fossem aplicadas
em uma sociedade tradicional, onde a divis˜ao do trabalho era pouco especializada e o artesanato e pequenas f´abricas eram a tecnologia da e´ poca, o efeito nas massas teria sido m´ınimo e a superproduc¸a˜ o que as empresas tanto temiam poderiam acarretar em grandes preju´ızos financeiros. Por´em, Bernays garantiu a corporac¸o˜ es americanas que era poss´ıvel associar os produtos ao desejos do subconsciente. Tais ideias levariam a sociedade a adquirir comportamentos consumistas, eternizando a imagem de que a sociedade moderna possui como caracter´ıstica a necessidade de comprar porque deseja e quer, n˜ao porque precisa. 2.2. O Pseudoacontecimento na sociedade complexa Em meados do s´eculo XVIII e XIX, uma crise ocorria na populac¸a˜ o. Dado aos avanc¸os tecnol´ogicos e a complexificac¸a˜ o da sociedade tradicional, o homem encontrava-se em profundo desencantamento com o mundo. Max Weber dizia que,em sociedades primitivas e tradicionais, as explicac¸o˜ es de fenˆomenos nos quais o ser humano n˜ao compreendiam eram chamados de mitos, e com o avanc¸o da racionalidade e da ciˆencia, as condutas dos homens aram a serem baseadas por suas ac¸o˜ es, e n˜ao por tradic¸o˜ es. Franc¸ois Laplantine e Liana Trindade (1996,p.72) dizem que ” Tudo que est´a do imagin´ario pertenceria a` categoria da fantasia, do capricho, da dispers˜ao, da evas˜ao”. Se tal evas˜ao era dificultada pela racionalidade, era necess´ario um novo meio de poder fugir do mundo. A m´ıdia, portanto, entrava como fator principal para essa fuga do real. O ser humano e´ tocado por esperanc¸as exageradas, sobre o que contˆem o mundo e o poder que ele tem de modelar o universo (BOORSTIN, p.2). Tais esperanc¸as recaem sobre a m´ıdia: e´ ela a respons´avel por apresentar ao homem produtos atuais interessantes para alimentar o imagin´ario humano. O pseudoacontecimento portanto, surge como uma estrat´egia de mostrar ao homem que o que e´ mediatizado e´ o que vale na sociedade. Berneys dizia que O especialista n˜ao apenas possu´ıa conhecimento do valor da atualidade: ele podia fazer com que a atualidade se realizasse. Daniel Boorstin (p.6) mostra que para um pseudoacontecimento ter sucesso, era preciso provocar com o objetivo de ser registrado, possuir relac¸a˜ o amb´ıgua com o real e constituir uma profecia que se realiza por ela mesma. Muitas das estrat´egias publicit´arias de Bernays tiveram eˆ xito, por seguir exatamente tais elementos e principalmente: por conter um car´ater de novidade, de surpresa. Bernays conseguia manipular o inconsciente da massa justamente por manipular seus imagin´arios.
3. Engenharia do Consentimento 3.1. A violˆencia reprimida O segundo cap´ıtulo, ”Engenharia do Consentimento” , d´a continuac¸a˜ o a` saga da fam´ılia Freud: ap´os os estudos, Segmund Freud concluiu que no subconsciente de cada ser humano residia pensamentos e comportamentos perigosos. Caso esse pensamentos fossem liberados, coisas terr´ıveis poderiam acontecer a` humanidade. A Alemanha nazista era vista como exemplo dessa liberac¸a˜ o descontrolada do instinto humano. Para controle das massas, seria preciso instaurar a democracia no interior de cada indiv´ıduo. O nome por tr´as dessa ideia e´ de Anna Freud, filha mais nova de Freud que se tornou l´ıder do movimento psicanal´ıtico mundial.
