CURSO DE PSICOLOGIA PSICOPATOLOGIA (SDE 0167) TEXTOS DE APOIO Professor ADELMO GOMES
[email protected]
1
CALENDÁRIO ACADÊMICO 2015.1 (6 º PERÍODO) QUARTA-FEIRA 11 FEV 18 Carnaval 25 04 11 MAR 18 25 01 08 (AV 1) ABR 15 22 Descobrimento 29 06 13 MAI 20 27
JUN
JUL
03 10 17 (AV 2) 24 01 (AV 3) 08
SEXTA-FEIRA 13 Carnaval 20 27 06 13 20 27 03 Paixão 10 (AV 1) 17 24 01 Trabalhador 08 15 22 29 05 12 19 (AV 2) 26 03 (AV 3) 10 Fim
EMENTA DA DISCIPLINA Unidade I - Introdução ao estudo da Psicopatologia e o diagnóstico em Psiquiatria 1.1 - Histórico e principais correntes em Psicopatologia; 1.2 - O normal e patológico em Psicopatologia; 1.3 - Conceituação de doença mental e transtorno psiquiátrico; 1.4 - Sistemas classificatórios: DSM IV e CID-10; 1.5 - Entrevista psiquiátrica e exame da doença mental; anamnese psiquiátrica; diagnóstico pluridimensional. Unidade II - Processos psíquicos e suas alterações 2.1 - Alterações da consciência (vigilância); 2.2 - Alterações da atenção; 2.3 - Alterações da orientação; 2.4 - Alterações nas vivências de tempo e espaço; 2.5 - Alterações da sensopercepção (alucinação); 2.6 - Alterações do pensamento; 2.7 - Alteração do juízo de realidade (delírio); 2.8 - Alterações da afetividade; “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
2
2.9 - Alterações da volição; 2.10 - Alterações do comportamento motor; 2.11 – Alterações da linguagem; 2.12 – Alterações da memória. Unidade III - Transtornos de Ansiedade: A ansiedade normal e patológica 3.1 – Agorafobia; 3.2 - Transtorno do Pânico; 3.3 - Fobia Específica; 3.4 - Fobia Social; 3.5 - Transtorno de Ansiedade Generalizada; 3.6 - Transtorno de Estresse Pós-Traumático; 3.7 - Transtorno Obsessivo-Compulsivo; Unidade IV - Transtornos Somatoformes; 4.1 - Transtorno de Somatização; 4.2 - Transtorno Conversivo; 4.3 - Transtorno de Dor Psicogênica; 4.4 - Transtorno Factício; Unidade V - Transtornos de Personalidade e Transtornos de Ajustamento 5.1 - Transtornos de personalidade e psicopatias; 5.2 - Transtornos de ajustamento; Unidade VI - Transtornos do Humor 6.1 – Distimia; 6.2 – Ciclotimia; 6.3 - Transtorno Bipolar; 6.4 - Transtorno Depressivo Maior; Unidade VII - Transtornos Psicóticos 7.1 – Esquizofrenia; 7.2 - Outros transtornos psicóticos; Unidade VIII - Transtornos relacionados ao uso de substâncias 8.1 - Conceitos gerais (uso social, abuso, dependência, síndrome de abstinência); 8.2 - Transtornos relacionados ao álcool; 8.2 - Transtornos relacionados à anfetamina e cocaína; 8.3 - Transtornos relacionados à cannabis e alucinógenos; 8.4 - Transtornos relacionados à cafeína e nicotina; 8.5 - Transtornos relacionados aos inalantes. ***
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
3
Considerações preliminares A expressão psicopatologia origina-se de três afixos gregos: “pshiché” – psiquismo, psiquê, psíquico; “pathos” – paixão, sofrimento e, “logos” – discurso, conhecimento. [...] A psicopatologia pode ser definida como o conjunto de conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser humano. É um conhecimento que se esforça por ser sistemático, elucidativo e desmistificante. Como conhecimento que visa ser científico, não inclui critérios de valor, nem aceita dogmas ou verdades a priori. O psicopatólogo não julga moralmente o seu objeto, busca apenas observar, identificar e compreender os diversos elementos da doença mental. A psicopatologia estuda especialmente os transtornos, não a sua causa ou tratamento. Procura, portanto, estudar as manifestações clínicas das doenças mentais. É um estudo descritivo dos transtornos, então não é explicativo.
Nesse sentido, a psicopatologia possui uma natureza semiológica, ou seja, a de um estudo dos sinais e sintomas dos transtornos mentais (ou patognomonia). O que são doenças mentais? Transtornos caracterizados por [signos] psicológicos, comportamentos anormais, funcionamento prejudicado ou qualquer combinação destes. Tais transtornos podem causar sofrimento clinicamente significativo e prejuízo em uma variedade de esferas de funcionamento e podem ser devidos a fatores orgânicos, sociais, genéticos, químicos ou psicológicos. (adaptado APA, 2010, p. 984-5) As doenças mentais podem ter uma base orgânica (genética/neurológica/cerebral) conhecida (por exemplo, as demências nas doenças de Alzheimer e de Parkinson), presumida (por exemplo, a Esquizofrenia1 e o Transtorno Afetivo Bipolar) ou desconhecida/inexistente (por exemplo, nas neuroses). No entanto, no estudo das causas das doenças mentais a influência do ambiente (relações familiares, traumas emocionais, condições socioeconômicas e culturais etc.) deverá sempre ser levada em consideração, sob pena de se cair num discurso organicista de cunho determinista. Ou seja, ao se avaliar uma doença, a partir de uma perspectiva multidimensional, três fatores precisam ser considerados. São eles: (1) as possíveis predisposições genéticas (temperamento, doenças genéticas etc.), (2) as influências ambientais (relações de afeto, educação, socialização, eventos ocorridos etc.) e, (3) as estruturas psicológicas constituídos e desenvolvidas (caráter, inteligência, psicopatologias etc.). 1
Vide artigo sobre as causas genéticas da Esquizofrenia – pág. 195.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
4
Sinais e sintomas Os sinais e os sintomas2 representam os signos da psicopatologia [...]. Os sintomas são subjetivos (vivências, sensações e impressões) e aparecem nas queixas do paciente. Dor, o sentimento de tristeza e a escuta alucinatória, por exemplo, são sintomas. Já os sinais são objetivos, ou seja são verificáveis pela observação direta. Eles podem ser detectados por outra pessoa, às vezes pelo próprio paciente. [...] uma fácies de tristeza e o solilóquio (falar sozinho) são sinais. (CHENIAUX, 2013, p. 4). Síndrome é um agrupamento de sintomas e sinais que ocorrem juntos e que constituem uma condição reconhecível com etiologias e mecanismos diversos.3 Sintomas positivos e negativos Sintomas Positivos – [...] estão relacionados diretamente ao surto psicótico4. Entende-se por surto psicótico um estado mental agudo caracterizado por grave desorganização psíquica e fenômenos delirantes e/ou alucinatórios, com perda do juízo crítico da realidade. A capacidade de perder a noção do que é real e do que é fantasia, criação da mente da própria pessoa, é um aspecto muito presente nos quadros agudos da esquizofrenia. [...] Sintomas Negativos – [...] estão mais relacionados à fase crônica da esquizofrenia. Embora possam ocorrer na fase aguda, eles se estendem por mais tempo e predominam a longo prazo. Esses sintomas são chamados também de deficitários, como referência à deficiência de algumas funções mentais, como a vontade e a afetividade. (http://entendendoaesquizofrenia.com.br/website/?page_id=144) Transfundos das Vivências Psicopatológicas e Sintomas Emergentes5 Desenvolvendo o modelo sugerido por autores como Jaspers, Schineider e Weitbrecht, propõe-se aqui situar as vivências psicopatológicas em duas perspectivas fundamentais: têm-se de um lado, os transfundos das vivências psicopatológicas, espécie de palco, de contexto mais geral, em que emergem os sintomas. De outro, reconhecem-se os sintomas específicos vivenciados, denominados sintomas emergentes6. Eles são, portanto, vivências pontuais, que ocorrem sempre sobre determinado transfundo. Esse transfundo, por sua vez, influencia basicamente o sentido, a direção, a qualidade específica do sintoma emergente. Há uma relação dialética entre o sintoma emergente e o transfundo, entre a figura e o fundo, a parte e o todo, o pontual e o contextual. Nesse modelo, discriminam-se dois tipos básicos de transfundo: os estáveis e duradouros e os mutáveis e momentâneos: 1. Os transfundos estáveis, pouco mutáveis, são a personalidade e a inteligência. Qualquer vivência ganha conotação diferente a partir da personalidade específica do indivíduo. Pacientes ivos, dependentes, astênicos e ‘largados’ tendem a vivenciar os sintomas de modo também ivo; já indivíduos explosivos, hipersensíveis e muito reativos a diferentes 2
Do grego símptoma, significando acontecimento, o que ocorre. Lowenkron, T. 2007. Com relação aos signos psicopatológicos (sinais e sintomas), caberia a menção dos conceitos de simulação (forjar, teatralizar, fingir algum sinal ou sintoma psicopatológico) e de dissimulação (encobrir, disfarçar, esconder algum sinal ou sintoma psicopatológico). 4 Vide item na página 8 desta apostila. 5 Adaptado de DALGALARRONDO, 2008, p. 293-9. (Negritos e acréscimos foram feitos pelo professor da matéria) 6 Observe que no caso das psicoses, os sintomas emergentes são classificados como positivos e negativos, conforme visto anteriormente. 3
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
5
estímulos tendem a responder aos sintomas de forma mais viva e ampla, e assim por diante. A inteligência determina essencialmente os contornos, a diferenciação, a profundidade e a riqueza de todos os sintomas. Pacientes muito inteligentes produzem, por exemplo, delírios ricos e complexos, interpretam constantemente as suas vivências e desenvolvem as dimensões conceituais das vivências de forma mais acabada. Sujeitos com inteligência reduzida criam quadros psicopatológicos indiscriminados, sem detalhes, superficiais e pueris. 2. Os transfundos mutáveis e momentâneos também atuam decisivamente na determinação da qualidade e no sentido do conjunto das vivências psicopatológicas. O nível de consciência estabelece a clareza e a precisão dos sintomas. Sob o estado de turvação, uma alucinação auditiva ou visual, uma recordação, um sentimento específico são experimentados em uma atmosfera mais onírica e confusa. O humor e o estado afetivovolitivo momentâneo influem decisivamente não apenas no desencadeamento de sintomas (os chamados sintomas catatímicos7), mas também no colorido específico de sintomas não diretamente deriváveis do estado afetivo. Uma ideia prevalente, em um contexto ansioso intenso, pode ganhar dimensões muito próprias. Em um estado depressivo, qualquer dificuldade cognitiva a a ter uma importância enorme para o paciente. Sintomas emergentes são todas aquelas vivências psicopatológicas mais destacadas, individualizáveis, que o paciente experimenta. Incluem as esferas que não fazem parte dos transfundos, como uma alucinação (sensopercepção), um sentimento (afetividade), um delírio (juízo), uma paramnésia (memória), uma alteração do pensamento ou da linguagem, etc.8
7
Catatimia - 1. Entidade psiquiátrica que se manifesta paroxisticamente como crises ageiras, ditas catatímicas, e que se caracteriza por intensa alteração do humor, seja no sentido da depressão, da expansão ou da ividade, não levando, contudo, à melancolia, à mania ou à esquizofrenia. 2. Influência que exerce o estado afetivo sobre as demais funções psíquicas. (Aurélio) 8 DALGALARRONDO, p., 2008, p. 293-4)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
6
Transfundos e Sintomas Emergentes
Componentes do surgimento, da constituição e da manifestação dos sintomas e transtornos
Evolução Temporal dos Transtornos Mentais CURSOS CRÔNICOS DOS TRANSTORNOS MENTAIS9
PROCESSO
DESENVOLVIMENTO (ou, EVOLUÇÃO) Crises (ou, Ataques) Episódios
Fenômenos Agudos ou Subagudos
Reação Vivencial Anormal
- Personalidade pré-mórbida; - Sinais prodrômicos; - Remissão; - Recuperação; - Recaída ou Recidiva; - Recorrência.
Fase Surto
9
Adaptado de DALGALARRONDO, 2008, p. 296-9. (Negritos e acréscimos foram feitos pelo professor da matéria)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
7
Processo Processo refere-se a uma transformação lenta e insidiosa da personalidade, decorrente de alterações psicologicamente incompreensíveis, de natureza endógena. O processo irreversível, supostamente de natureza corporal (neurobiológica), rompe a continuidade do sentido normal do desenvolvimento biográfico de uma pessoa. Utiliza-se o termo processo, por exemplo, para caracterizar a natureza de uma esquizofrenia de evolução insidiosa [doentia, maléfica], que lenta e radicalmente transforma a personalidade do sujeito acometido. Desenvolvimento (ou, Evolução) Desenvolvimento refere-se à evolução psicologicamente compreensível de uma personalidade. Essa evolução pode ser normal, configurando os distintos traços de caráter do individuo, ou anormal, deter minando os transtornos da personalidade e as neuroses. Nesse caso, há uma conexão de sentido, uma trajetória compreensível ao longo da vida do sujeito. Fala-se, então, em ‘desenvolvimento paranoide’, ‘desenvolvimento histriônico’, ‘desenvolvimento hipocondríaco’, etc. Crise (ou, Ataque) A crise, ou ataque, caracteriza-se, em geral, por surgimento e término abruptos, durando segundos ou minutos, raramente horas. Utilizam-se os termos crise ou ataque para fenômenos como: crises epilépticas, crises ou ataques de pânico, crises histéricas, crises de agitação psicomotora, etc. Episódio O episódio tem geralmente a duração de dias até semanas. Tanto o termo crise como o termo episodio nada especificam sobre a natureza do fenômeno mórbido. Os termos episodio e crise são denominações referentes apenas ao aspecto temporal do fenômeno. Na pratica, é comum utilizarse o termo episodio de forma inespecífica, quando não há condições de precisar a natureza do fenômeno mórbido. Assim, pode-se falar em episodio maniatimorfo, episodio paranoide, episodio depressivo, etc. Personalidade pré-mórbida e sinais pré-mórbidos A personalidade pré-mórbida e os sinais pré-mórbidos são aqueles elementos identificados em períodos da vida do paciente claramente anteriores ao surgimento da doença propriamente dita, em geral na infância. Já pertencendo ao início do transtorno, fala-se em sinais e sintomas prodrômicos10, que representam de fato a fase precoce, inicial do adoecimento. A literatura psiquiátrica, principalmente a de língua inglesa, utiliza os seguintes termos em relação ao curso dos episódios de transtornos mentais: Remissão (remission). É o retorno ao estado normal tão logo acaba o episódio agudo. Fala-se em remissão espontânea quando o paciente se recupera sem o auxílio de intervenção terapêutica. Recuperação (recovery). É o retorno e a manutenção do estado normal, já tendo ado um bom período de tempo (geralmente se considera um ano) sem que o paciente apresente recaída do quadro. 10
Pródromo - Fenômeno clínico que revela o início de uma doença; propatia.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
8
Recaída ou recidiva (relapse). É o retorno dos sintomas logo após haver ocorrido uma melhora parcial do quadro clínico [...] (não tendo ado um ano do episódio agudo). Recorrência (recurrence). É o surgimento de um novo episódio, tendo o indivíduo estado assintomático por um bom período (pelo menos por cerca de um ano). Pode-se dizer que a recorrência é um novo episódio da doença.
Reação Vivencial Anormal A reação vivencial anormal caracteriza-se por ser um fenômeno psicologicamente compreensível, desencadeado por eventos vitais significativos para o individuo que os experimenta. É designada reação anormal pela intensidade muito marcante e duração prolongada dos sintomas. Ocorre geralmente em personalidades vulneráveis, predispostas a reagir de forma anormal a certas ocorrências da vida. Após a morte de uma pessoa próxima, da perda do emprego ou do divórcio, o individuo reage, por exemplo, apresentando um conjunto de sintomas depressivos ou ansiosos, sintomas fóbicos ou mesmo paranóides. A reação vivencial pode durar semanas ou meses, eventualmente alguns anos. ada a reação vivencial, o individuo retorna ao que era antes, sua personalidade não sofre ruptura; pode empobrecer-se ou enriquecer-se, mas não se modifica radicalmente. Fase Já a fase refere-se particularmente aos períodos de depressão e de mania dos transtornos afetivos. ada a fase, o individuo retorna ao que era antes dela, sem alterações duradouras na personalidade, ou seja, não há sequelas na personalidade. A fase é, em sua gênese, incompreensível psicologicamente, tendo um caráter endógeno. Uma fase pode durar semanas ou meses, menos frequentemente, anos, havendo sempre (ou quase sempre) restitutio ad integrum11. Fala-se, então, em fase depressiva, fase maníaca e período interfásico assintomático. Surto O surto, segundo a noção da patologia geral (mas assumida pela psicopatologia), é uma ocorrência aguda, que se instala de forma repentina, fazendo eclodir uma doença de base endógena, não compreensível psicologicamente. O característico do surto é que ele produz sequelas irreversíveis, danos à personalidade e/ou à esfera cognitiva do individuo. Assim como, após o primeiro surto de esclerose múltipla, o paciente ‘sai’ com alguma sequela sensitiva ou motora, após o primeiro surto de esquizofrenia (com alucinações, delírios, percepção delirante, etc.), que pode durar de 3 a 4 meses, por exemplo, o individuo ‘sai diferente’, seu contato com os amigos torna-se mais distanciado, o afeto modula menos, e ele tem dificuldades na vida social, as quais não consegue explicar ou entender. É o ‘déficit pós-esquizofrênico’, devido àquilo que Bleuler afirmava: ‘A esquizofrenia, de modo geral, não permite restitutio ad integrum’. Tem-se, portanto, como possibilidades, um surto esquizofrênico agudo, um surto hebefrênico, um surto catatônico, etc. Após vários anos de doença, nos quais vários surtos foram se sucedendo (ou um processo insidioso foi se implantando de forma lenta), em geral o paciente encontra-se no chamado estado residual da 11
Restitutio ad integrum - Regresso ou retorno completo à normalidade ou à integridade.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
9
doença, apresentando apenas sinais e sintomas que são sequelas desta, sintomas predominantemente negativos. Dessa forma, é incorreto falar em surto maníaco [pois o surto, no exemplo dado, é bipolar], fase esquizofrênica [pois fase refere-se a períodos dos transtornos afetivos, conforme visto anteriormente, e não à doença], crise maníaca [pois a crise, ou ataque, refere-se ao que foi visto anteriormente]; tal uso revela o desconhecimento da terminologia e dos conceitos psicopatológicos básicos. Forma e conteúdo dos signos psicopatológicos Em geral, quando se estudam os sintomas psicopatológicos, dois aspectos básicos costumam ser enfocados: a forma dos sintomas, isto é, sua estrutura básica, relativamente semelhante nos diversos pacientes (alucinação, delírio, ideia obsessiva, labilidade afetiva etc.), e seu conteúdo, ou seja, aquilo que preenche a alteração estrutural (conteúdo de culpa, religioso, de perseguição, etc.). Este último é geralmente mais pessoal, dependendo da história de vida do paciente, de seu universo cultural e da personalidade prévia do adoecimento. De um modo geral, os conteúdos dos sintomas estão relacionados aos temas centrais da existência humana, tais como sobrevivência e segurança, sexualidade, temores básicos (morte, doença, miséria, etc.), religiosidade, entre outros. Esses temas representam uma espécie de substrato, que entra como ingrediente fundamental na constituição da experiência psicopatológica. (DALGALARRONDO, 2008, p. 28) Sistemas classificatórios: DSM 5 e CID-1012 São dois os principais sistemas classificatórios: 1º) A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, da Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente em sua 10ª revisão – CID – 10 e, 2ª) A Diagnostic and Statiscal Manual of Mental Disorders, da American Psychiatric Association atualmente em sua 5ª edição – DSM – V.
12
Toda classificação não é o resultado de um trabalho exclusivamente científico ou apenas um instrumento político; ela é o conjunto, de modo geral, desses fatores. Cabe aos que produzem as classificações e aos que se utilizam delas que estejam cientes desses propósitos, de suas finalidades e de seus limites. (Lowenkron, T. 2007)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
10
Classificação Geral das Doenças Mentais
Conceituação a. Oligofrenias (ou, Retardos Mentais) Oligofrenia é sinônimo de Deficiência ou Retardo Mental. A característica essencial do Retardo Mental é um funcionamento intelectual significativamente inferior à média, acompanhado de limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas de habilidades: comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais/interpessoais, uso de recursos comunitários, autossuficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança. O início deve ocorrer antes dos 18 anos. O Retardo Mental possui muitas causas diferentes que afetam o funcionamento do sistema nervoso central. O funcionamento intelectual geral é definido pelo quociente de inteligência (QI ou equivalente) obtido mediante avaliação com um ou mais testes de inteligência padronizados de istração individual (por ex., Escalas Wechsler de Inteligência para Crianças — Revisada, Stanford-Binet, Bateria Kaufman de Avaliação para Crianças). Um funcionamento intelectual significativamente abaixo da média é definido como um QI de cerca de 70 ou menos (aproximadamente 2 desviospadrão abaixo da média). Cabe notar que existe um erro de medição de aproximadamente 5 pontos na avaliação do QI, embora este possa variar de instrumento para instrumento (por ex., um QI de 70 na escala Wechsler é considerado como representando uma faixa de 65-75). Portanto, é possível diagnosticar o Retardo Mental em indivíduos com QIs entre 70 e 75, que exibem déficits significativos no comportamento adaptativo. Inversamente, o Retardo Mental não deve ser diagnosticado em um indivíduo com um QI inferior a 70, se não existirem déficits ou prejuízos significativos no funcionamento adaptativo. (http://www.psiqweb.med.br)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
11
b. Demências A demência não é apenas um tipo de doença, ela é considerada uma síndrome, ou seja, é um grupo de sinais físicos e sintomas que a pessoa apresenta, estando presente em várias doenças diferentes. Assim, como uma síndrome a Demência apresenta três características principais. Prejuízo da memória. Os problemas de memória podem ser desde um simples esquecimento leve até um prejuízo severo a ponto de não se recordar da própria identidade. Problemas de comportamento. Normalmente se caracteriza por agitação, insônia, choro fácil, comportamentos inadequados, perda da inibição social normal, alterações de personalidade. Perda das habilidades. São as habilidades adquiridas durante a vida, tais como, organizar os compromissos, dirigir, vestir a roupa, cuidar da vida financeira, cozinhar, etc. Os sintomas iniciais de Demência variam, mas a perda de memória em curto prazo costuma ser a característica principal ou única a ser trazida à atenção do médico na primeira consulta. Ainda assim, nem todos os problemas cognitivos nos idosos são devidos a Demência. Perguntas cuidadosas aos pacientes e aos familiares podem ajudar a determinar a natureza do comprometimento cognitivo e a estreitar o diagnóstico. Os sintomas mais comuns que aparecem nas Demências são: 1- déficit de memória; 2- dificuldades de executar tarefas domésticas; 3- problema com o vocabulário; 4- desorientação no tempo e espaço; 5- incapacidade de julgar situações; 6- problemas com o raciocínio abstrato; 7- colocar objetos em lugares equivocados; 8- alterações de humor de comportamento; 9- alterações de personalidade; 10- perda da iniciativa – ividade. Existem muitas doenças ou alterações orgânicas capazes de levar a um quadro demencial. Muitas dessas causas relacionadas à Demência são reversíveis, principalmente o uso prolongado de alguns medicamentos, como por exemplo, drogas usadas para hipertensão arterial, diuréticos, alguns hipnóticos. A depressão também pode esta associada à Demência. Muitas vezes, diferenciar a Demência da depressão é uma tarefa difícil e que apresenta muitos obstáculos. Outras doenças relacionadas com a Demência são: doenças vasculares do sistema nervoso central – SNC, doenças infecciosas, hipotireoidismo, deficiência de vitamina B12, Síndrome de Wernic-Korsacoff, sífilis e HIV no SNC, doenças degenerativas do SNC (doenças inflamatórias, atrofias etc.) (adaptado de http://www.psiqweb.med.br/)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
12
c. Psicoses Psicoses são distúrbios psiquiátricos graves onde o paciente perde contato com a realidade, emite juízos falsos (delírios), podendo também apresentar alucinações (ter percepções irreais quanto a audição, visão, tato), distúrbios de conduta levando à impossibilidade de convívio social, além de outras formas bizarras de comportamento. O termo Psicose (e sintomas psicóticos) é empregado para se referir à perda do juízo da realidade e um comprometimento do funcionamento mental, social e pessoal, normalmente levando a um prejuízo no desempenho das tarefas e papéis habituais. As Psicoses podem ter várias origens: por lesões cerebrais, tumores cerebrais, esquizofrenia, tóxicos, álcool, infecções, traumas emocionais etc. Algumas Psicose são incuráveis, outras apresentam cura completa. Quase sempre requer tratamento à base de psicotrópicos. Nem sempre é necessária a internação. Nas psicoses agudas, as psicoterapias são pouco indicadas. [No DSM-5, os Transtornos Psicóticos incluem: Transtorno Psicótico Breve, Transtorno Esquizofreniforme, Esquizofrenia, Transtorno Esquizoafetivo, Transtorno Psicótico Induzido por Substância/Medicamento, Transtorno Psicótico Devido a Outra Condição Médica, Catatonia13 Associada a Outro Transtorno Mental, Transtorno Catatônico Devido a Outra Condição Médica, Catatonia Não Especificada, Outro Transtorno do Espectro da Esquizofrenia e Outro Transtorno Psicótico Especificado, Transtorno do Espectro da Esquizofrenia e Outro Transtorno Psicótico Não Especificado.] Na CID.10 os Transtornos Psicóticos são classificados como (F20-F29) esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e transtornos delirantes. Este agrupamento reúne a esquizofrenia, a categoria mais importante deste grupo de transtornos, o transtorno esquizotípico e os transtornos delirantes persistentes e um grupo maior de transtornos psicóticos agudos e transitórios. Os transtornos esquizoafetivos foram mantidos nesta seção, ainda que sua natureza permaneça controversa.” (http://www.psiqweb.med.br/) A perspectiva psicanalítica em relação às psicoses propõe existir um terrível conflito entre o ego e o mundo externo. Incapaz de mediar satisfatoriamente tais circunstâncias o ego criaria uma nova realidade, uma realidade delirante e alucinadamente de acordo com os impulsos do Id. “O efeito patogênico depende do ego, numa tensão conflitual desse tipo, permanecer fiel à sua dependência do mundo externo e tentar silenciar o id, ou se ele se deixar derrotar pelo id e, portanto, ser arrancado da realidade.” Inicialmente, Freud propõe que na neurose existe uma luta vitoriosa contra a perda da realidade, enquanto na psicose a perda é irremediável. Posteriormente, através da observação clínica, ele conclui no texto “A Perda da Realidade na Neurose e na Psicose” que tanto na neurose quanto na psicose existe uma perturbação da relação do sujeito com a realidade. “Na neurose, um fragmento da realidade é evitado por uma espécie de fuga, ao o que na psicose ele é remodelado... a neurose não repudia a realidade, apenas a ignora: a psicose a repudia e tenta substituí-la”. (Freud, 1924, pág. 231) [...] Para Freud, o ponto central de sua observação é que em ambas as estruturas o mais importante não
13
Catatonia - Fenômeno esquizofrênico caracterizado por perda da iniciativa motora e certo grau de tensão muscular, atitude fixa, fenômenos cinéticos e automáticos paradoxais, e, às vezes, estupor, mutismo e negativismo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
13
é a questão relativa à perda da realidade, mas sim os substitutos encontrados. Na neurose, o substituto encontrado ocorre via mundo da fantasia; já na psicose, os substitutos são delírio e alucinação.14 d. Neuroses [...] A neurose é uma reação exagerada do sistema emocional em relação a uma experiência vivida (Reação Vivencial). Neurose é uma maneira da pessoa SER e de reagir à vida. Quando se diz que a pessoa É neurótica e não ESTÁ neurótica, está se tentando dizer que a neurose é uma maneira da pessoa ser, associada a traços de sua personalidade. Essa maneira de ser neurótica significa que a pessoa reage à vida através de reações vivenciais não normais; seja no sentido dessas reações serem desproporcionais, seja pelo fato de serem muito duradouras, seja pelo fato delas existirem mesmo sem que exista uma causa vivencial aparente. Essa maneira exagerada de reagir leva a pessoa neurótica a adotar uma serie de comportamentos compatíveis com o que está sentindo. Cada tipo de transtorno neurótico tem seus sintomas, suas atitudes e sentimentos; o quadro das neuroses é muito variável. Na realidade os quadros neuróticos estão descritos em várias seções, tais como Ansiedades e Fobias, Depressão, Estresse, Histeria e afins, Obsessões e Compulsões e outros. O neurótico tem plena consciência do seu problema e muitas vezes, sente-se impotente para modificá-lo. [...] (adaptado de http://www.psiqweb.med.br/) Sob o ponto de vista psicanalítico, as neuroses corresponderiam, então, “numa divisão entre o afeto e a ideia. O afeto permanece na esfera psíquica, enquanto a ideia a a ser enfraquecida e permanece na [recalcada no inconsciente], separada de qualquer associação. Para Freud, o afeto apresenta um destino diferenciado.15 ‘Mas seu afeto, tornado livre, liga-se a outras ideias que não lhe sejam incompatíveis; e, graças a essa ‘falsa conexão’, tais ideias desenvolvem-se como obsessivas. Essa é, em poucas palavras, a teoria psicológica das obsessões e fobias...’ (Freud,1894, pág. 64) Nesse texto encontra-se a afirmativa de que a histeria, as fobias e obsessões acham-se diretamente relacionadas a ideias sexuais reprimidas. No artigo “hereditariedade e a etiologia das Neuroses”, de 1896, Freud reafirma que a origem das neuroses está vinculada à vida sexual: ‘Baseado em uma laboriosa observação dos fatos, devo sustentar que essa última suposição concorda e muito com a realidade, pois cada uma das neuroses maiores que enumerei têm como sua causa imediata um distúrbio particular da economia do sistema nervoso, e que essas modificações patológicas funcionais têm como fonte comum a vida sexual do sujeito, sejam apoiadas em uma perturbação de sua vida sexual contemporânea ou em fatos importantes do ado.’ (Freud,1896, pág. 171/172)16
14
Adaptado de OLIVEIRA, M.S.B., O conceito das estruturas clínicas neurose e psicose para a psicanálise. [s.d.], p. 120. 15 Estas ideias correspondem ao que se conceitua em psicanálise de “Solução de Compromisso” nas neuroses. 16 OLIVEIRA, M.S.B., O conceito das estruturas clínicas neurose e psicose para a psicanálise. [s.d.], p. 120. As chaves são do professor.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
14
e. Transtornos de personalidade Pessoas explosivas, teatrais, sistemáticas, meticulosas, obsessivas, cismadas, muito emotivas e outros tipos difíceis de conviver sugerem, intuitivamente para todos nós, tratar-se de uma maneira de SER assim e não de ESTAR assim. Ao longo da vida essas pessoas podem melhorar, através de muito empenho e vontade de morrer melhor do que nasceram. Outras estacionam, petrificadas para sempre, sofrendo e fazendo sofrer. Henri Ey considera algumas pessoas portadoras de um Ego Patológico, caracterizando não apenas uma maneira de ESTAR no mundo, mas sobretudo, uma maneira de SER no mundo. Karl Jaspers afirma serem anormais as personalidades que fazem sofrer, tanto a pessoa quanto quem a rodeia. Para Jaspers, as personalidades anormais representam variações não-normais da natureza humana, as quais podem perfeitamente ser entendidas como Transtornos de Personalidade (TP). Diz a CID.10 que os transtornos de personalidade são estados e tipos de comportamentos característicos que expressam maneiras da pessoa viver e de estabelecer relações consigo mesma e com os outros. São distúrbios da constituição e das tendências comportamentais – continua dizendo a CID.10 – não diretamente relacionados a alguma doença, lesão, afecção cerebral ou a outro transtorno psiquiátrico. Isso tudo quer dizer que a pessoa simplesmente é desse jeito e será sempre assim.17 Habitualmente os transtornos da personalidade se acompanham de sofrimento e de comprometimento no desempenho global da pessoa. Aparecem precocemente durante o desenvolvimento individual sob a influência de múltiplos fatores, sejam constitucionais, sociais ou existenciais.18 Depois de solidificado este conjunto de traços pessoais, tal como uma personalidade normal, persistirá indefinidamente. Entretanto, dependendo da cognição, juízo crítico, conhecimento e disposição ao entendimento, tais estados supostamente pétreos podem seguir por caminhos mais favoráveis e de menor sofrimento, tanto para a pessoa deles portadora, quanto dos demais à sua volta. Sabendo lidar com essa questão a pessoa poderá se adaptar perfeitamente a sua maneira de ser, poderá disciplinar pulsões, esquemas de pensamentos, impulsos específicos desses transtornos, e tal manejo poderá ser de tal forma eficiente que a qualidade da vida emocional será muito melhorada. De fato, o que denomina, classifica ou dá o nome ao transtorno da personalidade é a predominância de determinados traços, os quais todos nós os temos em dose diminuta. Todos temos algo de histéricos, uma pitada de paranoia, traços de ansiedade, e assim por diante. Entretanto, no transtorno da personalidade tais traços são predominantes e dominam tiranamente a maneira de ração dessas pessoas de forma a causar sofrimento (na pessoa e/ou naqueles próximos) e comprometer o desempenho. [...] A Organização Mundial de Saúde (OMS) trata do assunto sob o titulo de Transtornos da Personalidade e de Comportamento, especificando-os nos códigos F60 até F69 na CID-10. A OMS descreve tais transtornos da seguinte maneira: ‘Estes tipos de condição abrangem padrões de comportamento permanentes e profundamente arraigados no ser que se manifestam como respostas inflexíveis a uma ampla série de situações 17
Este trecho nos sugere uma causa genética/orgânica para os diversos Transtornos de Personalidade. Observe que neste trecho, diferentemente dos demais, cogitam-se causas sociais e existenciais para os TP. Isto nos sugere uma possível falta de consenso entre os autores psiquiátricos. Note-se, no entanto, que a tendência predominante em psiquiatria, em relação às causas dos TP, é a de atribuir às causas genéticas/orgânicas. 18
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
15
pessoais e sociais. Elas representam desvios extremos ou significativos do modo como o indivíduo médio, em uma dada cultura, percebe, pensa, sente e, particularmente, se relaciona com os outros’. Quando a OMS diz ‘...permanentes e profundamente arraigados no ser...’ ela quer dizer que se trata de uma característica definitiva. Uma pessoa obsessiva, meticulosa, perfeccionista e rígida com problemas de adaptação, por exemplo, pode mudar sua maneira de ser para melhor refazendo algumas crenças pessoais e atitudes comportamentais no sentido de construir melhor relação consigo mesma, com os outros e com a vida, embora continue sendo menos obsessiva, menos meticulosa, menos perfeccionista e menos rígida. Acontecendo assim a pessoa deixará de ter um transtorno de personalidade para ter apenas traços obsessivos, traços perfeccionistas e assim por diante. As características de personalidade por si só não caracterizam um Transtorno de Personalidade, elas são os traços, ou seja, padrões duradouros de percepção, relação e pensamento acerca do ambiente e de si mesmo, e são exibidos numa ampla faixa de contextos sociais e pessoais importantes. É somente quando as características de personalidade são inflexíveis e desadaptadas, causando um comprometimento significativo no desempenho da pessoa é que elas podem constituir-se em Transtornos da Personalidade. Os Transtornos de Personalidade, ainda segundo a CID-10, são condições do desenvolvimento da personalidade que aparecem na infância ou adolescência e continuam pela vida adulta. Esta condição constitucional e biológica de desenvolvimento diferencia o Transtorno da Alteração da Personalidade. A Alteração da Personalidade ocorre durante a vida em consequência de algum outro transtorno emocional, dependência química, traumatismo craniano, tumores, infecções cerebrais, etc. Enfatizando, os Transtornos de Personalidades são perturbações graves da constituição do caráter e das tendências comportamentais [atitudes], portanto, não são adquiridas no meio tal como as Alterações da Personalidade19. A CID-10 apresenta entre os títulos F60 e F69 uma grande variedade de subtipos de Transtornos de Personalidade. [...] A Associação Norte-americana de Psiquiatria, através de seus critérios de classificação e diagnóstico de transtornos mentais, o DSM-5, fala sobre os Transtornos da Personalidade da seguinte forma: Os traços de personalidade constituem transtornos da personalidade somente quando são inflexíveis e mal-adaptativos e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. O aspecto essencial de um transtorno da personalidade é um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo e que se manifesta em pelo menos duas das seguintes áreas: cognição, afetividade, funcionamento interpessoal ou controle de impulsos (Critério A). Esse padrão persistente é inflexível e abrange uma ampla faixa de situações pessoais e sociais (Critério B), provocando sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério C). O padrão é estável e de longa duração, e seu surgimento ocorre pelo menos a partir da adolescência ou do início da fase adulta (Critério D). O padrão não é mais bem explicado como uma manifestação ou consequência de outro transtorno mental (Critério E) e não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento, 19
Este trecho nos sugere uma possível origem genética para tais transtornos. Tal posição da psiquiatria não é a definitiva nas ciências que estudam a mente humana (por exemplo, a própria psicologia).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
16
exposição a uma toxina) ou a outra condição médica (p. ex., traumatismo craniencefálico) (Critério F). E qual seria a diferença entre o Transtorno da Personalidade e a Doença Mental franca? As doenças mentais ocorrem e se desenvolvem a partir de um momento definido da vida, tal como são as crises, reações, processos, episódios e surtos20, enquanto os Transtornos da Personalidade, por sua vez, são maneiras problemáticas de ser, constantes e perenes. As doenças mentais surgem e os Transtornos da Personalidade são.21 Na Esquizofrenia, por exemplo, assim como nos Transtornos do Humor e outros, a partir de um determinado momento na vida a personalidade, que já era chamada pré-mórbida, envereda por uma trajetória que se afasta mais e mais do normal resultando em um episódio agudo. Nos Transtornos da Personalidade o rumo da personalidade está e sempre esteve algo distante do normal, embora não tenha obrigatoriamente que piorar cada vez mais, como nos outros processos psicopatológicos. Os Transtornos de Personalidade afetam todas as áreas da personalidade, o modo como o indivíduo vê o mundo, a maneira como expressa as emoções, o comportamento social. Caracteriza um estilo pessoal de vida mal adaptado, inflexível e prejudicial a si próprio e/ou aos que com ele convivem. Essas características, no entanto, apesar de necessárias não são suficientes para identificação dos Transtornos de Personalidade, pelo fato de serem muito vagas. A maneira mais clara como a classificação deste problema vem sendo tratada é através da subdivisão em tipos de transtornos de personalidade, com critérios de diagnóstico próprios e bem definidos, tanto pela CID.10, quanto pelo DSM-5. Convencionalmente os transtornos da personalidade foram divididos em três grupos: 1º. Grupo – Aqui estão as pessoas caracterizadas essencialmente por pensamentos estranhos, comportamentos excêntricos e mórbida tendência ao isolamento. Estão classificadas aqui as personalidades paranoides e esquizoides, as primeiras possuidoras de rígido padrão de suspeitas e desconfianças infundadas, as segundas são emocionalmente distantes e com dificuldade em estabelecer relações sociais. 2º Grupo – Os transtornos deste grupo têm em comum um comportamento com tendência à dramaticidade, apelação e emoções que se expressam intensamente. Os indivíduos histriônicos representam esse grupo, sendo muito excitáveis, demonstrativos, justificativos e egocêntricos. Também está aqui a chamada Personalidade Antissocial, que manifesta expressiva incapacidade geral de adaptação aos padrões sociais estabelecidos e para relações afetivas estáveis. 3º. Grupo – Estão neste grupo as personalidades com marcantes traços de dificuldade no controle dos impulsos; transtorno explosivo ou impulsivo da personalidade, transtorno ansioso ou evitativo da personalidade, transtorno anancástico ou obsessivo-compulsivo da personalidade.22
20
Assim definidas, o conceito de Doença Mental assemelha-se ao de Alteração da Personalidade, anteriormente estabelecido. 21 Este parágrafo nos sugere, portanto, que os TP não deveriam ser classificados, stricto-sensu, como “doenças mentais”. 22 Adaptado de www.psiqweb.com.br.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
17
Introdução ao estudo da Psicopatologia e o diagnóstico em Psiquiatria Histórico e principais correntes em Psicopatologia CORRENTE DA PSICOPATOLOGIA23 DESCRITIVA – “interessa-se fundamentalmente pela forma das alterações psíquicas, a estrutura dos sintomas, aquilo que caracteriza a vivência patológica como sintoma mais ou menos típico.” Possui, portanto, características diagnósticas e objetivas.
DINÂMICA – “interessa-se pelo conteúdo da vivência, os movimentos internos de afetos, desejos e temores do indivíduo, sua experiência particular, pessoal, não necessariamente classificável em sintomas previamente descritos. Possui, portanto, características pessoais e subjetivas.
MÉDICO-NATURALISTA – “Trabalha com uma noção de homem centrada no corpo, no ser biológico como espécie natural e universal. Assim, o adoecimento mental é visto como um mau funcionamento do cérebro, uma desregulação, uma disfunção de alguma parte do “aparelho biológico”.
EXISTENCIAL – “O doente é visto principalmente como “existência singular”, como ser lançado a um mundo que é apenas natural e biológico na sua dimensão elementar, mas que é fundamentalmente histórico e humano. O ser é construído por meio da experiência particular de cada sujeito, na sua relação com outros sujeitos, na abertura para a construção de cada destino pessoal. A doença mental, nessa perspectiva, não é vista tanto como disfunção biológica ou psicológica, mas, sobretudo, como um modo particular de existência, uma forma trágica de ser no mundo, de construir um destino, um modo particularmente doloroso de ser com os outros.”
COMPORTAMENTAL-COGNITIVISTA – “o homem é visto como um conjunto de comportamentos observáveis, verificáveis, que são regulados por estímulos específicos e gerais, e por certas leis e determinantes do aprendizado. Associada a essa visão, a perspectiva cognitivista centra atenção sobre as representações cognitivas conscientes de cada indivíduo. As representações conscientes seriam vistas como essenciais ao funcionamento mental, normal e patológico. Os sintomas resultam de comportamentos e representações cognitivas disfuncionais, aprendidas e reforçadas pela experiência sociofamiliar.”
PSICANALÍTICA – “o homem é visto como ser “determinado”, dominado por forças, desejos e conflitos inconscientes. A psicanálise dá grande importância aos afetos, que, segundo ela, dominam o psiquismo; o homem racional, autocontrolado, senhor de si e de seus desejos, é, para ela, uma enorme ilusão. Na visão psicanalítica, [as] síndromes mentais são consideradas formas de expressão de conflitos, predominantemente inconscientes, de desejos que não podem ser realizados, de temores aos quais o indivíduo não tem o. O sintoma é encarado, nesse caso, como uma “formação de compromisso”, um certo arranjo entre o desejo inconsciente, as normas e as permissões culturais e as possibilidades reais de satisfação desse desejo. A resultante desse emaranhado
23
Quadro montado a partir de DALGALARRONDO, 2008, p. 35-8)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
18
de forças, dessa “trama conflitiva” inconsciente, é o que se identifica como sintoma psicopatológico.” CATEGORIAL – “As entidades 24 nosológicas ou transtornos mentais específicos podem ser compreendidos como entidades completamente individualizadas, com contornos e fronteiras bem demarcados. As categorias diagnósticas seriam “espécies únicas”, tal qual espécies biológicas, cuja identificação precisa constituiria uma das tarefas da psicopatologia. Assim, entre a esquizofrenia e os transtornos afetivos bipolares e os delirantes, haveria, por exemplo, uma fronteira nítida, configurando-os como entidades ou categorias diagnósticas diferentes e discerníveis na sua natureza básica.” [é o modelo adotado pelo CID-10 e pelo DSM-5].
DIMENSIONAL – “Haveria, então, dimensões como, por exemplo, o espectro esquizofrênico, que incluiria desde formais muito graves, tipo ‘demência precoce’ (com grave deterioração da personalidade, embotamento afetivo, muitos sintomas residuais), formas menos deteriorantes de esquizofrenia, formas com sintomas afetivos, chegando até um outro polo, de transtornos afetivos, incluindo formas com sintomas psicóticos até formas puras de depressão25 e mania26 (hipótese esta que se relaciona à antiga noção de psicose27 unitária). Algumas polaridades dimensionais em psicopatologia seriam, por exemplo: Esquizofrenia deficitária / Esquizofrenia benigna / Psicoses esquizoafetivas / Transtornos afetivos com sintomas psicóticos / Transtornos afetivos menores Ou Depressões graves (estupor28, psicótica) / Depressão bipolar / Depressões moderadas / Distimia / Personalidade depressiva / Depressão subclínica.”
24
Nosologia – é o estudo das doenças. Distimia – [...] em psicopatologia geral, é o termo que designa a alteração básica do humor, tanto no sentido da inibição como no sentido da exaltação. Não se deve confundir o sintoma distímico com o transtorno depressivo persistente (no DSM-5 também chamado de distimia), que, segundo as classificações da CID-10 e do DSM-5, é um transtorno depressivo leve e crônico. (DALGALARRONDO, 2008, p. 164). Como transtorno, a distimia caracteriza-se por ser um rebaixamento crônico do humor, persistindo ao menos por vários anos, mas cuja gravidade não é suficiente ou na qual os episódios individuais são muito curtos para responder aos critérios de transtorno depressivo recorrente grave, moderado ou leve. 26 Mania sem sintomas psicóticos - Presença de uma elevação do humor fora de proporção com a situação do sujeito, podendo variar de uma jovialidade descuidada a uma agitação praticamente incontrolável. Esta elação se acompanha de um aumento da energia, levando à hiperatividade, um desejo de falar e uma redução da necessidade de sono. A atenção não pode ser mantida, e existe frequentemente uma grande distração. O sujeito apresenta frequentemente um aumento do autoestima com ideias de grandeza e superestimativa de suas capacidades. A perda das inibições sociais pode levar a condutas imprudentes, irrazoáveis, inapropriadas ou deslocadas. (CID 10) Mania com sintomas psicóticos - Presença, além do quadro clínico descrito [anteriormente] de ideias delirantes (em geral de grandeza) ou de alucinações (em geral do tipo de voz que fala diretamente ao sujeito) ou de agitação, de atividade motora excessiva e de fuga de ideias de uma gravidade tal que o sujeito se torna incompreensível ou inível a toda comunicação normal. (CID 10) 27 ‘ [...] Uma psicose corresponde a uma perturbação primária da relação libidinal com a realidade. A oposição neurosepsicose põe em jogo a posição intermediária do ego entre o id e a realidade. Enquanto na neurose o ego obedece as exigências da realidade (e do superego), recalcando as reivindicações pulsionais, na psicose começar por se gerar uma ruptura entre o ego e a realidade, que deixa o ego sob o domínio do id.” (CASTRO, 2006, p. 75) 28 Estupor – “estado mental no qual um indivíduo fica total ou quase totalmente insensível e imóvel e experimenta desorientação”. (APA, 2010, p. 391) 25
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
19
BIOLÓGICA – “enfatiza os aspectos cerebrais, neuroquímicos ou neurofisiológicos das doenças e dos sintomas mentais. A base de todo transtorno mental são alterações de mecanismos neurais e de determinadas áreas e circuitos cerebrais. [...] ‘doenças mentais são (de fato) doenças cerebrais. Griesinger, 1845.”
SOCIOCULTURAL – “visa estudar os transtornos mentais como comportamentos desviantes que surgem a partir de certos fatores socioculturais, como discriminação, pobreza, migração, estresse ocupacional, desmoralização sócio familiar etc. Os sintomas e os transtornos devem ser estudados, segundo essa visão, no seu contexto eminentemente sociocultural, simbólico e histórico. É nesse contexto de normas, valores e símbolos culturalmente construídos que os sintomas recebem seu significado, e, portanto, poderiam ser precisamente estudados e tratados. Mais que isso, a cultura, em tal perspectiva, é elemento fundamental na própria determinação do que é normal ou patológico, na constituição dos transtornos e nos repertórios terapêuticos disponíveis em cada sociedade.”29
OPERACIONAL-PRAGMÁTICA – “as definições básicas de transtornos mentais e sintomas são formuladas e tomadas de modo arbitrário, em função de sua utilidade pragmática, clínica ou orientada à pesquisa. Não são questionados a natureza da doença ou do sintoma e tampouco os fundamentos filosóficos ou antropológicos de determinada definição. Trata-se do modelo adotado pelas modernas classificações de transtornos mentais; o DSM-5, norte-americano, e a CID10, da OMS.”
FUNDAMENTAL – “o projeto de psicopatologia fundamental, proposto pelo psicanalista francês Pierre Fedida, visa centrar a atenção da pesquisa psicopatológica sobre os fundamentos de cada conceito psicopatológico. Além disso, tal psicopatologia dá ênfase à noção de doença mental como pathos, que significa sofrimento, paixão e ividade. O pathos, diz Berlin (1977), é um sofrimentopaixão que, ao ser narrado a um interlocutor, em certas condições, pode ser transformado em experiência e enriquecimento.”
29
Assim colocada, esta corrente assemelha-se à corrente Existencial, anteriormente estudada.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
20
O normal e patológico em Psicopatologia "Normalidade é a habilidade para se adaptar ao mundo exterior com satisfação e para dominar a tarefa de aculturação". K. Meninge Há vários critérios de normalidade e anormalidade em medicina e psicopatologia. A adoção de um ou outro depende, entre outras coisas, de opções filosóficas, ideológicas e pragmáticas do profissional [...]. Os principais critérios de normalidade utilizados em psicopatologia são: 1. Normalidade como ausência de doença O primeiro critério que geralmente se utiliza é o de saúde como “ausência de sintomas, de sinais ou de doenças”. Segundo expressiva formação de René Lerdice (1936): “a saúde é a vida no silêncio dos órgãos”. Normal, do ponto de vista psicopatológico, seria então, aquele indivíduo que simplesmente não é portador de um transtorno mental definido. Tal critério é bastante falho e precário, pois, além de redundante, baseia-se em uma “definição negativa”, ou seja, define-se a normalidade não por aquilo que ela supostamente é, mas sim, por aquilo que ela não é, pelo que lhe falta [...]. 2. Normalidade ideal A normalidade aqui é tomada como uma certa “utopia”. Estabelece-se arbitrariamente uma norma ideal, o que é supostamente “sadio”, mas “evoluído”. Tal norma é, de fato, socialmente construída e referendada. Depende, portanto, de critérios socioculturais e ideológicos arbitrários, e, às vezes, dogmáticos e doutrinários. Exemplos de tais conceitos de normalidade são aqueles com base na adaptação do indivíduo às normas morais e políticas de terminada sociedade (como no caso do macarthismo30 nos EUA e do pseudodiagnóstico de dissidentes políticos como doentes mentais da antiga União Soviética). “[...] chamamos de mentalmente insanas as pessoas cujas condutas pessoais violam certas normas éticas, políticas e sociais. Isso explica porque muitas figuras históricas, de Jesus a Castro, e de Jó a Hitler, têm sido diagnosticadas como sofrendo desta ou daquela doença psiquiátrica.” (SZASZ, 1980, p. 29) 3. Normalidade estatística A normalidade estatística identifica norma e frequência. Trata-se de um conceito de normalidade que se aplica especialmente a fenômenos quantitativos, com determinada distribuição estatística na população geral (como peso, altura, tensão arterial, horas de sono, quantidade de sintomas ansiosos, etc.). O normal a a ser aquilo que se observa com maior frequência. Os indivíduos que se situam estatisticamente fora (ou no extremo) de uma curva de distribuição normal am, por exemplo, a ser considerados anormais ou doentes. É um critério muitas vezes falho em saúde geral e mental, pois nem tudo o que é frequente é necessariamente “saudável”, e nem tudo que é raro ou infrequente é patológico. Tomem-se como exemplo fenômenos como as cáries dentárias, a presbiopia31, os sintomas ansiosos e depressivos leves, o uso pesado do álcool, fenômenos estes que podem ser muito 30
Macarthismo (em inglês McCarthyism) é o termo que descreve um período de intensa patrulha anticomunista, perseguição política e desrespeito aos direitos civis nos Estados Unidos que durou do fim da década de 1940 até meados da década de 1950. Foi uma época em que o medo do Comunismo e da sua influência em instituições americanas tornou-se exacerbado, juntamente ao medo de ações de espionagem promovidas pela OTAN. (Wikipedia) 31 Presbiopia - Distúrbio visual que se observa na velhice, e em que se perde, por baixa de elasticidade e por diminuição da capacidade de acomodação do cristalino, o poder de distinguir, com nitidez, objetos próximos. (AURÉLIO)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
21
frequentes, mas que evidentemente não podem, a priori, ser considerados normais ou saudáveis. 4. Normalidade como bem-estar A Organização Mundial de Saúde (WHO, 1946) definiu, em 1946, a saúde como o completo bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente como ausência de doença. É um conceito criticável por ser muito vasto e impreciso, pois bem-estar é algo difícil de se definir objetivamente. Além disso, esse completo bem-estar físico, mental e social é tão utópico que poucas pessoas se encaixariam na categoria “saudáveis”. 5. Normalidade funcional Tal conceito baseia-se em aspectos funcionais e não necessariamente quantitativos. O fenômeno é considerado patológico a partir do momento em que é disfuncional, produz sofrimento para o próprio indivíduo ou para o seu grupo social. 6. Normalidade como processo Neste caso, mais que uma visão estática, consideram-se os aspectos dinâmicos do desenvolvimento psicossocial, das desestruturações e das reestruturações ao longo do tempo, de crises, de mudanças próprias a certos períodos etários. Esse conceito é particularmente útil em psiquiatria infantil, de adolescentes e geriátrica. 7. Normalidade subjetiva Aqui é dada maior ênfase à percepção subjetiva do próprio indivíduo em relação a seu estado de saúde, as suas vivências subjetivas. O ponto falho desse critério é que muitas pessoas que se sentem bem, “muito saudáveis e felizes”, como no caso de sujeitos em fase maníaca, apresentam, de fato, um transtorno mental grave. 8. Normalidade como liberdade Alguns autores de orientação fenomenológica e existencial propõem conceituar a doença mental como perda da liberdade existencial (p.ex., Henry Ey). Dessa forma, a saúde mental se vincularia às possibilidades de transitar com graus distintos de liberdade sobre o mundo e sobre o próprio destino. A doença mental é constrangimento do ser, é fechamento, fossilização das possibilidades existenciais. [...] 9. Normalidade operacional Trata-se de um critério assumidamente arbitrário, com finalidades pragmáticas explícitas. Define-se, a priori, o que é normal e o que é patológico e busca-se trabalhar operacionalmente com esses conceitos, aceitando as consequências de tal definição prévia. Portanto, de modo geral, pode-se concluir que os critérios de normalidade e de doença em psicopatologia variam consideravelmente em função dos fenômenos específicos com os quais se trabalha e, também, de acordo com as opções filosóficas do profissional. Além disso, em alguns casos, pode-se utilizar a associação de vários critérios de normalidade ou doença, de acordo com o objetivo que se tem em mente. De toda forma, essa é uma área da psicopatologia que existe postura permanentemente crítica e reflexiva dos profissionais. (DALGALARRONDO, 2008, p. 31-4)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
22
Entrevista psiquiátrica e exame da doença mental; anamnese psiquiátrica; diagnóstico pluridimensional Principais conceitos: Anamnese – (do grego anámnesis – ana = novo; mnesis = memória - rememoração; recordação). Termo originalmente proposto por Platão para significar a possibilidade de reconhecimento, de recordação da verdade, conhecida pela alma quando da sua existência no mundo espiritual e esquecida quando da sua encarnação material terrena. “[...] em psiquiatria, o relato pessoal do paciente, de sua história desenvolvimental, familiar e médica anterior ao início de um transtorno psicológico ou internação. [sugerido por Aldolf Meyer, psiquiatra norte-americano nascido na Suíça (1866-1950), como um auxílio para o diagnóstico e a exploração de possíveis causas do transtorno do paciente.]” (APA, 2010, p. 74) Diagnóstico – (do grego diagnostikós – “movimento através do conhecimento”; distinguir; reconhecer) – “processo de identificar e determinar a natureza de uma doença ou distúrbio por seus sinais e sintomas, mediante o uso de técnicas de avaliação. [...]” (APA, 2010, p. 283) A entrevista psiquiátrica32 A entrevista psiquiátrica possui três objetivos básicos: a formulação de um diagnóstico, a formulação de um prognóstico33 e o planejamento terapêutico. [...] No início é essencial que o médico se apresente, explique o objetivo da entrevista e, se possível, obtenha o consentimento do paciente. Se não há plena consciência de morbidade por parte do paciente, é fundamental que se entrevistem os familiares – ou outras pessoas que possam prestar informações – de preferência com a concordância (e a presença) do paciente. A arte de entrevistar só pode ser adquirida mediante o treinamento com um supervisor e com a prática. Aulas e manuais, contudo, também trazem algum auxílio. Ensina-se ao aluno como trabalhar com as evidências apuradas, embora seja difícil mostrar como obtê-las. De qualquer modo, há algumas regras básicas que devem ser seguidas: - No começo, deve-se deixar o paciente falar livremente, e só depois perguntar de modo mais específico temas ou pontos duvidosos. - É preciso saber quando e como interromper o paciente: sem cortar o fluxo da comunicação, mas sem deixar que a minuciosidade ou a prolixidade (alterações da forma do pensamento) prejudiquem a obtenção da história clínica. Sempre controlar e dirigir a entrevista. - Não formular as perguntas de maneira monótona ou mecânica. O diálogo deve ser tão informal quanto possível. - Evitar perguntas muito sugestivas, fechadas, que podem ser respondidas com um simples sim ou não: é melhor perguntar ‘Como você está se sentido?’ do que ‘Você está ansioso?’ - Não aceitar jargões fornecidos pelos pacientes, como ‘nervoso’, ‘deprimido’, ‘tenho pânico’: pedir para que ele explique o que quer dizer com essas palavras. - Certificar-se de que o paciente compreende as perguntas: utilizar linguagem ível, sem termos médicos.
32
CHENIAUX, 2013, p. 5-13 – com adaptações. Prognóstico - Juízo médico, baseado no diagnóstico e nas possibilidades terapêuticas, acerca da duração, evolução e termo de uma doença. (AURÉLIO) 33
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
23
Estrutura e conteúdo da anamnese [ou, avaliação] psiquiátrica Os dois componentes da avalição psiquiátrica são: a anamnese e o exame psíquico. [...] A anamnese psiquiátrica segue, em linhas gerais, o roteiro da anamnese em medicina. É preciso ter em mente um roteiro de anamnese, mas este não pode perturbar a espontaneidade da entrevista. A redação final de uma observação psiquiátrica precisa ser completa, sem ser sobrecarregada ou repetitiva, mas nunca será totalmente completa e precisa. Dois examinadores jamais farão a mesma anamnese do mesmo paciente. [...] Itens da avaliação psiquiátrica A redação da avaliação psiquiátrica – incluindo a anamnese e o exame psíquico – pode ser dividida nos seguintes itens: 1) Identificação – A identificação é composta pelos seguintes itens: nome, data de nascimento, sexo, estado civil, naturalidade, nível de instrução, profissão, etnia, religião, residência, procedência, filiação. A identificação pode ser de grande auxílio para a formulação do diagnóstico. Por exemplo, o alcoolismo é mais comum em homens; esquizofrênicos em geral não são casados; pacientes com retardo mental costumam apresentar um baixo nível educacional; etc. Na apresentação pública de casos – como em sessões clínicas -, o nome pode ser representado pelas iniciais, mas é preferível, para preservar o sigilo, usar um pseudônimo. 2) Queixa principal (QP) A QP, que constitui o foco da história da doença atual, deve ser sucinta. Convém relacionar no máximo três queixas, de preferência apenas uma. A QP é redigida com as palavras do paciente (entre aspas, ou usando sic34), devendo ser registrada mesmo que absurda. Caso o paciente não formule nenhuma queixa, isso também tem que ser apontado. 3) Motivo do atendimento – O item motivo do atendimento só é necessário quando não há consciência de morbidade por parte do paciente. O seu conteúdo é fornecido por outra pessoa: um familiar, vizinho, bombeiro, policial, outro profissional de saúde, etc. São reproduzidas literalmente as palavras do informante. 4) História da doença atual – (HDA) A HDA consta de um relato sobre a época e modo de início da doença, a presença de fatores desencadeantes, tratamentos efetuados e o modo de evolução, o impacto sobre a vida do paciente, intercorrência de outros sintomas e as queixas atuais. Ela é narrada pelo paciente, ou por informantes – no caso de pacientes psicóticos -, ou por ambos. Faz-se necessário identificar sempre, para cada informação, qual foi a fonte. Na redação da HDA, evitam-se termos técnicos: são utilizadas as palavras do paciente ou do informante. Os quadros clínicos são descritos, porém não nomeados. A redação deve seguir uma ordem cronológica, mesmo que a narrativa, por parte do paciente ou dos informantes, não tenha sido assim. São ainda incluídas na HDA informações (sobre alterações psíquicas e físicas) pesquisadas ativamente pelo entrevistador, mesmo que não tenham sido trazidas espontaneamente pelo paciente ou informante. Fazem parte também da HDA os negativos pertinentes, ou seja, 34
sic - Palavra que se pospõe a uma citação, ou que nesta se intercala, entre parênteses ou entre colchetes, para indicar que o texto original é bem assim, por errado ou estranho que pareça. (AURÉLIO)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
24
certos sintomas cuja ausência pode ser significativa para a identificação da doença ou da fase evolutiva em que esta se encontra. Episódios psiquiátricos anteriores devem ser relatados também aqui, já que estes devem estar relacionados ao atual, visto que os transtornos mentais são, em geral, crônicos. Em casos de transtorno de personalidade ou de retardo mental, será impossível separar HDA e história pessoal, que podem ser fundidas. 5) História patológica pregressa (HPP) A HPP refere-se a estados mórbidos ados, em geral não psiquiátricos, que não mostrem possuir relação direta ou indireta de causa e efeito com a moléstia atual. Se existir essa relação, eles são incluídos na HDA. São investigados principalmente as seguintes ocorrências: enurese [incontinência urinária], sonilóquio, pesadelos frequentes, terror noturno, sonambulismo, asma, tartamudez [dificuldades para falar, gagueira], fobia escolar, na infância; convulsões35 ou desmaios; doenças venéreas; outras doenças infecciosas, tóxicas ou degenerativas; traumatismos cranianos; alergia; intervenções cirúrgicas; hábitos tóxicos (álcool, tabaco, drogas ilícitas); uso de medicamentos. Faz parte também da HPP a revisão de sistemas, isto é, o questionamento junto ao paciente relativo a cada aparelho de seu organismo (cardiovascular, respiratório, etc.). Na redação da HPP incluem-se todas as doenças importantes relatadas. Não se devem listar doenças ausentes, já que é impossível citar todas as que existem, a não ser que tal ausência seja significativa para a formulação do diagnóstico. 6) História fisiológica São investigados os seguintes elementos relativos à história fisiológica: gestação (da mãe), nascimento, aleitamento, desenvolvimento psicomotor (andar, falar, controle esfincteriano), menarca [primeira menstruação], catamênios [menstruação], atividade sexual, gestações, partos, abortamentos, menopausa, padrões de sono e de alimentação. 7) História pessoal (Fatores Predisponentes) Pode-se optar por fundir a HPP, a história fisiológica, a história pessoal e a história social, sob a denominação de história pessoal. Caso se mantenha a história pessoal como um item mais , pesquisam-se as seguintes informações: - Infância: personalidade, socialização, jogos e brincadeiras, aproveitamento escolar, ansiedade de separação. - Adolescência: desempenho escolar, uso de álcool e drogas, delinquência, relacionamentos interpessoais. - Sexualidade: iniciação, preferência, orientação, número de parceiros, frequência. - Vida profissional: vocações; estabilidade no emprego; relacionamento com chefes, subordinados e colegas; desempenho. - Personalidade pré-mórbida: relacionamentos sociais, interesses, hábitos de lazer e culturais, padrão de humor, agressividade, introversão/extroversão, egoísmo, altruísmo, independência/dependência, atividade/ividade, valore, adaptação ao ambiente. 35
As convulsões generalizadas podem ser: De ausência: geralmente ocorrem em crianças. Como o nome implica, a pessoa fica ausente do mundo consciente por um breve período. Clônicas: causam convulsões ou movimentos involuntários em ambos os lados do corpo. Mioclônicas: envolvem o movimento involuntário da parte superior do corpo e dos membros. Tônicas: resultam na contração súbita dos músculos. Essas convulsões são mais comuns durante o sono. Atônicas: envolvem a perda do controle muscular, fazendo a pessoa desmaiar ou cair. Tônico-clônicas: envolvem uma combinação dos sintomas das convulsões tônicas e clônicas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
25
8) História social Fazem parte da história social informações relativas à moradia – condições sanitárias, pessoas com quem convive, número de cômodos, privacidade, características sóciodemográficas da região; situação socioeconômica; características socioculturais; atividade ocupacional atual; situação previdenciária; vínculo com o sistema de saúde; atividades religiosas e políticas; antecedentes criminais. 9) História familiar (Fator Predisponente) A história familiar abrange dados relacionados a: doenças psiquiátricas e não psiquiátricas; ter sido a gravidez desejada ou não pelos pais do paciente, separação dos pais, quem criou o paciente; ordem de nascimento entre os irmãos, diferença de idade; características de personalidade dos familiares, o relacionamento entre estes e destes com o paciente; atitude da família diante da doença do paciente; relacionamento com o cônjuge e filhos. O exame psíquico O exame psíquico também é chamado de exame do estado mental, exame mental, exame psicopatológico, exame psiquiátrico. Ele começa no primeiro contato com o paciente, antes de se obterem os dados de identificação. O psiquiatra experiente será capaz de realizar a maior parte do exame do estado mental ao mesmo tempo em que completa a tomada da história. [...] No exame psíquico, são descritas apenas as alterações presenciadas durante a entrevista. Portanto, na redação do exame psíquico, expressões como no momento ou durante a entrevista são redundantes. De um momento para outro, a sintomatologia psiquiátrica pode mudar – como podem mudar a frequência cardíaca, a pressão arterial, etc. -, constituindo assim um outro exame psíquico. Nos casos em que a sintomatologia é intermitente, o que não é raro com alucinações e com alterações do nível de consciência, um exame psíquico isolado pode ser pouco revelador. Uma possível solução seria tornar o exame psíquico mais amplo, compreendendo mais de uma observação, com intervalos de horas ou dias entre uma e outra. Na redação, é conveniente a descrição das condições nas quais se realizou ou exame: se no domicílio do paciente, em consultório ou ambulatório, em quarto de hospital, ou numa enfermaria; se havia mais alguém presente. Há uma influência mútua entre as funções mentais. Na verdade, qualquer subdivisão das funções mentais é artificial, e as diversas funções psíquicas são avaliadas de forma praticamente simultânea. As funções psíquicas podem alterar-se quantitativa ou qualitativamente. Além do registro das alterações psicopatológicas, faz parte do exame psíquico a descrição das funções mentais preservadas. Não devem ser consideradas as possíveis causas dos fenômenos: são apontadas todas as alterações presentes, mesmo que, por exemplo, se acredite que elas sejam devidas à medicação em uso. Para a avaliação de algumas funções, como memória, orientação, inteligência, etc., são necessárias perguntas mais específicas ou mesmo testes. A redação do exame psíquico deve restringir-se a uma descrição dos fenômenos observados, sem o uso de termos técnicos. Súmula psicopatológica Os itens que compõem a súmula psicopatológica são: (1) aparência; (2) atitude; (3) consciência; (4) atenção; (5) sensopercepção; (6) memória; (7) fala e linguagem; (8) pensamento; (9) inteligência; “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
26
(10) imaginação; (11) conação36; (12) psicomotricidade; (13) pragmatismo37; (14) humor e afetividade; (15) orientação38; (16) consciência do eu; (17) prospecção39; (18) consciência de morbidade. Esses mesmos elementos são examinados no exame psíquico. A súmula psicopatológica e o exame psíquico possuem o mesmo conteúdo, sendo a súmula um resumo do exame psíquico: a partir de um exame psíquico bem feito, qualquer outra pessoa terá que formular a mesma súmula psicopatológica. Além disso, na súmula torna-se explícita a subdivisão das funções mentais e são utilizados termos técnicos. Não há uma uniformidade quanto a uma configuração ideal da súmula, nem quanto ao número ou ordem de apresentação dos itens. [...] Diagnóstico psiquiátrico [...] As doenças são apenas conceitos, abstrações criadas pelo homem, que podem ser a qualquer momento modificadas ou descartadas. Constituem condições relacionadas a desconforto, dor, incapacitação ou morte, mas que só vão ser consideradas doenças em função de muitos fatores (sociais, econômicos, biológicos, etc.). São levantadas algumas objeções à formulação de diagnósticos. Uma delas está relacionada à ideia de que cada pessoa é uma realidade única e inclassificável: ‘não existem doenças, mas doentes.’ Afirma-se ainda que o diagnóstico é estigmatizante, e que ele apenas serviria para rotular as pessoas diferentes, permitindo e legitimando o poder médico, o controle social sobre o indivíduo desadaptado ou questionador. Mas, entre diagnosticar e reduzir a pessoa que recebeu o diagnóstico a um rótulo, há uma grande diferença. Embora possua algumas desvantagens e possa ser usado indevidamente, o diagnóstico 36
Conação – “[...] conjunto de atividades psíquicas direcionadas para a ação. Incluem-se as funções conativas os impulsos e a vontade.” (CHENIAUX, 2013, p.117) 37 Pragmatismo – “[...] capacidade de colocar em prática, de realizar de forma eficaz, aquilo que se deseja ou que foi planejado. Portanto, ele não pode ser avaliado se a conação está diminuída: se o paciente nada quer, o distúrbio não está na transposição do querer para a realização. De certa forma, o pragmatismo serve como uma medida do grau de eficácia das funções psíquicas em seu conjunto (Motta, 1995). O pragmatismo só pode se alterar quantitativamente, e para menos: hipopragmatismo e apragmatismo. O exame do pragmatismo implica, em primeiro lugar, identificar os interesses e objetivos do paciente, e, em segundo, avaliar a adequação do comportamento quanto à realização de tais objetivos. Todos os transtornos mentais levam a acerto grau de hipopragmatismo, uns mais, outros menos. O maníaco, apesar da hiperbullia (intensificação da vontade), está hipopragmático: seus objetivos mudam constantemente e ele não consegue terminar nada que inicia.” (CHENIAUX, 2013, p.130) 38 Orientação – “é a capacidade de se situar em relação a si mesmo e ao ambiente. Não é propriamente uma função psíquica; consiste, de fato, no resultado dos rendimentos e da integração de diversas funções psíquicas – como a percepção, a atenção, a memória, o pensamento, a inteligência e o afeto. A orientação resulta especialmente da apercepção (ou apreensão, compreensão intelectual). A apercepção representa a capacidade de relacionar entre si as percepções para alcançar a significação do contexto. Por exemplo, na tela do televisor vemos um extenso gramado com algumas marcações brancas e duas traves, além de um bola e homens uniformizados correndo, e, através da apercepção, concluímos que se trata de uma partida de futebol.” (CHENIAUX, 2013, p.152) 39 Prospecção – “[...] consiste no planejamento que o indivíduo faz quanto à própria vida, e reflete a expectativa que ele tem em relação ao futuro. O exame da prospecção se faz perguntando-se diretamente ao paciente o que ele planeja fazer, por exemplo, quando tiver alta hospitalar – se estiver internado -, ou mesmo num futuro mais distante. Os planos para o futuro podem estar ausentes ou presentes. Se estão presentes, podem ser adequados e exequíveis, ou então inadequados e inexequíveis – incompatíveis com a realidade do paciente. Pacientes delirantes costumam formular planos absurdos e inexequíveis: por exemplo, eliminar todas as doenças do mundo. Os deprimidos em geral são pessimistas, e nada esperam do futuro. Os maníacos, ao contrário, são muito otimistas, e muitas vezes formulam planos cuja execução está além de suas possibilidades. Em alguns indivíduos com demência ou retardo mental, em função do prejuízo intelectivo, noções abstratas como a de tempo podem estar ausentes, e a vida psíquica se limita à realidade imediata, sendo impossível a prospecção.” (CHENIAUX, 2013, p.168)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
27
representa uma necessidade prática na medicina e na ciência. As finalidades principais do diagnóstico são: comunicação – permitir uma linguagem comum – e previsão (‘diagnóstico e prognóstico’). Além disso, o diagnóstico favorece a investigação científica e fundamenta as medidas terapêuticas e preventivas.” (CHENIAUX, 2013, p. 5-11) A entrevista com o paciente40 "Harry Stack Sullivan (1983) afirmava que o domínio da técnica de realizar entrevistas é o que qualifica especificamente o profissional habilidoso. Nesse sentido, por exemplo, ele define o psiquiatra (poderia ser um psicólogo clínico ou enfermeiro em saúde mental) como “um perito do campo das relações interpessoais”, ou seja, um expert em realizar entrevistas que sejam realmente úteis, pelas informações que fornecem e pelos efeitos terapêuticos que exercem sobre os pacientes. Assim, a técnica e a habilidade em realizar entrevistas são atributos fundamentais e insubstituíveis do profissional de saúde em geral e de saúde mental em particular. Tal habilidade é, em parte, aprendida e, em outra, intuitiva, patrimônio da personalidade do profissional, de sua sensibilidade nas relações pessoais. É a respeito dos aspectos íveis de serem desenvolvidos, aprendidos, corrigidos e aprofundados que trata este capítulo. [...] De início, pode-se afirmar que a habilidade do entrevistador se revela pelas perguntas que formula, por aquelas que evita formular e pela decisão de quando e como falar ou apenas calar. Também é atributo essencial do entrevistador a capacidade de estabelecer uma relação ao mesmo tempo empática [rapport] e tecnicamente útil do ponto de vista humano. É fundamental que o profissional possa estar em condições de acolher o paciente em seu sofrimento, de ouvi-lo realmente, escutando-o em suas dificuldades e idiossincrasias. Além de paciência e respeito, o profissional necessita de certa têmpera e habilidade para estabelecer limites aos pacientes invasivos ou agressivos, e, assim, proteger-se e assegurar o contexto da entrevista. Às vezes, uma entrevista bem-conduzida é aquela na qual o profissional fala muito pouco e ouve pacientemente o enfermo. Outras vezes, o paciente e a situação “exigem” que o entrevistador seja mais ativo, mais participante, falando mais, fazendo muitas perguntas, intervindo mais frequentemente. Isso varia muito em função: 1. Do paciente, da sua personalidade, do seu estado mental e emocional no momento, das suas capacidades cognitivas, etc. Às vezes, o entrevistador precisa ouvir muito, pois o paciente “precisa muito falar, precisa desabafar”; outras vezes, o entrevistador deve falar mais para que o paciente não se sinta muito tenso ou retraído. 2. Do contexto institucional da entrevista (caso a entrevista se realize em pronto-socorro, enfermaria, ambulatório, centro de saúde, CAPS, consultório, etc.). 3. Dos objetivos da entrevista (diagnóstico clínico; estabelecimento de vínculo terapêutico inicial [rapport]; entrevista para psicoterapia, tratamento farmacológico, orientação familiar, conjugal, pesquisa, finalidades forenses, trabalhistas, etc.). 4. E, finalmente, mas não menos importante, da personalidade do entrevistador. Alguns profissionais são ótimos entrevistadores, falam muito pouco durante a entrevista, sendo discretos e introvertidos; outros só conseguem trabalhar bem e realizar boas entrevistas sendo espontaneamente falantes e extrovertidos. Deve-se ressaltar que, de modo geral, algumas atitudes são, na maior parte das vezes, inadequadas e improdutivas, devendo o profissional, sempre que possível, evitar: 40
DALGALARRONDO, P., 2008, p. 66-84. As chaves e destaques são do professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
28
1. Posturas rígidas, estereotipadas, fórmulas que o profissional acha que funcionaram bem com alguns pacientes e, portanto, devem funcionar com todos. Assim, ele deve buscar uma atitude flexível, que seja adequada à personalidade do doente, aos sintomas que apresenta no momento, à sua bagagem cultural, aos seus valores e à sua linguagem. 2. Atitude excessivamente neutra ou fria, que, muito frequentemente em nossa cultura, transmite ao paciente sensação de distância e desprezo. 3. Reações exageradamente emotivas ou artificialmente calorosas, que produzem, na maioria das vezes, uma falsa intimidade. Uma atitude receptiva e calorosa, mas discreta, de respeito e consideração pelo paciente, é o ideal para a primeira entrevista. Criar um clima de confiança para que a história do doente surja em sua plenitude tem grande utilidade tanto diagnóstica como terapêutica. 4. Comentários valorativos ou emitir julgamentos sobre o que o paciente relata ou apresenta. 5. Reações emocionais intensas de pena ou compaixão. O paciente desesperadamente transtornado, aos prantos, em uma situação existencial dramática, beneficia-se mais de um profissional que acolhe tal sofrimento de forma empática, mas discreta, que de um profissional que se desespera junto com ele. 6. Responder com hostilidade ou agressão às investidas hostis ou agressivas de alguns pacientes. O profissional deve se esforçar por demonstrar serenidade e firmeza diante de um doente agressivo ou muito hostil. Também deve ficar claro que, na entrevista, há limites. O profissional procura responder, ao paciente que eleva a voz e se exalta, sempre em voz mais baixa que ele. Em algumas situações, apesar de não revidar às agressões, o profissional deve mostrar ao paciente que ele está sendo inadequadamente hostil e que não aceita agressão física ou verbal exagerada. Querelas e discussões acirradas costumam ser inúteis no contato com os pacientes. 7. Entrevistas excessivamente prolixas, nas quais o paciente fala, fala, fala, mas, no fundo, não diz nada de substancial sobre seu sofrimento. Fala, às vezes, para se esconder, para dissuadir a si mesmo e ao entrevistador. Nesse sentido, o profissional deve ter a habilidade de conduzir a entrevista para termos e pontos mais significativos, interrompendo a fala do paciente quando julgar necessário. 8. Fazer muitas anotações durante a entrevista, pois, em alguns casos, isso pode transmitir ao paciente que as anotações são mais importantes que a própria entrevista (o profissional precisa observar se o paciente se sente incomodado enquanto anota). Uma dificuldade comum nas entrevistas realizadas em serviços públicos é a falta de tempo dos profissionais, excesso de trabalho, estresse e condições físicas (arquitetônicas) de atendimento precárias. Assim, muitas vezes o profissional de saúde está impaciente para ouvir pessoas com queixas pouco precisas (os “poliqueixosos”), rejeita aqueles doentes que informam de forma vaga ou que estão muito desorganizados psiquicamente. Entretanto, no atendimento em saúde, a paciência do entrevistador é fundamental. Às vezes, o profissional dispõe de não mais que 5 ou 10 minutos (p. ex., no pronto-socorro ou em um ambulatório repleto de pacientes à espera), mas, se nesse pouco tempo, puder ouvir e examinar o doente com paciência e respeito, criando uma atmosfera de confiança e empatia, mesmo com as restrições de tempo, isso poderá propiciar o início de um trabalho de boa qualidade. Muitas vezes, não é a quantidade de tempo com o paciente que mais conta, mas a qualidade da atenção que o profissional consegue lhe oferecer. Assim, o profissional, ao entrar em contato com cada novo paciente, deve preparar seu espírito para encarar o desafio de conhecer essa pessoa, formular um diagnóstico, entender, quando possível, “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
29
algo do que realmente se a em seu interior. Aqui, a paciência é um dos elementos mais fundamentais. Não é possível saber quantas entrevistas e quanto tempo serão necessários para conhecer adequadamente o paciente. A experiência e a atitude do profissional, curiosa, atenta e receptiva, determinam o quão profundo e abrangente será o conhecimento extraído das entrevistas. A(s) primeira(s) entrevista(s) A entrevista inicial é considerada um momento crucial no diagnóstico e no tratamento em saúde mental. Esse primeiro contato, sendo bem-conduzido, deve produzir no paciente uma sensação de confiança e de esperança em relação ao alívio do sofrimento. Entrevistas iniciais desencontradas, desastrosas, nas quais o profissional é, involuntariamente ou não, negligente ou hostil com o paciente, em geral são seguidas de abandono do tratamento. Logo no início, o olhar e, com ele, toda a comunicação não-verbal, já tem sua importância: é o centro da comunicação, que inclui toda a carga emocional do ver e ser visto, do gesto, da postura, das vestimentas, do modo de sorrir ou expressar sofrimento. Mayer-Gross, Slater e Roth (1976) assinalam, nesse sentido, que: ‘A primeira impressão tem o seu valor próprio e dificilmente poderá ser recapturada em ocasiões posteriores...’. E prosseguem: [...] com maior frequência, essa impressão é correta, mesmo que desapareça aos poucos ou e a ser considerada como enganosa, quando a atenção estiver voltada para os detalhes, as ideias e as informações fornecidas pelo paciente.
Em um trabalho clássico sobre o diagnóstico em psiquiatria, Sandifer, Hordern e Grenn (1970) observaram por meio de pesquisas empíricas que, em profissionais com alguma experiência clínica, a entrevista em psiquiatria não funciona como uma “máquina de somar simples”, na qual o ar do tempo vai acrescentando informações, em progressão linear. De fato, esses pesquisadores verificaram que os primeiros três minutos da entrevista são extremamente significativos, sendo muitas vezes úteis tanto para a identificação do perfil dominante de sintomas do paciente como para a formulação da hipótese diagnóstica final. A primeira impressão que o paciente produz no entrevistador é, na verdade, o produto de uma mescla de muitos fatores, como a experiência clínica do profissional, a transferência que o paciente estabelece com ele, aspectos contratransferenciais do entrevistador e valores pessoais e preconceitos inevitáveis que o profissional, querendo ou não, carrega consigo. Além disso, há grande dose de intuição que, lapidada pelo estudo e amadurecida pela prática clínica, pode se tornar instrumento valioso de conhecimento e ação.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
30
Aspecto global do paciente Um fator importante nas fases iniciais da avaliação do paciente é notar e descrever o aspecto global do paciente, expresso pelo corpo e pela postura corporal, pela indumentária (roupas, sapatos, etc.), pelos órios (colares, brincos, piercing, etc.), por detalhes como maquiagem, perfumes, odores, marcas corporais (tatuagens, queimaduras, etc.), porte e atitudes psicológicas específicas e globais do paciente. A aparência do paciente, suas vestes, seu olhar, sua postura, revela muito de seu estado mental interior e é recurso fundamental para o diagnóstico. Nesse sentido, o Quadro 8.2, organizado a partir dos trabalhos de Betta (1972) e de Cheniaux (2005), visa resumir os principais padrões observados no consultório. Além disso, para descrever a aparência do paciente, convém relatar o que se observou de forma detalhada, objetiva e precisa, mas sem precipitações ou inferências indevidas. O Quadro 8.3 apresenta os termos descritivos relativos à aparência física do paciente (Carlat, 2007).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
31
(continua)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
32
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
33
Apresentação Logo no início da entrevista, é conveniente que o profissional se apresente, dizendo seu nome, se necessário, sua profissão e especialidade e, se for o caso, a razão da entrevista. A confidencialidade, a privacidade e o sigilo poderão ser explicitamente garantidos caso se note o paciente tímido ou desconfiado ou se o contexto da entre- vista assim o exigir. Para isso, em alguns casos, é importante que o profissional garanta explicitamente o que segue: 1. A entrevista e o tratamento ocorrerão com sigilo e discrição. O profissional esclarece ao paciente (e aos familiares, quando necessário) que aquilo que for relatado durante as entrevistas não será revelado a ninguém. Caso isso se faça necessário por exigência do próprio tratamento (encaminhamento a um outro profissional, carta à alguma instituição, informação à família para proteger o paciente, etc.), só será feito após consulta e anuência do entrevistado. O sigilo poderá ser rompido no caso de ideias, planos ou atos seriamente auto ou heterodestrutivos. 2. Em qualquer caso, é preciso ressaltar a necessidade de colaboração mútua entre o profissional e o paciente. Ambos devem trabalhar ativamente para que o processo terapêutico tenha bons resultados. Na primeira entrevista, o profissional deve inicialmente colher os dados sociodemográficos básicos, como nome, idade, data de nascimento, naturalidade e procedência, estado civil, com quem reside, profissão, atividade profissional, religião, etc. Após colher tais informações, que de fato situam quem é o paciente que chega ao serviço de saúde, deve-se solicitar que o paciente relate a queixa “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
34
básica, o sofrimento, a dificuldade ou o conflito que o traz à consulta. Esse primeiro relato deve ocorrer de forma predominantemente livre, para que o paciente expresse de forma espontânea seus sintomas e sinais. O profissional ouve o relato e observa, além do conteúdo daquilo que o paciente conta, como esse relato é feito, o “estilo” do paciente, sua aparência e suas atitudes básicas. O profissional deve, nesse momento, muito mais ouvir que falar. Suas intervenções objetivam facilitar o prosseguimento da fala do paciente. O psiquiatra espanhol Vallejo Nágera (1944) aconselhava ao jovem profissional: El explorador hablará poco y dejará que hable mucho el enfermo; la regla más importante del interrogatorio es que el alienista hable muy poco, para que sea locuaz el alienado.
Cabe lembrar, entretanto, que, embora a atitude básica do entrevistador na fase inicial da avaliação seja de escuta, isso não significa colocar-se em posição totalmente iva. Bem ao contrário, pois, como enfatizado por Sullivan (1983), os dados essenciais da clínica psicopatológica emergem basicamente de uma observação participativa, da interação intensa entre paciente e profissional. Nesse sentido, Sullivan (1983) afirmava que [...] o entrevistador desempenha um papel muito ativo na introdução de interrogações, não para mostrar que é inteligente ou cético, mas literalmente para ter certeza que ele sabe o que está sendo dito. [...] Quase toda vez que se pergunta, ‘Bem, você quer dizer assim e assado?’, o paciente é um pouco mais claro sobre o que ele quer dizer...