Freud e Anna possu´ıam algumas divergˆencias de pensamento: enquanto ele acreditava que a psican´alise ajudava as pessoas a entenderem seus impulsos, ela acreditava que era poss´ıvel ensinar como controlar esses comportamentos, seguindo estritamente as regras da sociedade. Fazendo uma analogia com o estudo de Condicionamento Cl´assico proposto pelo fisiologista russo Ivan Pavlov, onde um est´ımulo neutro e´ associado numerosas vezes a um est´ımulo incondicional, ando a provocar a reac¸a˜ o deste u´ ltimo, podemos ver o seguinte: as orientac¸o˜ es de Anna seriam est´ımulos condicionados, voltados para o crescimento ego (a verdadeira personalidade que dita o real). Tal crescimento seria um fenˆomeno fisiol´ogico. Assim, com a orientac¸a˜ o associada a` inserc¸a˜ o do paciente na democracia, que e´ o est´ımulo condicionado, faria o ego continuar se desenvolvendo e lutaria pela consciˆencia do indiv´ıduo. 3.2. Os instintos subconscientes As ideias de Anna se difundiram por toda Am´erica, fazendo com que um padr˜ao-modelo de sociedade fosse seguido e irado. Edgar Morin (1962) dizia que ” uma cultura constitui um corpo complexo de normas,s´ımbolos, mitos e imagens que penetram o indiv´ıduo em sua intimidade, estruturam os instintos, orientam as emoc¸o˜ es”. E´ poss´ıvel dizer ent˜ao que, psicanalistas tinham como objetivo de introduzir normas, s´ımbolos, mitos e imagens nas massas para que essas agissem de acordo com o que eles acreditavam ser conduta e cultura ideal. Bernays considerava que para lidar com p´ublico, era preciso conectar os medos com os desejos, encorajando e manipulando o medo. Grupos eram manipul´aveis, por´em essa massa tamb´em era irracional. Edward chamou essa manipulac¸a˜ o do interior de uma massa ”irracional” de engenharia do consentimento. Psicanalistas comec¸aram a usar as ideias de Bernays. Com a ajuda de Ernest Dichter, o subconsciente foi estudado de uma maneira onde era poss´ıvel achar respostas para tais comportamentos da massa, como repudiar um produto, mesmo o achando favor´avel para o dia a dia. Um exemplo interessante e´ o das donas de casa que, por acharem que a massa de bolo Betty Crocker traziam muita facilidade e conveniˆencia, acabavam por n˜ao comprarem tal produto por um sentimento de culpa por tal facilidade. Analogicamente, podemos fazer uma relac¸a˜ o com o rep´udio que artistas e pintores tiveram com a f´acil reproduc¸a˜ o t´ecnica que ocorreu no in´ıcio do s´eculo XX. Nos dois casos, a sua autenticidade, o ”aqui e agora” que Walter Benjamin prop˜oe que as obras de arte possuem (1955), desvaloriza o trabalho final e o esforc¸o do artista, fazendo com que a aura seja perdida. No caso da massa de bolo, uma simples instruc¸a˜ o na embalagem especificando que era necess´ario adicionar ovos foi o suficiente para que o efeito de culpa fosse extinguido. J´a no caso das obras de artes, ainda h´a pessoas que abominam a reproduc¸a˜ o t´ecnica e defendem a contemplac¸a˜ o de pec¸as autˆenticas, por´em esse pensamento varia muito de pessoa para pessoa. 3.3. A psican´alise no Olimpo Edgar Morin (1962) considerava os astros de cinema como olimpianos modernos, encontrados no ´ımpeto do imagin´ario para o real: A informac¸a˜ o transforma esses olimpos em vedetes da atualidade. Ela eleva a` dignidade de acontecimentos hist´oricos acontecimentos destitu´ıdos de qualquer significac¸a˜ o pol´ıtica.
O telespectador possui, em seus astros e her´ois de filme, modelos e condutas para ser imitado. E´ a animac¸a˜ o da verdadeira vida pela o´ tica de Hollywood (MORIN,1962). Finalmente a psican´alise adentrava na ind´ustria cinematogr´afica, preparada para ensinar aqueles que eram modelos para uma populac¸a˜ o.No entanto, uma forte corrente contra esse tipo de psican´alise surge ap´os o suic´ıdio de Marylin Monroe. E´ preciso perceber que uma grande estrela mediatizada e elevada a condic¸a˜ o de semideusa no ”Olimpo moderno”, havia se sucumbido aos instintos do subconsciente, o que levou a muitos se indagarem se n˜ao haviam um prop´osito ”nefasto” de controle de massas por tr´as, o que veio a` tona algum tempo depois.