O entrevistador deve lembrar que, nas fases mais iniciais da entrevista, o paciente pode estar muito ansioso e usar manobras e mecanismos defensivos como riso, silêncio, perguntas inadequadas, comentários circunstanciais sobre o profissional, etc. Por exemplo: “O senhor é jovem, não?”; ou ‘A senhora é casada, tem filhos?”; ou, ainda, “Por que será que todo psiquiatra é tão sério (ou tem barba, etc.)...?’. São estratégias involuntárias ou propositais que podem estar sendo utilizadas para que o paciente evite falar de si, de seu sofrimento, de suas dificuldades. O profissional deve lidar com tais manobras, lembrando polidamente ao paciente que a entrevista tem por finalidade identificar seu problema para, assim, poder melhor ajudá-lo. Ele também deve deixar claro para o paciente que a pessoa do entrevistador não é o tema da entrevista. Nos primeiros encontros, o entrevistador deve evitar pausas e silêncios prolongados, que possam aumentar muito o nível de ansiedade do paciente e deixar a entrevista muito tensa e improdutiva. Alguns procedimentos podem facilitar a entrevista no momento em que o entrevistador lida com o silêncio do paciente: 1. O entrevistador deve fazer perguntas e colocações breves que assinalem a sua presença efetiva e mostrem ao paciente que ele está atento e tranquilo para ouvi-lo. 2. O entrevistador deve evitar perguntas muito direcionadas, fechadas, que possam ser respondidas com um sim ou um não categóricos; também deve evitar perguntas muito longas e complexas, difíceis de serem compreendidas pelo paciente. 3. É sempre melhor intervenções do tipo ‘Como foi isso?’, ‘Explique melhor’, ‘Conte um pouco mais sobre isso’, que questões como ‘Por quê?’ ou ‘Qual a causa?’. Estas últimas estimulam o paciente a fechar e encerrar a sua fala. 4. O entrevistador deve buscar para cada paciente em particular o tipo de intervenção que facilite a continuidade de sua fala. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
35
Mesmo realizando entrevistas abertas, nos primeiros encontros, o profissional deve ter a estrutura da entrevista em sua mente, permitindo ao mesmo tempo que o paciente conte sua própria versão. Falar de forma livre permite que o entrevistador avalie melhor a personalidade e, por vezes, alguns conflitos do paciente. A fala livre também tem frequentemente uma dimensão catártica, de ‘desabafo’, que pode ser muito útil e servir de alívio para o paciente. À medida que o relato feito pelo doente progride, tal relato vai sendo ‘encaixado’ em determinada estrutura de história, que está na mente do entrevistador. Surgirão lacunas nessa história, que saltarão à mente deste. Após a fase de exposição livre, ele fará as perguntas que faltam para completar e esclarecer os pontos importantes da história e da anamnese de modo geral. A duração e o número de entrevistas iniciais, com fins diagnósticos e de planejamento terapêutico não são fixos, dependendo do contexto institucional onde se dá a prática profissional, da complexidade e da gravidade do caso e da habilidade do entrevistador. Transferência e contratransferência O conceito de transferência, introduzido por Freud, é um elemento fundamental que o profissional deve conhecer para realizar as entrevistas de forma mais habilidosa, entendendo e tratando seus pacientes de modo menos ingênuo, mais profundo e sensível. A transferência compreende atitudes e sentimentos cuja origem são basicamente inconscientes para o paciente. Inclui tanto sentimentos positivos (como confiança, amor e carinho) quanto negativos (como raiva, hostilidade, inveja, etc.). Esses sentimentos são uma repetição inconsciente do ado; o analista (ou médico, profissional de saúde, professor, etc.) a a ocupar, no presente, o lugar que o pai ou a mãe ocupavam no ado. O paciente não se dá conta, dizia Freud [1926] (1986), da natureza de tais sentimentos, e os considera como novas experiências reais, em vez de identificar o que eles realmente são, ou seja, reflexos, repetições de sentimentos do ado. O próprio Freud assim descreveu a transferência: Eles desenvolvem com seu médico relações emocionais, tanto de caráter afetuoso como hostil, que não se baseiam na situação real, sendo antes derivadas de suas relações com os pais (o complexo de Édipo). A transferência é a prova de que os adultos não superaram sua dependência infantil.
Assim, para Dewald (1981), a transferência é uma forma de deslocamento que dirige para um objeto presente todos aqueles impulsos, defesas, atitudes, sentimentos e respostas que experimentou e desenvolveu no relacionamento com os primeiros objetos de sua vida.
Segundo Jung (1999), a transferência não é mais que o processo comum de projeção: o paciente tende a projetar inconscientemente no médico os afetos básicos que nutria (e nutre) pelas figuras significativas de sua vida. Trata-se, então, de um fenômeno geral, não apenas exclusivo da relação analítica. Para Jung, pode-se observar a transferência sempre que uma relação íntima entre duas pessoas se estabelece. O paciente projeta inconscientemente, no profissional de saúde, os sentimentos primordiais que nutria por seus pais na infância. Sente o seu médico atual como o pai poderoso e onipotente (ou cruel e autoritário) da infância, ou a enfermeira como a mãe carinhosa e preocupada (ou omissa e negligente) de seus primeiros anos. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
36
A contratransferência é, em certo sentido, a transferência que o profissional estabelece com seus pacientes. Da mesma forma que o paciente, o profissional de saúde projeta inconscientemente, no paciente, sentimentos que nutria no ado por pessoas significativas de sua vida. Sem saber por que, este ou aquele paciente desperta no profissional sentimentos de raiva, medo, piedade, carinho, repulsa, etc. Ao identificar tais reações contratransferenciais e conscientizar-se que estas têm a ver com seus próprios conflitos, o profissional poderá lidar de forma mais racional e objetiva com o que está ocorrendo na relação profissional. [...] Entrevista e dados fornecidos por um “informante [...] muitas vezes faz-se necessária a informação de familiares, amigos, conhecidos e outros. Os dados fornecidos pelo ‘informante’ também padecem de certo subjetivismo, que o entrevistador deve levar em conta. A mãe, o pai ou o cônjuge do(a) paciente, por exemplo, têm a sua visão do caso, e não ‘a visão’ (correta e absoluta) do caso. De qualquer forma, muitas vezes as informações fornecidas pelos acompanhantes podem revelar dados mais confiáveis, claros e significativos. Pacientes com quadro demencial, déficit cognitivo, em estado psicótico grave e em mutismo geralmente não conseguem informar dados sobre sua história, sendo, nesses casos, fundamental a contribuição do acompanhante. Sobre a confiabilidade dos dados obtidos: simulação e dissimulação O profissional com alguma experiência em psicopatologia aprende prontamente que os dados obtidos em uma entrevista podem estar subestimados ou superestimados. Não é raro o paciente esconder deliberadamente um sintoma que vem apresentando, às vezes, de forma intensa; ou relatar um sintoma ou vivência que de fato não apresenta. O profissional deve exercer toda a sua habilidade para buscar diferenciar as informações verdadeiras, confiáveis e consistentes das falsas e inconsistentes. Denomina-se dissimulação o ato de esconder ou negar voluntariamente a presença de sinais e sintomas psicopatológicos. Ao ser questionado sobre se tem algum temor, se tem cismas ou acredita que alguém quer prejudicá-lo, o paciente, mesmo tendo ideação paranóide ou delírio persecutório, nega terminantemente experimentar tais vivências. Em geral, tal negativa ocorre por medo de ser internado, de receber medicamentos ou de ser rotulado como louco. O paciente nega alucinações auditivas, mas cochicha frequentemente com um ser imaginário que está ao seu lado, ou seja, apesar de dissimular as alucinações para o profissional, revela indícios de sua presença por meio de comportamento que é incapaz de dissimular. Já a simulação é a tentativa do paciente de criar, apresentar, como o faria um ator, voluntariamente, um sintoma, sinal ou vivência que de fato não tem (Turner, 1997). O paciente diz ouvir vozes, estar profundamente deprimido ou ter fortes dores nas costas, tudo isso no sentido de obter algo. Geralmente, o paciente que simula sintomas está buscando obter algum ganho com isso: dispensa do trabalho, aposentadoria, internação para não ser encontrado por traficantes de drogas, etc. Devese ressaltar que a simulação é, por definição, um ato voluntário e consciente, não se incluindo aqui os sintomas psicogênicos (como paralisia histérica) sem base orgânica, mas com suas raízes em processos e conflitos inconscientes.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
37
Crítica do paciente e insight em relação a sintomas e transtornos Em psicopatologia, um aspecto característico da clínica é que parte dos pacientes, apesar de apresentar sintomas graves que comprometem profundamente suas vidas, não os reconhece como tal (Lewis, 1934- 2004). Foi proposto que o insight não é um fenômeno categorial e unidimensional, mas inclui vários níveis de intensidade e distintas dimensões (Dantas; Banzato, 2004). Por exemplo, David (1990) propôs ser o insight composto por três componentes: 1. consciência da doença; 2. modo de nomear ou renomear os sintomas; 3. adesão a tratamentos propostos. Em particular, pacientes graves, como psicóticos (Dantas; Banzato, 2007), bipolares em quadro maníaco, alguns dependentes químicos, com retardo mental, síndromes autísticas ou demências, apresentam graves prejuízos quanto ao insight (Antoine et al., 2004). Perspectiva transversal versus longitudinal A avaliação psiquiátrica possui uma dimensão longitudinal (histórica, temporal) e outra transversal (momentânea, atual) da vida do paciente. Ao se colher a dimensão longitudinal, devese buscar descrever relações temporais de forma clara e compreensível e observar como o paciente relata, sente e reage aos eventos ados. Sem a dimensão longitudinal, a transversal fica obscura e incompleta, sendo difícil a sua devida apreciação. Assim, as relações temporais ficam perdidas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
38
Relato do caso por escrito Ao final da entrevista, forma-se o esboço do caso na mente do entrevistador. O estado mental foi observado durante toda a coleta dos dados, surgindo, dessa forma, a síntese do estado mental do paciente para o profissional. O relato do caso por escrito deve conter, de preferência, as próprias palavras que o paciente e os informantes usaram ao descrever os sintomas mais relevantes. O uso de termos técnicos deve ser sóbrio e proporcional ao grau de conhecimento que o profissional obteve do caso. Já a caligrafia deve ser legível, e o estilo, claro, preciso, com frases e parágrafos curtos. Deve-se evitar terminologia por demais tecnicista que geralmente revela a insegurança do profissional, que busca compensar, na linguagem rebuscada, os vácuos de sua ignorância sobre o caso, ou que quer demonstrar de modo exibicionista sua erudição e seu saber médico. Além disso, o profissional deve evitar a interpretação precoce dos dados, seja ela psicológica, psicanalítica, sociológica ou biológica. Uma interpretação precoce, feita muitas vezes de modo apressado e excessivo pelo profissional que quer logo ver um sentido em tudo, pode impedir que se enxergue o paciente que está à sua frente. É preciso lembrar que, apesar de serem descritos fenômenos irracionais em uma história psicopatológica, muitas vezes de forma desorganizada e caótica, o relato deve ser organizado e coerente, facilitando o estabelecimento de hipóteses diagnósticas e o planejamento terapêutico adequado. O paciente tem o direito de ser confuso, contraditório, ilógico; já o profissional, ao relatar o caso, não. Além do aspecto médico essencial, que é o diagnóstico clínico, a entrevista e o seu relato devem fornecer uma compreensão suficientemente ampla da personalidade do paciente, da dinâmica de sua família e de seu meio sociocultural imediato. O relato escrito de um caso tem, além de valor médico, importante valor legal. É um documento que, sendo bem redigido, poderá ser decisivo em questões legais futuras, impensáveis no momento em que a avaliação está sendo feita. No momento em que o entrevistador redige os dados que coletou, deve lembrar que a história clínica deve ser redigida com uma linguagem simples, precisa e compreensível. O relato deve ser pormenorizado, mas não prolixo, detalhado naquilo que é essencial ao caso e conciso naquilo que é secundário. Não será enfocada aqui a entrevista de crianças e adolescentes. Um bom protocolo de avaliação psicopatológica desses grupos etários é o sugerido pela American Academy of Child and Adolescent Psychiatry (1997). Também são recomendados os trabalhos de Shaffer, Lucas e Richters (1999), o livro de Michael Rutter e Eric Taylor (2002), assim como a obra ível e didática de Robert Goodman e Stephen Scott (2004).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
39
DISSOCIAÇÃO DA REALIDADE
PSICOSES ESQUIZOFRENIA
MELANCOLIA
TRANSTORNO BIPOLAR DO HUMOR
___________________________________________________________________________________________________
TRANSTORNOS INTERMEDIÁRIOS
SOCIOPATIAS
BORDERLINES
NEUROSES FÓBICA
OBSESSIVA HISTÉRICA
TRANSFERÊNCIA
HIPOCONDRÍACA
ANSIEDADE DEPRESSIVA
NORMAIS
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
(ORIENTAÇÃO A PARTIR DOS JUÍZOS DE REALIDADE)
40
Processos psíquicos e suas alterações ALTERAÇÕES DA CONSCIÊNCIA (VIGILÂNCIA)41 Consciência psicológica – [...] soma total das experiências conscientes de um indivíduo em determinado momento. Nesse sentido, a consciência é o que se designa campo da consciência. É a dimensão subjetiva da atividade psíquica do sujeito que se volta para a realidade. Na relação do Eu com o meio ambiente a consciência é a capacidade de o indivíduo entrar em contato com a realidade, perceber e conhecer os seus objetos. (DALGALARRONDO, 2008, p. 88) Segundo Jaspers, consciência é ‘o todo momentâneo da vida psíquica.’ Em outras palavras, constitui uma síntese ou integração de todos os processos mentais em determinado momento. As características da consciência psicológica são as seguintes: - trata-se de uma vivência interna e atual; - está relacionada à distinção eu/não eu; - é o conhecimento (o dar-se conta) que o indivíduo tem de suas vivências internas, de seu corpo e do mundo externo – podendo ser didaticamente dividida em consciência do eu [autopsíquica] e consciência dos objetos [alopsíquica]; - segundo a fenomenologia, possui intencionalidade (‘toda consciência é sempre consciência de algo’ [Husserl], é doadora de significado às coisas. - é reflexiva, ou seja, o indivíduo tem consciência de que tem consciência, e assim pode refletir sobre os seus conteúdos psíquicos. (CHENIAUX, 2013, p. 20-1) Alterações quantitativas patológicas da consciência Rebaixamento do nível de consciência A expressão rebaixamento do nível de consciência refere-se a um nível de consciência entre a lucidez e o coma. Constitui uma perda da clareza da consciência: a percepção do mundo externo torna-se vaga e imprecisa (aumenta o limiar para a captação de estímulos externos), havendo ainda uma dificuldade para a introspecção, para a apreensão do próprio eu. O rebaixamento do nível de consciência está relacionado a um comprometimento difuso, generalizado, do funcionamento cerebral. Sempre possui uma etiologia orgânica. Ocorre um déficit cognitivo global. Estão especialmente afetadas as funções de atenção, orientação alopsíquica, pensamento, inteligência, sensopercepção, memória, afeto e psicomotricidade. [...] Obnubilação42 simples e oniróide “O doente revela-se indiferente, apático, sem iniciativa e sem espontaneidade.” (PAIM, 1993, p.201) 41
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 20-32; DALGALARRONDO, 2008, p. 88-101; PAIM, 1993, p. 193-218. 42 Obnubilação vem do latim, ob + nubilare, que significa ‘por uma nuvem na frente’, ‘enevoar’. Em psicopatologia, o turvamento da consciência.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
41
A obnubilação simples caracteriza-se pela ausência de sintomas psicóticos. O paciente apresenta, além de intensa sonolência, hipoprosexia (diminuição global da atenção), desorientação no tempo e no espaço, pensamento empobrecido e alentecido (às vezes, mutismo), dificuldades de compreensão e de raciocínio, hipoestesia (alteração quantitativa da sensopercepção), hipomnesia de fixação e de evocação (distúrbio da memória), apatia e inibição psicomotora (às vezes, estupor). A obnubilação oniróide43 caracteriza-se pela presença de sintomas psicóticos, especialmente ilusões e pseudoalucinações44 visuais (menos frequentemente, de outras modalidades sensoriais) [...], além de ideias deliróides (muitas vezes, persecutórias). Há ainda dificuldade de concentração (com exacerbação da atenção espontânea), desorientação têmporo-espacial, desagregação do pensamento, dificuldade de compreensão e de raciocínio, amnésia de fixação e de evocação, exaltação afetiva (muitas vezes, ansiedade), perplexidade e agitação psicomotora. Esse quadro corresponde à amência [ou, confusão mental], termo introduzido por Meynert em l890. O delirium tremens45, um quadro grave de abstinência alcóolica, costuma cursar com obnubilação oniróide. O indivíduo encontra-se agitado e assustado, sem saber onde está e não conseguindo 43
Oniroide – do grego oneiros, que significa ‘sonhos’. Pseudoalucinação – “percepção falsa que, ao contrário das alucinações, se reconhece como irreal. Kandinsky, que a descreveu pela primeira vez em 1885, a denomina como a percepção que prescinde de ‘corporeidade’ que aparece no ‘espaço’ subjetivo interno’ e, no entanto, ‘se apresenta com toda a adequação perceptiva dos elementos sensíveis’. (DORSCH, 2001, p. 711) “Resultam de atividade muito intensa da imaginação, em virtude da qual a imagem adquire o aspecto de percepção real. É comum, normalmente, depois de uma viagem a bordo, nos sentirmos, em terra, como se estivessemos navegando. Observa-se, por exemplo, como sintoma patológico, no delírio espírita episódico.” (http://www.psiquiatriageral.com.br/psicopatologia/01percepcao.htm) 45 Delirium – “Síndrome cerebral orgânica sem etiologia específica caracterizada pela presença simultânea de perturbações da consciência e da atenção, da percepção, do pensamento, da memória, do comportamento psicomotor, das emoções e do ritmo vigília-sono. A duração é variável e a gravidade varia de formas leves a formas muito graves. (CID -10) A característica essencial de um delirium consiste de uma perturbação da consciência acompanhada por uma alteração na cognição que não pode ser melhor explicada por uma Demência preexistente ou em evolução. A perturbação desenvolve-se em um curto período de tempo, geralmente de horas a dias, tendendo a flutuar no decorrer do dia. Existem evidências, a partir da anamnese, exame físico ou testes laboratoriais, de que o delirium é uma consequência fisiológica direta de uma condição médica geral, Intoxicação ou Abstinência de Substância, uso de um medicamento ou exposição a uma toxina, ou uma combinação desses fatores. A perturbação na consciência manifesta-se por uma redução da clareza da consciência em relação ao ambiente. A capacidade para focalizar, manter ou deslocar a atenção está prejudicada. As perguntas precisam ser repetidas porque a atenção do indivíduo se dispersa, ou o indivíduo pode perseverar na resposta a uma pergunta anterior, ao invés de deslocar adequadamente o foco de sua atenção. A pessoa se distrai facilmente com estímulos irrelevantes. Em vista desses problemas, pode ser difícil (ou impossível) engajá-la em uma conversação. Há uma alteração concomitante na cognição (que pode incluir comprometimento da memória, desorientação ou perturbação da linguagem) ou desenvolvimento de uma perturbação da percepção. O comprometimento da memória é evidente, acomete com maior frequência a memória recente e pode ser testado pedindo-se que a pessoa memorize vários objetos sem relação entre si ou uma frase curta e os repita após alguns minutos de distração. A desorientação é habitualmente manifestada por desorientação temporal (por ex., pensa ser de manhã no meio da noite) ou espacial (por ex., pensa estar em casa, não em um hospital). No delirium leve, a desorientação temporal pode ser o primeiro sintoma a aparecer. A desorientação autopsíquica é menos comum. A perturbação na linguagem pode se evidenciar como disnomia (isto é, prejuízo na capacidade de nomear objetos) ou disgrafia (isto é, prejuízo na capacidade de escrever). Em alguns casos, o discurso é dispersivo e irrelevante; em outros, compulsivo e incoerente, com mudanças imprevisíveis de assunto. O profissional pode ter dificuldade para avaliar alterações na função cognitiva, pois o indivíduo pode mostrar-se desatento e incoerente. Sob essas circunstâncias, é útil rever cuidadosamente a sua história e obter informações a partir de outros informantes, particularmente membros da família. As perturbações na cognição podem incluir interpretações errôneas, ilusões ou alucinações. O bater de uma porta, por exemplo, pode ser interpretado pela pessoa como um tiro (interpretação incorreta); as dobras nas roupas de cama podem 44
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
42
identificar corretamente as pessoas ao seu redor. Com grande frequência, ele vê ou sente sobre sua pele pequenos animais repugnantes – como baratas, aranhas, lagartixas ou ratos -, os quais não estão realmente presentes. Coma O termo coma vem do grego e significa sono profundo. O quadro caracteriza-se por abolição da consciência. Nesse estado, o indivíduo não pode ser despertado nem por estímulos dolorosos muito intensos. Ocorre perda total da motricidade voluntária e da sensibilidade. Embora a vida somática prossiga, não há sinal de atividade psíquica.”46 Sopor Segundo o dicionário Aurélio, sopor significa “modorra, sonolência; sono pesado. Estado comatoso, letargia.” Em psicopatologia, refere-se a um estado de marcante turvação da consciência no qual o paciente pode ser apenas despertado por estímulos enérgicos, sobretudo de natureza dolorosa. Embora o indivíduo ainda possa apresentar reações de defesa ele é incapaz de qualquer ação espontânea. O paciente sempre se mostra evidentemente sonolento. A psicomotricidade encontra-se mais inibida do que nos estados de obnubilação. O traçado eletroencefalográfico acha-se globalmente lentificado, podendo surgir as ondas mais lentas, do tipo delta e teta.47
parecer-lhe objetos animados (ilusão); ou o indivíduo pode "ver" um grupo de pessoas pairando sobre a cama, quando na verdade não há ninguém ali (alucinação). Embora as interpretações sensoriais incorretas sejam habitualmente do tipo visual, elas podem afetar também outras modalidades sensoriais. As percepções errôneas variam de simples e uniformes até altamente complexas. O indivíduo pode ter uma convicção delirante do caráter de realidade das alucinações e apresentar respostas emocionais e comportamentais congruentes com seu conteúdo. A perturbação desenvolve-se em um curto período de tempo e tende a apresentar flutuações no decorrer do dia. Durante a ronda hospitalar matinal, por exemplo, a pessoa pode mostrar-se coerente e cooperativa, mas à noite pode insistir em arrancar o equipamento intravenoso e voltar à casa dos pais já falecidos. (DSM-IV) A abstinência e várias outras condições médicas não relacionadas ao alcoolismo podem causar esse problema. Como dentro do estado de delirium da abstinência alcoólica são comuns os tremores intensos ou mesmo convulsão, o nome ficou como Delirium Tremens. Um traço comum no delírio tremens, mas nem sempre presente são as alucinações táteis e visuais em que o paciente "vê" insetos ou animais asquerosos próximos ou pelo seu corpo [Síndrome de Ekbom, Delírio Parasitário ou Delírio Dermatozóico, é uma condição na qual o paciente apresenta a crença inabalável de que está infestado por parasitas, sejam sobre sua pele, ou mesmo percorrendo o interior do seu corpo]. Esse tipo de alucinação pode levar o paciente a um estado de agitação violenta para tentar livrar-se dos animais que o atacam. Pode ocorrer também uma forma de alucinação induzida, por exemplo, o entrevistador pergunta ao paciente se está vendo as formigas andando em cima da mesa sem que nada exista e o paciente a a ver os insetos sugeridos. O Delirim Tremens é uma condição potencialmente fatal, principalmente nos dias quentes e nos pacientes debilitados. A fatalidade quando ocorre é devida ao desequilíbrio hidro-eletrolítico do corpo.”( http://www.psicosite.com.br) 46 Adaptado de CHENIAUX, 2013, p. 22-3. 47 Adapatado de DALGALARRONDO, 2008, p.96.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
43
Estados crepusculares48 ou estreitamento da consciência Outra alteração da qualidade da consciência é o Estado Crepuscular ou, conforme preferem alguns o Estreitamento da Consciência. Neste estado o paciente parece estar totalmente voltado para dentro. Perambula como que ausente psiquicamente, automático e sem objetivos claramente definidos. O pensamento pode ser comparado a uma vivência onírica, pouco clara e da qual as lembranças são embasadas e turvas, não raras vezes nada é lembrado depois de ado o episódio do Estado Crepuscular. Pode manifestar-se um pavor irracional ou uma agressividade extremada durante a crise. Entre as patologias que comumente proporcionam o Estado Crepuscular a Epilepsia tem lugar destacado mas não monopoliza todos os pacientes que apresentam este quadro. Situações psicotiformes reativas 49 e vivências muito traumáticas podem "empurrar" o paciente para este estado de afastamento momentâneo de uma realidade sofrível. Portanto, o Estado Crepuscular é um estreitamento transitório da consciência, com a conservação de uma atividade mais ou menos coordenada, mais ou menos automática. Normalmente há falsa aparência de que o paciente está compreendendo a situação. Em geral, a percepção do mundo exterior é imperfeita ou de todo inexistente. Em alguns casos de Estado Crepuscular, é possível observar a presença de alucinações e ideias deliróides, mas isso não é a regra. A conduta do enfermo durante o episódio, à primeira vista, pode parecer ordenada mas, na realidade, a maioria de suas atitudes é automática. Durante o Estado Crepuscular o paciente pode estar dominado por impulsos e, uma vez conservada sua capacidade de decisão e de ação, pode praticar atos incompreensíveis, agressivos, impulsivos e violentos contra pessoas. Essa espécie de automatismo resulta que o doente pode executar uma série de atos coordenados e com certa finalidade, embora inconscientes, tais como andar sem destino, enfrentar situações complexas como o sistema de transportes de uma grande cidade e até mesmo adquirir agens e realizar viagens de longo percurso. Os Estados Crepusculares costumam desaparecer rapidamente, mas, em alguns casos, podem durar muitos dias. Apresentam-se e terminam de modo súbito, acompanhando-se de amnésia em relação às vivências uais [por os].” (http://www.psiqweb.med.br). Os estados crepusculares podem ocorrer associados com despertar do sono [consciência hipnopômpica50], à epilepsia, ao sonambulismo, terror noturno, quadros alucinatórios, intoxicação alcoólica e delirium.
48
De crepúsculo, “luminosidade, de intensidade crescente ao amanhecer (crepúsculo matutino) e decrescente ao anoitecer (crepúsculo vespertino), proveniente da iluminação das camadas superiores da atmosfera pelo Sol, quando, embora escondido, está próximo do horizonte: Figura: Decadência, declínio; ocaso. (AURÉLIO) 49 Ou seja, formas psicóticas reativas à determinados eventos. P.ex., uma grave depressão, produzida pela morte de ente querido, com manifestações delirantes. 50 Convém diferenciar duas condições da consciência relacionadas ao sono/vigília: 1ª. a hipnagógica. Ou seja, a condição de sonolência, precedente ao sono e, 2ª. hipnopômpica. Ou seja, a condição anterior à vigília, logo após o sono.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
44
Onirismo “Estado semelhante a sonho em uma condição de vigília.” (APA, 2010, p. 664) O termo Onirismo é empregado para designar os estados de sonho patológico. O Onirismo se caracteriza pela predominância das representações imaginárias, resultando em perturbações sensoriais e sensitivas. Nesta situação, muitas imagens aparecem como nitidamente alucinatórias e tais representações compõem o fenômeno intelectual inicial, daí adquirem a forma de percepção, colocando em atividade os centros sensoriais das zonas sensitivas e sensoriais terminais. Henri Ey comenta esse tema e diz que as lembranças e as imagens que participam da composição fantástica do Onirismo são, elas próprias, dotadas de forte coeficiente de realidade, de tal sorte que o conjunto adquire um perfeito caráter de nitidez e de realidade cênica. Será exatamente essa realidade cênica que constitui o material imaginário do qual, pelo menos em certos momentos, o paciente toma consciência. Muitos autores estudaram esses casos de perturbações do sonhar, relatados como sonhos intensos e vivenciados por uma consciência em Estado Crepuscular, o que determina uma profunda alteração do imaginário e do próprio ato de sonhar. A descrição desses casos de Onirismo mostra a existência de uma obnubilação da consciência durante um Estado Crepuscular, onde as cenas oníricas desenroladas durante este Estado Crepuscular pudessem ser relembradas ao retornar o paciente às condições de normalidade. (http://www.psiqweb.med.br)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
45
Alterações da consciência do eu51 52 [...] As alterações da consciência do eu normalmente estão relacionadas ao fato do indivíduo sentirse possuído por entidades sobrenaturais, especialmente espíritos e demônios. No grupo das Alterações da Consciência do Eu incluem-se os seguintes transtornos: Estado de Êxtase Estado mental transitório, no qual o indivíduo perde todo contato com o mundo sensível e experimenta um profundo sentimento de beatitude ou de graça, por encontrar-se absorvido na contemplação mística e/ou espiritual. Algumas pessoas com prática em meditação podem experimentar estados de êxtases de duração muito variável. Portanto, para se atingir voluntariamente o estado de êxtase, é necessário um treinamento especial ou preparação através de exercícios espirituais. Também alguns estados psicopatológicos, como por exemplo na histeria, em alguns casos de esquizofrenia ou em crises de mania podemos observar Estados de Êxtase. Nesses casos a consciência fica polarizada ao objeto da meditação e a pessoa abstêm-se voluntariamente de contatar o restante da realidade, tal como ocorreria numa auto-hipnose.53 Transitivismo Transitivismo é o fenômeno onde o enfermo sente-se transformado em outra pessoa, como se fosse uma despersonalização54. Em psicopatologia, o transitivismo consiste no desaparecimento da relação entre o corpo e os objetos do meio exterior, como uma impossibilidade de estabelecer a distinção entre aquilo que é próprio do indivíduo e aquilo que pertence ao meio exterior, havendo um apagamento dos limites entre a pessoa e o exterior. Apesar do fenômeno poder aparecer sob a influência de severa angústia55, na maioria das vezes prenuncia o desenvolvimento de uma psicose ou, quando não, ocorre na vigência de uma lesão dos 51
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 159-67; DALGALARRONDO, 2008, p. 245-56; PAIM, 1993, p. 193-218. 52 “[...] De maneira muito geral, ele [o Ego/Eu] define a pessoa enquanto unidade distinta. Deve-se assinalar uma ambiguidade fundamental: o ego/eu se baseia numa experiência subjetiva (consciência de si), que garante sua unidade, e ao mesmo tempo é o agente que governa as relações da pessoa com o mundo. [...] [Em psicanálise] O ego/eu aparece, com efeito, como uma instância dentro da personalidade, cujas principais funções são a adaptação ao real e a manutenção da coerência interna. O ego/eu é, ao mesmo tempo, uma instância integrada onde se forjam as representações conscientes, especialmente a representação de si, e a agência defensiva que, para corresponder às duas exigências do princípio da realidade e da coerência interna, deve, diante de qualquer sinal de ameaça em relação a esses dois princípios (proveniente das representações internas ou das percepções), instalar mecanismos de recalque. O ego/eu é, portanto, ao mesmo tempo, a sede da consciência e o agente de operações conscientes e inconscientes. (DORON; PAROT, 2006, p. 270) 53 O Estado do Êxtase é também considerado uma alteração do humor. 54 Vide página 52. 55 Cabe aqui fazer algumas diferenciações importantes: “O termo angústia relaciona-se diretamente à sensação de aperto no peito e na garganta, de compressão, sufocamento. Assemelha-se muito à ansiedade, mas tem conotação mais corporal e mais relacionada ao ado. Do ponto de vista existencial, a angústia tem significado mais marcante, é algo que define a condição humana, é um tipo de vivência mais ‘pesada’, mais fundamental que a experiência da ansiedade. Ansiedade, por seu turno, é definida como estado de humor desconfortável, apreensão negativa em relação ao futuro, inquietação interna desagradável. Inclui manifestações somáticas e fisiológicas (dispneia, taquicardia, vasoconstrição ou dilatação, tensão muscular, parestesias (sensações anormais - formigamento, picada, queimadura - não causadas por
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
46
hemisférios cerebrais ou alguma outra da maturação neurológica. Por falta dessa maturação o fenômeno pode ser observado como manifestação patológica em crianças entre 4 e 8 anos de idade. No curso da esquizofrenia o Transitivismo, se apresenta como sintoma de primeira ordem, quando então o enfermo situa em seu corpo um objeto exterior; seus órgãos se transformaram ou se comunicam uns com os outros, sem consideração as realidades anatômicas. Nessa situação as ações parecem comandadas de fora e acompanhadas da sensação de influência. Possessão O fenômeno da possessão tem caráter universal e a psicopatologia tenta explicá-lo em termos de sugestão ou autossugestão ou como resultado de desdobramentos do eu. Evidentemente a crença cultural em espíritos desempenha papel importante no aparecimento dessas possessões. Oesterreich acha que através da provocação da possessão, o ser humano primitivo procurou voluntariamente a presença consciente do metafísico e o desejo da presença divina, ambos oferecendo forte incentivo para continuar a cultivar estados de possessão. Também os desejos de comunicação com ancestrais e outros parentes mortos desempenham importante papel na possessão do moderno espiritismo. Em seu estudo, Oesterreich procurou destacar as relações da possessão com as condições socioculturais existentes entre os povos onde o fenômeno é observado e, pode-se dizer que, na sociedade humana, a possessão começa a desaparecer assim que a crença nos espíritos vai perdendo influência. A partir do momento em que não se leva a sério a possibilidade da possessão, começa a faltar a necessária autossugestão. Na clínica psiquiátrica a possessão é sempre acompanhada do sentimento de desdobramento da personalidade e se manifesta em sua forma típica no delírio de possessão demoníaca ou no Transtorno de Possessão. Há também um evidente aspecto de contaminação (normalmente entre pacientes histéricos) desses fenômenos de possessão, onde ocorrem "epidemias" de possuídos. Licantropia Podem ser observados também os casos de delírio de possessão por animais, dos quais os mais célebres são as possessões por lobos, neste caso chamado de Licantropia (Lobisomem). A Licantropia foi uma das manifestações muito comuns na Idade Média. Os pacientes com este quadro se achavam transformados em lobo, ou tinham uma serpente dentro do corpo, ou outros animais. Na manifestação completa de Licantropia o paciente se torna "corpo e alma" do animal. Com frequência, a possessão é vivida não como a inclusão de um corpo em outro corpo, mas como a animação do corpo por um espírito do animal. Convicção de inexistência Trata-se de uma convicção de inexistência do próprio corpo ou de certos órgãos, ou de que o enfermo não se encontra vivo e sim morto. O paciente apresenta uma forma de anulação da própria corporalidade ou existência.” (http://www.psiqweb.med.br) estímulo exterior ao corpo), tremores, sudorese, tonturas, etc.) e manifestações psíquicas (inquietação interna, apreensão, desconforto mental, etc.). [...] (DALGALARRONDO, 2008, p. 166)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
47
ALTERAÇÕES DA ATENÇÃO56 Atenção (ou, direção da consciência) – estado de consciência em que os sentidos estão seletivamente focados em aspectos do ambiente e o sistema nervoso central está em estado de prontidão para responder a estímulos. Uma vez que os seres humanos não possuem uma capacidade infinita de prestar atenção a todas as coisas – focalizam certos aspectos às custas de outros -, grande parte da pesquisa nesse campo investiga os fatores que influenciam a atenção e procura compreender os mecanismos neurais envolvidos no processamento seletivo da informação. Por exemplo, a experiência ada afeta a experiência perceptiva (percebemos coisas que têm significado para nós) e algumas atividades (p.ex., leitura) requerem participação consciente (i.e., atenção intencional). Entretanto, a atenção também pode ser capturada (i.e., dirigida involuntariamente) por qualidades de estímulos do ambiente, tais como intensidade, movimento, repetição, contraste e novidade. (APA, 2010, p. 107) Em função da atividade predominante, distinguem-se várias formas de atenção: sensorial, motora e intelectual. A atenção sensorial está relacionada aos nossos cinco sentidos (visão, audição, olfato, tato e paladar). Por exemplo, ao provarmos uma bebida, concentramos nossa percepção (atenção) no paladar a fim de discernirmos o gosto da bebida. “Na atenção motora, a consciência está concentrada na execução de uma atividade: o exemplo típico é encontrado na aprendizagem de exercícios físicos e, mais comumente, na formação intencional dos hábitos. O papel da atenção, nesse caso, consiste em limitar o campo aos seus movimentos voluntários, à exclusão dos elementos automáticos e a reduzir os elementos intelectuais do próprio movimento. (PAIM, 1993, p. 164) Atenção intelectual – “Representa o ato de reflexão, quando necessitamos resolver qualquer problema em que se encontre implicado o raciocínio. [...]” (PAIM, 1993, p. 164) Distração – Chama-se distração a dois estados diferentes. Em primeiro lugar é uma incapacidade quase completa de fixar a atenção. Bleuler cita como exemplo a falta de tenacidade e a supervigilância observada no escolar, que desvia a todo instante a atenção de seus deveres para os mais simples ruídos do meio exterior. No segundo caso, trata-se de uma concentração muito forte em determinado assunto, que impede a apreensão de tudo aquilo que não se refere ao motivo particular de atenção: é a distração do sábio, do estudioso que se acha interessado vivamente por uma ideia ou por uma pesquisa científica. Os efeitos, nos dois casos, são idênticos, pois a consciência não focaliza, suficientemente, as impressões que a atingem. [...] (PAIM, 1993, p. 170) Alguns autores referem-se a distraibilidade, um estado patológico que se exprime por instabilidade marcante e mobilidade acentuada da atenção voluntária, com dificuldade ou incapacidade para
56
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 33-40; DALGALARRONDO, 2008, p. 102-08; PAIM, 1993, p. 161-72.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
48
fixar-se ou deter-se em qualquer coisa que implique esforço produtivo. A atenção do indivíduo é muito facilmente desviada de um objeto para outro. Hiperprosexia – refere-se ao aumento quantitativo da atenção. Refere-se a uma superatividade da atenção espontânea. Caracteriza-se, essencialmente, por uma extrema habilidade de atenção, o que leva o indivíduo a atender, simultaneamente, às mais variadas impressões sensoriais, sem que fixe a atenção sobre um objeto determinado. [...] Nas síndromes maníacas, os enfermos são levados a prestar atenção forçada aos deferentes estímulos sensoriais. [...] (PAIM, 1993, p. 171) Hipoprosexia – Consiste no enfraquecimento acentuada da atenção em todos os seus aspectos. É observada nos estados infecciosos acompanhados de obnubilação da consciência, na embriaguez alcoólica aguda, em casos de transtornos mentais tóxicos, na amência e em certas reações vivenciais anormais. Os estados depressivos sempre se acompanham de diminuição da capacidade de concentrar a atenção, particularmente nos quadros de depressão ansiosa, que podem chegar, em casos de estupor melancólicos, a um diminuição acentuada da capacidade de concentrar a atenção. (PAIM, 1993, p. 171) Aprosexia – É a falta absoluta de atenção, dependendo esse tipo de transtorno de acentuada deficiência intelectual ou de inibição cortical. Esse estado difere da insuficiente capacidade de concentração de origem afetiva e das manifestações de negativismos esquizofrênico. O sintoma foi descrito por Chavigny como sequela da confusão mental de guerra. Observa-se a aprosexia na amência, no estupor e nos estados demenciais. (PAIM, 1993, p. 172) No transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) o paciente “apresenta atenção ou vigilância excessiva e desregulada. O paciente demonstra alterações no controle executivo (funções frontais), na memória de trabalho (intimamente relacionada à atenção e na seleção de respostas. Na esquizofrenia, o déficit de atenção é central. A filtragem de informação irrelevante geralmente consiste em uma dificuldade importante dos sujeitos acometidos. Pacientes esquizofrênicos costumam ter dificuldades em anular adequadamente estímulos sensoriais irrelevantes enquanto realizam determinada tarefa; são muito suscetíveis de distrair-se com estímulos visuais e auditivos externos.[...] No transtorno do déficit de atenção/hiperatividade57 (TDAH) - A característica essencial do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade é um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade que interfere no funcionamento ou no desenvolvimento. A desatenção manifesta-se comportamentalmente no TDAH como divagação em tarefas, falta de persistência, dificuldade de manter o foco e desorganização – e não constitui consequência de desafio ou falta de 57
TDAH - O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude (hiperatividade) e impulsividade. Ele é chamado às vezes de DDA (Distúrbio do Déficit de Atenção). (http://www.tdah.org.br)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
49
compreensão. A hiperatividade refere-se a atividade motora excessiva (como uma criança que corre por tudo) quando não apropriado ou remexer, batucar ou conversar em excesso. Nos adultos, a hiperatividade pode se manifestar como inquietude extrema ou esgotamento dos outros com sua atividade. A impulsividade refere-se a ações precipitadas que ocorrem no momento sem premeditação e com elevado potencial para dano à pessoa (p. ex., atravessar uma rua sem olhar). A impulsividade pode ser reflexo de um desejo de recompensas imediatas ou de incapacidade de postergar a gratificação [baixo limiar de frustração]. Comportamentos impulsivos podem se manifestar com intromissão social (p. ex., interromper os outros em excesso) e/ou tomada de decisões importantes sem considerações acerca das consequências no longo prazo (p. ex., assumir um emprego sem informações adequadas). O TDAH começa na infância. A exigência de que vários sintomas estejam presentes antes dos 12 anos de idade exprime a importância de uma apresentação clínica substancial durante a infância. Ao mesmo tempo, uma idade de início mais precoce não é especificada devido a dificuldades para se estabelecer retrospectivamente um início na infância. As lembranças dos adultos sobre sintomas na infância tendem a não ser confiáveis, sendo benéfico obter informações complementares. Manifestações do transtorno devem estar presentes em mais de um ambiente (p. ex., em casa e na escola, no trabalho). A confirmação de sintomas substanciais em vários ambientes não costuma ser feita com precisão sem uma consulta a informantes que tenham visto o indivíduo em tais ambientes. É comum os sintomas variarem conforme o contexto em um determinado ambiente. Sinais do transtorno podem ser mínimos ou ausentes quando o indivíduo está recebendo recompensas frequentes por comportamento apropriado, está sob supervisão, está em uma situação nova, está envolvido em atividades especialmente interessantes, recebe estímulos externos consistentes (p. ex., através de telas eletrônicas) ou está interagindo em situações individualizadas (p. ex., em um consultório). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Atrasos leves no desenvolvimento linguístico, motor ou social não são específicos do TDAH, embora costumem ser comórbidos. As características associadas podem incluir baixa tolerância a frustração, irritabilidade ou labilidade do humor. Mesmo na ausência de um transtorno específico da aprendizagem, o desempenho acadêmico ou profissional costuma estar prejudicado. Comportamento desatento está associado a vários processos cognitivos subjacentes, e indivíduos com TDAH podem exibir problemas cognitivos em testes de atenção, função executiva ou memória, embora esses testes não sejam suficientemente sensíveis ou específicos para servir como índices diagnósticos. No início da vida adulta, o TDAH está associado a risco aumentado de tentativa de suicídio, principalmente quando em comorbidade com transtornos do humor, da conduta ou por uso de substância. Não há marcador biológico que seja diagnóstico de TDAH. Como grupo, na comparação com pares, crianças com TDAH apresentam eletrencefalogramas com aumento de ondas lentas, volume encefálico total reduzido na ressonância magnética e, possivelmente, atraso na maturação cortical no sentido póstero-anterior, embora esses achados não sejam diagnósticos. Nos raros casos em que há uma causa genética conhecida (p. ex., síndrome do X-frágil, síndrome da deleção 22q11), a apresentação do TDAH ainda deve ser diagnosticada. (DSM-5)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
50
ALTERAÇÕES DA ORIENTAÇÃO58 Denomina-se orientação o complexo de funções psíquicas em virtude das quais temos consciência, em cada momento de nossa vida, da situação real em que nos encontramos. A orientação se encontra intimamente ligada às noções de espaço e de tempo. Tipos de orientação A orientação divide-se em autopsíquica e alopsíquica, classificação essa proposta por Wernicke. A orientação autopsíquica refere-se à própria pessoa, e consiste num dos elementos da consciência do eu. A orientação alopsíquica refere-se ao mundo externo e poder ser subdividida em: orientação temporal (‘saber o dia da semana, o dia do mês, o mês e o ano em que se está. [...]’), orientação espacial (‘significa exatamente onde se está – por exemplo, se estiver internado, saber que se está num hospital, e o nome deste -, incluindo a rua, o bairro, a cidade etc.’), orientação quanto às outras pessoas (‘estar orientado quanto as outras pessoas significa poder reconhece-las, identificalas corretamente’) e orientação situacional (‘significa saber a razão pela qual se está em determinado lugar e que tipo de relação se tem com as pessoas ali presentes. Por exemplo, o indivíduo saber que está num hospital como paciente, e que está sendo examinado por um médico. A orientação situacional está estreitamente relacionada com as outras formas de orientação alopsíquica e também com a orientação autopsíquica.’) (CHENIAUX, 2013, p. 152-3) Examinar a orientação, tanto a auto quanto a alopsíquica, estamos avaliando as noções do paciente sobre si mesmo, sobre seu estado atual e sobre suas relações com o restante do ambiente. Tendo em vista a complexidade funcional da orientação, os quadros onde esta se encontra alterada não devem ser considerados como sintomas autônomos, senão como consequência de vários fatores psicopatológicos. Na desorientação autopsíquica total, o indivíduo não sabe quem é. Normalmente esse desconhecimento da própria identidade se verifica nas amnésias totais traumáticas, nos estados de acentuada obnubilação da consciência ou na evolução extremas dos processos demenciais. Bem mais frequente é a chamada falsa orientação autopsíquica. É a que acomete os enfermos delirantes, quando se auto atribuem uma nova identidade ou quando assimilam a personalidade de figuras fantasiosas de seus delírios. Nos esquizofrênicos pode ocorrer ainda uma dupla orientação, isto é, uma orientação verdadeira ao lado de uma falsa. É o caso, por exemplo, do paciente que responde encontrar-se numa igreja, escola ou prisão, porque se delira acreditando incumbido de alta missão moral ou educativa, ou porque se supõe prisioneiro, sequestrado, vítima da polícia, de associações secretas, de organizações políticas internacionais mas, ao mesmo tempo ou logo a seguir, mostra saber que se acha no hospital e que está diante do médico. Os distúrbios da orientação podem manifestar-se de modo global ou atingir, preferentemente, apenas uma das facetas da orientação. É, por exemplo, o que acontece no delirium tremens, onde se observa conservada a orientação autopsíquica, junto com a mais completa desorientação alopsíquica 58
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p.152-58; DALGALARRONDO, 2008, p. 109-13; PAIM, 1993, p. 181-92.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
51
(no tempo, no espaço e nas relações do enfermo com o ambiente). Em geral, nos doentes mentais, verifica-se que, em primeiro lugar, há perda da orientação no tempo, depois no espaço e, por último, em relação à própria pessoa. Também pode ocorrer desorientação temporo-espacial completa diante de extremo desinteresse, como acontece em esquizofrênicos, ou dependente de insuficiente apreensão e fixação de estímulos sensoriais por desatenção e desinteresse nos depressivos mais graves (estupor depressivo). Pode ainda ocorrer ofuscação geral da consciência, logo, desorientação global, nos estados crepusculares epilépticos e histéricos, ou nas síndromes confusionais das psicoses tóxicas e infecciosas agudas. Examinar a orientação, embora seja relativamente simples e ível, pode ser considerada como a investigação da essência estrutural da consciência. Portanto, para bem avaliar suas perturbações, não basta nos limitarmos às perguntinhas costumeiras da rotina hospitalar mas sim, nos dedicarmos à uma entrevista mais completa, demorada e minuciosa. Desorientação Apática [...] a Desorientação Apática depende de alterações da percepção, ou seja, de alterações decorrentes da vida instintivo-afetiva. Embora o paciente esteja lúcido e perceba com clareza sensorial o que se a no ambiente à sua volta, existe enorme falta de interesse, expressiva inibição psíquica e insuficiente energia psíquica para a elaboração da representação e do raciocínio. O paciente percebe todas as particularidades do ambiente mas não tem capacidade para integrar essas informação e formar um juízo sobre a própria situação. A Desorientação Apática ocorre nos estados de profunda e grave depressão. Desorientação Amnéstica As perturbações da memória, que se acompanham de deficiência ou incapacidade de fixação resultam numa desorientação no tempo e no espaço denominada de Desorientação Amnéstica. Caracteriza-se pela incapacidade que o enfermo demonstra para fixar os acontecimentos e, consequentemente, para orientar-se no tempo, no espaço e em suas relações com as pessoas do ambiente. Desorientação Amencial e Desorientação Delirante Tanto os casos de obnubilação da consciência quanto os estados delirantes se acompanham de dificuldades da compreensão e, por consequência, de alterações da síntese perceptiva. As alucinações e a impressão das percepções, observadas nesses casos, influem também no aparecimento da Desorientação Amencial. Fala-se em Desorientação Amencial para aquela que se observa no delirium tremens e nas psicoses orgânicas, onde se verificam alucinações e transtornos da compreensão que dificultam a orientação. Nas psicoses esquizofrênicas falamos em Desorientação Delirante, onde, apesar da completa lucidez da consciência, observa-se um tipo de desorientação resultado da adulteração da situação no tempo e no espaço. Nesses casos, é muito frequente observar também uma dupla orientação, a delirante ao lado da orientação normal, como dissemos acima. De sorte que os pacientes possam estar orientados no tempo e no espaço mas, por outro lado, podem acreditar que se encontram numa prisão ou no inferno. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
52
Desdobramento da Personalidade Hoje em dia os casos de Desdobramento da Personalidade são considerados como dependentes de autossugestão, tratando-se em geral de pessoas histriônicas (histéricas), mas, de qualquer forma, há uma evidente desorientação autopsíquica onde o paciente, desdobrando-se em outra personalidade, perde a orientação da original. Despersonalização O fenômeno conhecido como Despersonalização pode ser observado em alguns casos de reações afetivas muito intensas, em casos de os febris toxi-infecciosos e em certas intoxicações exógenas. Trata-se de um estado mental particular, de natureza paroxística, de rápida ou longa duração, caracterizado por um inexplicável sentimento de estranheza. Essa sensação de estranheza é inicialmente relacionada com o meio exterior e se estende, progressivamente, até a própria personalidade. Nessa situação o paciente assiste inerte ao desenrolar de sua vida psíquica, como se aquilo não estivesse relacionado com sua pessoa. Concomitantemente ele conserva um incrível estado de apatia. (adaptado de www.psiqweb.med.br) “Experiências de irrealidade, distanciamento ou de ser um observador externo dos próprios pensamentos, sentimentos, sensações, corpo ou ações (p. ex., alterações da percepção, senso distorcido do tempo, sensação de irrealidade ou senso de si mesmo irreal ou ausente, anestesia emocional e/ou física).” (DSM-5)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
53
ALTERAÇÕES NAS VIVÊNCIAS DE TEMPO E ESPAÇO59 De modo geral, a agem do tempo é percebido como lenta e vagarosa nos estados depressivos, e rápida e acelerada nos estados maníacos. O ritmo psíquico também é oposto nesses dois transtornos: na mania, há o taquipsiquismo geral, com aceleração de todas as funções psíquicas (pensamento, psicomotricidade, linguagem, etc.), e, na depressão, ocorre o bradipsiquismo, com lentificação de todas as atividades mentais. Ilusão sobre a duração do tempo Trata-se de deformação acentuada da percepção da duração temporal. Ocorre, sobretudo, nas intoxicações por alucinógenos ou psicoestimulantes (cocaína, anfetamina, etc.), nas fases agudas e iniciais das psicoses e em situações emocionais especiais e intensas. Ocorre também quando são recebidas, por exemplo, muitas informações novas; o tempo pode parecer transcorrer de modo extremamente veloz ou comprimido, ou de forma muito lenta e dilatada. Atomização do tempo Vivemos no tempo presente, em um agora que vincula intimamente aos acontecimentos ados e às possibilidades do porvir. A alteração ou a falta dessa experiência subjetiva natural de fluir temporal, decorrente da perda ou do enfraquecimento de ambas as margens do tempo (ado e futuro), produz uma redução quase puntiforme ou atomizada do tempo, fazendo-o parecer uma sucessão de pontos presentes que não se articulam entre si. O indivíduo não consegue inserir-se naturalmente na continuidade do devir, adere a momentos quase descontínuos. Esse fenômeno ocorre nos estados de exaltação e agitação maníaca, geralmente acompanhados da chamada fuga de ideias e de distraibilidade intensa. Inibição da sensação de fluir do tempo (inibição do devir subjetivo) A experiência normal do tempo implica a ampliação de um agora que se estende ao ado e se dirige ao porvir. Implica também um movimento mental que integra o fluir dos acontecimentos objetivos e externos à dimensão temporal subjetiva, ou seja, ao devir da vida subjetiva. A anormalidade da sensação do fluir do tempo corresponde à falta da sensação do avançar subjetivo do tempo, na qual o sujeito perde o sincronismo entre o ar do tempo objetivo, cronológico, e o fluir de seu tempo interno. Isso ocorre em síndromes depressivas graves. Certos pacientes depressivos expressam a sua vivência do tempo dizendo que o tempo encolheu, que não a, deixou de fluir, ou que está ando muito mais devagar que o normal. Alguns pacientes esquizofrênicos experimentam certa ividade em relação ao fluir do tempo; sentem que a sua percepção do tempo é controlada por uma instância exterior ao seu Eu. Outros pacientes esquizofrênicos, geralmente mais graves, sofrem verdadeira desintegração da sensação do tempo e do espaço. Pacientes muito ansiosos descrevem uma pressão do tempo, como se o tempo de que dispõem fosse sempre insuficiente; ‘sinto que nunca vou dar conta de fazer o que devo fazer em determinado período’. Pacientes obsessivo-compulsivos graves ocasionalmente experimentam uma lentificação enorme de todas as atividades, sobretudo quando devem completar alguma tarefa.
59
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 152-58; DALGALARRONDO, 2008, p. 114-18; PAIM, 1993, p. 181-92.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
54
Anormalidades da vivência do espaço No estado de êxtase, há perda das fronteiras entre o eu e o mundo exterior. Nesse caso (que também pode ser classificado como transtorno da consciência do eu), o sujeito sente como se estivesse fundido ao mundo exterior [...]. A vivência do espaço no indivíduo em estado maníaco é a de um espaço extremamente dilatado e amplo, que invade o das outras pessoas. O maníaco desconhece as fronteiras espaciais e vive como se todo o espaço exterior fosse seu. Esse espaço não oferece resistências ao seu eu. Nos quadros depressivos, o espaço exterior pode ser vivenciado como muito encolhido, contraído, escuro e pouco penetrável pelo indivíduo e pelos outros. O indivíduo com quadro paranoide vivencia o seu espaço interior como invadido por aspectos ameaçadores, perigosos e hostis do mundo. O espaço exterior é, em princípio, invasivo, fonte de perigos e ameaça. No caso do indivíduo com agorafobia, o espaço exterior é percebido como sufocante, pesado, perigoso e potencialmente aniquilador.60
60
DALGALARRONDO, 2008, p. 114-7)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
55
ALTERAÇÕES DA SENSOPERCEPÇÃO (ALUCINAÇÃO)61
Conceitos básicos Sensação Define-se sensação como o fenômeno elementar gerado por estímulos físicos, químicos ou biológicos variados, originados fora ou dentro do organismo, que produzem alterações nos órgãos receptores, estimulando-os. Os estímulos sensoriais fornecem a alimentação sensorial aos sistemas de informação do organismo. As diferentes formas de sensação são geradas por estímulos sensoriais específicos, como visuais, táteis, auditivos, olfativos, gustativos, 62 proprioceptivos e cinestésicos63. Percepção Por percepção, entende-se a tomada de consciência, pelo indivíduo, do estímulo sensorial. Arbitrariamente, então, se atribui à sensação a dimensão neuronal, ainda não plenamente consciente, no processo de sensopercepção. Já a percepção diz respeito à dimensão propriamente neuropsicológica e psicológica do processo, à transformação de estímulos puramente sensoriais em fenômenos perceptivos conscientes. Piéron (1996) define percepção como a tomada de conhecimento sensorial de objetos ou de fatos exteriores mais ou menos complexos. A sensação é considerada, portanto, um fenômeno ivo; estímulos físicos (luz, som, pressão) ou químicos atuam sobre sistemas de recepção do organismo. Já a percepção seria fenômeno ativo; o sistema nervoso e a mente do sujeito constroem um percepto (ou seja, um conteúdo significativo) por meio da síntese dos estímulos sensoriais, estímulos esses confrontados com experiências 61
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 41-53; DALGALARRONDO, 2008, p. 119-36; PAIM, 1993, p. 25-70. 62 Proprioceptivos ou Cenestésicos - estímulos originados no interior do próprio organismo. Segundo o dicionário Aurélio, as cenestesias corresponderiam a “sensação que o indivíduo experimenta, conscientemente, de sua existência; sensação que tem o indivíduo de que todas as suas funções orgânicas estão normais.” 63 Cinestésicos - Sentido pelo qual se percebem os movimentos musculares, o peso e a posição dos membros.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
56
adas registradas na memória e com o contexto sociocultural em que vive o sujeito e que atribui significado às experiências. Tal percepto, ou seja, a percepção final, é, dessa forma, apreendido pelo sujeito consciente. Analise o quadro abaixo:
Imagem (ou imagem perceptiva real) O elemento básico do processo de sensopercepção é a imagem perceptiva real, ou simplesmente imagem. A imagem se caracteriza pelas seguintes qualidade: - Nitidez (a imagem é nítida, seus contorno são precisos); - Corporeidade (a imagem é viva, corpórea, tem luz, brilho e cores vivas); - Estabilidade (a imagem percebida é estável, não muda de um momento para outro); - Extrojeção (a imagem, provinda do espaço exterior, também é percebida nesse espaço); - Ininfluenciabilidade voluntária (o indivíduo não consegue alterar voluntariamente a imagem percebida) - Completitude (a imagem apresenta desenho completo e determinado, com todos os detalhes diante do observador). A imaginação é uma atividade psíquica, geralmente voluntária, que consiste na evocação de imagens percebidas no ado (imagem mnêmica) ou na criação de novas imagens (imagem criada). A imaginação, ou processo de produção de imagens, geralmente ocorre na ausência de estímulos sensoriais. A fantasia, ou fantasma, é uma produção imaginativa, produto minimamente organizado da imaginação. No sentido psicanalítico, a fantasia pode ser consciente ou inconsciente. Ela se origina de desejos, temores e conflitos tanto conscientes como inconscientes. A produção de fantasias é muito frequente e intensa em crianças. Às vezes, é dominante em certos tipos de personalidades, como nas personalidades histéricas. A produção de fantasias tem uma importante função psicológica: ajudar o indivíduo a lidar com frustrações, com o desconhecido e, de modo geral, com os seus conflitos. Muitas pessoas encontram grande prazer em suas atividades fantasmáticas, e os profissionais da criatividade (artistas, inventores, poetas, etc.) dependem basicamente de sua capacidade de produzir, desenvolver e elaborar fantasias. [...]
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
57
Representação é a reapresentação de uma imagem na consciência, sem a presença real, externa, do objeto que, em um primeiro momento, gerou uma imagem sensorial. (“A representação é a reprodução na consciência de percepções adas.64) A imagem representativa ou mnêmica (representação) se caracteriza por: - Pouca nitidez (os contornos, geralmente, são borrados); - Pouca corporeidade (a representação não tem a vida de uma imagem real); - Instabilidade (a representação aparece e desaparece facilmente do campo da consciência); - Introjeção (a representação é percebida no espaço interno); - Incompletude (a representação demonstra um desenho indeterminado, apresentando-se geralmente incompleta e apenas com alguns detalhes). Existem alguns subtipos de imagem representativa: - Imagem eidética (eidetismo). É a evocação de uma imagem guardada na memória, ou seja, de uma representação, de forma muito precisa, com características semelhantes à percepção. A imagem eidética é experimentada por alguns indivíduos que, por uma capacidade excepcional, conseguem ver um objeto com muita nitidez e clareza (uma cadeira, a face de uma pessoa, etc.). A evocação de uma imagem eidética é voluntária e não representa necessariamente sintoma de transtorno mental. - Pareidolias. São as imagens visualizadas voluntariamente a partir de estímulos imprecisos do ambiente. Ao olhar uma nuvem e poder ver nela um gato ou um elefante, a criança está experimentando o que se denomina pareidolia. Da mesma forma, ocorre pareidolia ao se olhar uma folha com manchas imprecisas e, por meio de esforço voluntário, visualizar nessas manchas determinados objetos65. Ambas as formas de percepção artificialmente modificadas devem ser classificadas como pareidolias. [...] É preciso distinguir o fenômeno imagem do fenômeno representação. Ao contrário da imagem perceptiva real, a imagem representativa ou mnêmica (representação) se caracteriza por ser apenas uma revivescência de uma imagem sensorial determinada, sem que esteja presente o objeto original que a produziu. [...] A diferença entre a experiência vívida da sensopercepção e as experiências da imaginação e da representação é bem descrita pelo criador da psicologia empírica, o filósofo inglês David Hume (1711- 1776): Todos itirão sem hesitar que existe uma considerável diferença entre as percepções da mente quando o homem sente a dor de um calor excessivo ou o prazer de um ar moderadamente tépido e 64 65
PAIM, 1993, p. 25. O conhecido teste de personalidade Rorschach utiliza tais manchas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
58
quando relembra mais tarde essa sensação ou a antecipa pela imaginação. Essas faculdades podem remedar ou copiar as percepções dos sentidos, mas jamais atingirão a forma e a vivacidade do sentimento original. O máximo que podemos dizer delas, mesmo quando operam com todo o seu vigor, é que representam o seu objeto de maneira tão viva que quase se poderia dizer que os vemos ou sentimos. [...] O mais vivo pensamento é ainda inferior à mais embotada das sensações (1973, p. 134) Alterações da sensopercepção Alterações quantitativas da sensopercepção Nas alterações quantitativas, as imagens perceptivas têm intensidade anormal, para mais ou para menos, configurando hiperestesias, hiperpatias, hipoestesias, anestesias e analgesias. Eventualmente, esses termos são empregados em neurologia com um sentido um pouco diverso do utilizado em psicopatologia. A hiperestesia, no sentido psicopatológico, é a condição na qual as percepções encontram-se anormalmente aumentadas em sua intensidade ou duração. Os sons são ouvidos de forma muito amplificada; um ruído parece um estrondo; as imagens visuais e as cores tornam-se mais vivas e intensas. A hiperestesia ocorre nas intoxicações por alucinógenos, como o LSD 66(eventualmente também após a ingestão de substâncias como cocaína, maconha, harmina e harmalina, estas duas últimas contidas na beberagem [ou, chá] de uso ritual nas religiões Santo Daime e União do Vegetal), em algumas formas de epilepsia, na enxaqueca, no hipertireoidismo, na esquizofrenia aguda e em certos quadros maníacos. Denomina-se hiperpatia, no sentido neurológico, quando uma sensação desagradável (geralmente de queimação dolorosa) é produzida por um leve estímulo da pele. A hiperpatia ocorre tipicamente nas síndromes talâmicas. Já a hipoestesia, no sentido psicopatológico, é observada em alguns pacientes depressivos, nos quais o mundo circundante é percebido como mais escuro; as cores tornam-se mais pálidas e sem brilho; os alimentos não têm mais sabor; e os odores perdem a sua intensidade. As hipoestesias táteis, com sentido neurológico, são alterações localizadas em territórios cutâneos de inervação anatomicamente determinada, compondo as chamadas síndromes sensitivas de interesse à neurologia clínica. As mais comuns são decorrentes de lesões da medula, 66
O LSD, acrônimo de dietilamida do ácido lisérgico, produz grandes alterações no cérebro, atuando diretamente sobre o sistema nervoso e provocando fenômenos psíquicos, como alucinações, delírios e ilusões. É uma substância sintética, produzida em laboratório, que adquiriu popularidade na década de 60, quando não era vista como algo prejudicial à saúde. Pode ser consumida por via oral, injeção ou inalação, e se apresenta em forma de barras, cápsulas, tiras de gelatina e líquida; seus efeitos duram de oito a doze horas. Os efeitos físicos dessa droga são: dilatação das pupilas, sudorese, aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial, aumento da temperatura, náuseas, vômitos. Os sintomas psíquicos são alucinações auditivas e visuais, sensibilidade sensorial, confusão, pensamento desordenado, perda do controle emocional, euforia alternada com angústia, dificuldade de concentração. É importante destacar que os efeitos do LSD dependem do ambiente, da qualidade da droga e da personalidade da pessoa. O LSD é mais usado por adolescentes e jovens, que querem experimentar visões e sensações novas e coloridas, pois as formas, cheiros, cores e situações se modificam, levando a pessoa a criar ilusões e delírios, como por exemplo, paredes que escorregam, mania de grandeza e perseguição. Pode ocorrer também um “flashback”, fenômeno no qual são sentidos os efeitos da droga após um período de semanas ou meses sem usá-la. O LSD é conhecido também com outros nomes como doce, ácido, gota, papel e microponto. (http://www.brasilescola.com/drogas/lsd.htm)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
59
das raízes medulares dos nervos (hipoestesia em faixa) e dos neurônios periféricos (hipoestesia ‘em bota’ e ‘em luva’ das clássicas polineuropatias). Por sua vez, as anestesias táteis implicam a perda da sensação tátil em determinada área da pele. Usa-se, com frequência, o termo anestesia para indicar também analgesias (perda das sensações dolorosas) de áreas da pele e partes do corpo. Anestesias, hipoestesias e analgesias em áreas que não correspondem a territórios de nervos anatomicamente definidos, em geral são de causas psicogenéticas. Tais alterações ocorrem mais em pacientes com transtornos histéricos, em sujeitos com alto grau de sugestionabilidade e em alguns quadros depressivos e psicóticos graves. [...] Alterações qualitativas da sensopercepção As alterações qualitativas da sensopercepção são as mais importantes em psicopatologia. Compreendem as ilusões, as alucinações, a alucinose e a pseudoalucinação. O fenômeno descrito como ilusão se caracteriza pela percepção deformada, alterada de um objeto real e presente. Na ilusão, há sempre um objeto externo real, gerador do processo de sensopercepção, mas tal percepção é deformada, adulterada, por fatores psicológicos diversos. A ilusão é a percepção deformada de um objeto real e presente. As ilusões ocorrem basicamente em três condições: 1. Estados de rebaixamento do nível de consciência. Por turvação da consciência, a percepção torna-se imprecisa, fazendo com que os estímulos sejam percebidos de forma deformada. 2. Estados de fadiga grave ou inatenção marcante. Podem ocorrer ilusões transitórias e sem muita importância clínica. 3. Alguns estados afetivos. Por sua acentuada intensidade, o afeto deforma o processo de sensopercepção, gerando as chamadas ilusões catatímicas. Agnosias associativas e seus diversos tipos As agnosias associativas caracterizam um prejuízo, uma deterioração, na capacidade de reconhecer as características dos objetos por meio dos sentidos: tato, gosto, olfato, visão e audição. Ou seja, refere-se ao déficit de formação do percepto. Na agnosia visual o paciente não é capaz de identificar objetos, formas, cor e espaço. Enxerga-os, pode descrevê-los, mas não sabe o que realmente são. Na agnosia tátil o paciente é incapaz de reconhecer objetos mediante o sentido do tato, apesar da sensibilidade se encontrar conservada no fundamental. Na agnosia auditiva o enfermo ouve sons e ruídos, porém não o pode identificar; não compreende. Por exemplo: não pode reconhecer um relógio pelo tique-taque ou um chaveiro pelo tilintar das chaves. Nas agnosias olfativa e gustativa ocorrem, respectivamente, a incapacidade de discernir odores e gostos, sem que os respectivos órgãos sensoriais estejam prejudicados. “Esta está normalmente associada a danos cerebrais ou doenças neurológicas, particularmente a lesões do lobo temporal e do lobo parcial, onde se armazena a memória e a importância dos objetos conhecidos. Muitas vezes, a agnosia aparece subitamente depois de um traumatismo craniano. Pode, no entanto, ser também
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
60
resultado de uma vida com muito stress onde a saúde em si é deixada em segundo plano em relação às atividades do dia-a-dia.”67 Tipos de ilusão As ilusões mais comuns são as visuais, nas quais o paciente geralmente vê pessoas, monstros, animais, entre outras coisas, a partir de estímulos visuais como móveis, roupas, objetos ou figuras penduradas nas paredes. Também não são raras as ilusões auditivas, nas quais, a partir de estímulos sonoros inespecíficos, o paciente ouve seu nome, palavras significativas ou chamamentos. As alucinações Define-se alucinação como a percepção de um objeto, sem que este esteja presente, sem o estímulo sensorial respectivo. [...] A alucinação é a percepção clara e definida de um objeto (voz, ruído, imagem) sem a presença do objeto estimulante real. Embora as alucinações sejam mais comuns em indivíduos com transtornos mentais graves, podem ocorrer em pessoas que não os apresentam. Um estudo de Tien (1991) revelou que alucinações de qualquer tipo ocorrem na população normal com incidência anual de 4 a 5%, sendo as visuais mais comuns que as auditivas. Dessa forma, indivíduos sem transtornos mentais podem ter visões ou ouvir vozes [odores], sobretudo a de parentes próximos já mortos, devido ao desejo intenso de reencontrá-los. [...] Tipos de alucinações
ALUCINAÇÕES
- Auditiva; - Visuais (Liliputianas, Autoscópica; Extracampinas); - Táteis e de contato; - Olfativas; - Gustativas; - Cinestésicas; - Cenestésicas (ou, Proprioceptivas); - Psíquicas;
Alucinações auditivas são as mais frequentes e as mais importantes. Apresentam-se sob a forma elementar: ruídos, zumbidos, murmúrios, estalidos; e sob a forma complexa: como ‘vozes’ que censuram e ameaçam, como melodias, toques de campainha. O enfermo pode ouvir uma única voz, que repete uma palavra ou diz frases completas, ou muitas vozes que mantêm entre si uma conversação. Em alguns casos, são quase imperceptíveis, como sussurradas. As vozes podem ser masculinas, femininas ou de crianças. A direção de onde provêm é variável; podem vir de longe ou de perto, do teto, do quarto ao lado ou da rua. Alucinações liliputianas foram descritas por Bierre de Boismont e Ziehen. Trata-se de um tipo especial de alucinação visual no qual, ao lado da percepção normal dos objetos e pessoas que o rodeiam, o enfermo divisa uma série de personagens 67
http://doencasneurologicas.blogs.sapo.pt
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
61
minúsculos, isolados ou acompanhados de pequenos animais em movimento. Alucinações autoscópica, é uma variedade visual em que o enfermo percebe a sua imagem corporal como se estivesse diante de si próprio. Alucinações extracampinas – Bleuler descreveu[...] os casos em que as visões se localizam fora do campo sensorial correspondente. O paciente ‘vê’ pessoas que estão atrás de sua cabeça. Alucinações táteis e de contato – As primeiras são encontradas nas perturbações mentais tóxicas. Os enfermos sentem sobre a pele pequenos animais. Encontram-se com mais frequência nos transtornos psicóticos tóxicos, especialmente no delirium tremens e no cocainismo. [...] As alucinações de contato estão, em sua maioria, localizadas nas zonas erógenas e aparecem com mais frequência no sexo feminino. As enfermas se queixam de serem vítimas da prática de relações sexuais, de defloramento, de masturbação. Nas alucinações olfativas o enfermo é perseguido por sensações repugnantes de mau odor: de cadáver, de carne deteriorada, de pano queimado, de lixo, de mofo e de cheiro pútrido de fezes. Em alguns casos, ao doente parece que o mau odor provém dele próprio. Nos casos em que os pacientes se julgam influenciados por gases tóxicos, trata-se de interpretações delirantes de percepções normais. As alucinações gustativas consistem, segundo informações dos enfermos, em que o alimento tem um sabor estranho, metálico, um sabor de droga que não pode ser identificado. Queixam-se os doentes de sentir um gosto desagradável na boca, que permanece durante todo o dia. A sitiofobia (medo patológico de se alimentar) pode resultar de alucinações do paladar, quando o enfermo ‘percebe’ gosto de veneno na comida. Nas alucinações cinestésicas alguns enfermos têm a impressão de que o seu corpo realiza, espontaneamente, determinados movimentos. Outros item que os seus músculos se contraem, que um dos braços se levanta ou um das pernas se encolhe, sem que, na realidade, se observe qualquer movimento na parte indicada. Nas alucinações cenestésicas muitos enfermos fazem referência a sensações estranhas em outros órgãos: algo pressiona os olhos, na parte interna, de modo que, ao olharem-se no espelho, percebem atemorizados que os olhos estão projetados para fora das órbitas; outros referem-se a sensações estranhas no cérebro, como se ali tive colocado uma pedra de gelo. Sentem, em alguns momentos, ‘as veias correrem dentro do corpo’; ‘uma bala girar em espiral dentro do crânio, subindo da base para a parte superior’. Sensações relativas à cabeça são referidas como se algo pressionasse o cérebro, que aumenta de forma desmedida a ponto de espedaçar-se o crânio. Especialmente, no início da enfermidade, os pacientes se queixam de dores internas, que o ‘o couro cabeludo está tão sensível que o menor toque no cabelo produz dores lancinantes’; têm sensações de frio ou de calor intenso; sentem dentro do corpo como se tivessem colocado ali óleo fervendo; seus olhos e seus cabelos expelem chamas. Insuflam ar em seus pulmões, o que produz uma sensação desagradável de sufocação e de morte iminente. Nas alucinações psíquicas as imagens alucinatórias não têm um verdadeiro caráter sensorial, objetivo. Os enfermos fazem referência a ‘palavras sem som’, dizem, por exemplo, que falam com indivíduos estranhos por ‘direta comunicação do pensamento’, por uma espécie de ‘linguagem dos espíritos’, feita de ‘vozes sem ruído’, de ‘palavras secretas e interiores que não soam’.”68 Alucinose – “A alucinação denominada alucinose é o fenômeno pelo qual o paciente percebe tal alucinação como estranha a sua pessoa. [...] o característico das alucinoses é serem adequada e imediatamente criticadas pelo sujeito, reconhecendo o seu caráter patológico. [...] Na alucinose, embora o doente veja a imagem ou ouça a voz ou o ruído, fala a crença que comumente o alucinado tem em sua alucinação. O indivíduo permanece consciente de que aquilo é 68
Adaptado de PAIM, 1993, p.41-60)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
62
um fenômeno estranho, patológico, não tem nada a ver com a sua pessoa, estabelecendo distanciamento entre si e o sintoma. Diz-se que a alucionose é um fenômeno periférico ao Eu, enquanto a alucinação é central ao Eu. A alucinose ocorre com maior frequência em quadros psico-orgâncos; por isso, foram também denominadas alucinações neurológicas. A alucinose em sua modalidade visual ocorre com maior frequência em pacientes com intoxicações por substâncias alucinógenas, com LSD, psilobicina, mescalina, anticolinérgicos, ayahuasca, etc. Pode ocorrer devido a tumores do pendúnculo cerebral, sendo então denominada alucinose penduncular de Lhermitte, [...].”69 Pseudoalucinações As pseudo-alucinações são produtos patológicos da atividade representativa. [...] Constituem-se de imagens dotadas de clareza sensorial, as quais, ao contrário das alucinações verdadeiras, são percebidas numa espécie de espaço subjetivo. Distinguem-se das alucinações pelo fato de que as imagens visuais e as vozes serem localizadas no interior da cabeça ou na parte interna do corpo. Kandinski empregou a expressão pseudo-alucinações para designar os casos em que as imagens percebidas careciam de objetividade. Nas alucinações verdadeiras, as imagens visuais e auditivas são projetadas para o exterior, para o espaço objetivo. A nitidez sensorial e a impressão de realidade são de tal ordem que dão ao enfermo uma irresistível força de convicção. Nas pseudo-alucinações, ao contrário, o paciente não desconhece o caráter falso dos fenômenos. (PAIM, 1993, p. 59-60)
69
DALGALARRONDO, 2008, p. 129-30)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
63
ALTERAÇÕES DO PENSAMENTO70 O que é o pensamento? A palavra pensar vem do verbo latino pendere, que significa ficar em suspenso, examinar, pesar, ponderar. Comportamento cognitivo no qual ideias, imagens, representações mentais ou outros elementos hipotéticos da reflexão são experimentados ou manipulados. Nesse sentido pensamento inclui imaginação, lembrança, solução de problema, devaneio, livre associação, formação de conceito e muitos outros processos. Pode-se dizer que o pensamento tem duas características definidoras: (a) Ele é velado, ou seja, não é diretamente observável, mas deve ser deduzido a partir de comportamentos ou autorrelatos; (b) ele é simbólico, ou seja, parece envolver operações sobre símbolos ou representações mentais, cuja natureza permanece obscura e controversa.71 O que caracteriza o pensamento normal é ser regido pela lógica formal e orientar-se segundo a realidade e os princípios de racionalidade da cultura na qual o indivíduo se insere. Atividades fundamentais do pensamento As atividades fundamentais do pensamento são: a elaboração de conceitos, a formação de juízos e o raciocínio. Um conceito identifica os atributos ou qualidades mais gerais e essenciais de um objeto ou fenômeno. É expresso por uma palavra. Está relacionado a abstração e generalização. Por exemplo: céu e azul são conceitos. O juízo estabelece uma relação entre dois ou mais conceitos. Consiste no ato da consciência de afirmar ou negar algum atributo ou qualidade a um objeto ou fenômeno. É composto por um sujeito, um verbo de ligação e um predicado. Por exemplo: ‘O céu é azul.’ Raciocínio representa uma operação mental que relaciona juízos, levando à formação de novos juízos (ou conclusões). Por exemplo: ‘Todo homem é mortal’; ‘Sócrates é um homem’, portanto, ‘Sócrates é mortal’ [neste caso, um raciocínio dedutivo]. Um raciocínio pode ser indutivo (do particular para o geral)72, dedutivo (do geral para o particular) ou analógico (de um particular para outro particular)73. [...] Aspectos do pensamento Curso, forma e conteúdo constituem os aspectos do pensamento. O curso refere-se à velocidade e ritmo do pensamento, à quantidade de ideias ao longo do tempo. A forma, por sua vez, está 70
O texto de todo esse tópico foi extraído e adaptado de: CHENIAUX, 2013, p. 82-106; PAIM, 1993, p. 87-114; DALGALARRONDO, 2008, p. 193-231. 71 APA, 2010, p. 692 72 Exemplo de raciocínio indutivo: Um cientista observa a cor de milhares de cisnes. Verificar que todos os cisnes observados por ele são brancos (regularidade na cor dos cisnes). Formula, então, a partir desses dados empíricos uma teoria a respeito da cor dos cisnes: “Todos os cisnes são brancos” (generalização). 73 Exemplo de raciocínio analógico: “A árvore é um ser vivo. Tem metabolismo e reproduz-se. O ser humano também. Nisto, são semelhantes. Ora, se são semelhantes nestas coisas e a árvore cresce podemos concluir que o ser humano também cresce.”