4. Um policial dentro de nossas cabec¸as 4.1. A ideia de liberdade Na d´ecada de 60, as ideias de Freud e sua filha Anna deram lugar a um movimento onde a liberac¸a˜ o dos sentimento reprimidos era encorajada. Wilhelm Reich, o pensador por tr´as da ideia, bateu de frente com pensamentos da fam´ılia Freud,principalmente por suas ideias sobre liberac¸a˜ o da libido e de instintos violentos. Tais pensamentos despertaram o indagamento de que psicanalistas estavam manipulando consumismo para fazer com que a populac¸a˜ o permanecesse d´ocil. Houve portanto um decl´ınio do psicanalismo, para dar lugar a um outro m´etodo. Psicoterapeutas, baseando nos ideais de Reich, comec¸aram a dar liberdade para que o emocional de pacientes viesse a` tona, livres do condicionamento social. A informac¸a˜ o em potencial contida deveria virar informac¸a˜ o de fato. O Semin´ario Werber Erhard de Treinamento foi um grande exemplo de curso onde alunos aprendiam a se autoconhecer. Essa liberdade do interior fez com que empresas focassem sua atenc¸a˜ o para adaptar seus produtos: era preciso mostrar uma variedade e uma personalidade nos bens de consumo. 4.2. A informac¸a˜ o e a individualidade O ser humano e´ um animal que demanda informac¸a˜ o. A curiosidade aplicada a` vida social pode ser assim explicada: A informac¸a˜ o em quest˜ao e´ aquela relativa a um mundo globalizado (unificado, universalizado) e a` s demandas do indiv´ıduo moderno, tornado relativamente autˆonomo em relac¸a˜ o ao coletivo como exigˆencia do processo mesmo de constituic¸a˜ o da sociedade complexa. Neste tipo de organizac¸a˜ o social a integrac¸a˜ o do indiv´ıduo a` sociedade requer atividade, iniciativa, nos mais diversos aˆ mbitos de sua existˆencia social. (Martino,2009) O desenvolvimento do homem social na d´ecada de 60 o fez olhar para o seu interior. Erhard queria que as pessoas pudessem ter autenticidade e enxergarem o indiv´ıduo que compunha da massa, e n˜ao a massa em si. Essa vis˜ao se espalhou nos anos 70 e com ela veio a preocupac¸a˜ o das empresas de poderem atingir um mercado t˜ao segmentado. A soluc¸a˜ o: dividir a massa em r´otulos e entender o estilo de vida do consumidor. Novamente, a sociedade complexa centralizada na sua pr´opria imagem era manipulada por grandes empresas. E´ irˆonico pensar que, em uma e´ poca onde a individualizac¸a˜ o e a autenticidade eram t˜ao fortes, a produc¸a˜ o de bens conseguia atingir de uma u´ nica maneira toda a massa e suas variedades de personalidades. Umberto Eco em seu texto () aponta um
eterno problema da cultura de massa: ela e´ manobrada por grupos que visam somente fins lucrativos, sem que perceba um grupo, que ele chama de homens de cultura. Tais homens eram contra a cultura de massa por acreditar que o p´ublico n˜ao era consciente de si mesmo como um grupo social, o que facilitava alienac¸a˜ o e a manipulac¸a˜ o de empres´arios.
5. Referˆencias 1. Wazlawick, Raul Sidnei, An´alise e Projeto de Sistemas de Informac¸a˜ o Orientados a Objetos. Elsevier, 2004. 2. R. M. Stair, G. W. Reynolds, Princ´ıpios de Sistemas de Informac¸a˜ o. Cengage Learning, 2011. 3. RALHA, C´elia Ghedini Notas de Aula.