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
64
relacionada à estrutura do pensamento, à relação entre as ideias. Já o conteúdo diz respeito à temática do pensamento, às qualidades ou características das ideias. Alterações do pensamento [...] Aqui é proposta a seguinte classificação das alterações do pensamento: - Quantitativas – curso (aceleração, alentecimento, interrupção); - Qualitativas – forma (fuga de ideias, desagregação, prolixidade, minuciosidade, perseveração) e, conteúdo (concretismo; ideias delirantes, deliroides e sobrevaloradas). Analise o esquema a seguir:
O Exame do pensamento A fala do paciente é o único meio de o ao seu pensamento. Não é possível, portanto, avaliar o pensamento de um paciente em mutismo. Quando se quer examinar a forma do pensamento, deve-se deixar o paciente falar livremente durante algum tempo, evitando interrompê-lo. ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS (CURSO DO PENSAMENTO) Aceleração do curso Na aceleração do curso do pensamento (ou taquipsiquismo), o paciente fala mais rápido; há uma maior produtividade ideativa e uma maior velocidade no processo associativo. Isso ocorre na mania, na intoxicação por cocaína ou anfetamina e nos estados de ansiedade ou agitação psicomotora.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
65
Alentecimento do curso (ou inibição) No alentecimento do curso do pensamento (ou retardo, ou inibição do pensamento, ou bradipsiquismo), o paciente fala mais devagar; há uma redução no número de ideias e representações, e inibição do processo associativo. Esse fenômeno – [...] – é tipicamente observado na depressão, ocorrendo também na demência e no estupor (abolição da psicomotricidade) do delirium ou da esquizofrenia catatônica. Interrupção do curso (ou, bloqueio; ou, interceptação do pensamento; ou roubo do pensamento) A interrupção do curso (ou bloqueio do pensamento) foi descrita por Bleuler, sendo considerada uma alteração quase exclusiva da esquizofrenia. Kraepelin empregava o termo interceptação para esse mesmo fenômeno. Abruptamente, e sem qualquer motivo aparente, o paciente interrompe a sua fala, deixando de completar uma ideia. Algumas vezes a interrupção se dá no meio de uma frase, ou mesmo de uma palavra. Após um intervalo, que varia entre alguns poucos minutos e várias horas, o paciente pode completar o pensamento interrompido ou, o que é mais frequente, inicia um outro ciclo de pensamento, inteiramente diverso do anterior. A vivência do paciente é a de que o fluxo do seu pensamento cessou ou rompeu-se, resultando num branco, num vazio, em sua mente. Tal experiência é muitas vezes atribuída pelo paciente a um roubo do seu pensamento. [...] ALTERAÇÕES QUALITATIVAS (FORMA DO PENSAMENTO) Fuga de ideias A fuga de ideias – [...] – caracteriza-se pela variação rápida e incessante de tema, com preservação da coerência do relato e da lógica na associação de ideias. A tendência dominante do pensamento está enfraquecida e, consequentemente, há um progressivo afastamento da ideia-alvo. Alternativamente, pode-se considerar que diversas ideias-alvo se sucedem em um pequeno espaço de tempo. O pensamento é facilmente desviado por estímulos externos; e as associações muitas vezes se dão por assonância (rimas) ou aliteração (repetição de consoantes) das palavras. A fuga de ideias está quase sempre associada a logorreia e aceleração do curso do pensamento. Trata-se de uma manifestação típica da síndrome maníaca primária, sendo ainda observada na intoxicação por cocaína ou anfetamina, na embriaguez alcoólica, na sífilis cerebral etc. Exemplo: ‘Você foi o médico do meu marido. Ele voou pela janela. Minha irmã também se matou. Também pulou pela janela. Ela se tratava com o doutor Pitta. Ele devia se chamar doutor ‘Apita’. Aí ele apitava, e todos os doentes pulavam pela janela.’ Desagregação do pensamento (ou confusional, ou ainda dissociado) A desagregação do pensamento caracteriza-se por uma perda do sentido lógico na associação de ideias. Há a formação de associações novas, que são incompreensíveis, irracionais e extravagantes. Como consequência, altera-se a sintaxe74 do discurso, que se torna incoerente, fragmentado e, muitas vezes, ininteligível. A desagregação do pensamento ocorre na esquizofrenia, no delirium, na demência avançada e, ocasionalmente, em casos de extrema agitação maníaca. 74
Sintaxe - Parte da gramática que estuda a disposição das palavras na frase e a das frases no discurso, bem como a relação lógica das frases entre si; construção gramatical (Aurélio).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
66
Pensamento desagregado, pensamento dissociado, pensamento incoerente, pensamento confuso, pensamento descarrilado, pensamento disparatado, pensamento vago ou afrouxamento dos enlaces associativos possuem significado basicamente semelhantes, embora alguns autores, de maneira não uniforme, tentem estabelecer diferenças quantitativas ou qualitativas entres eles. Os termos desagregado (Bleuler), dissociado (Bleuler), descarrilado (Carl Scheider) e disparatado (Carl Scheider) são mais usados na esquizofrenia; já termos incoerente e confuso são empregados mais frequentemente nos quadros de delirium. [...] Alguns autores propõem um subtipo que seria o pensamento confusional – ‘devido à turvação da consciência, [verifica-se] um pensamento incoerente, de curso tortuoso, que impede que o indivíduo apreenda de forma clara e precisa os estímulos ambientais e possa, assim, processar seu raciocínio adequadamente. Há marcante dificuldade em estabelecer vínculos entre conceitos e juízos devido às alterações de consciência, de atenção e de memória imediata, impedindo a formação adequada do raciocínio e lançando o indivíduo em estado de perplexidade e impotência. Ocorre principalmente nas síndromes confusionais agudas. Prolixidade A prolixidade, que foi descrita por Lipmann e Edel, caracteriza-se por um discurso repleto de detalhes irrelevantes, o que o torna tedioso; a ideia-alvo jamais e alcançada ou só o é tardiamente. Decorre de uma incapacidade de síntese, de distinguir o essencial do ório. É encontrada basicamente nos quadros em que há comprometimento intelectivo, como retardo mental e na demência. Também é observada no transtorno de personalidade associado à epilepsia do lobo temporal e na esquizofrenia. Alguns autores preferem utilizar os termos circunstancialidade e tangencialidade para designar esse tipo de pensamento. O que diferencia um do outro é que, só no caso da circunstancialidade, a ideia-alvo seria atingida. Um paciente prolixo apresenta dificuldades em responder de forma direta e objetiva uma pergunta. Se questionado sobre, por exemplo, onde mora, ele, em vez de fornecer de imediato o seu endereço, vai dar um monte de informações desnecessárias. Pode comentar que reside num local muito bonito, que lá faz muito calor, citar todas as linhas de ônibus que circulam por lá etc. Quando pressionado a ir direto ao ponto, muitas vezes vai dizer algo como ‘calma, que eu chego lá!’. Minuciosidade A minuciosidade caracteriza-se por um discurso com um número excessivo de detalhes relevantes. Estes são introduzidos para enriquecer a comunicação e, ansiosamente, para evitar quaisquer possíveis omissões. É encontrada no transtorno obsessivo-compulsivo e no transtorno de personalidade obsessiva (anancástica). Perguntado pelo médico sobre como tem ado, um paciente minucioso vai fazer um relatório pormenorizado de tudo o que sentia a cada dia desde a última consulta, descrevendo as características e a cronologia completa dos sintomas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
67
Perseveração A perseveração, descrita por Pick, caracteriza-se por uma recorrência excessiva e inadequada no discurso do mesmo tema, ou uma dificuldade em abandonar determinado tema. Consiste numa perda da flexibilidade do pensamento. Há a fixação persistente de uma única ideia-alvo e um empobrecimento dos processos associativos. A perseveração ocorre na demência, retardo mental, delirium, epilepsia, esquizofrenia. Muitas vezes, num transtorno psicótico, um delírio (alteração do conteúdo do pensamento) assume tal importância na vida do paciente que, em seu discurso, a temática se torna perseverante (alteração da forma do pensamento). As ideias obsessivas (ou obsessões) podem ser consideradas uma forma especial de perseveração do pensamento. Elas possuem as seguintes características: - São ideias tidas pelos próprios pacientes como absurdas, irracionais, sem sentido, repulsivas, desagradáveis ou ansiogênicas; - que o indivíduo reconhece como próprias; - que são repetitivas ou persistentes; - que se impõem à sua consciência contra a sua vontade; - e que levam a violenta luta interna, isto é, o indivíduo se esforça para afastá-la de sua mente ou realiza cerimoniais preventivos ou expiatórios. São exemplos de conteúdos de ideias obsessivas: dúvidas torturantes, [...], tentações censuráveis, presságios quanto a tragédias ou morte relacionadas a familiares ou a si próprio. [...] As ideias obsessivas, [...], são encontradas principalmente no transtorno obsessivo-compulsivo, mas também na depressão e na esquizofrenia. Pensamento mágico É o tipo de pensamento que fere frontalmente os princípios da lógica formal, bem como os indicativos e imperativos da realidade. O pensamento mágico segue os desígnios dos desejos, das fantasias e dos temores, conscientes e inconscientes, do sujeito, adequando a realidade ao pensamento, e não o contrário. Pensamento dereístico O pensamento dito dereístico, algo semelhante ao pensamento mágico, é um tipo de pensamento que se opõe marcadamente ao pensamento realista, o qual se submete à lógica e à realidade. Aqui, o pensamento só obedece à lógica e à realidade naquilo que interessa ao desejo do indivíduo, distorcendo a realidade para que esta se adapte aos seus anseios. No pensamento dereístico, o pensar volta-se muito mais ao mundo interno do sujeito, suas fantasias e seus sonhos, manifestandose como um devaneio, no qual tudo é possível e favorável ao indivíduo. [...] Na língua inglesa, utiliza-se o termo wishful thinking (tomar o desejo pela realidade) para indicar a identificação errônea dos próprios desejos com a realidade, o conjunto de crenças adotadas pelo indivíduo, crenças estas baseadas mais nos desejos que em fatos, ou seja, um aspecto do pensamento dereístico. Pode ocorrer nos transtornos de personalidade (esquizotípica, histriônica, borderline, narcisista, etc.), na esquizofrenia, na histeria e, eventualmente, em crianças e adolescentes (e mesmo em adultos) normais.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
68
Pensamento vago As relações conceituais, a formação dos juízos e a concatenação destes em raciocínios são caracterizadas pela imprecisão. O paciente expõe um pensamento muito ambíguo, podendo mesmo parecer obscuro. Não há propriamente o empobrecimento do pensamento, mas, antes, a marcante falta de clareza e precisão do raciocínio. O pensamento vago pode ser um sinal inicial de esquizofrenia ou ocorrer em quadros demenciais iniciais, transtornos de personalidade (p.ex., esquizotípica) e neuroses75 graves. Pensamento obsessivo Aqui, predominam ideias ou representações que, apesar de terem conteúdo absurdo ou repulsivo para o indivíduo, se impõem à consciência de modo persistente e incontrolável. Isso determina uma luta constante entre as ideias obsessivas, que voltam de forma recorrente à consciência, e o indivíduo, que se esforça por bani-las de sua consciência, gerando um estado de angústia constante. Com certa frequência, em pacientes gravemente obsessivos, aspectos do pensamento mágico também estão presentes (p.ex., ‘Se eu tocar na roupa de uma prostituta ficarei contaminado’, ou ‘Se eu repetir a palavra santo cinquenta vezes impedirei que meu pai morra’). Afrouxamento das associações Neste caso, embora ainda haja concatenação lógica entre as ideias, nota-se já o afrouxamento dos enlaces associativos [...]. As associações parecem mais livres, não tão bem articuladas. Manifesta-se nas fases iniciais da esquizofrenia e em transtornos da personalidade (sobretudo no da personalidade esquizotípica). Descarrilhamento do pensamento O pensamento a a extraviar-se de seu curso normal, toma atalhos colaterais, desvios, pensamentos supérfluos, retornando aqui e acolá ao seu curso original. Geralmente está associado a marcante distraibilidade. Se o descarrilhamento for muito acentuado, e os desvios, muito frequentes e longos, pode-se não mais captar a sequência lógica do pensamento. O descarrilhamento é observado na esquizofrenia e, eventualmente, nos transtornos maníacos. ALTERAÇÕES QUALITATIVAS (CONTEÚDO DO PENSAMENTO) Concretismo (ou deficitário, ou oligofrênico) O concretismo (ou pensamento empobrecido) caracteriza-se por um discurso pobre em conceitos abstratos, em metáforas e analogias. Há uma intensa adesão ao nível sensorial e imediato da experiência. Ocorre na demência, no delirium, no retardo mental e na esquizofrenia. Uma forma especial de concretismo seria a reificação (res = coisa), que consiste na utilização de expressões e símbolos, não com algo representativo, mas com coisa substantiva, concreta. Um esquizofrênico, por exemplo, que diz que roubaram seu pensamento o está vivenciando como um objeto físico. 75
Uma neurose, em sentido amplo, caracteriza uma afecção psicogênica cujos sinais e sintomas são, segundo a teoria psicanalítica, uma expressão simbólica de conflitos psíquicos, normalmente inconscientes, que têm suas raízes na história infantil do indivíduo e constituem compromissos entre o desejo e as defesas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
69
Pensamento demencial Trata-se também de pensamento pobre, porém tal empobrecimento é desigual, ao contrário do que ocorre no pensamento deficitário, no qual o empobrecimento é mais homogêneo. Em certos pontos, o pensamento demencial pode revelar elaborações mais ou menos sofisticadas, embora de forma geral seja imperfeito, irregular, sem unidade ou congruência. Em relação aos conceitos abstratos e aos raciocínios diferenciados e complicados, podem-se observar seus resquícios no pensamento demencial, embora, com o progredir da síndrome demencial, vá predominando mais e mais o pensamento pobre, concreto e desorganizado. É frequente o fato de o indivíduo dementado, nas fases iniciais, tentar dissimular suas dificuldades cognitivas. Ao se deparar com a dificuldade em encontrar as palavras (aspecto característico no início das demências), procura termos mais genéricos, evita os adjetivos e os substantivos específicos. Por exemplo, ‘Não consigo encontrar aquela coisa, o meu... (batom), aquilo para pintar a boca...’; ‘Vou pedir ao...àquele homem (o guarda), que me ajude a atravessar... aqui (a rua). Ideias delirantes A palavra delirar é derivada do latim delirare (de = fora; liros = sulcos), que significa literalmente lavrar fora do sulco. Apofania é a apresentação do delírio. De acordo com Karl Jaspers (1987), ideias delirantes (ou delírios) são juízos patologicamente falsos, que possuem as seguintes características externas: acompanham-se de uma convicção extraordinária, não são susceptíveis à influência e possuem um conteúdo impossível. Os delírios, constituindo uma alteração do conteúdo do pensamento, são, por conseguinte, detectados no discurso do paciente. Todavia, com frequência o paciente irá dissimular sua atividade delirante ou não terá interesse ou possibilidade (nos casos de estupor, por exemplo) de verbaliza-la. Nessa situação, torna-se fundamental a avaliação da atitude (desconfiança, medo, arrogância, etc.). O delírio constitui uma alteração relacionada à formação de juízos. Através dos juízos, discernimos a verdade do erro. Através do juízo de realidade, distinguimos o que é real do que é fruto de nossa imaginação. [...] O delírio caracteriza-se por uma certeza subjetiva absoluta, por uma firmeza irremovível da convicção, por uma impossibilidade de modificação diante do desmentir dos fatos ou da refutação rigorosa: é incorrigível. [...] A impossibilidade do conteúdo é um critério bastante criticado, pois considera-se que a maior parte dos delírios tem um conteúdo possível, embora improvável; e, em alguns casos, o conteúdo do delírio é, por mero acaso, verdadeiro. O juízo falso é impossível e irracional quando está relacionado a um erro lógico, quando o raciocínio subverte os princípios lógicos: tornar existente o que não existe e não pode existir. Por exemplo: acreditar estar na Terra e na Lua ao mesmo tempo. Trata-se de uma impossibilidade lógica. O juízo falso é impossível e racional quando está relacionado a um erro gnosiológico76 – tornar existente o que não existe mas pode vir a existir – e, no raciocínio, os princípios lógicos são preservados. Por exemplo: antes de 1969, afirmar ter estado na Lua. Trata-se de uma impossibilidade real. 76
Gnosiologia – teoria do conhecimento.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
70
O juízo falso é possível e improvável quando está relacionado a um erro gnosiológico mas também a uma possibilidade real, embora pequena, de ser verdadeiro (Chalub, 1977). Um exemplo de um delírio com essas características é o seguinte: Senhora de mais de 50 anos morava sozinha desde sua separação conjugal. Havia alguns anos que ela não tinha mais contato com o ex-marido, que estava agora casado com uma mulher bem mais jovem que ela. A paciente, quando chegava em casa do trabalho, notava que alguns objetos estavam fora de lugar. Ela acreditava que, quando saía de casa, o ex-marido entrava em seu apartamento (sem ser visto por ela) e tirava de lugar tais objetos, para que ela pensasse que estava perdendo a memória e ficando ‘maluca’. Segundo ela, o porteiro estava envolvido nesse plano, pois ele avisava a seu ex-marido quando ela saía, assim como um chaveiro, que tinha feito uma cópia da chave de seu apartamento para o invasor. Também faziam parte da trama o síndico do edifício e diversas outras pessoas, todos judeus. O objetivo deles era fazer com que ela ficasse nervosa e desesperada, e, assim, vendesse seu apartamento por um baixo preço para um dos conspiradores, que então teria um grande lucro financeiro. Nenhuma das ideias formuladas pela paciente era absurda, todavia as chances de todas elas terem sido verdadeiras eram, na prática, desprezíveis. [...] O delírio constitui uma vivência individual, idiossincrática77. Com isso, distingue-se das crenças culturalmente compartilhadas, como os dogmas religiosos, os quais podem possuir as mesmas características apontadas por Jaspers em relação ao delírio. Todo delírio é de certa forma autorreferente, no sentido de que o seu conteúdo está direta ou indiretamente relacionado ao enfermo. O delírio se transforma no eixo em torno do qual a a girar a vida do indivíduo. Em função de sua convicção extraordinária, o delirante não sente a necessidade de comprovar objetivamente a veracidade de seu juízo e pode não achar importante convencer as outras pessoas de que está certo. Muitas vezes há uma discrepância entre o delírio e a conduta do paciente: ou este não muda em nada seu comportamento, ou age de forma diferente do que se esperaria de alguém que realmente estivesse na sua situação. Delírios são experimentados subjetivamente com características mais de saber do que acreditar (Sedler, 1995), o que também os distingue das crenças religiosas. Delírio primário O delírio primário é a ideia delirante autêntica. Ele é autóctone, isto é, não deriva de nenhuma outra manifestação psíquica. É incompreensível: não pode ser seguido psicologicamente até a sua origem, é algo de ‘último e derradeiro’ (Jaspers). Está relacionado a uma profunda transformação da personalidade, sendo expressão de um processo: o surgimento de algo novo, duradouro e irreversível na vida mental. Classicamente, seria exclusivo da esquizofrenia. K. Jaspers incluiu sob a denominação de vivências delirantes primárias as percepções delirantes, as representações delirantes e as cognições delirantes. K. Schneider criou o conceito de ocorrências delirantes, que englobaria as representações delirantes e cognições delirantes [ou, delírio intuitivo]. A percepção delirante consiste na atribuição de um significado novo, anormal, a uma percepção normal de um objeto real. Essa significação se dá de forma simultânea ao ato perceptivo. O significado é para o observador algo ilógico, absurdo e incompreensível, ou seja, parece não haver 77
Idiossincrasia - 1. Disposição do temperamento do indivíduo, que o faz reagir de maneira muito pessoal à ação dos agentes externos. 2. Maneira de ver, sentir, reagir, própria de cada pessoa.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
71
qualquer relação entre o que foi percebido e a conclusão a que se chegou. Para o doente, o significado é em geral autorreferente; tem o caráter de um aviso, mensagem ou revelação; é algo especial, de grande importância, que é sentido como imposto. Um exemplo seria o seguinte: o indivíduo vê um cachorro urinando na rua e sabe que o mundo vai acabar. A percepção delirante é um dos sintomas de primeira ordem de Kurt Schneider para o diagnóstico da esquizofrenia. [...] Na representação delirante, um significado anormal é dado a uma recordação normal. Por exemplo: ‘Eu podia muito bem ser filho do Rei Luis’ – uma recordação clara, de como o imperador, ao ar a cavalo, na parada, vista há alguns anos, olhou justamente para ele, o confirma’ (Jasper, 1987). A cognição delirante [ou, delírio intuitivo] consiste em uma convicção patológica intuitiva, uma certeza súbita, uma revelação imediata, que prescinde por completo de conexões significativas com quaisquer dados perceptivos ou representativos. Por exemplo, o indivíduo de repente sabe que é Jesus Cristo, mas isso não está relacionado com nada que ele tenha visto, ouvido ou se lembrado. A cognição delirante ocorre mais em quadros psicóticos mais agudos do que crônicos. Ao contrário da percepção delirante e da representação delirante, constituídas por 2 membros – a percepção ou recordação normal + a significação anormal –, a cognição delirante possui um único membro (Schneider, 1978). Delírio secundário (ou, ideia deliroide) O delírio secundário também é chamado de ideia deliroide. Ele se origina de forma compreensível psicologicamente de outras manifestações psíquicas patológicas, tais como alterações do humor, da sensopercepção e da consciência. São exemplos de delírios secundários: as ideias de culpa na depressão – a tristeza vital é considerada primária -, as ideias de grandeza na mania, as ideias de influência relacionadas a alucinações cenestésicas, as ideias de perseguição no delirium tremens, etc. [...] Ideia sobrevalorada Na definição de Nobre de Melo (1981), a ideia sobrevalorada (ou supervalorada, ou prevalente, ou sobrevalente) é uma ideia errônea por superestimação afetiva. O erro decorre do fato de a ideia estar relacionada a uma carga afetiva muito intensa, que influencia o julgamento da realidade (influência catatímica) tornando-o pouco racional. Essa ideia ganha preponderância em relação às demais e orienta unilateralmente a conduta do indivíduo. Na ideia sobrevalorada, o erro é compreensível psicologicamente em função da vivência emocional ou de traços de personalidade do indivíduo. A convicção é menor do que no delírio: a ideia é mais influenciável. A ideia sobrevalorada pode ocorrer em pessoas normais. Por exemplo, convicções apaixonadas em relação a questões científicas, filosóficas, políticas e religiosas, assim como as ideias dos enamorados sobre o objeto do seu amor. Ocorre ainda em alguns transtornos mentais, como na hipocondria (a ideia de sofrer de uma doença), no transtorno dismórfico corporal (ter um defeito na aparência), na anorexia nervosa (precisar emagrecer), no transtorno obsessivo-compulsivo (ter que limpar, contar, verificar ou tocar) e no transtorno de personalidade paranoide (estar sendo enganado ou prejudicado).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
72
Os temas dos delírios - Delírio de perseguição (ou persecutório) – O doente acredita que o estão vigiando, querem prejudica-lo ou mesmo mata-lo. - Delírio de prejuízo – Seria uma forma atenuada de delírio persecutório: o indivíduo pensa que as outras pessoas são hostis em relação a ele, zombam dele ou o menosprezam. - Delírio de reivindicação (ou querelante) – Seria um subtipo de delírio persecutório. O indivíduo se julga vítima de terríveis injustiças ou discriminações, e, em função disso, envolve-se em disputas legais e querelas. - Delírio de influência ou controle (também chamado de Vivências de Influência) – Seria um outro tipo de delírio persecutório. O paciente acredita que alguém ou alguma força externa controla (literalmente) sua mente ou seu corpo. Pode, por exemplo, dizer que um pensamento que apareceu em sua mente não é seu, que foi colocado lá por outra pessoa; ou então afirmar que está se sentido fraco porque um ímã está sugando suas energias. - Delírio de grandeza (de enormidade) – O doente acredita ser muito rico e poderoso, ou possuir habilidades e talentos especiais. Tal conteúdo de delírio é típico da mania. - Delírio de ciúmes e delírios de infidelidade – O indivíduo acredita que seu cônjuge ou amante está sendo infiel a ele. Esse quadro está especialmente associado ao alcoolismo crônico e ao transtorno delirante, sendo mais comum no sexo masculino. - Delírio erotomaníaco (ou erótico)78 – O indivíduo crê ser amado, a distância, por uma outra pessoa. Essa outra pessoa é tipicamente mais velha e possui uma situação socioeconômica mais elevada que a do paciente. Muitas vezes trata-se de uma pessoa famosa. O indivíduo pode atribuir a
78
O delírio erotomaníaco é típico da chamada Síndrome de Clèrambault, que se caracteriza na convicção delirante, por parte do paciente, de que alguém de posição social mais elevada o ama. Nas descrições clássicas, o surgimento dos delírios é abrupto, o que nem sempre é observado na prática clínica. De Clèrambault descreveu a erotomania como uma síndrome de emoções patológicas que segue uma evolução ordenada, ando pelos estágios de esperança, despeito e rancor. Essa evolução foi considerada por ele como invariável, sendo a fase de rancor a mais importante delas e, na verdade, o que mais bem caracteriza toda a síndrome, ao invés do estágio de amor. Então o portador da erotomania acredita que o seu objeto de amor declarou-se para ele, de alguma maneira: por sinais , telepaticamente, ou frases ditas ao público mas que o portador acredita ter sido direcionadas a ele. Depois disto, o portador que inicialmente poderia não corresponder ao amor que acredita ter sido declarado primeiramente pelo outro, a interessar-se e corresponder e tentar demonstrar este amor, seduzindo seu objeto amado, declarando-se, etc.. O paciente pode desejar ter relações sexuais com o objeto de seu amor delirante, pode tentar seduzi-lo para esse fim ou ar a acreditar, inclusive, que está gestando um filho dele. Os homens tendem mais à perseguição de seus objetos que as mulheres. Embora atos físicos ou sexuais sejam incomuns, esses pacientes podem trazer significativo impacto psicológico e social à vida de suas vítimas, em consequência de perseguições por períodos prolongados, que variam de chamadas telefônicas a declarações de amor em ambientes públicos e movimentados. Diante da percepção do envolvimento do ser amado com terceiros surge o despeito e diante de sua rejeição, o rancor. Quando o paciente erotomaníaco alcança o estágio de rancor, depois de repetidas rejeições que sofre, não raro exerce retaliações contra seu objeto de amor ou contra terceiros. O típico portador da erotomania pode ser homem ou mulher, leva uma vida reservada, socialmente inexpressiva; poucos são casados, muitos são privados de contato sexual por anos, a maioria ocupa cargos subalternos, e alguns são muito pouco atraentes. Esse comportamento pode resultar de traços de personalidade hipersensível, desconfiança acentuada ou assumida superioridade em relação às outras pessoas. Por outro lado, os objetos de amor delirante, na realidade ou em fantasia, são sempre superiores em inteligência, posição social, aparência física, autoridade ou uma combinação destes atributos. Quase sempre, o paciente sente-se como que livrado de sua solidão pelo amor que o objeto supostamente lhe dedica. Esta síndrome pode apresentar-se em diversos transtornos mentais: transtorno delirante persistente, esquizofrenias, transtorno afetivo bipolar. (http://dicionariodesindromes.blogspot.com.br/2006/10/sndrome-declrambault.html)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
73
não aproximação por parte da outra pessoa à malevolência de terceiros. O delírio erotomaníaco é mais comum no sexo feminino e pode ocorrer no transtorno delirante. - Delírio de referência (de alusão ou de auto-referência) – O doente atribui a fatos fortuitos ou acidentes do cotidiano uma relação direta com a sua pessoa. Por exemplo: ele vê dois desconhecidos conversando, e, mesmo sem nada ouvir, sabe que estão falando sobre ele. Ou então: ele acredita que o enredo da novela da TV foi baseado na sua vida. - Delírio de relação – O indivíduo delirante constrói conexões significativas (delirantes) entre os fatos normalmente percebidos. Essas conexões novas surgem geralmente sem motivação compreensível. Por exemplo, o paciente agora sabe que tudo faz sentido, os fatos se relacionam (as chuvas do verão ado, o inverno atual mais frio, etc.), indicando “que realmente a guerra dos seres alienígenas irá começar”. Tal tipo de delírio também apresenta colorido persecutório. (DALGALARRONDO, 2008, p. 219) - Delírio de ruína (ou niilista) – É comum na depressão. Para o paciente, sua vida está repleta de desgraça, sofrimento, fracassos e perdas: tornou-se financeiramente miserável, seus familiares o abandonaram, etc. Os delírios somáticos (ruína da saúde física), de culpa (ruína moral) e de negação (ruína total) poderiam ser considerados subtipos do delírio de ruína.79 - Delírio somático (ou hipocondríaco) – o paciente acredita estar sofrendo de uma doença muito grave e incurável, como AIDS, câncer, tumor cerebral, etc., ou ter o corpo terrivelmente deformado. - Delírio de infestação (Síndrome de Ekbom) – O indivíduo acredita que seu corpo (principalmente sua pele e/ou cabelos) está infestado por pequenos (mas macroscópicos) organismos. Relata, no mais das vezes, que há ‘bichinhos’ sob a pele’, insetos nos cabelos, vermezinhos, aranhas, etc. Acompanhando o delírio, podem ocorrer alucinações táteis (correspondentes aos ‘pequenos insetos’). Esse tipo de delírio ocorre em pacientes esquizofrênicos, deprimidos, no delirium tremens, em intoxicações por cocaína ou alucinógenos e em indivíduos obcecados pela higiene corporal. (DALGALARRONDO, 2008, p. 223) - Delírio de culpa (ou autoacusação) – Característico da depressão. O paciente acredita que cometeu pecados terríveis, ou mesmo crimes, em seu ado, e que merece ser punido. Ele supervaloriza pequenas falhas que cometeu, ou pensa ter influenciado o acontecimento de grandes catástrofes. - Delírio de negação de órgãos – O indivíduo experimenta profunda alterações corporais. Relata que seu corpo está destruído ou morto, que não tem mais um ou vários órgãos, como o coração, o fígado ou o cérebro, suas veias ‘estão secas’, não tem mais nem uma gota de sangue, seu corpo secou ou apodreceu, seus braços e pernas estão se ‘esfarelando’. Denomina-se síndrome ou delírio de Cottard quando o delírio de negação de órgãos vem acompanhado de delírio de imortalidade e de enormidade (‘Não vou morrer nunca mais, vou sofrer para o resto da eternidade’) e, mais raramente, de delírio de enormidade (o paciente vivencia o corpo se expandido, tomando conta de todo o quarto, crescendo até proporções gigantescas). [...] O delírio de negação de órgãos e a síndrome de Cottard são típicos das depressões graves com marcante componente ansioso. Podem ocorrer também em quadros psico-orgânicos crônicos e na esquizofrenia. (DALGALARRONDO, 2008, p. 221-2) 79
Alguns autores fazem menção a uma variação relativa a este delírio: a chamada Síndrome de Cotard também chamada de delírio de Cotard, síndrome do cadáver ambulante1, delírio niilista ou delírio de negação. É uma síndrome rara de fundo psicológico onde a pessoa acredita estar morta, não reagindo a estímulos exteriores nem a outras pessoas. Também pode acreditar que está com seus órgãos internos podres ou apodrecendo. (adaptado de Wikipédia)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
74
- Delírio místico ou religioso – Envolve temas religiosos, espíritos, etc. O indivíduo diz que é Jesus Cristo, que pode fazer milagres, que Deus lhe deu uma missão, ou que vai fundar uma nova religião. No delírio de possessão, que pode ser aqui incluído, o doente julga que um espírito entrou em seu corpo e assumiu o controle de sus atos. - Delírio de reforma (ou salvacionismo) – Ocorre entre indivíduos que se sentem destinados a salvar, reformar, revolucionar ou redimir o mundo ou a sociedade. Tal plano revolucionário ou salvacionista está muitas vezes fundamentado em dogma ou sistema religioso ou político, desenvolvido pelo próprio delírio. Esses delirantes têm convicção plena de que seu sistema religioso ou político é absolutamente o único capaz de salvar de fato a humanidade. (DALGALARRONDO, 2008, p. 223) - Delírio fantástico (ou mitomaníaco) – Envolve temas extraordinários, ou de extrema grandiosidade. Por exemplo: uma paciente que afirma ter parido todas as pessoas que existem no mundo. - Delírio de identificação – O paciente julga que uma pessoa familiar foi substituída por uma sósia. Este é fisicamente idêntico à primeira, mas psicologicamente distinto. - Delírio de conteúdo depressivo – são aqueles que têm temática de colorido marcadamente triste, como ruína ou miséria, culpa ou auto-acusação, doenças e mesmo o desaparecimento de partes do corpo (negação dos órgãos). São tipos de delírios intimamente associados a estados depressivos profundos. Esses delírios são o inverso dos delírios de grandeza ou daqueles em que o sujeito acredita ser alguém muito especial (verificados em certos quadros de mania). Além disso, diz-se que, nos transtornos de humor que cursam com ideias delirantes, o delírio é congruente com o humor quando, em episódios de depressão psicótica, se observam delírios de ruína, culpa, negação dos órgãos ou hipocondríacos (e, no caso da mania, delírios de grandeza). Quando os conteúdos dos delírios não estão coerentes com a alteração do humor, diz-se que eles são “incongruentes com o humor” ou humor-incongruentes (delírio persecutório em quadro depressivo, sem a ideia de ‘merecer’ ser perseguido, ou delírio de controle80 em quadro de mania). Os principais delírios de conteúdo depressivo são os de ruína, de culpa e de auto-acusação, de negação de órgãos e hipocondríacos.” (DALGALARRONDO, 2008, p. 221) - Delírio de invenção ou descoberta – Aqui o indivíduo, mesmo completamente leigo na ciência ou na área tecnológica em questão, revela ter descoberto a cura de uma doença grave (de AIDS, do câncer, etc.), ou ter desenvolvido um aparelho moderno fantástico; enfim, descobertas ou invenções que irão mudar o mundo. Verifica-se principalmente nos transtornos delirantes (antiga paranoia), na esquizofrenia e na mania. (DALGALARRONDO, 2008, p. 222-3) 80
O delírio de controle é típico na Síndrome de Kandinsky-Clèrambault. Nesta síndrome seu portador acredita que sua mente esta sendo controlada por alguém ou por forças externas. O portador crê, portanto, que seu pensamento, suas sensações e seus comportamentos estão sendo controlados por outra pessoa, gerando o que se chama em psicopatologia "automatismos". Assim, segundo o primeiro psiquiatra a descrever o fenômeno, Dr. Kandinsky na Rússia, poderia haver automatismos cognitivos, sensitivos e motores, combinados com delírios de influência física ou mental, tais como roubo ou inserção do pensamento. Mais adiante, Dr. Clèrambault na França, dividiu os automatismos de modo semelhante em três tipos: 1.Tipo associativo: inclui afrouxamento de associações, bloqueio do pensamento, fuga de ideias, delírios de influência, publicação do pensamento etc. 2.Tipo sensitivo: delírios de influência física com sensações desagradáveis vindas de órgãos internos, provocadas por terceiros. 3.Tipo motor: envolve o delírio de que outra pessoa é responsável por movimentos e ações. Esta síndrome é frequentmente observada no contexto das Esquizofrenias.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
75
- Delírio hipocondríaco - O paciente crê com convicção extrema que tem uma doença grave, incurável e que irá morrer brevemente.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
76
ALTERAÇÕES DA AFETIVIDADE81 Afetividade – Definições: [...] grau de resposta da pessoa ou sua suscetibilidade a prazer, dor e outros estímulos emocionais. [...] (APA, 2010, p. 40) [...] refere-se a um tom emocional momentâneo que acompanha o que dizemos ou fazemos. (BARLOW, 2010, p. 62) [...] termo introduzido por Bleuler para designar o conjunto dos processos emocionais da vida dos sentimentos, da vida emotiva. Em sentido amplo, designa o conjunto dos sentimentos de uma pessoa. (DORCSH, 2001, p. 19) Chama-se afetividade a capacidade de experimentar sentimentos e emoções. A afetividade compreende o estado de ânimo ou humor, os sentimentos, as emoções e as paixões. (PAIM, 1993, p. 219) [...] Afeto vem do latim afficere, que significa influenciar, afetar. Esse termo pode ser usado para designar genericamente os elementos da afetividade, incluindo emoções, sentimentos e humor; mas, outras vezes, é empregado como sinônimo de emoção. O termo emoção corresponde ao francês emouvoir, que significa comover, emocionar; e está ligado a uma ideia de movimento. Emoção em geral representa um estado afetivo súbito, de curta duração e grande intensidade, que se acompanha de alterações corporais, relacionadas a uma hiperatividade autonômica. Sentimento deriva-se do latim sentire, que significa sensação, perceber através dos sentidos, dar-se conta. Esse termo em geral se refere a um estado afetivo menos intenso e mais prolongado que as emoções, e sem as alterações fisiológicas encontradas nestas. Talvez se possa dizer que os sentimentos resultem de um processamento cognitivo maior do que haveria nas emoções. As paixões têm a intensidade das emoções, porém uma duração maior. Elas monopolizam e direcionam os pensamentos e ações do indivíduo. O humor (ou estado de ânimo, ou tônus afetivo) representa um somatório ou síntese dos afetos presentes na consciência em um dado momento. Constitui o estado afetivo basal e fundamental, que se caracteriza por ser difuso, isto é, não relacionado a um objeto específico, e por ser em geral persistente e não reativo. O humor oscila entre os polos da alegria, da tristeza e da irritabilidade, assim como entre a calma e a ansiedade. [...] Não é necessário que o paciente nos conte como está se sentido para podermos avaliar a sua afetividade: o afeto é expresso através da mímica, do olhar, dos gestos da postura e do tom de voz. A afetividade é avaliada empaticamente. É como se o observador dissesse para si mesmo, por exemplo: ‘Se eu estivesse me sentido como aquele indivíduo aparenta estar – pela sua expressão facial, gestos, etc. -, eu me sentiria muito alegre, portanto, ele está alegre.
81
O texto deste item foi retirado e adaptado, principalmente, de: CHENIAUX,2013, p. 139-151; DALGALARRONDO, 2008, p. 155-173 e, PAIM, 1993, p. 219-236
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
77
Alterações do humor Analise o esquema a seguir:
Hipertimia – [...] ou estado de ânimo morbidamente elevado, distinguem-se a euforia e a exaltação afetiva patológica. A euforia simples se traduz por um estado de completa satisfação e felicidade. Verificam-se elevação do estado de ânimo, aceleração do curso do pensamento, loquacidade, vivacidade da mímica facial, aumento da gesticulação, riso fácil e logorreia. A euforia simples é observada nos indivíduos predispostos constitucionalmente e, em sua forma pura, na fase maníaca, nos estados hipomaníacos, na embriaguez alcoólica, na demência senil. Na epilepsia, podem-se verificar estados de euforia simples, [...]. Na exaltação patológica há não só a euforia, mas, também, aumento da convicção do próprio valor e das aspirações. (‘[...] há, além da alegria patológica, a expansão do eu, uma sensação subjetiva de grandeza e de poder. O Eu vai além dos seus limites, ganhando o mundo’). Vai acompanhada de aceleração do curso do pensamento, que pode chegar à fuga de ideias, desviabilidade da atenção e certa facilidade para ar rapidamente do pensamento à ação. A instabilidade afetiva desses enfermos se traduz pela extrema facilidade com que eles am da euforia à tristeza ou à cólera. O estado de ânimo é o da distimia expansiva. Nos estados de exaltação patológica os enfermos dão a impressão de mais jovens, há aumento do turgor vitalis82, manifestações de apetite voraz e de excitação sexual, insônia, grande facilidade dos movimentos expressivos e tendência irresistível à ação. Hipotimia ou, depressão/ tristeza patológica; ou distimia hipotímica – Verifica-se o aumento da reatividade para os sentimentos desagradáveis, podendo variar desde o simples mal-estar até o estupor melancólico. Caracteriza-se, essencialmente, por uma tristeza profunda e imotivada, que se acompanha de lentidão e inibição de todos os processos psíquicos. Em suas formas leves, a depressão se revela por um sentimento de mal-estar, de abatimento, de tristeza, de inutilidade e de 82
Turgor vitalis – expressão latina que significa força, pressão de vida ou vital; disposição; estado de espírito.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
78
incapacidade para realizar qualquer atividade. Nas formas mais graves, os doentes apresentam um estado de profundo abatimento: fisionomia triste, traços contraídos, [...]. Os enfermos estão dominados por um profundo sentimento de tristeza imotivada. No doente deprimido, as percepções são acompanhadas de uma tonalidade afetiva desagradável: tudo lhe parece sombrio. Os doentes perdem completamente o interesse pela vida. Nada lhes interessa do presente nem do futuro e, do ado, são rememorados apenas os acontecimentos desagradáveis. As percepções são lentas, monótonas, descoloridas. Ao enfermo parece que os alimentos perderam o sabor habitual. Nos estados depressivos, as ilusões são mais frequentes do que as alucinações. As ideias deliroides são comuns, expressando geralmente ideias de culpabilidade, de indignidade e de autoacusação. O pensamento é lento e o próprio ato-de-pensar é acompanhado de um sentimento desagradável. O conteúdo do pensamento exprime motivações dolorosas. O doente não pode livrar-se de suas ideias tristes. O quadro clínico da depressão patológica é caracterizado pela inibição, refletida na lentidão e pobreza de movimentos, na mímica apagada, na linguagem lenta, monótona, algumas vezes expressa numa voz sussurrada. Em alguns casos, a inibição motora acompanha-se de um estado de tensão da musculatura voluntária, quadro clínico esse denominado pelos antigos autores de ‘estado atônito’. Os sintomas somáticos são evidentes. As alterações vasomotoras se revelam pelas mãos frias e cianosadas, pela cianose dos lábios e pela hipotermia. São frequentes espasmos vasculares, com elevação da pressão arterial, palidez da face e diminuição do turgor vitalis. Os doentes dão a impressão de mais velhos. As perturbações digestivas são constantes: língua saburrosa (mucosa), inapetência, prisão de ventre. As perturbações circulatórias ocasionam um sentimento subjetivo de opressão na região cardíaca, determinando a chamada angústia precordial83. Disforia – [...] diz respeito à distimia acompanhada de uma tonalidade afetiva desagradável, malhumorada. Quando se fala em depressão disfórica ou mania disfórica, está sendo designado um quadro de depressão ou de mania acompanhado de forte componente de irritação, amargura, desgosto ou agressividade. Puerilidade – É uma alteração do humor que se caracteriza pelo aspecto infantil, simplório, regredido. O indivíduo ri ou chora por motivos banais; sua vida afetiva é superficial, sem afetos profundos, consistentes e duradouros. Verifica-se especialmente na esquizofrenia hebefrênica, em indivíduos com déficit intelectual, em alguns quadros histéricos e em personalidades imaturas de modo geral. Assemelhando-se à puerilidade, a moria é uma forma de alegria muito pueril, ingênua, boba, que ocorre principalmente em pacientes com lesões extensas dos lobos frontais, em deficientes mentais e em indivíduos com quadros demenciais acentuados. Nesses casos os enfermos fazem bufonarias, caretas, não
83
Precordial - Relativo ou pertencente à região que fica adiante do coração, ou nela situado. (Aurélio)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
79
permanecem quietos um só instante; o humor é extremamente instável; tornam-se cada vez mais exuberantes, loquazes, riem às gargalhadas. Êxtase – [...] há uma experiência de beatitude, uma sensação de dissolução do Eu no todo, de compartilhamento íntimo do estado afetivo interior com o mundo exterior, muitas vezes com colorido hipertímico e expansivo. Está frequentemente associado a experiências circunscritas a um contexto religioso ou místico, não sendo aqui considerado como fenômeno psicopatológico, mas cultural. Entretanto, o êxtase também pode estar presente em condições psicopatológicas, como no transe histérico, na esquizofrenia ou na mania. Irritabilidade patológica – [...] há a hiper-reatividade desagradável, hostil e, eventualmente, agressiva a estímulos (mesmo leves) do meio exterior. Qualquer estímulo é sentido como perturbador, e o indivíduo reage prontamente de forma disfórica. Qualquer ruído (de crianças, da televisão, de carros, etc.), a presença de muitas pessoas no local, qualquer crítica à pessoa doente, enfim, tudo é vivenciado com muita irritação. A irritabilidade é sintoma bastante frequente e inespecífico, indicando, não raramente, quadro de natureza orgânica. Também ocorre a irritabilidade patológica nas síndromes depressivas, nos quadros maníacos, nos transtornos ansiosos e na esquizofrenia. O clínico sempre deve procurar diferenciar a irritabilidade primária, oriunda diretamente de um transtorno do humor psico-orgânico, de uma irritabilidade secundária, associada a vivências psicóticas (delírios persecutórios, alucinações ameaçadoras, etc.) ou neuróticas (conflitos inconscientes, insegurança, dificuldade em tomar decisões existenciais importantes, etc.). Paratimia – A paratimia caracteriza-se por uma inadequação do afeto: uma incongruência entre o afeto expresso e a situação vivenciadas, ou entre o afeto expresso e aquilo que o indivíduo verbaliza. Por exemplo: o paciente, rindo, conta que foi torturado na noite anterior; ou então o doente afirma estar alegre, mas sua mímica é de tristeza. A paratimia reflete uma desarmonia entre a afetividade e o pensamento. Ocorre na esquizofrenia. Ambitimia – A ambitimia também chamada de ambivalência afetiva, segundo a denominação de Bleuler, [...] Representa a presença de sentimentos opostos ou contraditórios que simultâneos e que se referem ao mesmo objeto, pessoa ou situação. Por exemplo: ao mesmo tempo amar e odiar a mesma pessoa. Neotimia – [...] consiste em uma vivência inteiramente nova, extravagante e inusitada. São afetos qualitativamente diferentes de todos os que o paciente havia experimentado em sua vida. Podem ter esse caráter de neotimia alguns sentimentos místicos, de êxtase, de elação, de desolação e de terror. A neotimia é observada na esquizofrenia – especialmente no trema84 -, na intoxicação por alucinógenos e em algumas auras85 epiléticas.
84
Trema – [...] estado de tensão peculiar em que o ator fica antes de entrar em cena e que o professor experimenta antes de iniciar a aula. Poderá ser de maior ou menor intensidade. Esta é uma palavra tirada do argot, da gíria do teatro. 85 Aura - Fenômeno ou sensação especial que, nos indivíduos epilépticos, surge imediatamente antes do início do ataque. “O paciente sente pronunciado cheiro de terra molhada e experimenta várias outras sensações peculiares. Involuntariamente, emite um urro animalesco, conhecido como “grito do leão” ou “grito do pavão”. Seguem-se normalmente, a queda ao chão e o início das convulsões. Durante as crises o paciente pode ser tomado de grande
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
80
Outras alterações da afetividade Labilidade afetiva – São estados nos quais ocorrem mudanças súbitas e imotivadas de humor, sentimentos ou emoções. O indivíduo oscila de forma abrupta, rápida e inesperada de um estado afeito para outro. O paciente está falando de algo ameno e começa a chorar convulsivamente, ando, logo a seguir, a sorrir de forma tranquila. Pode ocorrer em quadros de depressão ou mania, estados graves de ansiedade e esquizofrenia. Incontinência afetiva – Na incontinência afetiva, o indivíduo não consegue conter de forma alguma suas reações afetivas. A resposta afetiva ocorre geralmente em consequência a estímulos apropriados, mas é sempre muito desproporcional. Pode ocorrer em quadros de depressão ou mania, estados graves de ansiedade e esquizofrenia. Fobias – São medos determinados psicopatologicamente, desproporcionais e incompatíveis com as possibilidades de perigo real oferecidas pelos desencadeantes, chamados de objetos ou situações fobígenas86. Pânico – É uma reação de medo intenso, de pavor, relacionado geralmente ao perigo imaginário de morte iminente, descontrole ou desintegração. O pânico se manifesta quase sempre como crises de pânico. Estas são crises agudas e intensas de ansiedade, acompanhadas por medo intenso de morrer ou de perder o controle e de acentuada descarga autonômica (taquicardia, sudorese, etc.). As crises caracterizam-se pelo início abrupto de uma sensação de grande perigo e desejo de fugir ou escapar da situação. [...] Tenacidade afetiva – [...] consiste na persistência anormal de certos estados afetivos, como ressentimento, o ódio e o rancor. Em virtude dessa fixação prolongada de sentimentos desagradáveis, o enfermo está sempre de mau humor e encara todos os acontecimentos da vida através de um prima pessimista. [...] A tenacidade afetiva é própria dos epilépticos, conforme assinalou Kleis, a perseveração dos epilépticos é um fenômeno geral, semelhante à sonolência ou ao estupor, e abrange também os processos afetivos. Daí a persistência anormal dos sentimentos observada nesses enfermos. Sugestibilidade patológica – É uma alteração de ordem tanto afetiva quanto volitiva. Trata-se de uma predisposição psíquica especial, que determina uma receptividade e uma submissão muito fáceis às influências estranhas exercidas sobre o indivíduo. No terreno puramente psíquico, encontra-se a sugestibilidade nos histéricos, razão pela qual se tornam esses enfermos muito favoráveis à produção de estados hipnóticos, de sintomas somáticos e até mesmo de sintomas psicóticos – as chamadas perturbações mentais induzidas ou por contágio mental. [...] A sugestibilidade é também muito comum nos deficientes mentais e nos estados demenciais, nos quais é uma consequência da insuficiência intelectual. Na demência senil a sugestibilidade adquire grande significação do ponto de vista médico-legal (Justiça), em virtude de estarem esses enfermos agressividade. Fora do surto a consciência e a vontade são restabelecidas plena ou parcialmente” (FUHRER, R.E., 2000, p. 58) 86 Vide descrição clínica e relação das principais fobias na página 113 desta apostila.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
81
sujeitos a explorações prejudiciais a seus interesses pessoais, extorsão de dinheiro, captação de herança. A sugestibilidade pode também ser observada nos estados de excitação maníaca e nos alcoolistas. No delirium de abstinência alcoólica, por exemplo, podem-se sugerir facilmente várias coisas ao enfermo, inclusive alucinações. Na catatonia, a sugestibilidade é predominantemente motora. [...]
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
82
ALTERAÇÕES DA VOLIÇÃO87 88 Principais conceitos: Impulso (em inglês, drive - tendência – “necessidade repentina e inegável de agir imediatamente, muitas vezes resultando em ação sem deliberação para um propósito que não pode ser lembrado. Também denominado impulsão.” (APA, 2010, p.503) Comportamento súbito, brusco, inesperado e irracional, muitas vezes perigoso, vivenciado pelo sujeito como uma necessidade imperiosa. Sua carga afetiva é geralmente intensa, mas de diversas naturezas, por exemplo, sexual ou destrutiva; [...] (DORON; PAROT, 2008, p. 416). A impulsividade compõe o temperamento89 de um indivíduo. O conceito de impulso corresponde à tradução do termo psicanalítico pulsão (em alemão, trieb – impulso, ímpeto, força impelente, força que coloca em movimento) cujo melhor sentido, em psicanálise, seria o de uma pressão interna, totalmente inconsciente, “[...] algo incômodo, que incita, algo intrinsecamente incessante e impelente que não é eliminado, pode apenas ficar em estado de impedimento, bloqueado, latente. [...] [...] “Trieb é a força responsável pelas necessidades, vontades, impulsos e desejos, assumindo a forma de impulso fisiológico, pensamento etc..” (FREUD, 2004, p. 48) “Processo dinâmico que consiste numa pressão ou força (carga energética, fator de motricidade) que faz tender o organismo para um alvo. Segundo Freud, uma pulsão tem a sua fonte numa excitação corporal (estado de tensão); o seu alvo é suprimir o estado de tensão que reina na fonte pulsional; é no objeto ou graças a ele que a pulsão pode atingir o seu alvo.” (LAPLANCHE; PONTALIS, 1986, p. 506). Em psicanálise são distinguidos vários tipos de pulsão (p.ex., pulsões sexuais, pulsões agressivas etc). Vontade – A vontade constitui um processo psíquico de escolha de uma entre várias possibilidades de ação, uma atividade consciente de direcionamento da ação. Trata-se de uma elaboração cognitiva realizada a partir dos impulsos, sendo influenciada por fatores intelectivos e socioculturais. Desejo – [...] é um querer, um anseio, um apetite, de natureza consciente ou inconsciente, que visa sempre algo, que busca sempre a sua satisfação. Os desejos se diferenciam das necessidades, pois estas são fixas e inatas, independentes da cultura e da história individual, enquanto aqueles são móveis, moldados e transformados social e historicamente. ‘[...] Foi no contexto da psicologia do sonho que S. Freud elaborou sua teoria do desejo. As condições de possibilidade da formação do desejo são dispostas no decorrer da experiência de satisfação [prazer]. Esta ocorre quando a excitação proveniente de uma necessidade interior é 87
A expressão volição caracteriza o “ato pelo qual a vontade se determina.” (Aurélio). Entre os autores de psicopatologia há termos distintos sobre esse mesmo tema. Por exemplo, vontade (“sentimento que incita alguém a atingir o fim proposto por esta faculdade; aspiração; anseio; desejo” – Aurélio), conação (“tendência consciente para atuar” – Aurélio), atividade voluntária etc. 88 Este item foi construído a partir de adaptações dos seguintes autores: CHENIAUX, 2013, p. 117-29; DALGALARRONDO, 2008. p. 174-84. 89 Temperamento (do latim temperare que significa “equilíbrio”) – corresponde aos aspectos (traços) geralmente inconscientes da personalidade relacionados às reações emocionais bem como de sua rapidez e intensidade. O temperamento poderá ser alterado, até certos limites, por influências médicas (medicações, tratamentos etc) bem como no decurso da aprendizagem e das experiências de vida. A impulsividade, a sensibilidade, a intempestividade etc. são características de temperamento.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
83
amainada pela obtenção do objeto específico. S. Freud traz o exemplo de um bebê faminto que recebe seu alimento: um elemento essencial dessa experiência é o aparecimento de certa percepção (o alimento, no exemplo escolhido), cuja imagem mnésica ficará associada com o traço mnésico da excitação da necessidade. Desde o momento em que a necessidade se apresentar novamente, haverá, graças à relação estabelecida, desencadeamento de uma impulsão psíquica, que de novo investirá a imagem mnésica dessa percepção na memória e provocará de novo a percepção, ou seja, reconstituirá a situação de primeira satisfação. Essa moção [movimento] chama-se desejo; o reaparecimento da percepção é realizada pelo desejo. O desejo inconsciente e, portanto, definido como visando primitivamente a uma repetição alucinatória de uma percepção anteriormente associada à satisfação, o que explica sua propensão a manifestar-se no sonho ou na fantasia.’ (DORON; PAROT, 2006, p. 227 – as chaves são do professor) Inclinação – [...] é a tendência a desejar, buscar, gostar, etc., intimamente relacionada à personalidade do indivíduo, duradoura e estável, que inclui tanto aspectos afetivos como volitivos. Trata-se de algo constitutivo do indivíduo e é, em certa proporção, de natureza genética. Instinto – [...] é definido como um modo relativamente organizado, fixo e complexo de resposta comportamental de determinada espécie, que, por meio dela, pode sobreviver melhor em seu ambiente natural. Geralmente envolve um conjunto de respostas e comportamentos herdados que, apenas com modificações superficiais, serve sempre à adaptação do organismo (p.ex., as reações e os comportamentos associados à fome, os instintos de sobrevivência, etc.). Há uma expressão proveniente da etologia, que é a pesquisa científica em relação aos hábitos dos animais e da sua acomodação às condições do ambiente, ‘padrão fixo de ação’, que para em alguns casos, assemelhase ao de instinto. Sua definição é a de um ‘comportamento caracterizado como específico de uma espécie, altamente estereotipado, completado uma vez que iniciado, resistente à modificação e frequentemente desencadeado por um estímulo específico.’ (DAVIDOFF, 2001, p.767) Processo volitivo O processo volitivo divide-se em quatro etapas: (1) intenção ou propósito; (2) deliberação (ou análise); (3) decisão; e, (4) execução. A fase de intenção ou propósito, na qual se esboçam as tendências básicas do indivíduo, suas inclinações e interesses. Nesse momento, impulsos, desejos e temores inconscientes exercem influência decisiva sobre o ato volitivo, muitas vezes imperceptíveis para o próprio indivíduo. A fase de deliberação, que diz respeito à ponderação consciente, levando-se em conta tanto os motivos como os móveis implicados no ato volitivo. O indivíduo faz uma análise básica do que seria positivo ou negativo, favorável ou desfavorável, benéfico ou maléfico em sua decisão. É um momento de apreciação, consideração dos vários aspectos e das implicações de determinada decisão. A fase de decisão propriamente dita é o momento culminante do processo volitivo, instante que demarca o começo da ação, no qual os móveis e os motivos vencidos dão lugar aos vencedores. A fase de execução constitui a etapa final do processo volitivo, na qual os atos psicomotores simples e complexos decorrentes da decisão são postos em funcionamento, a fim de realizar e consumar aquilo que mentalmente foi decidido e aprovado pelo indivíduo. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
84
O ato de vontade pautado por essas quatro fases, em que ponderação, análise e reflexão precedem a execução motora, é denominado ação vonluntária. Alterações da vontade Hipobulia/abulia – significam, respectivamente, diminuição e abolição da atividade conativa. A hipobulia e a abulia caracterizam-se por uma sensação de indisposição, fraqueza, desânimo ou falta de energia; perda da iniciativa, da espontaneidade e do interesse pelo mundo externo; indecisão; dificuldade de transformar as decisões em ações; e inibição da psicomotricidade. Ocorrem na depressão, na esquizofrenia, no delirium sem psicose, em alguns casos de demência ou retardo mental e no uso crônico de neurolépticos90. Enfraquecimento de impulsos específicos Distúrbios como a diminuição ou perda do apetite (anorexia), da sede e da libido, além de insônia, representam um enfraquecimento dos impulsos, um debilitamento das tendências naturais à satisfação das necessidades corporais. A anorexia é observada na depressão, na anorexia nervosa, em alguns quadros de ansiedade e em diversas condições médicas gerais. A anorexia deve ser distinguida da sitiofobia91, na qual a recusa alimentar se deve a manifestações fóbicas ou delirantes, não havendo uma real redução do apetite. A insônia pode ser classificada em: inicial, quando há dificuldade para adormecer; intermediária, caracterizada por diversos despertares noturnos; e terminal, quando o paciente acorda muito cedo e não consegue voltar a dormir. A insônia aparece na depressão (podendo ser inicial ou terminal), nas síndromes de ansiedade (em geral, inicial ou intermediária), na mania, nos quadros de agitação psicomotora, nas intoxicações por psicoestimulantes (anfetamina, cocaína, cafeína, etc) e em quadros de abstinência a algumas drogas psicoativas (opiáceos, benzodiazepínicos, álcool, etc). A perda da libido é observada na depressão e no uso de substâncias antiandrogênicas92, de neurolépticos e de alguns antidepressivos (especialmente os tricíclicos e os serotoninérgicos93).
90
Neurolépticos - Os antipsicóticos ou neurolépticos são medicamentos inibidores das funções psicomotoras, a qual pode encontrar-se aumentada em estados, por exemplo, de excitação e de agitação. Paralelamente eles atenuam também os sintomas neuro-psíquicos considerados psicóticos, tais como os delírios e as alucinações. São substâncias químicas sintéticas, capazes de atuar seletivamente nas células nervosas que regulam os processos psíquicos no ser humano e a conduta em animais. (http://www.psiqweb.med.br) 91 Sitiofobia - Medo de se alimentar. 92 Antiandrogênicas são drogas que inibem o hormônio testosterona. Geralmente são utilizadas no tratamento de doenças da próstata. 93 Serotonina - A serotonina é um neurotransmissor que atua no cérebro regulando o humor, sono, apetite, ritmo cardíaco, temperatura corporal, sensibilidade a dor, movimentos e as funções intelectuais. Quando ela se encontra numa baixa concentração, pode levar ao mau humor, dificuldade para dormir e vontade de comer o tempo todo, por exemplo. Uma das formas de aumentar a concentração de serotonina na corrente sanguínea é consumindo alimentos ricos em triptofano, outra forma é praticando exercícios físicos com regularidade. (http://www.tuasaude.com)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
85
Intensificação de impulsos específicos A bulimia (ou sitiomania, ou sitiofilia) consiste num aumento patológico do apetite. Pode ocorrer em distúrbios hipotalâmicos, na síndrome de abstinência relacionada à anfetamina, em alguns casos de depressão, no transtorno disfórico pré-menstrual e em quadros de ansiedade. Está relacionada à hiperfagia94 – ingestão excessiva de alimentos – e à obesidade. A sede excessiva é denominada potomania; a ingestão exagerada de água, polidipsia. Esta é observada no diabetes melito, no diabetes insípidus95 e na síndrome de ansiedade. Hipersonia (ou letargia) significa sono em excesso. Ela é observada em alguns deprimidos; pode ser um efeito colateral de medicamentos como benzodiazepínicos, antipsicóticos e antidepressivos; e ocorre de forma paroxística na narcolepsia96. O desejo sexual patologicamente aumentado no homem é chamado de satiríase e, na mulher, ninformania. O aumento da libido é uma alteração típica da mania. Hiperbulia – [...] caracteriza-se por um sentimento subjetivo de força, de energia, de disposição; observa-se um aumento da iniciativa, da espontaneidade e do interesse em relação ao mundo externo; costuma haver desinibição e aumento da psicomotricidade. Ocorre principalmente na síndrome maníaca. Atos impulsivos – [...] caracterizam-se por serem súbitos, incoercíveis e incontroláveis. São atos desprovidos de finalidade consciente. Pulam-se as etapas de deliberação e decisão do processo volitivo, indo-se direto da intenção para a ação. Presumivelmente, os atos impulsivos ocorrem em função de um aumento da intensidade dos impulsos ou de um enfraquecimento dos mecanismos de inibição e refreamento. Os atos impulsivos tornam-se patológicos quando são empaticamente incompreensíveis para o observador. Alguns comportamentos heteroagressivos, autoagressivos e suicidas, a frangofilia, a piromania, a dromomania, a dipsomania e os ataques de hiperingestão alimentar (da bulimia nervosa) podem ter as características de um ato impulsivo. Os comportamentos heteroagressivos impulsivos ocorrem de forma não premeditada, sendo muitas vezes imotivados. Podem algumas vezes resultar em homicídio. A frangofilia representa uma forma especial de comportamento agressivo. Nesse caso, a ação é a de destruir objetos – deixa-los em frangalhos -, como roupas, móveis, colchões, etc. A piromania constitui uma propensão a atear fogo, provocar incêndio. Muitas vezes trata-se de uma reação agressiva a uma contrariedade. 94
Sobre hiperfagia, vide página 193. A diabetes insipidus (DI) é uma doença caracterizada pela sede pronunciada e pela excreção de grandes quantidades de urina muito diluída. Esta diluição não diminui quando a ingestão de líquidos é reduzida. Isto denota a incapacidade renal de concentrar a urina. A DI é ocasionada pela deficiência do hormônio antidiurético (vasopressina) ou pela insensibilidade dos rins a este hormônio. 96 Narcolepsia - Manifestação caracterizada pela necessidade mórbida de dormir, ou por ataques repentinos de sono, que ocorrem com intervalos; sono paroxístico; hipnolepsia. 95
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
86
Os impulsos heteroagressivos, a frangofilia e a piromania são observados nos transtornos de personalidade antissocial, borderline97 e explosiva, assim como na mania, na esquizofrenia, no retardo mental, na demência e no estado crepuscular epiléptico. A dromomania (poriomania, automatismo ambulatório ou fuga) consiste numa necessidade de afastar-se, de mudar de lugar, que se manifesta como uma deambulação sem finalidade ou como uma corrida súbita e imotivada. A fuga proporciona alívio para um estado de disforia relacionado a circunstância do ambiente. Ocorre nos estados crepusculares histérico e epiléptico, na esquizofrenia, na demência e no retardo mental. A dipsomania representa uma tendência periódica para a ingestão de grande quantidade de álcool, afetando pessoas que estão, em geral, abstêmias. Após o início da ingestão alcoólica, o indivíduo perde inteiramente o controle sobre esta, e a bebe até cair inconsciente. Na bulimia nervosa, ocorrem ataques de hiperingestão alimentar, que se caracterizam pelo comportamento de comer rapidamente uma grande quantidade de alimentos e, principalmente, pela sensação de perda de controle sobre a ingestão. Atos compulsivos (ou compulsões) As compulsões, [...], são atos que o indivíduo se sente compelido a realizar. Todavia, ao contrário do que ocorre nos atos impulsivos, a execução não se dá de imediato, e sim somente após alguma deliberação consciente, havendo, com frequência, luta ou resistência contra a sua execução. Também diferentemente dos atos impulsivos, os atos compulsivos nem sempre levam a uma sensação de prazer; muitas vezes produzem apenas certo alívio, em geral temporário, para uma vivência disfórica. No transtorno obsessivo-compulsivo, as compulsões podem ser secundárias a ideias obsessivas, uma forma de combater essas ideias, de reduzir a ansiedade provocada por elas; ou, então, consistem em comportamentos repetitivos que requerem um padrão rígido de realização, e que muitas vezes assumem a forma de verdadeiros rituais. Por exemplo: vem à mente do paciente a ideia de que seu pai vai morrer, e ele se vê impelido a bater com a colher na xícara de café cinco vezes para evitar que tal tragédia ocorra; lavar as mãos dezenas de vezes ao dia em função do medo de contaminação por germes; conferir se desligou o gás inúmeras vezes ao sair de casa. [...] O paciente com transtorno obsessivo-compulsivo reconhece o caráter absurdo de suas compulsões e tenta resistir a elas. Compulsões são comuns também na depressão e na síndrome de Tourette98. 97
Sobre o tipo borderline vide página 142. Síndrome de Tourette (Transtorno de Tourette ou Doença de Gilles de La Tourette) é um distúrbio neuropsiquiátrico caracterizado por tiques múltiplos, motores ou vocais, que persistem por mais de um ano e geralmente se instalam na infância. Na verdade, alguns destes movimentos, sua intensidade, podem ser controlados parcialmente, à custa de muita tensão. Assim, na presença de pessoas desconhecidas ou com quem não se tem intimidade, a pessoa com a síndrome certamente se esforçará para conter ao máximo os tiques. Classificação dos Tiques: •Simples 1.Motores: Piscar os olhos, repuxar a cabeça, encolher os ombros, fazer caretas, trincar os dentes, mover os dedos das mãos, etc. 2.Vocais: “coçar” a garganta (Pigarrear, limpar a garganta), grunhidos, uivos, zumbidos, latidos, estalidos com a língua, fungar, gritar, assobiar... •Complexos. Os tiques complexos geralmente são precedidos por algum pensamento que direta ou indiretamente os desencadeia, como obsessões, gerando ansiedade. 1.Motores: Pular, tocar pessoas ou coisas, cheirar, retorcer-se e, embora muito raramente, atos de autoagressão, tais como machucar-se ou morder a si próprio... 98
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
87
Possuem igualmente um caráter compulsivo o padrão de uso de drogas psicoativas na dependência química (toxicofilia), o comportamento alimentar na obesidade hiperfágica comum (em que não há ataques de hiperingestão), o jogo patológico, a cleptomania e certos padrões de comportamentos relativos ao comprar e ao envolvimento amoroso. O comportamento de um indivíduo em relação à comida, ao jogo e ao objeto sexual pode possuir os mesmos aspectos observados nos quadros de dependência química em relação à droga: avidez (ânsia por comida, pelo jogo ou pelo parceiro sexual), pensamentos recorrentes (quanto aos mesmos), negação da dependência, sintomas de abstinência e a ocorrência de prejuízos psicossociais significativos. Na cleptomania, o indivíduo, mais frequentemente uma mulher, vê-se impelido a furtar determinado objeto, do qual na verdade não necessita e cujo valor financeiro é irrelevante. O ato de roubar é precedido de ansiedade e acompanha-se de um alívio dessa ansiedade, além de certa excitação e prazer. A compulsão por comprar (ou oniomania, prodigalidade99) tem características semelhantes. Comportamentos desviantes em relação aos impulsos Os comportamentos de automutilação e suicida podem ser considerados desvios dos impulsos de autopreservação. Formas leves e moderadas de automutilação ocorrem mais em pacientes com retardo mental ou transtorno de personalidade borderline. Já formas mais graves são mais comuns na esquizofrenia. O suicídio é um risco importante especialmente na depressão, no alcoolismo e na esquizofrenia, embora nem sempre esteja relacionado a uma doença mental. A alotriofagia representa um desvio dos impulsos de nutrição, uma perversão do apetite, como se chamava antigamente. Consiste na ingestão de coisas estranhas ou inadequadas. Por exemplo: comer animais repugnantes (lagartixa, barata, minhoca), excrementos (coprofagia), substâncias nocivas e objetos perigosos (tinta, botões, alfinetes, sabão, etc). [...] Ocorre mais frequentemente no retardo mental e na demência, e, ainda, na esquizofrenia residual e na mania. Comum também é a tricotilomania, impulso a arrancar os cabelos podendo ser seguido da tricofagia, comê-los. A malácia caracteriza uma tendência do indivíduo a comer coisas extravagantes, como comer terra, cinza, madeira, papel, sabão, parafina, animais pequenos repugnantes como lagartixas, baratas, minhocas, vermes e outros pequenos animais vivos, substâncias orgânicas em decomposição, excrementos (croprofagias) etc. Essa alteração é comum nos casos de deficiência mental grave e nos dementes senis. As parafilias100 (ou Transtornos da Preferência Sexual) constituem um desvio do comportamento sexual. Consistem na preferência por objetos ou situações sexuais não usuais, que 2.Vocais: Frases fora de contexto, frases ou sons ouvidos recentemente que têm que ser repetidos (ecolalia), e mais raramente obscenidades. Apesar de não haver cura, há tratamento e a indicação para fazê-lo depende muito do quão incomodado o "Touréttico" se sente. Sim, porque muitas vezes os tiques incomodam mais quem os observa, do que quem os têm. 99 A prodigalidade também pode ser entendida não só pelo impulso descontrolado (patológico, portanto) à compra, como também o impulso descontrolado ao desperdício, às doações e à dilapidação do patrimônio pessoal ou familiar (comum por exemplo, em alguns casos da demência, da compulsão ao jogo, da dependência química etc.). É comum, nessas circunstâncias, que tais pessoas, por iniciativa de suas próprias famílias, sejam interditadas civilmente na Justiça. 100 Alguns autores preferem a denominação ‘atos impulsivos e compulsivos de natureza sexual; outros as chamam de perversões sexuais. “Uma perversão representa um desvio em relação ao ato sexual ‘normal’, definido este como coito que visa a obtenção do orgasmo pela penetração genital, com uma pessoa do sexo oposto. Diz-se que existe perversão
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
88
se tornam uma condição necessária para a excitação sexual e o orgasmo. Na quase totalidade das vezes, as parafilias acometem pessoas do sexo masculino. No fetichismo, o interesse sexual se concentra sobre partes não genitais do corpo feminino (pés, cabelos, nuca, etc) ou peças do vestuário (sapatos, roupas íntimas, meias, etc.). No fetichismo transvéstico o indivíduo veste-se com roupas do sexo oposto a fim de excitar-se sexualmente. No exibicionismo, o comportamento consiste na exposição dos órgãos genitais, geralmente contra a vontade da pessoa que observa. Na escopofilia (ou voyeurismo), o prazer provém basicamente da observação de uma pessoa que está tento uma relação sexual ou que está nua ou tirando a roupa. No sadomasoquismo, o prazer está vinculado à dor, humilhação, ou dominação e submissão. Na coprofilia, a excitação depende do uso de excrementos no ato sexual. Na pedofilia o desejo sexual é por crianças ou púberes do sexo oposto. Na pederastia o desejo sexual é por crianças ou púberes do mesmo sexo. Na gerontofilia o desejo sexual é por idosos. Na zoofilia é por animais e na necrofilia os objetos sexuais são cadáveres. Na compulsão à masturbação há uma intensa necessidade de realizar atividades masturbatórias repetitivas, até mesmo praticada com desprazer. Na compulsão a utilizar clisteres101 o paciente introduz objetos, como lâmpadas, podes vidro, garrafas, etc., no ânus ou na vagina. No frotteurismo o indivíduo toca ou esfrega-se em uma pessoa sem o seu consentimento. Ambitendência A ambitendência também é denominada ambivalência volitiva. Consiste numa incapacidade para decidir, em função da presença na consciência de tendências volitivas opostas. Por exemplo, querer ficar perto de alguém e, ao mesmo tempo, não querer, e temer tal aproximação. A ambitendência pode ocorrer na esquizofrenia. Um fenômeno dessa natureza ocorre nos pacientes obsessivos. Nestes há um excesso de deliberação, ou seja, todas as alternativas possíveis de conduta são minuciosa e repetidamente examinadas, o que impede que se chegue à etapa de decisão do processo volitivo. Negativismo O negativismo, [...], consiste numa resistência não deliberada, imotivada e incompreensível às solicitações externas. No negativismo ivo, o paciente simplesmente não faz o que lhe é pedido; no ativo, ele faz o oposto ao solicitado. Podem ser manifestações de negativismo ivo o mutismo (a recusa a falar) e a sitiofobia (recusa de alimentos). [...] O negativismo é observado em quadros catatônicos, como na esquizofrenia e na depressão. É uma ‘tendência permanente e instintiva a reagir contra toda solicitação do mundo exterior, quaisquer que seja a sua natureza.’ (Kahlbaum). Essa tendência a resistir às influências externas, chamada pelos antigos autores loucura de oposição, manifesta-se não só em relação às ordens transmitidas ao paciente como ainda aos movimentos que se procura imprimir aos seus membros. Se o médico manda o enfermo levantar-se, deitar-se, vestir-se ou andar, ele não obedece ou faz exatamente o contrário daquilo que se lhe ordena. O negativismo também é classificado como uma alteração do comportamento motor ou da psicomotricidade (vide página 96). quando o orgasmo é obtido através de objeto sexuais ou por outras zonas corporais, e quando o orgasmo é subordinado de forma imperiosa a certas condições extrínsecas. De forma geral, tem-se por perversão o conjunto de comportamento psicossexual que acompanha tais atipias na obtenção do prazer sexual.” (adaptado de CASTRO, 2006, 76) 101 Clister - Injeção, no reto, de água, de líquido medicamentoso ou de substância para contraste radiológico.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
89
Reação do último momento [...] consiste no desaparecimento súbito de uma conduta negativista justamente no momento em que o examinador desiste do seu empenho de fazer com que o paciente atenda à sua solicitação. Por exemplo, o indivíduo se recusa a responder a qualquer pergunta por mais de uma hora, e permanece o tempo todo em silêncio, sem sequer olhar para o examinador. Mas, quando este vai se retirar, o doente começa a cooperar. Todavia, a falta de cooperação em geral se reinicia logo em seguida. Sugestionabilidade volitiva ou patológica [...] é um sintoma oposto ao negativismo. Consiste numa tendência exagerada a atender às solicitações vindas do exterior. Ocorre nos transtornos dissociativos e conversivos (autossugestão); e nos estados hipnóticos e no transtorno psicótico compartilhado (heterossugestão). Num transtorno dissociativo, por exemplo, o paciente se convence de que perdeu a memória. Num transtorno conversivo, ele pode ar a acreditar, por si próprio, que está paralítico ou cego. Já no transtorno psicótico compartilhado, um indivíduo primariamente delirante, que sofre, por exemplo, de esquizofrenia, ‘contagia’ um segundo indivíduo, mais crédulo e ingênuo, com sua ideação patológica. Os fenômenos em eco – ecopraxia, ecomimia e ecolalia102 – representam casos mais graves de sugestionabilidade e ocorrem na síndrome catatônica. Obediência automática A obediência automática representa um exemplo de sugestionabilidade patológica. Caracteriza-se pelo cumprimento ivo e imediato, sem qualquer reflexão ou elaboração, de quaisquer ordens ou solicitações, mesmo que a ação realizada seja perigosa ou danosa para o próprio paciente. Se se disser para o indivíduo pular do vigésimo andar, ele o fará ‘sem pestanejar’. O obediência automática ocorre na síndrome catatônica. Poriomania – É o impulso e o comportamento de andar a esmo, viajar, ‘desaparecer de casa’, ‘ganhar o mundo’, como se diz na linguagem popular. Ocorre em pacientes esquizofrênicos (às vezes, por imaginar que está sendo perseguido e precisar ‘sumir do mapa’), em pessoas com quadro psico-orgânicos e nos deficientes mentais, etc. Jogo patológico É a compulsão por jogos de azar, fazer apostas, especular com dinheiro, apesar de prejuízos financeiros e sociais percebidos pelo sujeito. Compulsão por internet e vídeos-games Recentemente um número crescente de pessoas ou a apresentar dependência grave pela internet (jogos, salas de bate-papo, sites eróticos e de compra, [sms] etc.). Parecem ser jovens com baixa autoestima, tímidos e com baixa proatividade. O exame da conação
102
Ecopraxia – consiste na repetição automática e despropositada das ações motoras executadas por outra pessoa, que está diante do paciente. São imitados gestos, posturas, a fala (ecolalia) ou as expressões fisionômicas (ecomimia).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
90
A exploração da conação dá-se, basicamente, pela observação do comportamento do paciente: observa-se se ele demonstra iniciativa, espontaneidade e interesse, e ainda a capacidade de tomar decisões. Em geral, o grau de cooperação do paciente numa simples entrevista já fornece elementos para a identificação de alterações, como negativismo e sugestionabilidade patológica. Para a detecção de obediência automática, são dada, sem prévias explicações, ordens simples que pareceriam às pessoas em geral estranhas ou inadequadas para a situação de um exame médico: ‘Levante os braço...Abaixe os braços...Sente-se... fique de pé... Dê três pulinhos...Dê três voltas em torno da cadeira...’ As variações quantitativas da linguagem e da psicomotricidade costumam estar correlacionadas diretamente com a conação. A hiperbulia quase sempre se acompanha de logorreia e de agitação psicomotora; e a hipobulia, de oligolalia103 ou mutismo e de inibição psicomotora.
103
Oligolalia ou laconismo – refere-se a uma expressão verbal diminuída, mas não abolida. Consiste no oposto da logorreia. É observada nas mesmas situações em que o mutismo pode ocorrer.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
91
ALTERAÇÕES DO COMPORTAMENTO MOTOR (ou, PSICOMOTRICIDADE)104 A motilidade Nem todos os movimentos corporais se encontram no âmbito da psicologia e da psicopatologia, mas somente as ações psicomotoras. Aqueles movimentos corporais involuntários e independentes do psiquismo interessam apenas à neurologia. As ações psicomotoras possuem um conteúdo psicológico, são uma expressão do psiquismo. São voluntárias, isto é, conscientes quanto à motivação e finalidade. Representam a quarta etapa do processo volitivo: a execução. A motilidade consiste na via final de todo evento psíquico e é a única forma de o que temos ao psiquismo de uma outra pessoa. Na psicomotricidade está incluída a fala, mas esta faz jus a um capítulo à parte. Os movimentos expressivos da mímica – embora estejam diretamente relacionados ao psiquismo, particularmente à afetividade – não são estudados aqui, por não serem, segundo Jaspers, voluntários nem intencionais. Apraxia – [...] consiste na dificuldade ou impossibilidade de realizar atos motores intencionais, voluntários, na ausência de paresia105 ou paralisia, de déficit sensorial e de incoordenação motora. A apraxia representa a perda do movimento aprendido. As apraxias estão relacionadas a lesões corticais, geralmente no hemisfério dominante, envolvendo doenças vasculares cerebrais, processos demenciais e neoplasia106. [As formas da apraxia são: a ideomotora, a ideativa, a construcional, a de vestimenta e a da marcha.] A apraxia ideomotora é a perda da capacidade de realizar movimentos simples em resposta à solicitação do examinador: por exemplo, bater num prego com um martelo; fazer um aceno significando adeus; escovar os dentes; etc. O paciente pode conseguir executar o mesmo ato de forma espontânea. A apraxia ideativa, por sua vez, é a perda da capacidade de realizar movimentos sequenciais: por exemplo, dobrar uma carta, coloca-la em um envelope, lacrar o envelope e, em seguida, colocar um selo. Os pacientes conseguem executar individualmente os movimentos que integram a sequência. A apraxia construcional é a incapacidade de construir figuras geométricas, montar quebra-cabeças ou desenhar um cubo ou outras formas geométricas. A apraxia de vestimenta é a perda da capacidade para vestir-se, mantendo-se as capacidades motoras simples e a cognição global. Tanto a apraxia construcional como a de vestimenta resultam geralmente de lesões do hemisfério direito. A apraxia da marcha é a incapacidade de iniciar o movimento espontaneamente e organizar a atividade gestual da marcha, ocorrendo com frequência a marcha em pequenos os (petit pas). A apraxia da marcha resulta de lesões dos lobos frontais e subcorticais e de alterações associadas à hidrocefalia de pressão normal. Para avaliar a presença de apraxia ideomotora, podem ser dadas ao paciente ordens como as seguintes: ‘Mostre-me como você faz um aceno de adeus’; ‘Mostre-me como você cortaria com uma tesoura; ‘Mostre-me como você escovaria seus dentes com uma escova’. Deve-se frisar para o
104
Este tópico foi elaborado a partir de recortes e adaptações dos seguintes autores: CHENIAUX, 2013, p.131-38; DALGALARRONDO, 2008, p. 184-92; PAIM, 1993, p. 237-48. 105 Paresia - Diminuição da força em um ou mais grupos musculares. É um grau menor de paralisia. 106 Neoplasia - Termo que denomina um conjunto de doenças caracterizadas pelo crescimento anormal e em certas situações pela invasão de órgãos à distância (ver metástases). As neoplasias mais frequentes são as de mama, cólon, pele e pulmões.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
92
paciente, por exemplo, que ele não deve fazer o movimento como se seus dedos fossem a escova de dentes, e sim como se ele estivesse segurando uma escova. Para avaliar a presença de apraxia ideativa, podem ser dadas as seguintes ordens, que se referem a tarefas sequenciais: ‘Eu vou lhe dar um pedaço de papel. Quando eu fizer isso, pegue o papel com a sua mão direita, dobre-o ao meio, com ambas as mãos, e coloque-o no chão’. Hipocinesia (ou lentificação psicomotora) A hipocinesia (ou inibição psicomotora) caracteriza-se pela diminuição acentuada e generalizada dos movimentos voluntários. Os movimentos tornam-se lentos e são realizados com grande dificuldade. Em geral, há inibição do pensamento e da fala, empobrecimento da mímica (hipomimia), e diminuição da vontade (hipobulia). [Tal quadro reflete a lentificação de toda a atividade psíquica (bradipsiquismo).] Acinesia (ou estupor) Na acinesia há abolição dos movimentos voluntários. O paciente pode ficar por longo período ao leito, sem qualquer reação ao ambiente, apresentando mutismo, abolição da expressão facial (amimia), recusa de alimentos (sitiofobia) e incontinência urinária e fecal (gatismo), além de abulia (normalmente o nível de consciência está aparentemente preservado e de capacidade sensório-motora para reagir ao ambiente). Tanto o estupor quanto a hipocinesia podem ocorrer na esquizofrenia catatônica, na depressão grave, nos quadros de delirium não psicóticos, em estados dissociativos histéricos, no parkinsonismo, na encefalite letárgica e, mais raramente, em estados demenciais avançados, no retardo mental e em ataques de pânico (reações de congelamento). Quando o estupor se acompanha de rigidez muscular, com redução da mobilidade iva e manutenção da postura corporal, trata-se de catalepsia, que também é uma forma de estereotipia. Nesse caso, o paciente pode assumir espontaneamente posições bastante incômodas por um tempo prolongado: por exemplo, manter os braços elevados; ficar deitado com as pernas para o ar; ou ainda permanecer com a cabeça inclinada para a frente, como se estivesse apoiada em um travesseiro imaginário (travesseiro psíquico). Na flexibilidade cerácea, o indivíduo, ou uma parte de seu corpo (braço, perna, cabeça), é colocado pelo examinador em determinada posição (mesmo posições muito desconfortáveis), e assim permanece, como se fosse um homem de cera, moldável por uma outra pessoa. A catalepsia e a flexibilidade cerácea são sintomas frequentes na esquizofrenia catatônica. As paralisias da conversão histérica constituem um estado de acinesia localizada, restrita a um ou mais membros. Uma variação interessante desse tipo é a cataplexia que é a perda abrupta do tônus muscular, geralmente acompanhada de queda ao chão. Está presente na narcolepsia (crises recorrentes de sono tipo REM107 no indivíduo desperto).
107
Sono REM (Rapid Eye Moviment). É a fase do sono em que sonhamos.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
93
Hipercinesia (ou exaltação psicomotora, ou agitação psicomotora) A hipercinesia caracteriza-se por um aumento patológico da atividade motora voluntária. Essa exaltação da psicomotricidade pode se dar em três níveis de gravidade: inquietação, agitação e furor (do menos para o mais intenso). Comumente a hipercinesia acompanha-se de logorreia (fala excessiva) e de heteroagressividade. Trata-se de uma alteração psicopatológica bastante comum e inespecífica, podendo ser observada na esquizofrenia catatônica, na mania, na depressão ansiosa, em quadros de delirium com sintomas psicóticos, em estados crepusculares histéricos e epilépticos, em síndromes de ansiedade, em síndromes delirantes, em alguns pacientes com retardo mental ou demência e no transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), quadros psico-orgânicos agudos (por intoxicação com substâncias, síndromes de abstinência, traumas cranioencefálicos, encefalites metabólicas, etc). Estereotipias motoras São repetições automáticas e uniformes de determinado ato motor complexo, indicando geralmente marcante perda do controle voluntário sobre a esfera motora. O paciente repete o mesmo gesto com as mãos (gestos esses desprovidos de finalidade e sentido, inclusive para o próprio doente) dezenas ou centenas de vezes em um mesmo dia. As estereotipias podem ser movimentos (desde simples movimentos de dedos até marchas), de posição (estereotipia acinética ou catalepsia – a manutenção de uma postura corporal, geralmente extravagante, durante longo tempo), de lugar (a busca reiterada, sem razão plausível, de um mesmo local) ou de palavras e frases (chamada de verbigeração). Observam-se as estereotipias motoras na esquizofrenia, sobretudo nas formas crônicas e catatônicas, assim como na deficiência mental. Ecopraxia Consiste na repetição automática e despropositada das ações motoras executadas por outra pessoa, que está diante do paciente. São imitados gestos, a postura, a fala (ecolalia) ou a expressão fisionômica (ecomimia). A ecopraxia está relacionada à sugestionabilidade patológica. Pode ser observada principalmente na síndrome catatônica e, ainda, no retardo mental, no delirium e em processos demenciais. Maneirismo São movimentos expressivos – isto é, movimentos que servem a um propósito de comunicação, tais como gestos, mímicas, vocalizações – que se tornam exagerados quanto à sua amplitude, tornam-se afetados, rebuscados, estilizados ou desarmônicos, perdem sua graça natural e parecerem extravagantes ao observador. Observavam-se maneirismos na esquizofrenia catatônica ou hebefrênica, no retardo mental, na histeria, em doenças cerebrais orgânicas e no homossexualismo. O comportamento de um paciente que, toda vez em que vê seu médico, ajoelha-se e beija as mãos deste pode ser considerado amaneirado. Um outro exemplo de maneirismo é o de um aperto de mão que dura mais de um minuto, com movimentos excessivamente vigoroso. O paciente pega a colher de modo muito próprio e realiza gestos bizarros para levar a comida à boca. Ao falar com o enfermeiro, gesticula, faz caretas, encolhe os ombros de modo peculiar, faz rodopios com as mãos e movimenta a cabeça de forma afetada. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
94
Tiques Os tiques são movimentos de defesa ou movimentos de expressão que acabaram por degenerar em atos automáticos. São semiconscientes e só em determinado grau dependem da vontade. São atos coordenados, repetitivos, resultantes de contrações súbitas, breves e intermitentes, envolvendo geralmente um grupo de músculos que atua em suas relações sinérgicas normais. Acentuam-se muito com a ansiedade. Os tiques geralmente são reflexos condicionados, os quais surgiram associados a determinados estímulos emocionais ou físicos, mantendo-se de forma estereotipada, como um movimento involuntário. Podem ocorrer no indivíduo sem qualquer outra alteração mental e entre crianças ansiosas, submetidas a estresse. Tiques múltiplos, motores e/ou vocais, podem indicar a presença do Transtorno de Tourette. Os tiques ocorrem com mais frequência em crianças que adultos. Interceptação cinética Consiste numa interrupção brusca e incompreensível de uma ação motora já iniciada, que para no meio. O paciente muitas vezes atribui a impossibilidade de completar o movimento a uma influência externa. A interceptação cinética é algo equivalente ao roubo do pensamento (alteração da consciência do eu), podendo também ocorrer na esquizofrenia catatônica. Perseveração motora Representa uma repetição sem sentido de uma ação motora de início executada adequadamente. Por exemplo: solicita-se ao paciente que coloque a língua para fora, o que ele faz, e, em seguida, que ele a coloque para dentro, o que ele também faz; todavia, o paciente agora ar a realizar repetidamente os mesmos movimentos com a língua sem que haja uma nova solicitação por parte do examinador. Conversão Na conversão há o surgimento abrupto de sintomas físicos (paralisias, anestesias, parestesias108, cegueira, etc), de origem psicogênica. A conversão motora (paralisias, contraturas conversivas, ataxias109 psicogênicas, etc.) ocorre geralmente em situação estressante, de ameaça ou conflito intrapsíquico ou interpessoal significativos para o indivíduo. Por exemplo, após discussão violenta com o marido, a esposa a a apresentar-se paraplégica, não conseguindo mais andar, ou o marido, após ser descoberta a sua infidelidade conjugal, a abruptamente a apresentar hemiplegia110 psicogênica. Alterações da marcha A marcha do paciente histérico é descrita como irregular, mutável, bizarra, podendo ter elementos de ataxia, espasticidade111 e outras alterações, mas raramente revela um padrão preciso e estável de 108
Parestesia - Sensação de formigamento ou de ardência na pele, não-causadas por estímulo exterior ao corpo. Ataxia - Perda da faculdade de coordenar os movimentos voluntários. 110 Hemiplegia - Paralisia da metade do corpo. Compromete a metade da face, braço e pernas do mesmo lado. Relaciona-se a infartos, hemorragias ou tumores do sistema nervoso central. 111 Espasticidade - é a rigidez muscular que dificulta ou impossibilita o movimento, em especial dos braços e das pernas. 109
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
95
determinada marcha neurológica. Há muitos movimentos supérfluos e balancear exagerado de um lado para outro, arremessos das pernas e tremores das extremidades. Tem-se a impressão de que o paciente está prestes a cair, mas raramente ele cai, a não ser na presença de outros. Quando cai, em geral não se machuca gravemente. O exame neurológico para tônus, força muscular, coordenação motora e reflexos (estes principalmente) pode estar normal. Alguns pacientes histéricos apresentam a camptocormia, que é o caminhar com o tronco fletido para a frente. Na hemiplegia histérica, o paciente em geral arrasta o pé ‘paralisado’ sobre o solo, diferentemente da marcha ceifante do hemiplégico orgânico (que tem de fato uma paralisia espástica). Os termos astasia e abasia foram muito utilizados no ado, no contexto da histeria. A abasia é a impossibilidade ou dificuldade para a marcha; e a astasia, a impossibilidade de ficar de pé quando não há razão orgânica para isso (utiliza-se atualmente também o termo disbasia histérica). Apresenta, então, astasia-abasia aquele paciente, em geral com histeria, que revela total ou parcial incapacidade de levantar-se e andar, apesar de não apresentar qualquer paralisia ou ataxia de origem orgânica. A marcha de alguns pacientes esquizofrênicos é marcadamente bizarra, com maneirismos e estereotipias motoras variadas. Quando estão usando neurolépticos tradicionais, alguns pacientes psicóticos apresentam distonias de tronco ou membros, revelando marcha bizarra pelo componente distônico de sua postura. Alguns pacientes gravemente deprimidos apresentam marcha lentificada e difícil. O padrão de marcha do paciente psiquiátrico deve ser comparado, a título de diagnóstico diferencial, com os principais padrões de marchas alteradas das doenças neurológicas. Hiperventilação psicogênica Nesse tipo a respiração se acelera, fica quase imperceptível e é marcada por suspiros não obstrutivos. Ocorre associada à ansiedade ou à situação estressante. Observa-se esse problema em portadores de transtornos de pânico, em pacientes histéricos e, de modo geral, em indivíduos muito ansiosos. [...] Apragmatismo (ou hipopragmatismo) Caracteriza a dificuldade ou incapacidade de realizar condutas volitivas e psicomotoras minimamente complexas, como cuidar da higiene pessoal, limpar o quarto, participar de trabalhos domésticos, envolver-se em qualquer tipo de atividade produtiva para si ou para seu meio. O apragmatismo resulta de alteração básica das esferas volitivas e afetivas (está geralmente associada à hipobulia, apatia e desorganização psíquica geral), não havendo incapacidade neuropsicológica de realizar os atos motores complexos. Não deve, portanto, ser confundido com a apraxia (perda da atividade gestual complexa por lesão neuronal). O hipopragmatismo é uma alteração frequente em pacientes psicóticos crônicos, representando um desafio à reabilitação. No caso de alguns pacientes esquizofrênicos crônicos e graves, já ao cumprimenta-los, nota-se que seu aperto de mão é ‘sintomático’, pois não apertam propriamente a mão do outro, tocam-na apenas com a ponta dos dedos (mão ateleiótica, de atelès, no grego; sem fim, inacabado, imperfeito). Negativismo (vide página 88) “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
96
ALTERAÇÕES DA LINGUAGEM112 A linguagem, particularmente na sua forma verbal, é uma atividade especificamente humana, talvez a mais característica de nossas atividades mentais. É o principal instrumento de comunicação dos seres humanos. Além disso, é fundamental na elaboração e na expressão do pensamento. Alterações da linguagem, embora de definição e delimitação difíceis, sempre foram de grande interesse para a psicopatologia. [...] Especificamente em relação à língua, é preciso diferenciar ainda três elementos essenciais de qualquer língua ou idioma: o fonético, que se refere aos sons, aos elementos materiais da fala; o semântico, relacionado à significação dos vocábulos utilizados em determinada língua, e o sintático, que diz respeito à relação e à articulação lógica das diversas palavras. Além disso, é possível descrever as seguintes funções da linguagem: 1. A função comunicativa, que garante a socialização do indivíduo. 2. A linguagem como e do pensamento, particularmente de sua forma evoluída, como pensamento lógico e abstrato. 3. A linguagem como instrumento de expressão dos estados emocionais, das vivências internas, subjetivas. 4. A linguagem como afirmação do eu e de instituição das oposições eu/mundo, eu/tu, eu/outros. 5. A linguagem na sua dimensão artística e/ou lúdica, como elaboração e expressão do belo, do dramático, do sublime ou do terrível, isto é, a linguagem como poesia, como literatura. [...] A linguagem é ainda um sistema de signos arbitrários, o signo linguístico, as palavras. Esses signos ganham seus significados específicos por meio de um sistema de convenções historicamente dado. A linguagem é, portanto, uma criação social de cada um e de todos os grupos humanos. Linguagem e pensamento estão intimamente relacionados, não podendo ser facilmente separados, mas são dois fenômenos distintos. Podem ocorrer perturbações de pensamento não associadas a perturbações da fala, e vice-versa. Podem existir pensamentos sem linguagem, como nos devaneios; assim como palavras não associadas a pensamentos, como frases sem sentido usadas puramente para a interação social – por exemplo, ‘olá!’, ‘tudo bem?’ O estudo da linguagem tem como objeto as palavras, enquanto o estudo do pensamento se refere às ideias. A linguagem molda o pensamento e é fundamental para a sua elaboração e expressão. Só com a aquisição da linguagem, e a consequente utilização de conceitos, é que se desenvolve na criança o pensamento abstrato. Além do componente cognitivo, a linguagem possui ainda um componente afetivo, que a prosódia. Esta é constituída pela musicalidade, entonação e inflexões da fala, além da gesticulação. Não faz parte da psicopatologia o estudo dos distúrbios s ao aparelho fonador, isto é, as perturbações no processo mecânico da fala. Estas não interferem na compreensão da linguagem e, principalmente, podem ocorrer na ausência de um transtorno mental. Assim, não estudaremos as 112
Este tópico foi elaborado a partir de recortes e adaptações dos seguintes autores: CHENIAUX, 2013, p.72-81; DALGALARRONDO, 2008, p. 232-44; PAIM, 1993, p. 259-74.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
97
disartrias (dificuldade mais ou menos geral na articulação da palavras, prejudicando especialmente a pronúncia de consoantes), as dislalias (deformação, omissão ou substituição restrita a determinadas consoantes), as disfemias (como a tartamudez ou gagueira) e as disfonias (perturbação da voz, atingindo principalmente as vogais). Por outro lado, a distinção entre distúrbios orgânicos e distúrbios psíquicos (ou funcionais) da fala, encontrada em diversos textos de psicopatologia, é bastante criticável, por basear-se na presunção da existência de uma separação mente-corpo. O exame da linguagem A expressão oral e a compreensão auditivo-verbal são avaliadas de forma informal durante toda a entrevista. Todavia, alguns testes podem ser necessários, [...]. - A compreensão pode ser avaliada através de ordens transmitidas oralmente ao paciente, como ‘Toque sua orelha direita com sua mão esquerda.’; perguntas simples, como ‘Os bairros são maiores do que as cidades?’; ou ordens por escrito, como ‘Feche os olhos’. - Capacidade de nomeação: mostra-se ao paciente uma caneta e um relógio, por exemplo, e pedese que diga como se chamam esses objetos. Ou então pede-se que ele, em um minuto, cite todos os nomes de animais que puder. - Capacidade de repetição: pede-se ao paciente que repita frases como ‘Nem aqui, nem ali, nem lá.’, ou “Sem quês, nem mas, nem porquês.’ - Expressão: solicita-se ao paciente que escreva uma frase (com sujeito, verbo e objeto). Afasias e disfasias Os termos afasia e disfasias são, com frequência, usados de forma intercambiáveis, todavia, mais precisamente, o primeiro se refere a uma perda, e o segundo, a um prejuízo ou dificuldade quanto à linguagem. As afasias são distúrbios adquiridos da capacidade linguística – na compreensão ou expressão -, sem que haja um déficit auditivo ou incapacidade motora do órgão fonador. Estão relacionadas a lesões corticais – causadas principalmente por distúrbios vasculares, tumores e processos degenerativos, como a doença de Alzheimer. As afasias podem ser classificadas como: motora (expressiva, ou de Broca), sensorial (receptiva, ou de Wernicke), de condução, global, transcortical e anômica (semântica, amnéstica). Afasia motora Constitui uma apraxia verbal. Os pacientes conseguem utilizar os músculos fonadores para outros fins que não a fala. Trata-se de uma forma de afasia não fluente. O discurso, emitido com grande dificuldade, caracteriza-se por frases curtas ou simplesmente fragmentos de palavras, e pela perda da estrutura gramatical (agramatismo: ausência de artigos, preposições, conjunções, advérbios de lugar e “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
98
verbos auxiliares). Além disso, os pacientes cometem erros parafásicos 113 literais, e há perda da prosódia. A compreensão da linguagem, assim com a capacidade de nomeação, está preservada, mas a capacidade de repetição (do que o examinador fala) está comprometida. A afasia motora está relacionada a lesões na região posteroinferior do lobo frontal esquerdo (área de Broca). Afasia sensorial Corresponde a uma agnosia verbal. Há perda da capacidade de compreender a linguagem, e a audição, por definição, não está prejudicada. É uma afasia fluente, mas o paciente tem dificuldades em compreender a própria fala. As palavras são pronunciadas de forma defeituosa – há parafasias literais e semânticas – e a sintaxe pode estar bastante alterada (paragramatismo). As capacidades de repetição e de nomeação também estão comprometidas. Na afasia sensorial, há lesão na região posterosuperior do lobo temporal esquerdo (área de Wernicke). Afasia da condução Nessa forma de afasia há fluência, a compreensão é normal, mas a capacidade de repetição e a de nomeação estão comprometidas. Esse tipo de afasia está relacionado a lesões no fascículo arqueado, que conecta a área de Wernick com a de Broca. Afasia global Esta afasia está relacionada a lesões das áreas de Broca e de Wernick – a expressão, a compreensão e a repetição estão comprometidas. Afasia transcortical A principal característica dessa afasia é a preservação da capacidade de repetição. Trata-se de uma afasia não fluente, podendo estar a capacidade de compreensão comprometida ou não. Afasia anômica Nesse tipo de afasia há dificuldade de nomear objetos. A expressão, a compreensão e a repetição são normais. Agrafia Caracteriza-se pela incapacidade isolada para escrever. Pode também estar associada às afasias. Alexia Nesse tipo, perde-se a capacidade para a leitura. Pode ocorrer isoladamente ou associada às afasias e às agrafias. Aprosódia (hipoprosódia) Na aprosódia ou na hipoprosódia há, respectivamente, perda ou diminuição da modulação afetiva da fala, que se torna monocórdica, monótona. Pode haver também perda (ou diminuição) da
113
Vide parafasias – pág. 101 desta apostila.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
99
capacidade de compreender a prosódia da fala das outras pessoas. Esse distúrbio relaciona-se a lesões no hemisfério direito. Hiperprosódia Caracteriza-se por uma acentuação da inflexão verbal; uma fala enfática, loquaz. Ocorre na mania. Mutismo Significa ausência da fala. Pode expressar negativismo (silencia deliberado) ou inibição psíquica (no estupor esquizofrênico, depressivo, histérico ou do delirium). Logorreia (ou verborreia, ou verborragia) Refere-se a uma expressão verbal aumentada. O paciente fala o tempo todo e é difícil interrompê-lo. Ela é observada tipicamente nos estados maníacos. Oligolalia (ou laconismo) Refere-se a uma expressão verbal diminuída, mas não abolida. Consiste no oposto da logorreia. É observada nas mesmas situações em que o mutismo pode ocorrer. Hiperfonia Representa uma elevação do volume da voz, isto é, falar excessivamente alto. Hipofonia Representa uma redução do volume da voz, isto é, falar excessivamente baixo, o que às vezes torna impossível entender o que se está dizendo. Taquilalia (ou taquifasia) e bradilalia (ou bradifasia) Referem-se respectivamente, a um aumento e a uma diminuição da velocidade da expressão verbal. Correspondem às alterações do curso do pensamento. Latência da resposta Refere-se ao tempo que o paciente demora para responder às perguntas do examinador, podendo estar aumentada ou diminuída. O aumento pode expressar uma inibição psíquica (como na depressão), negativismo ou suspicácia (suspeita). A diminuição pode estar relacionada a uma síndrome maníaca ou a ansiedade. Ecolalia Consiste na repetição, como um eco, da últimas ou últimas palavras faladas pelo entrevistador (ou outra pessoa do ambiente), dirigidas ou não ao paciente. Corresponde, na linguagem, ao que são a ecomimia e a ecopraxia na psicomotricidade. Ocorre na síndrome catatônica, no autismo114 e na demência. Por exemplo, o examinador pergunta ‘qual é o seu nome?’, e o paciente responde ‘qual é o seu nome?’
114
Vide página 202.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
100
Palilalia Consiste na repetição involuntária da última ou últimas palavras que o próprio paciente falou. Ocorre na demência. Por exemplo, o examinador pergunta ‘qual o seu nome?’, e o paciente responde ‘eu me chamo João...João’. Logoclonia Este tipo é semelhante à palilalia, só que a repetição é apenas das últimas silabas. É encontrada tipicamente na demência. Por exemplo, o examinador pergunta ‘qual é o seu nome?’, e o paciente responde ‘eu me chamo João...ão’. Estereotipia verbal (ou Verbigeração) Consiste numa repetição monótona, inadequada e sem sentido comunicativo de palavras ou frases. Ocorre na síndrome catatônica e na demência. Um paciente ficava o dia inteiro gritando ‘É uma coisa! É uma coisa!’. Não pronunciava praticamente nenhuma outra palavra. Mussitação Nesse tipo o paciente fala com uma voz sussurrada, em volume muito baixo e tom monótono, quase sem mover os lábios; fala para si próprio, e de forma incompreensível. Esse distúrbio ocorre na esquizofrenia. Neologismos Consiste em palavras novas, criadas pelos pacientes, ou palavras já existentes às quais é atribuído um novo significado. Podem ser resultado de uma fusão de conceitos, ou consistir numa tentativa de expressar vivências extraordinárias que o vocabulário comum não conseguiria expressar. São encontrados principalmente na esquizofrenia. [...] Paim (1998) refere-se a um paciente cujo discurso era repleto de neologismos: ‘Não é solteiro nem casado, é ‘sindorá’; seu pai não está vivo, é ‘simprizatos’; e sua mãe chama-se Maria do ‘Silenciale’. [...] Jargonofasia (ou salada de palavras, ou esquizofasia, ou confusão de linguagem) Representa uma completa desorganização da linguagem, cuja sintaxe se torna inteiramente incoerente. Palavras reconhecíveis, em geral articuladas corretamente, são emitidas numa ordem caótica e ilógica, podendo ainda ser misturadas com neologismos, o que torna o discurso sem qualquer sentido, ininteligível. Ocorre na esquizofrenia e na afasia sensorial. O discurso de um paciente, recolhido por Pio Abreu (1997), exemplifica a jargonofasia: ‘Alviela de seporte antantá da cédula de emigração delitianos de poupador de alter cor de várias entidades oficiais tite as insígnias desmercocoloie de bat anglo bater dulpagi de armas glomirais de briquet dos regimentos de Lisboa.’ Parafasias Referem-se à deformação ou troca de palavras, podendo ser literais ou verbais. A parafasia literal (ou fonêmica) caracteriza-se pela substituição de uma palavra por outra de som semelhante, como faca por vaca, cadeira por cameila. Ocorre nas afasias motora e sensorial. A parafasia verbal (ou “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
101
semântica), por sua vez, é caracterizada pela substituição de uma palavra por outra semanticamente relacionada, como faca por garfo. Ocorre na afasia sensorial. Solilóquio Refere-se ao comportamento de falar sozinho. É uma manifestação indicativa de alucinação auditiva, mas pode ocorrer também em pessoas normais. Coprolalia Neste tipo o discurso é caracterizado pela presença de palavras obscenas, vulgares ou relativas a excrementos. Quando se constitui num tique verbal, é uma manifestação típica da síndrome de Tourette. Glossolalia O indivíduo expressa-se como se falando em outra língua. Ele produz sons ininteligíveis, mantendo os aspectos prosódicos da fala normal. Maneirismos Nesse tipo a fala torna-se pouco natural, afetada, seja quanto à escolha das palavras (rebuscamento, uso de palavras difíceis, formalismo exagerado, assim como o uso excessivo de diminutivos, gírias ou jargões), à pronúncia, ao sotaque ou à inflexão verbal (disprosódia ou paraprosódia115). Quando um indivíduo refere-se a si mesmo na terceira pessoa, isso representa um maneirismo. Com frequência o ex-jogador de futebol Pelé conta episódios de sua carreira sem usar o pronome eu, preferindo usar a expressão o Pelé. [...] Pedolalia O paciente fala com uma voz infantilizada. Pararrespostas São respostas totalmente disparatadas em relação às perguntas. Por exemplo: ‘Qual o seu nome?’ – Resposta: ‘Acho que vai chover’. São encontradas na esquizofrenia e na demência. Respostas aproximadas [...] O paciente, embora compreenda perfeitamente a pergunta e conheça a resposta correta, deliberadamente dá uma resposta errada, mas que está relacionada à pergunta. Por exemplo: ‘Quantas patas tem um cachorro?’ – Resposta: ‘Cinco’; ou então: ‘Quantos são 3 X 3’? – Resposta: ‘Dez’. Respostas aproximadas ocorrem num quadro de pseudodemência (dissociativa) conhecido como síndrome de Ganser [...].
115
Disprosódia ou paraprosódia - Distúrbio da fala em que há maior demora na silabação das palavras, e anomalia em sua entonação, ritmo e altura.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
102
ALTERAÇÕES DA MEMÓRIA116 A memória é a capacidade de registrar, manter e evocar as experiências e os fatos já ocorridos. A capacidade de memorizar relaciona-se intimamente com o nível de consciência, com a atenção e com o interesse afetivo. Tudo o que uma pessoa aprende [e conhece – cognição] em sua vida depende intimamente da capacidade de memorização. O processo de memorização possui três etapas principais: fixação (ou engramação), conservação (ou retenção) e evocação. Do ponto de vista psicológico, a engramação depende de: - Nível de consciência e estado geral do organismo (o indivíduo deve estar desperto, não muito cansado, bem-nutrido, calmo, etc); - Atenção global e capacidade de manutenção de atenção concentrada sobre o conteúdo a ser fixado (capacidade do indivíduo concentrar-se); - Sensopercepção preservada; - Interesse e colorido emocional relacionado ao conteúdo mnêmico a ser fixado, assim como do empenho do indivíduo em aprender (vontade e afetividade); - Conhecimento anterior (elementos já conhecidos ajudam a adquirir elementos novos); - Capacidade de compreensão do conteúdo fixado; - Organização temporal das repetições (distribuição harmônica e ritmada no tempo auxilia na fixação de novos elementos); - Canais sensoperceptivos envolvidos na percepção, já que, quanto maior o número de canais sensoriais, mais eficaz a fixação (p.ex., o método audiovisual de ensino de línguas). A conservação dos elementos mnêmicos depende de: - Repetição (pois, de modo geral, quanto mais se repete um conteúdo, mais facilmente este se conserva); - Associação com outros elementos (cadeia de elementos mnêmicos); A evocação é a capacidade de recuperar e atualizar os dados fixados. Esquecimento, por sua vez, é a denominação que se dá à impossibilidade de evocar e recordar. O reconhecimento é a capacidade de identificar o conteúdo mnêmico como lembrança e diferenciá-la da imaginação e de representações atuais. Em relação ao processo temporal de aquisição e evocação de elementos mnêmicos, a neuropsicologia moderna divide a memória em três fases ou tipos [...]: 1. Memória imediata ou de curtíssimo prazo (de poucos segundos até 1 a 3 minutos) Este tipo de memória confunde-se com a atenção e com a memória de trabalho117, pois é a capacidade de reter o material (palavras, números, imagens, etc) imediatamente após ser percebida. 116
Este item foi redigido a partir de recortes de CHENIAUX, 2013, p.54-71; DALGALARRONDO, 2008, p. 137-54; PAIM, 1993, p. 141-60. 117 Memória de trabalho – [...] é, na verdade, a combinação de habilidades de atenção (capacidade de prestar atenção e de concentração) e da memória imediata. São exemplos de memória de trabalho ouvir um número telefônico, retê-lo na mente, para, em seguida, discar, assim como, quando ao dirigir em uma cidade desconhecida, perguntar sobre um endereço, receber a informação e a sugestão do trajeto e, mentalmente, executar o itinerário de forma progressiva. [...]
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
103
2.
3.
1. 2.
3.
A memória imediata tem capacidade limitada e depende da concentração, da fatigabilidade e de certo treino. As memórias imediatas e de trabalho dependem sobretudo da integridade das áreas pré-frontais. Memória recente ou de curto prazo (de poucos minutos até 3 a 6 horas) Refere-se à capacidade de reter a informação por curto período. Também é um tipo de memória de capacidade limitada. A memória recente depende de estruturas cerebrais das partes mediais dos lobos temporais, como a região CA1 do hipocampo, do córtex entorrinal, assim como do córtex parietal posterior. [...] Memória remota ou de longo prazo (de meses até muitos anos) É a capacidade de evocação de informações e acontecimentos ocorridos no ado, geralmente após muito tempo do evento (pode durar por toda a vida). É um tipo de memória de capacidade bem mais ampla que a imediata e a recente. Acredita-se que a memória remota relaciona-se tanto ao hipocampo (no processo de transferência de memórias recentes para remotas) como as amplas e difusas áreas corticais, principalmente frontais, incluindo todos os outros lobos cerebrais, sobretudo em suas áreas corticais de associação. O termo priming diz respeito a um fenômeno normal e importante do processo de recordação e evocação. Fragmentos de um conteúdo mnêmico amplo são evocados e, a partir deles, todo o resto é gradativamente recuperado. Assim, um músico toca ou ouve os primeiros dois ou três acordes de uma canção aparentemente esquecida, e, de forma gradativa, a canção toda (e sua sequência de acordes e melodias) começa a surgir para o sujeito. O priming pode ser traduzido como dicas evocadoras de lembranças mais amplas. Ele sugere que a lembrança de alguns fragmentos da memória e conjuntos mnêmicos maiores seriam armazenados de forma parcialmente independentes. O priming é um fenômeno predominantemente neocortical, participando dele as áreas pré-frontais e corticais associativas temporoparietooccipitais. O esquecimento (o oposto da evocação) se dá por três vias: O esquecimento normal, fisiológico: ou por desinteresse do indivíduo ou por desuso. O esquecimento por repressão: quando se trata de conteúdo desagradável ou pouco importante para o indivíduo, podendo, no entanto, o sujeito, por esforço próprio, voltar a recordar certos conteúdos reprimidos (que ficam estocados nos pré-consciente). Esquecimento por recalque: certos conteúdos mnêmicos, devido ao fato de serem emocionalmente ináveis, são banidos da consciência, podendo ser recuperados apenas em circunstâncias especiais (ficam estocados no inconsciente).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
104
ALTERAÇÕES PATOLÓGICAS DA MEMÓRIA Hipermnésias As representações (elementos mnêmicos) afluem rapidamente, em tropel, ganhando em número, perdendo, porém, em clareza e precisão. [...] A hipermnésia traduz mais a aceleração geral do ritmo psíquico que um alteração propriamente da memória. Amnésia (ou hipomnésia) Denomina-se amnésia, de forma genérica, a perda da memória, seja a da capacidade de fixar ou a da capacidade de manter e evocar antigos conteúdos mnêmicos. Diferenciam-se os seguintes tipos de amnésias: 1. Amnésia psicogênica. Nesse tipo há perda de elementos mnêmicos focais, os quais têm valor psicológico específico (simbólico e afetivo). O indivíduo esquece, por exemplo, um evento de sua vida (que teve um significado especial para ele), mas consegue lembrar de tudo que ocorreu ao seu ‘redor’. Tal amnésia pode ser superada por um estado hipnótico (na hipnose, o indivíduo consegue lembrar do que, estado de consciência, não recorda). 2. Amnésia orgânica. Trata-se de amnésia menos seletiva (em relação ao conteúdo do material esquecido) que a psicogênica. Em geral, perde-se primeiramente a capacidade de fixação (memórias imediatas e recentes); em estados avançados da doença, o indivíduo começa a perder conteúdos antigos. [...] Amnésia anterógrada e retrógrada Na amnésia anterógrada, o indivíduo não consegue mais fixar elementos mnêmicos a partir do evento que lhe causou o dano cerebral. Por exemplo, o indivíduo não lembra do que ocorreu nas semanas (ou meses) depois de um trauma cranioencefálico. Esse tipo de amnésia é um distúrbiochave e bastante frequente na maior parte dos distúrbios neurocognitivos. Já na amnésia retrógrada, o indivíduo perde a memória para fatos ocorridos antes do início da doença (ou trauma). Sua ocorrência sem amnésia anterógrada pode ser observada em quadros dissociativos (psicogênicos), como a amnésia dissociativa e a fuga dissociativa. [...] De um modo geral, é comum, após trauma cranioencefálico, a ocorrência de amnésias retroanterógradas (ou total), ou seja, déficits de fixação para o que ocorreu dias, semanas ou meses antes e depois do evento. A amnésia pode ainda ser transitória (ou breve) e lacunar (relacionada a determinados períodos de tempo). Os casos mais típicos e mais de amnésia transitória observa-se na convalescença de enfermidades infecciosas graves (por exemplo, meningites) e de amnésia lacunar nos casos de traumatismos cranioencefálicos. Alomnésia (ou ilusão mnêmica ou ilusão de memória) É uma alteração análoga à que ocorre na sensopercepção. Aqui as recordações de um evento real são deturpadas, distorcidas pelo indivíduo de forma involuntária. Ocorre no delirium, na demência, no transtorno amnéstico e nos estados crepusculares, associada a alterações quantitativas da memória; na mania e na melancolia118, por influência do afeto 118
A melancolia representa uma das formas da psicose. “A depressão melancólica é um diagnóstico psiquiátrico de história de vida, geralmente com episódios recorrentes. Melancolia é uma síndrome com longa duração e características específicas de psicopatologia, insuficientemente diferenciada de depressão maior por um especificador no DSM-5 e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
105
dominante; e, ainda, na esquizofrenia e no transtorno delirante, com expressão do conteúdo dos delírios. Paramnésia (ou alucinação de memória) Trata-se de recordação de algo que de fato não ocorreu, de uma falsa lembrança, embora para o paciente ela seja verdadeira. Pode ocorrer na esquizofrenia, em virtude da atividade delirante. A fabulação (ou confabulação) seria um tipo especial de paramnésia. Fabulação é um termo em geral utilizado para designar as alucinações de memória que ocorrem em quadros amnésticos de origem orgânica, como no transtorno amnéstico, na demência e no delirium. Déjà vu e Jamais vu No déjà vu (já visto), o indivíduo tem uma sensação de familiaridade diante de uma situação (ou objeto) inteiramente nova, como se ele já a houvesse vivenciado anteriormente. É muito comum, quando vamos a um lugar pela primeira vez, a sensação de que estivemos lá. No jamais vu (nunca visto) ocorre o oposto: há uma ausência da sensação de familiaridade diante de uma situação já vivenciada um ou mais vezes no ado. Um exemplo seria o de não ser capaz de reconhecer a mãe, o pai ou um amigo íntimo. [...] O dèjá vu e o jamais vu podem ocorrer na epilepsia do lobo temporal, na esquizofrenia, em síndromes de ansiedade em pessoas normais. Criptomnésia Termo criado por Freud. Consiste numa falha relativa ao reconhecimento como pretérito. Recordações voltam à mente do indivíduo, mas não são reconhecidas como tais, parecendo a ele ideias novas, criações originais suas. É o mecanismo dos casos de plágio involuntário. O próprio Freud reconheceu que havia, inconscientemente, tomado para si a autoria de uma hipótese psicanalítica, relativa à bissexualidade humana, que seu então amigo Fliess lhe comunicara algum tempo antes. Ecmnésia [...] representa também um distúrbio quanto ao reconhecimento como pretérito. Trata-se de uma presentificação do ado: a recordação é tão intensa, quase alucinatória, que o paciente se comporta como se o evento pretérito estivesse ocorrendo naquele momento, como se ele estivesse vivendo em uma época anterior de sua vida. Ocorre em estados crepusculares histéricos e epilépticos, em estados de obnubilação oniróide (como no delirium ocupacional), na intoxicação por alucinógenos e na demência. Um exemplo de ecmnésia, de natureza dissociativa, foi o de uma senhora de mais de 60 anos que, após a morte súbita do marido, ou a agir como criança, brincava o dia inteiro e ficava chamando pelos pais, falecidos havia muito tempo.
parcialmente descrito nos critérios da Classificação Internacional de Doenças-10ª Edição. Dentro da classificação atual, é frequentemente vista em pacientes gravemente doentes com depressão e transtorno bipolar. No entanto, a melancolia possui uma homogeneidade psicopatológica e biológica distinta na experiência clínica e nos marcadores de testes laboratoriais, e é diferencialmente sensível às intervenções terapêuticas específicas.” (adaptado de JURUENA, et al., Rev. Bras. Psiq., vol. 33, mai/2011.)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
106
Transtornos de Ansiedade: A ansiedade normal e patológica Ansiedade normal A ansiedade é uma reação em geral normal do ser humano. É um sentimento que acompanha mudanças na vida da pessoa; separação da criança dos pais ao ir para escola, rompimento de relacionamentos, espectativa para fazer provas ou testes, e assim por diante. A ansiedade é um sintoma primariamente psíquico, ou seja, a pessoa se sente ansiosa e conta isso aos outros, por exemplo, mas há uma série de sinais que acompanham a sensação mental que incluem: tontura, diarréia, pressão alta, palpitação, tremor, sudorese excessiva, etc. As reações variam de indivíduo a outro. Assim ela se divide em dois aspectos: 1) sua percepção de alterações fisiológicas (como sudorese e palpitação) 2) a consciência de estar nervoso ou amedrontado. A ansiedade tem como função adaptativa básica o alerta a perigos internos (dor) ou externos (ameaça de lesão corporal). Desta maneira, pode vir acompanhada de medo (medo de morrer frente à um assalto), e visa a preparar o indivíduo para reações imediatas ou evitar tais ameaças, ou pelo menos atenuar os seus danos. “Estresse” geralmente depende do estímulo e do indivíduo que recebe o estímulo. Assim, um desbalanço entre o interno (capacidade de a pessoa manter-se calma, estruturação psicológica, e assim por diante) e o externo (sobrecarga emocional e/ou física) gera o estresse. Ansiedade patológica A ansiedade a a ser patológica na medida em que ela aparece sem que haja um estímulo, ou seja, na medida em que a pessoa fique ansiosa sem ter um motivo aparente. Palpitações, sudorese, “aperto no peito” surgem com uma frequência razoável sem que haja uma causa imediata que possa ser identificada por ele. Outro critério que geralmente é usado é quando a reação ansiosa é desproporcional ao estímulo. Reações muito drásticas a estímulos que normalmente teriam de desencadear respostas menores por parte do indivíduo. As causas são as mais variadas; as teorias psicológicas falam e repressão de desejos (Freud), de condicionamento de respostas ansiosas (teorias comportamentais) e de vazios existenciais (teorias existenciais). As teorias biológicas falam em hiper-excitação do sistema nervoso autônomo (aquele que é responsável por respostas como taquicardia, dor de cabeça e aceleração da respiração, por exemplo) e desequilíbrio de hormônios como a serotonina e a noradrenalina, além de fatores genéticos que contribuem para isso. (http://www.psiq.med.br/index.php?opcao=ver_tema&id_tema=19&id_cat=3)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
107
Transtornos de Ansiedade Agorafobia CID-10 Grupo relativamente bem definido de fobias relativas ao medo de deixar seu domicílio, medo de lojas, de multidões e de locais públicos, ou medo de viajar sozinho em trem, ônibus ou avião. A presença de um transtorno de pânico é frequente no curso dos episódios atuais ou anteriores de agorafobia. Entre as características associadas, acham-se frequentemente sintomas depressivos ou obsessivos, assim como fobias sociais. As condutas de evitação comumente são proeminentes na sintomatologia e certos agorafóbicos manifestam pouca ansiedade dado que chegam a evitar as situações geradoras de fobia.
DSM-5 A característica essencial da agorafobia é o medo ou ansiedade acentuado ou intenso desencadeado pela exposição real ou prevista a diversas situações [...]. O diagnóstico requer que os sintomas ocorram em pelo menos duas das cinco situações seguintes: 1) uso de transporte público, como automóveis, ônibus, trens, navios ou aviões; 2) permanecer em espaços abertos, como áreas de estacionamento, mercados ou pontes; 3) permanecer em locais fechados, como lojas, teatros ou cinemas; 4) permanecer em uma fila ou ficar em meio a uma multidão; ou 5) sair de casa sozinho. Os exemplos de cada situação não são exaustivos; outras situações podem ser temidas. Quando experimentam medo e ansiedade acionada por essas situações, os indivíduos geralmente experimentam pensamentos de que algo terrível possa acontecer [...]. Acreditam com frequência que escapar dessas situações poderia ser difícil (p. ex., “não consigo sair daqui”) ou que o auxílio pode não estar disponível (p. ex., “não há ninguém para me ajudar”) quando ocorrem sintomas do tipo pânico ou outros sintomas incapacitantes ou constrangedores. “Sintomas do tipo pânico” se referem a algum dos 13 sintomas inclusos nos critérios para ataque de pânico, como tontura, desmaio e medo de morrer. “Outros sintomas incapacitantes ou constrangedores” incluem sintomas como vomitar e sintomas inflamatórios intestinais, bem como, em adultos mais velhos, medo de cair ou, em crianças, uma sensação de desorientação e de estar perdido. A quantidade de medo experimentada pode variar com a proximidade da situação temida e pode ocorrer em antecipação ou na presença real da situação agorafóbica. Além disso, o medo ou ansiedade pode assumir a forma de um ataque de pânico com sintomas completos ou sintomas limitados (i.e., um ataque de pânico esperado). O medo ou ansiedade é evocado quase todas as vezes em que o indivíduo entra em contato com a situação temida [...]. Assim, alguém que fica ansioso apenas ocasionalmente em uma situação
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
108
agorafóbica (p. ex., fica ansioso quando permanece em uma fila ou em apenas uma a cada cinco ocasiões) não seria diagnosticado com agorafobia. O indivíduo evita ativamente a situação, ou, se não consegue ou decide não evitá-la, a situação evoca medo ou ansiedade intenso [...]. Esquiva ativa significa que o indivíduo está, no momento, comportando-se de formas intencionalmente concebidas para prevenir ou minimizar o contato com situações agorafóbicas. A esquiva pode ser comportamental (p. ex., mudar as rotinas diárias, escolher um emprego próximo para evitar o uso de transporte público, organizar a entrega de alimentos para evitar ter de entrar em lojas e supermercados), bem como cognitiva por natureza (p. ex., usando a distração para ar por situações agorafóbicas). Pode tornar-se tão grave a ponto de a pessoa ficar completamente confinada à sua casa. Com frequência, um indivíduo é mais capaz de enfrentar uma situação temida quando acompanhado por alguém como um parceiro, amigo ou profissional da saúde. O medo, ansiedade ou esquiva deve ser desproporcional ao perigo real apresentado pelas situações agorafóbicas e ao contexto sociocultural [...]. A diferenciação de medos agorafóbicos clinicamente significativos de medos razoáveis (p. ex., sair de casa durante uma forte tempestade) ou de situações que são consideradas perigosas (p. ex., caminhar em uma área de estacionamento ou usar o transporte público em uma área de alta criminalidade) é importante por inúmeras razões. Primeiramente, o que constitui esquiva pode ser difícil de julgar entre as culturas e nos contextos socioculturais (p. ex., é culturalmente apropriado que as mulheres muçulmanas ortodoxas em certas partes do mundo evitem sair de casa sozinhas, e assim essa esquiva não seria considerada indicativa de agorafobia). Segundo, adultos mais velhos provavelmente superestimam a relação entre seus medos e as restrições relacionadas à idade e, de modo semelhante, podem não julgar seus medos como desproporcionais ao risco real. Terceiro, os indivíduos com agorafobia têm probabilidade de superestimar o perigo em relação aos sintomas do tipo pânico ou outros sintomas corporais. A agorafobia deve ser diagnosticada somente se “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
109
persiste o medo, ansiedade ou esquiva [...] e se ele causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo [...]. A duração de “mais de seis meses” significa excluir os indivíduos com problemas transitórios de curta duração. No entanto, o critério de duração deve ser usado como um guia geral, com a possibilidade de algum grau de flexibilidade. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Nas suas formas mais graves, a agorafobia pode levar os indivíduos a ficar completamente s à sua casa, incapazes de sair e dependentes de outra pessoa para serviços ou assistência até mesmo às suas necessidades básicas. A desmoralização e os sintomas depressivos, bem como o abuso de álcool e medicamentos sedativos como estratégias inadequadas de automedicação, são comuns. Transtorno do pânico (ou Ansiedade Paroxística Episódica) CID-10 DSM-5 A característica essencial deste transtorno são Transtorno de pânico se refere a ataques de os ataques recorrentes de uma ansiedade grave pânico inesperados recorrentes [...]. Um ataque (ataques de pânico), que não ocorrem de pânico é um surto abrupto de medo ou exclusivamente numa situação ou em desconforto intenso que alcança um pico em circunstâncias determinadas mas de fato são minutos e durante o qual ocorrem quatro ou imprevisíveis. mais de uma lista de 13 sintomas físicos e Como em outros transtornos ansiosos, os cognitivos. O termo recorrente significa sintomas essenciais comportam a ocorrência literalmente mais de um ataque de pânico brutal de palpitação e dores torácicas, inesperado. O termo inesperado se refere a um sensações de asfixia, tonturas e sentimentos de ataque de pânico para o qual não existe um irrealidade (despersonalização ou indício ou desencadeante óbvio no momento da 119 desrealização ). Existe, além disso, ocorrência – ou seja, o ataque parece vir do frequentemente um medo secundário de nada, como quando o indivíduo está relaxando morrer, de perder o autocontrole ou de ficar ou emergindo do sono (ataque de pânico louco. noturno). Em contraste, os ataques de pânico Não se deve fazer um diagnóstico principal de esperados são ataques para os quais existe um transtorno de pânico quando o sujeito indício ou desencadeante óbvio, como uma apresenta um transtorno depressivo no situação em que os ataques de pânico ocorrem momento da ocorrência de um ataque de geralmente. A determinação de os ataques de pânico, uma vez que os ataques de pânico são pânico serem esperados ou inesperados é feita provavelmente secundários à depressão neste pelo clínico, que faz esse julgamento com base caso. na combinação de um questionamento cuidadoso quanto à sequência dos eventos que 119
Desrealização: Experiências de irrealidade ou distanciamento em relação ao ambiente ao redor (p. ex., indivíduos ou objetos são vivenciados como irreais, oníricos, nebulosos, inertes ou visualmente distorcidos). DSM-5
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
110
precederam ou conduziram ao ataque e do próprio julgamento do indivíduo do quanto o ataque lhe pareceu ocorrer sem razão aparente. As interpretações culturais podem influenciar a designação do ataque de pânico como esperado ou inesperado [...]. Nos Estados Unidos e na Europa, aproximadamente metade dos indivíduos com transtorno de pânico tem ataques de pânico esperados tanto quanto ataques inesperados. Assim, a presença de ataques de pânico esperados não exclui o diagnóstico de transtorno de pânico. [...] A frequência e a gravidade dos ataques de pânico variam de forma considerável. Em termos de frequência, pode haver ataques moderadamente frequentes (p. ex., um por semana) durante meses, pequenos surtos de ataques mais frequentes (p. ex., todos os dias) separadas por semanas, meses sem ataques ou ataques menos frequentes (p. ex., dois por mês) durante muitos anos. As pessoas que têm ataques de pânico infrequentes se parecem com as pessoas com ataques de pânico mais frequentes em termos de sintomas do ataque, características demográficas, comorbidade com outros transtornos, história familiar e dados biológicos. Em termos de gravidade, os indivíduos com transtorno de pânico podem ter ataques com sintomas completos (quatro ou mais sintomas) ou com sintomas limitados (menos de quatro sintomas), e o número e o tipo de sintomas do ataque de pânico frequentemente diferem de um ataque de pânico para o seguinte. No entanto, é necessário mais de um ataque de pânico completo inesperado para o diagnóstico de transtorno de pânico. As preocupações acerca dos ataques de pânico ou de suas consequências geralmente relacionam-se a preocupações físicas, como a preocupação de que os ataques de pânico reflitam a presença de doenças ameaçadoras à vida (p. ex., doença cardíaca, transtorno convulsivo); preocupações pessoais, como constrangimento ou medo de ser julgado negativamente pelos outros devido aos sintomas visíveis de pânico; e preocupações acerca do funcionamento mental, como" "“enlouquecer” ou perder o controle [...]. As mudanças desadaptativas no comportamento representam as tentativas de minimizar ou evitar os ataques de pânico ou suas consequências. Os exemplos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
111
incluem a esquiva de esforço físico, reorganização da vida diária para garantir que haja ajuda disponível no caso de um ataque de pânico, restrição das atividades diárias habituais e esquiva de situações agorafóbicas, como sair de casa, usar transporte público ou fazer compras. Se a agorafobia está presente, um diagnóstico adicional de agorafobia é estabelecido. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Um tipo de ataque de pânico inesperado é o ataque de pânico noturno (i.e., acordar do sono em um estado de pânico, que difere de entrar em pânico depois de completamente acordado). Nos Estados Unidos, foi estimado que esse tipo de ataque de pânico ocorre pelo menos uma vez em aproximadamente um quarto a um terço dos indivíduos com transtorno de pânico, dos quais a maioria também tem ataques de pânico durante o dia. Além da preocupação acerca dos ataques e de suas consequências, muitos indivíduos com o transtorno relatam sentimentos constantes ou intermitentes de ansiedade que são mais amplamente relacionados a preocupações com a saúde em geral e com a saúde mental em específico. Por exemplo, indivíduos com transtorno de pânico com frequência preveem um resultado catastrófico a partir de um sintoma físico leve ou efeito colateral de medicamento (p. ex., pensar que pode ter um infarto agudo do miocárdio ou que uma dor de cabeça significa a presença de um tumor cerebral). Essas pessoas em geral são relativamente intolerantes aos efeitos colaterais de medicamentos. Além disso, pode haver preocupações acerca da capacidade de concluir as tarefas ou ar os estressores diários; pode haver uso excessivo de drogas (p. ex., álcool, medicamentos de prescrição ou drogas ilícitas) ou comportamentos extremos que visam controlar os ataques de pânico (p. ex., restrições severas na ingestão de alimentos ou evitação de alimentos ou medicamentos específicos devido a preocupa- ções acerca dos sintomas físicos que provocam ataques de pânico).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
112
Fobia específica CID-10 Fobias limitadas a situações altamente específicas tais como a proximidade de determinados animais [cinofobia], locais elevados [acrofobia], trovões [brontofobia], escuridão [nictofobia], viagens de avião [Ptesiofobia], espaços fechados [claustrofobia], utilização de banheiros públicos [molismofobia], ingestão de determinados alimentos [sitiofobia], cuidados odontológicos, visão de sangue [hemo/hemafobia ou hematofobia] ou ferimentos. Ainda que a situação desencadeante seja inofensiva, o contato com ela pode desencadear um estado de pânico como na agorafobia ou fobia social.
DSM-5 Uma característica essencial desse transtorno é que o medo ou ansiedade está circunscrito à presença de uma situação ou objeto particular [...], que pode ser denominado estímulo fóbico. As categorias das situações ou objetos temidos são apresentadas como especificadores. Muitos indivíduos temem objetos ou situações de mais de uma categoria, ou estímulo fóbico. Para o diagnóstico de fobia específica, a resposta deve ser diferente dos medos normais transitórios que comumente ocorrem na população. Para satisfazer os critérios para um diagnóstico, o medo ou ansiedade deve ser intenso ou grave (i.e., “acentuado”) [...]. O grau do medo experimentado pode variar com a proximidade do objeto ou situação temida e pode ocorrer com a antecipação da presença ou na presença real do objeto ou situação. Além disso, o medo ou ansiedade pode assumir a forma de um ataque de pânico com sintomas completos ou limitados (i.e., ataque de pânico esperado). Outra característica das fobias específicas é que o medo ou ansiedade é evocado quase todas as vezes que o indivíduo entra em contato com o estímulo fóbico [...]. Assim, um indivíduo que fica ansioso apenas ocasionalmente ao ser confrontado com a situação ou objeto (p. ex., fica ansioso apenas em um de cada cinco voos que faz) não seria diagnosticado com fobia específica. Entretanto, o grau de medo ou ansiedade expresso pode variar (desde a ansiedade antecipatória até um ataque de pânico completo) nas diferentes ocasiões de encontro com o objeto ou situação fóbica devido a vários fatores contextuais, como a presença de outra pessoa, a duração da exposição, e a outros elementos ameaçadores, como turbulência em um voo para indivíduos que têm medo de voar. O medo e a ansiedade são com frequência expressos de formas diferentes entre crianças e adultos. Além disso, o medo ou ansiedade ocorre tão logo o objeto ou situação fóbica é encontrado (i.e., imediatamente, em vez de ser retardado). O indivíduo evita ativamente a situação, ou, se não consegue ou decide não evitá-la, a situação ou objeto evoca temor ou ansiedade intensos [...]. Esquiva ativa significa que o indivíduo
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
113
intencionalmente se comporta de formas destinadas a prevenir ou minimizar o contato com objetos ou situações fóbicas (p. ex., pega túneis em vez de pontes em sua ida diária para o trabalho devido ao medo de alturas; evita entrar em um quarto escuro pelo medo de aranhas; evita aceitar um trabalho em um local em que um estímulo fóbico é mais comum). Os comportamentos de esquiva são com frequência óbvios (p. ex., um indivíduo que tem medo de sangue recusando-se a ir ao médico), mas às vezes são menos óbvios (p. ex., um indivíduo que tem medo de cobras recusando-se a olhar para figuras que se assemelham ao contorno ou à forma de cobras). Muitas pessoas com fobias específicas sofreram durante muitos anos e alteraram suas circunstâncias de vida com o objetivo de evitar o objeto ou situação fóbica o máximo possível (p. ex., uma pessoa diagnosticada com fobia específica, animal, que se muda a fim de residir em uma área desprovida do animal temido em particular). Consequentemente, elas não mais experimentam medo ou ansiedade em sua vida diária. Em tais circunstâncias, os comportamentos de esquiva ou a recusa persistente de se engajar em atividades que envolveriam exposição ao objeto ou situação fóbica (p. ex., recusa repetida em aceitar ofertas para viagens a trabalho devido ao medo de voar) podem ser úteis para a confirmação do diagnóstico na ausência de ansiedade ou pânico explícito. O medo ou ansiedade é desproporcional em relação ao perigo real apresentado pelo objeto ou situação ou mais intenso do que é considerado necessário [...]. Embora os indivíduos com fobia específica com frequência reconheçam que suas reações são desproporcionais, tendem a superestimar o perigo nas situações temidas, e assim o julgamento do caráter desproporcional é feito pelo clínico. O contexto sociocultural do indivíduo também deve ser levado em conta. Por exemplo, o medo do escuro pode ser razoável em um contexto de violência constante, e o medo de insetos pode ser mais desproporcional em contextos onde insetos são consumidos na dieta. O medo, a ansiedade ou a esquiva é persistente, geralmente durando mais de seis meses [...], o que ajuda a distinguir o transtorno de medos transitórios que são “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
114
comuns na população, em particular entre crianças. No entanto, o critério de duração deve ser usado como um guia geral, com a possibilidade de algum grau de flexibilidade. A fobia específica deve causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo para que o transtorno seja diagnosticado [...]. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Os indivíduos com fobia específica geralmente experimentam aumento na excitabilidade autonômica pela antecipação ou durante a exposição a um objeto ou situação fóbica. Entretanto, a resposta fisiológica à situação ou ao objeto temidos varia. Enquanto os indivíduos com fobias específicas situacionais, de ambiente natural e de animais têm probabilidade de apresentar excitabilidade aumentada do sistema nervoso simpático, aqueles com fobia específica a sangue-injeção-ferimentos frequentemente demonstram uma resposta de desmaio ou quase desmaio vasovagal120 que é marcada por breve aceleração inicial do ritmo cardíaco e elevação da pressão arterial seguida por desaceleração do ritmo cardíaco e queda na pressão arterial. Os modelos atuais dos sistemas neurais para fobia específica enfatizam a amígdala e estruturas relacionadas, assim como em outros transtornos de ansiedade.
120
Vasovagal - Relativo aos vasos e ao nervo vago; síndrome caracterizada por mal-estar epigástrico e cardíaco, sensação de constrição respiratória, até falsa angina de peito, palidez, extremidades frias, cefaléia, durante minutos.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
115
RELAÇÃO DAS PRINCIPAIS FORMAS DE FOBIAS Ablutofobia — medo de tomar banho; Acarofobia — medo de ter a pele infestada por pequenos organismos (ácaros); Acrofobia — medo de altura; Acusticofobia — medo relacionado aos ruídos de alta intensidade; Aerodromofobia — medo de viagens aéreas; Agliofobia — medo de sentir dor, sinônimo de algofobia; Afefobia — medo de ser tocado; Agrafobia — medo de abuso sexual; Agrizoofobia — medo de animais selvagens; Agirofobia — medo de ruas ou cruzamento de ruas; Aicmofobia — medo de agulhas de injeção ou objetos pontudos; Ailurofobia — medo de gatos. Idem galeofobia ou gatofobia; Aletrorofobia — medo de galinhas (ornitofobia); Algofobia — medo de dor. Idem agliofobia; Amaxofobia — medo mórbido de se encontrar ou viajar dentro de qualquer veículo de transporte; Ambulofobia — medo de andar; Amnesifobia — medo de perder a memória; Androfobia — medo de homens; Antofobia — medo de flores; Antropofobia — medo de pessoas ou da sociedade; Anuptafobia — medo de ficar solteiro (a); Apifobia — medo de abelhas; Aracnefobia ou Aracnofobia — medo de aranhas; Astenofobia — medo de desmaiar ou ter fraqueza; Astrofobia ou astrapofobia — medo de trovões e relâmpagos; Ataxofobia — medo de desordem; Autofobia — medo de si mesmo ou de ficar sozinho (Monofobia, Isolofobia); Bacilofobia ou Bacteriofobia — medo de bactérias (Microbiofobia); Basofobia ou basifobia — medo de andar ou cair (inabilidade de ficar em pé); Batofobia — medo de profundidade; Botanofobia — medo de plantas; Batracofobia — medo de anfíbios (como sapos, salamandras, rãs etc.); Belonofobia — medo de alfinetes e agulhas (aiquimofobia); Brontofobia — medo de trovões e relâmpagos; Biofobia — medo da vida. Cacorrafiofobia — medo de fracasso ou falhar; Caetofobia — medo de pêlos; Cainofobia ou cainotofobia — medo de novidades; Catagelofobia — medo do ridículo (estar ou ser); Catoptrofobia — medo de espelhos; Catsaridafobia — medo de baratas; Cimofobia — medo de ondas ou de movimentos parecidos com ondas; Cinetofobia ou cinesofobia — medo de movimento; Cinofobia — medo de cães; Cipridofobia, ciprifobia, ciprianofobia, ou ciprinofobia — medo de prostitutas ou doença venéreas; Ceraunofobia — medo de trovão;
Corofobia — medo de dançar; Coitofobia — medo ou aversão à sexo; Coniofobia — medo de poeira (amatofobia); Cromofobia ou cromatofobia — medo de cores; Cronofobia — medo do tempo; Cronomentrofobia — medo de relógios; Claustrofobia — medo de espaços confinados ou lugares fechados ou seja, o oposto da agorafobia; Cleitrofobia ou cleisiofobia — medo de ficar trancado em lugares fechados; Cleptofobia — medo de ser roubado; Climacofobia — medo de degraus (subir ou cair de degraus); Clinofobia — medo de ir para cama; Colpofobia — medo de órgãos genitais; Coimetrofobia — medo de cemitérios; Contreltofobia — medo de abuso sexual; Coprofobia — medo de fezes; Coulrofobia — medo de palhaços; Criofobia — medo de frio intenso, gelo ou congelamento; Demonofobia — medo de demônios; Demofobia ou enoclofobia — medo de multidão (agorafobia); Dendrofobia — medo de árvores; Dermatosiofobia, dermatofobia ou dermatopatofobia — medo de doenças de pele; Dipsofobia — medo de beber; Disabiliofobia — medo de se vestir na frente de alguém; Dismorfofobia — medo de deformidade; Distiquifobia — medo de acidentes; Dorafobia — medo de pele de animais; Dromofobia — medo de cruzar ruas. Eisoptrofobia — medo de espelhos ou de se ver no espelho; Electrofobia — medo de eletricidade; Eleuterofobia — medo da liberdade; Elurofobia — medo de gatos (ailurofobia); Emetofobia — medo de vomitar; Enosiofobia ou enissofobia — medo de ter cometido um pecado ou crítica imperdoável; Entomofobia — medo de insetos; Epistaxiofobia — medo de sangrar do nariz; Epistemofobia — medo do conhecimento; Equinofobia — medo de cavalos; Eremofobia — medo de ficar só; Ergofobia — medo do trabalho; Eretofobia — medo mórbido de sentir dor durante relações sexuais; Esciofobia ou esciafobia — medo de sombras Escolecifobia — medo de vermes; Escopofobia ou escoptofobia — medo de estar sendo olhado; Escotofobia — medo de escuro; Escotomafobia — medo de cegueira; Esfecsofobia — medo de marimbondos; Espectrofobia — medo de fantasmas ou espectros; Estasibasifobia ou estasifobia — medo de ficar de pé ou andar (ambulofobia); Estenofobia — medo de lugares ou coisas estreitas;
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
116 Fagofobia — medo de engolir ou de comer; Falacrofobia — medo de tornar-se careca; Farmacofobia — medo de tomar remédios; Febrifobia, fibrifobia ou fibriofobia — medo de febre; Fengofobia — medo da luz do dia ou nascer do sol; Felinofobia — medo de gatos (ailurofobia, elurofobia, galeofobia, gatofobia); Filemafobia ou filematofobia — medo de beijar; Filofobia — medo de apaixonar-se; Filosofobia — medo de filosofia; Fobia social — medo de estar sendo avaliado negativamente (socialmente); Fonofobia — medo de barulhos ou vozes ou da própria voz de telefone; Fotoaugliafobia — medo de luzes muito brilhantes; Fotofobia — medo de luz; Fronemofobia — medo de pensar; Flatusfobia — medo de liberar flatos a valer. Galeofobia ou gatofobia — medo de gatos, mesmo que Ailurofobia; Gamofobia — medo de casar; Gefirofobia, gefidrofobia ou gefisrofobia — medo de cruzar pontes; Geliofobia — medo de rir; Geniofobia — medo de manter a cabeça erguida; Gerascofobia — medo de envelhecer; Gerontofobia — medo de pessoas idosas; Geumafobia ou geumofobia — medo de sabores; Ghostfobia — Medo de fantasmas; Gimnofobia — medo de nudez; Ginofobia, ginefobia ou ginecofobia — medo de mulheres; Glossofobia — medo de falar ou tentar falar em publico; Gnosiofobia — medo do conhecimento. Hagiofobia — medo de santos ou coisas santas; Hamartofobia — medo de pecar; Hafefobia ou haptefobia — medo de ser tocado ou de tocar em alguém ou em alguma coisa; Harpaxofobia — medo de ser roubado; Hedonofobia — medo de sentir prazer; Heliofobia — medo do sol; Hemofobia, hemafobia ou hematofobia — medo de sangue; Heresifobia ou hereiofobia — medo de desafiar a doutrina oficial (governo); Herpetofobia — medo de répteis ou coisa que arrastam; Heterofobia — etimologicamente medo do sexo oposto, uso comum: medo da heterossexualidade; Hidrofobia — medo de água; Hidrofobofobia — medo de contrair hidrofobia; Hielofobia ou hialofobia — medo de vidro; Hierofobia — medo de padres ou coisas sacras; Higrofobia — medo de líquidos ou umidade; Hilefobia — medo de materialismo ou de epilepsia; Hilofobia — medo de florestas; Hipengiofobia ou hipegiafobia — medo de responsabilidade; Hipnofobia — medo de dormir ou ser hipnotizado; Hipofobia — medo de casas; Hipsifobia — medo de altura; Hobofobia — medo de bêbados ou mendigos; Hodofobia — medo de atravessar estradas;
Hormefobia — medo de ficar abalado ou chocado; Homiclofobia — medo de neblina; Hominofobia — medo de homens, mesmo que androfobia; Hoplofobia — medo de armas de fogo; Homofobia — etimologicamente medo do semelhante, uso comum: medo da homossexualidade; Humilhofobia — medo de ser humilhado. Iatrofobia — medo de ir ao médico; Ictiofobia — medo de peixe; Ideofobia — medo de ideias; Ilingofobia — medo de vertigem ou sentir vertigem quando olha para baixo; Iofobia — medo de veneno; Insetofobia — medo de insetos; Isolofobia — medo da solidão, de estar sozinho, o medo de ficar isolado (Autofobia, Monofobia); Isopterofobia — medo de cupins. Katsaridafobia ou Catsaridafobia — medo de baratas. Lachanophobia ou lachanofobia — medo de vegetais; Lactofobia — medo de leite; Laliofobia ou lalofobia — medo de falar; Lesbofobia — medo de mulheres lésbicas; Leprofobia ou leprafobia — medo de lepra; Ligirofobia — medo de barulhos; Ligofobia — medo de escuridão; Lilapsofobia — medo de furacões; Limnofobia — medo de lagos; Lissofobia — medo de ficar louco; Locquiofobia — medo de nascimento (criança); Logizomecanofobia — medo de computadores; Logofobia — medo de palavras; Luefobia — medo de sífilis (lues). Mageirocofobia — medo de cozinhar; Maieusiofobia — medo da infância; Malaxofobia — medo de amar (sarmassofobia); Maniafobia — medo de insanidade; Mastigofobia — medo de punição; Mecanofobia — medo de máquinas; Megalofobia — medo de coisas grandes; Melanofobia — medo de cor preta; Melissofobia — medo de abelhas; Melofobia — medo ou ódio de música; Meningitofobia — medo de doença nervosa; Merintofobia — medo de ficar amarrado; Metalofobia — medo de metal; Metatesiofobia — medo de mudar; Metifobia — medo de álcool; Metrofobia — medo ou ódio de poesia; Microbiofobia — medo de micróbios (bacilofobia); Mictofobia — medo de escuridão; Mirmecofobia — medo de formigas; Misofobia — medo de germes, contaminação ou sujeira; Mitofobia — medo de mitos, histórias ou declarações falsas; Molismofobia ou molisomofobia — medo de sujeira ou contaminação; Monofobia — medo de solidão ou ficar só (Autofobia, Isolofobia); Monopatofobia — medo de doença incurável; Motefobia — medo de borboleta e mariposa;
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
117 Motorfobia — medo de automóveis; Musofobia ou murofobia — medo de ratos. Narigofobia — medo de narizes; Nebulafobia — medo de neblina (homiclofobia); Necrofobia — medo de morte ou coisas mortas; Nelofobia — medo de vidro; Neofarmafobia — medo de medicamentos novos; Neofobia — medo de qualquer coisa nova; Nefofobia — medo de nevoeiros; Nictofobia — medo da escuridão ou da noite; Noctifobia — medo da noite; Nictohilofobia — medo de florestas escuras ou a noite; Ninfofobia — medo do sexo; Nosocomefobia — medo de hospital; Nosofobia ou nosemafobia — medo de ficar doente; Nostofobia — medo de voltar para casa; Nudofobia — medo de nudez. Obesofobia — medo de ganhar peso (pocrescofobia); Oclofobia — medo de multidão; Ocofobia — medo de veículos; Odinofobia ou odinefobia — medo da dor (algofobia); Odontofobia — medo de dentista ou cirurgia odontológica; Oenofobia — medo de vinhos; Ofidiofobia — medo de cobras; Oftalmofobia — medo de estar sendo vigiado; Olfactofobia — medo de cheiros; Ombrofobia — medo de chuva ou de estar chovendo; Ometafobia ou omatofobia — medo de olhos; Oneirofobia — medo de sonhos; Onomatofobia — medo de ouvir certas palavras ou nomes; Ornitofobia — medo de aros; Pantofobia — medo de tudo ou de todas as fobias; Pedofobia — medo das crianças; Penterofobia — medo da sogra; Pirofobia — medo do fogo; Ptesiofobia — medo de viajar de avião. Quemofobia — medo de substâncias químicas ou de trabalhar com elas; Quenofobia — medo de espaços vazios; Quifofobia — medo de parar; Quimofobia — medo de ondas; Quionofobia — medo de neve; Quinofobia — medo de raiva (doença); Quiraptofobia — medo de ser tocada(o); Quilofobia — medo de esquilos ou qualquer um roedor. Rabdofobia — medo de ser severamente punido; Radiofobia — medo de radiação, Raio—X; Ripofobia — medo de defecar; Ritifobia — medo de ficar enrugado; Rupofobia — medo de sujeira. Sarmassofobia — medo de seduzir e de participar de jogos de sedução; Satanofobia — medo de satã (demônio); Selafobia — medo de flashes (luzes); Selachofobia — medo de tubarões; Selenofobia — medo da lua; Seplofobia — medo de material radiativo; Sesquipedalofobia — medo de palavras grandes; Sexoafobia — medo de fazer sexo;
Sexofobia — medo do sexo oposto (heterofobia); Siderodromofobia — medo de trem ou viagem de trem; Siderofobia — medo de estrelas; Sinistrofobia — medo de coisas do lado esquerdo, mão esquerda; Sitofobia ou Sitiofobia — medo de comida ou comer (cibofobia); Socerafobia — medo de padrasto ou madrasta; Sociofobia — medo da sociedade ou de pessoas em geral; Somnifobia — medo de dormir; Simmetrofobia — medo de simetria; Singenesofobia — medo de parentes; Sifilofobia — medo de sífilis; Sofofobia — medo de aprender; Soteriofobia — medo de dependência dos outros; Surifobia — medo de camundongo (rato); Simbolofobia — medo de símbolos. Tacofobia ou Tachofobia — medo de velocidade; Taeniofobia ou Teniofobia — medo de solitária (tênia); Tafofobia ou tafefobia — medo de ser enterrado vivo; Talassofobia — medo do mar; Tanatofobia ou tantofobia — medo da morte ou de morrer; Tapinofobia - medo de ser contagioso; Taurofobia — medo de touro; Teatrofobia — medo de teatro; Tecnofobia — medo de tecnologia; Telefonofobia — medo de telefone; Teleofobia — medo de definir planos ou de cerimônias religiosas; Teofobia — medo de Deus ou de religião; Teologicofobia — medo de teologia; Teratofobia — medo de crianças ou pessoas deformadas; Termofobia — medo de calor; Testofobia — medo de fazer provas (escolares); Tiranofobia — medo de tiranos; Tocofobia — medo de gravidez; Tomofobia — medo de cirurgia; Tonitrofobia — medo de trovão; Topofobia — medo de certos lugares ou situações, que dão medo ou pavor; Toxifobia, toxofobia ou toxicofobia — medo de se envenenar; Traumatofobia — medo de traumas (físicos); Transfobia — medo de transexuais; Tripanofobia — medo de injeções; Tropofobia — medo de mudar ou fazer mudanças. Unatractifobia — medo de pessoas feias; Uranofobia — medo do céu; Urifobia — aversão e medo mórbido irracional, desproporcional persistente e repugnante a fenômenos paranormais; Urofobia — medo de urina ou do ato de urinar; Uiofobia — medo dos próprios filhos; medo da prole. Vacinofobia — medo de vacinação; Verbofobia — medo de palavras; Verminofobia — medo de vermes; Virginitifobia — medo de estupro; Vitricofobia — medo do padrasto. Xenofobia — medo de estrangeiros ou estranhos;
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
118 Xerofobia — medo de secura, aridez; Xilofobia — medo de objetos de madeira ou de floresta.
Transtorno de Ansiedade Social (Fobia Social) CID-10 Medo de ser exposto à observação atenta de outrem e que leva a evitar situações sociais. As fobias sociais graves se acompanham habitualmente de uma perda da autoestima e de um medo de ser criticado. As fobias sociais podem se manifestar por rubor, tremor das mãos, náuseas ou desejo urgente de urinar, sendo que o paciente por vezes está convencido que uma ou outra destas manifestações secundárias constitui seu problema primário. Os sintomas podem evoluir para um ataque de pânico.
Zelofobia — medo irracional do ciúme; Zoofobia — medo de animais.
DSM-5 A característica essencial do transtorno de ansiedade social é um medo ou ansiedade acentuados ou intensos de situações sociais nas quais o indivíduo pode ser avaliado pelos outros. Em crianças, o medo ou ansiedade deve ocorrer em contextos com os pares, e não apenas durante interações com adultos [...]. Quando exposto a essas situações sociais, o indivíduo tem medo de ser avaliado negativamente. Ele tem a preocupação de que será julgado como ansioso, débil, maluco, estúpido, enfadonho, amedrontado, sujo ou desagradável. O indivíduo teme agir ou aparecer de certa forma ou demonstrar sintomas de ansiedade, tais como ruborizar, tremer, transpirar, tropeçar nas palavras, que serão avaliados negativamente pelos demais [...]. Alguns têm medo de ofender os outros ou de ser rejeitados como consequência. O medo de ofender os outros – por exemplo, por meio de um olhar ou demonstrando sintomas de ansiedade – pode ser o medo predominante em pessoas de culturas com forte orientação coletivista. Um indivíduo com medo de tremer as mãos pode evitar beber, comer, escrever ou apontar em público; um com medo de transpirar pode evitar apertar mãos ou comer alimentos picantes; e um com medo de ruborizar pode evitar desempenho em público, luzes brilhantes ou discussão sobre tópicos íntimos. Alguns têm medo e evitam urinar em banheiros públicos quando outras pessoas estão presentes (i.e., parurese, ou “síndrome da bexiga tímida”)121. As situações sociais quase sempre provocam medo ou ansiedade [...]. Assim, um indivíduo
121
Parurese, também chamada de bexiga tímida, é um transtorno psicológico em que o parurético não consegue urinar na presença real ou imaginária de outras pessoas. Afeta mais os homens, porém as mulheres podem ser afetadas também. A Parurese varia de pessoa para pessoa, mas há certas coisas em comum. Ocorre principalmente em banheiros públicos, mas pode ocorrer na casa de amigos ou familiares ou mesmo na própria casa quando há alguém perto do banheiro enquanto o parurético está lá. Há várias intensidades, desde leve, quando consegue urinar em banheiros públicos com certas condições, à grave quando a pessoa só pode urinar quando estiver sozinha em casa. Uma pessoa que de vez em quando tem que esperar dois ou três segundos para conseguir urinar não tem Parurese. A Parurese é uma condição ao longo da vida caracterizada pela hesitação excessiva ou uma incapacidade de urinar. A maioria dos paruréticos exigem certo conforto pessoal para conseguir urinar. Em uma situação particular, onde há ruídos, odores, falta de privacidade visual, muitas pessoas no banheiro ou pressa para urinar, a Parurese entra em ação, pois geralmente o parurético imagina que há alguém esperando, ouvindo enquanto urina ou zombando dele. (Wikipedia)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
119
que fica ansioso apenas ocasionalmente em situação(ões) social(is) não seria diagnosticado com transtorno de ansiedade social. Entretanto, o grau e o tipo de medo e ansiedade podem variar (p. ex., ansiedade antecipatória, ataque de pânico) em diferentes ocasiões. A ansiedade antecipatória" "pode ocorrer às vezes muito antes das próximas situações (p. ex., preocuparse todos os dias durante semanas antes de participar de um evento social, repetir antecipadamente um discurso por dias). Em crianças, o medo ou ansiedade pode ser expresso por choro, ataques de raiva, imobilização, comportamento de agarrar-se ou encolher-se em situações sociais. Os indivíduos com frequência evitarão as situações sociais temidas ou então as arão com intenso medo ou ansiedade. A esquiva pode ser abrangente (p. ex., não ir a festas, recusar a escola) ou sutil (p. ex., preparando excessivamente o texto de um discurso, desviando a atenção para os outros, limitando o contato visual). O medo ou ansiedade é julgado desproporcional ao risco real de ser avaliado negativamente ou às consequências dessa avaliação negativa. Às vezes, a ansiedade pode não ser julgada excessiva porque está relacionada a um perigo real (p. ex., ser alvo de bullying ou atormentado pelos outros). No entanto, os indivíduos com transtorno de ansiedade social com frequência superestimam as consequências negativas das situações sociais, e, assim, o julgamento quanto a ser desproporcional é feito pelo clínico. O contexto sociocultural do indivíduo precisa ser levado em conta quando está sendo feito esse julgamento. Por exemplo, em certas culturas, o comportamento que de outra forma parece socialmente ansioso pode ser considerado apropriado em situações sociais (p. ex., pode ser visto como um sinal de respeito). A duração do transtorno é geralmente de pelo menos seis meses [...]. Esse limiar de duração ajuda a diferenciar o transtorno dos medos sociais transitórios comuns, particularmente entre crianças e na comunidade. Contudo, o critério de duração deve ser usado como um guia geral, com a possibilidade de algum grau de flexibilidade. O medo, a ansiedade e a esquiva devem interferir significativamente na rotina normal do indivíduo, no funcionamento “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
120
profissional ou acadêmico ou em atividades sociais ou relacionamentos ou deve causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes de sua vida [...]. Por exemplo, alguém que tem medo de falar em público não receberia um diagnóstico de transtorno de ansiedade social se essa atividade não é rotineiramente encontrada no trabalho ou nas tarefas de classe e se o indivíduo não tem um sofrimento significativo a respeito disso. Entretanto, se evita ou ignora o trabalho ou educação que realmente deseja ter devido aos sintomas de ansiedade social, [o critério] é satisfeito. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Os indivíduos com transtorno de ansiedade social podem ser inadequadamente assertivos ou muito submissos ou, com menos frequência, muito controladores da conversa. Podem mostrar uma postura corporal excessivamente rígida ou contato visual inadequado ou falar com voz extremamente suave. Podem ser tímidos ou retraídos e ser menos abertos em conversas e revelar pouco a seu respeito. Podem procurar emprego em atividades que não exigem contato social, embora esse não seja o caso para indivíduos com transtorno de ansiedade social somente desempenho. Podem sair da casa dos pais mais tarde. Os homens podem retardar o casamento e a paternidade, enquanto as mulheres que gostariam de trabalhar fora de casa podem viver uma vida inteira como donas de casa. A automedicação com substâncias é comum (p. ex., beber antes de ir a uma festa). A ansiedade social entre adultos mais velhos também pode incluir a exacerbação de sintomas de doenças médicas, como tremor aumentado ou taquicardia. O rubor é a resposta física característica do transtorno de ansiedade social. Transtorno de ansiedade generalizada CID-10 Ansiedade generalizada e persistente que não ocorre exclusivamente, nem mesmo de modo preferencial, numa situação determinada (a ansiedade é ‘flutuante’). Os sintomas essenciais são variáveis, mas compreendem
DSM-5 As características essenciais do transtorno de ansiedade generalizada são ansiedade e preocupação excessivas (expectativa apreensiva) acerca de diversos eventos ou atividades. A intensidade, duração ou frequência
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
121
da ansiedade e preocupação é desproporcional à probabilidade real ou ao impacto do evento antecipado. O indivíduo tem dificuldade de controlar a preocupação e de evitar que pensamentos preocupantes interfiram na atenção às tarefas em questão. Os adultos com transtorno de ansiedade generalizada frequentemente se preocupam com circunstâncias diárias da rotina de vida, como possíveis responsabilidades no trabalho, saúde e finanças, a saúde dos membros da família, desgraças com seus filhos ou questões menores (p. ex., realizar as tarefas domésticas ou se atrasar para compromissos). As crianças com o transtorno tendem a se preocupar excessivamente com sua competência ou a qualidade de seu desempenho. Durante o curso do transtorno, o foco da preocupação pode mudar de uma preocupação para outra. Várias características distinguem o transtorno de ansiedade generalizada da ansiedade não patológica. Primeiro, as preocupações associadas ao transtorno de ansiedade generalizada são excessivas e geralmente interferem de forma significativa no funcionamento psicossocial, enquanto as preocupações da vida diária não são excessivas e são percebidas como mais manejáveis, podendo ser adiadas quando surgem questões mais prementes. Segundo, as preocupações associadas ao transtorno de ansiedade generalizada são mais disseminadas, intensas e angustiantes; têm maior duração; e frequentemente ocorrem sem precipitantes. Quanto maior a variação das circunstâncias de vida sobre as quais a pessoa se preocupa (p. ex., finanças, segurança dos filhos, desempenho no trabalho), mais provavelmente seus sintomas satisfazem os critérios para transtorno de ansiedade generalizada. Terceiro, as preocupações diárias são muito menos prováveis de ser acompanhadas por sintomas físicos (p. ex., inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele). Os indivíduos com transtorno de ansiedade generalizada relatam sofrimento subjetivo devido à preocupação constante e prejuízo relacionado ao funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes de sua vida. A ansiedade e a preocupação são acompanhadas por pelo menos três dos seguintes sintomas “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
nervosismo persistente, tremores, tensão muscular, transpiração, sensação de vazio na cabeça, palpitações, tonturas e desconforto epigástrico. Medos de que o paciente ou um de seus próximos irá brevemente ficar doente ou sofrer um acidente são frequentemente expressos.
122
adicionais: inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele, fatigabilidade, dificuldade de concentrar-se ou sensações de “branco” na mente, irritabilidade, tensão muscular, perturbação do sono, embora apenas um sintoma adicional seja exigido para crianças. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Pode haver tremores, contrações, abalos e dores musculares, nervosismo ou irritabilidade associados a tensão muscular. Muitos indivíduos com transtorno de ansiedade generalizada também experimentam sintomas somáticos (p. ex., sudorese, náusea, diarreia) e uma resposta de sobres- salto exagerada. Sintomas de excitabilidade autonômica aumentada (p. ex., batimentos cardíacos acelerados, falta de ar, tonturas) são menos proeminentes no transtorno de ansiedade generali- zada do que em outros transtornos de ansiedade, tais como o transtorno de pânico. Outras con- dições que podem estar associadas ao estresse (p. ex., síndrome do intestino irritável, cefaleia) frequentemente acompanham o transtorno. Transtornos relacionados a traumas e a estressores Transtorno de Estresse Pós-traumático CID-10 DSM-5 Este transtorno constitui uma resposta Obs.: No DSM-5 esse transtorno não é mais retardada ou protraída a uma situação ou classificado como Transtorno de Ansiedade e evento estressante (de curta ou longa duração), sim como um Transtornos Relacionados a de natureza excepcionalmente ameaçadora ou Trauma e a Estressores. catastrófica, e que provocaria sintomas evidentes de perturbação na maioria dos A característica essencial do transtorno de indivíduos. Fatores predisponentes, tais como estresse pós-traumático é o desenvolvimento de certos traços de personalidade (por exemplo sintomas característicos após a exposição a um compulsiva, astênica) ou antecedentes do tipo ou mais eventos traumáticos. [...] A neurótico, podem diminuir o limiar para a apresentação clínica do TEPT varia. Em alguns ocorrência da síndrome ou agravar sua indivíduos, sintomas de revivência do medo, evolução; tais fatores, contudo, não são emocionais e comportamentais podem necessários ou suficientes para explicar a predominar. Em outros, estados de humor ocorrência da síndrome. Os sintomas típicos anedônicos ou disfóricos e cognições negativas incluem a revivescência repetida do evento podem ser mais perturbadores. Em alguns traumático sob a forma de lembranças outros, a excitação e sintomas reativos invasivas ("flashbacks"), de sonhos ou de externalizantes são proeminentes, enquanto em pesadelos; ocorrem num contexto durável de outros, sintomas dissociativos predominam. Por "anestesia psíquica" e de embotamento fim, algumas pessoas exibem combinações emocional, de retraimento com relação aos desses padrões de sintomas. outros, insensibilidade ao ambiente, anedonia, Os eventos traumáticos [...] sofridos diretamente “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
123
e de evitação de atividades ou de situações que possam despertar a lembrança do traumatismo. Os sintomas precedentes se acompanham habitualmente de uma hiperatividade neurovegetativa, com hipervigilância, estado de alerta e insônia, associadas frequentemente a uma ansiedade, depressão ou ideação suicida. O período que separa a ocorrência do traumatismo do transtorno pode variar de algumas semanas a alguns meses. A evolução é flutuante, mas se faz para a cura na maioria dos casos. Em uma pequena proporção de casos, o transtorno pode apresentar uma evolução crônica durante numerosos anos e levar a uma alteração duradoura da personalidade.
incluem, mas não se limitam a, exposição a guerra como combatente ou civil, ameaça ou ocorrência real de agressão física (ataque físico, assalto, furto, abuso físico infantil), ameaça ou ocorrência real de violência sexual (p. ex., penetração sexual forçada, penetração sexual facilitada por álcool/droga, contato sexual abusivo, abuso sexual sem contato, tráfico sexual), sequestro, ser mantido refém, ataque terrorista, tortura, encarceramento como prisioneiro de guerra, desastres naturais ou perpetrados pelo homem e acidentes automobilísticos graves. Para crianças, eventos sexualmente violentos podem incluir experiências sexuais inapropriadas em termos do estágio de desenvolvimento sem violência física ou lesão. Uma doença potencialmente fatal ou uma condição clínica debilitante não são consideradas necessariamente eventos traumáticos. Incidentes médicos que se qualificam como eventos traumáticos incluem eventos súbitos e catastróficos (p. ex., despertar durante uma cirurgia, choque anafilático122). Eventos testemunhados incluem, mas não se limitam a, observação de ameça de lesão ou lesão real grave, morte natural, abuso físico ou sexual de outra pessoa em virtude de agressão violenta, violência doméstica, acidente, guerra ou desastre ou catástrofe médica envolvendo um filho (p. ex., uma hemorragia potencialmente fatal). A exposição indireta por ter conhecimento do evento está limitada a experiências que afetam parentes ou amigos próximos e experiências violentas ou acidentais (p. ex., morte por causas naturais não se qualifica). Esses eventos incluem ataque pessoal violento, suicídio, acidente grave e lesão grave. O transtorno pode ser especialmente grave ou duradouro quando o estressor é interpessoal e intencional (p. ex., tortura, violência sexual). O evento traumático pode ser revivenciado de diversas maneiras. É comum que a pessoa tenha lembranças recorrentes, involuntárias e intrusivas do evento [...]. As lembranças intrusivas no TEPT são distintas das ruminações depressivas no sentido de que só se aplicam a
122
O choque anafilático, ou anafilaxia, é uma reação alérgica, de hipersensibilidade imediata e severa, que afeta o corpo todo. A sua manifestação mais grave é quando provoca inchaço e obstrução de vias aéreas superiores e/ou hipotensão, que pode ser fatal. A falta de ar pode ser fatal, a menos que o indivíduo receba o tratamento de emergência prontamente.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
124
recordações angustiantes involuntárias e intrusivas. A ênfase é nas lembranças recorrentes do evento, as quais normalmente incluem componentes comportamentais sensoriais, emocionais ou fisiológicos. Um sintoma comum de revivência são sonhos angustiantes que repetem o evento em si ou são representativos ou relacionados tematicamente às ameaças principais envolvidas no evento traumático [...]. A pessoa pode sofrer estados dissociativos que duram desde alguns segundos até várias horas ou até mesmo dias, durante os quais aspectos do evento são revividos e a pessoa se comporta como se o evento estivesse ocorrendo naquele momento [...]. Esses eventos ocorrem em um continuum desde intrusões visuais ou sensoriais breves de parte do evento traumático sem perda de senso de realidade até a perda total de percepção do ambiente ao redor. Esses episódios, conhecidos como flashbacks, são geralmente breves, mas "podem estar associados a sofrimento prolongado e excitação elevada. No caso de crianças pequenas, a reencenação de eventos relacionados ao trauma pode aparecer na brincadeira ou em estados dissociativos. Frequentemente ocorre sofrimento psicológico intenso [...] ou reatividade fisiológica [...] quando o indivíduo é exposto a eventos precipitadores que se assemelham a ou simbolizam algum aspecto do evento traumático (p. ex., dias ventosos depois de um furacão; ver alguém parecido com o criminoso). O fator desencadeante pode ser uma sensação física (p. ex., tontura para sobreviventes de traumatismo craniano; frequência cardíaca acelerada para uma criança previamente traumatizada), particularmente para indivíduos com quadros altamente somáticos. Estímulos associados ao trauma são evitados de maneira persistente (p. ex., sempre ou quase sempre). O indivíduo costuma fazer esforços deliberados para evitar pensamentos, lembranças, sentimentos ou diálogos a respeito do evento traumático (p. ex., utilizando técnicas de distração para evitar recordações internas) [...] e para evitar atividades, objetos, situações ou pessoas que desencadeiem lembranças do evento [...]. Alterações negativas em cognições ou no humor associadas ao evento surgem ou pioram depois da exposição a ele. Essas alterações negativas “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
125
podem assumir várias formas, incluindo incapacidade de recordar algum aspecto importante do evento traumático; esse tipo de amnésia deve-se essencialmente a amnésia dissociativa, e não a lesão craniana, álcool ou drogas [...]. Outra forma são expectativas negativas exageradas e persistentes (i.e., sempre ou quase sempre) a respeito de aspectos importantes da vida que se aplicam à vítima, a outras pessoas ou ao futuro (p. ex., “Sempre tive pouco discernimento”; “Não se pode confiar em figuras de autoridade”) que podem se manifestar como uma mudança negativa na identidade percebida desde o trauma (p. ex., “Nunca mais poderei confiar em alguém”; [...]). Indivíduos com TEPT podem ter cognições errôneas persistentes a respeito das causas do evento traumático que as levam a se culpar ou a culpar os outros (p. ex., “É culpa minha ter sido abusada pelo meu tio”) [...]. Um estado de humor negativo persistente (p. ex., medo, horror, raiva, culpa, ver- gonha) surge ou piora depois da exposição ao evento [...]. O indivíduo pode apresentar interesse ou participação notadamente menor em atividades que antes eram prazerosas [...], sentindo-se alheio ou isolado de outras pessoas [...], ou incapacidade persistente de sentir emoções positivas (especialmente felicidade, alegria, satisfação ou emoções associadas a intimidade, ternura e sexualidade) [...]. Indivíduos com TEPT podem irritar-se facilmente e até mesmo adotar um comportamento físico e/ou verbal agressivo com pouca ou nenhuma provocação (p. ex., gritar com os outros, envolver-se em brigas, destruir objetos) [...]. Eles podem também adotar um comportamento imprudente ou autodestrutivo, como direção perigosa, uso excessivo de álcool ou drogas, ou um comportamento automutilante ou suicida [...]. O TEPT é com frequência caracterizado por hipersensibilidade a ameaças potenciais, incluindo as relacionadas à experiência traumática (p. ex., depois de um acidente automobilístico, ficar especialmente sensível à ameaça potencial representada por carros ou caminhões) e as não relacionadas ao evento traumático (p. ex., medo de sofrer infarto agudo do miocárdio) [...]. Indivíduos com TEPT podem mostrar-se bastante reativos a estímulos inesperados, exibindo uma resposta de “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
126
sobressalto intensa ou tensão/nervosismo a ruídos elevados ou movimentos inesperados (p. ex., pulando de susto em resposta ao toque de um telefone) [...]. Dificuldades de concentração, incluindo dificuldade para lembrar de eventos diários (p. ex., esquecer o número do próprio telefone) ou participar de tarefas que exigem concentração (p. ex., acompanhar uma conversa por um determinado período), são comumente relatadas [...]. Problemas para iniciar e manter o sono são comuns e podem estar associados a pesadelos e preocupações com a segurança ou a hiperexcitação generalizada, que interfere no sono adequado [...]. Alguns indivíduos também sofrem sintomas dissociativos persistentes de distanciamento do próprio corpo (despersonalização) ou do mundo ao redor (desrealização); isso se reflete no especificador “com sintomas dissociativos”. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A regressão do desenvolvimento, como a perda da fala em crianças pequenas, pode ocorrer. Pseudoalucinações auditivas, como ter a experiência sensorial de escutar seus próprios pensamentos ditos em uma voz ou em vozes diferentes, bem como ideias paranoides, podem estar presentes. Depois de eventos traumáticos graves, prolongados e repetidos (p. ex., abuso infantil, tortura), o indivíduo pode apresentar também dificuldades na regulagem de emoções ou para manter rela- cionamentos interpessoais estáveis, ou ainda sintomas dissociativos. Quando o evento traumático produz morte violenta, sintomas de luto complicado e TEPT podem estar presentes. Transtornos de ajustamento (ou de adaptação) CID-10 Esta categoria difere das outras na medida que sua definição não repousa exclusivamente sobre a sintomatologia e a evolução, mas igualmente sobre a existência de um ou outro dos dois fatores causais seguintes: um acontecimento particularmente estressante desencadeia uma reação de "stress" aguda, ou uma alteração particularmente marcante na vida do sujeito, que comporta consequências desagradáveis e duradouras e levam a um
DSM-5 A presença de sintomas emocionais ou comportamentais em resposta a um estressor identificável é o aspecto essencial dos transtornos de adaptação [...]. O estressor pode ser um único evento (p. ex., o término de um relacionamento afetivo), ou pode haver múltiplos estressores (p. ex., dificuldades profissionais acentuadas e problemas conjugais). Os estressores podem ser recorrentes (p. ex., associados a crises profissionais cíclicas,
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
127
transtorno de adaptação. Embora fatores de "stress" psicossociais ("life events") relativamente pouco graves possam precipitar a ocorrência de um grande número de transtornos classificados em outra parte neste capítulo ou influenciar-lhes o quadro clínico, nem sempre é possível atribuir-lhes um papel etiológico, quanto mais que é necessário levar em consideração fatores de vulnerabilidade, frequentemente idiossincráticos, próprios de cada indivíduo; em outros termos, estes fatores não são nem necessários nem suficientes para explicar a ocorrência e a natureza do transtorno observado. Em contraste, para os transtornos reunidos aqui sob F43, ite-se que sua ocorrência é sempre a consequência direta de um "stress" agudo importante ou de um traumatismo persistente. O acontecimento estressante ou as circunstâncias penosas persistentes constituem o fator causal primário e essencial, na ausência do qual o transtorno não teria ocorrido. Os transtornos reunidos neste capítulo podem assim ser considerados como respostas inadaptadas a um "stress" grave ou persistente, na medida em que eles interferem com mecanismos adaptativos eficazes e entravam assim o funcionamento social.
relacionamentos sexuais insatisfatórios) ou contínuos (p. ex., uma doença dolorosa persistente com incapacidade crescente, morar em área de alta criminalidade) e podem afetar um único indivíduo ou uma família inteira, um grupo maior ou uma comunidade (p. ex., um desastre natural). Alguns estressores podem acompanhar eventos específicos do desenvolvimento (p. ex., ir para a escola, deixar a casa dos pais, voltar para a casa dos pais, casar-se, tornar-se pai/mãe, fracassar em metas profissionais, aposentadoria). Transtornos de adaptação podem ser diagnosticados após a morte de um ente querido quando a intensidade, a qualidade e a persistência das reações de luto excedem o que se esperaria normalmente, quando normas culturais, religiosas e apropriadas à idade são consideradas. Um conjunto mais específico de sintomas relacionados ao luto foi designado como transtorno do luto complexo persistente. Os transtornos de adaptação estão associados a um risco maior de tentativas e consumação de suicídio.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
128
Outros Transtornos Específicos Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) CID-10 Transtorno caracterizado essencialmente por ideias obsessivas ou por comportamentos compulsivos recorrentes. As ideias obsessivas são pensamentos, representações ou impulsos, que se intrometem na consciência do sujeito de modo repetitivo e estereotipado. Em regra geral, elas perturbam muito o sujeito, o qual tenta, frequentemente resistir-lhes, mas sem sucesso. O sujeito reconhece, entretanto, que se trata de seus próprios pensamentos, mas estranhos à sua vontade e em geral desprazeirosos. Os comportamentos e os rituais compulsivos são atividades estereotipadas repetitivas. O sujeito não tira prazer direto algum da realização destes atos os quais, por outro lado, não levam à realização de tarefas úteis por si mesmas. O comportamento compulsivo tem por finalidade prevenir algum evento objetivamente improvável, frequentemente implicando dano ao sujeito ou causado por ele, que ele(a) teme que possa ocorrer. O sujeito reconhece habitualmente o absurdo e a inutilidade de seu comportamento e faz esforços repetidos para resistir-lhes. O transtorno se acompanha quase sempre de ansiedade. Esta ansiedade se agrava quando o sujeito tenta resistir à sua atividade compulsiva.
DSM-5 O sintoma característico do TOC é a presença de obsessões e compulsões (Critério A). Obsessões são pensamentos repetitivos e persistentes (p. ex., de contaminação), imagens (p. ex., de cenas violentas ou horrorizantes) ou impulsos (p. ex., apunhalar alguém). É importante observar que as obsessões não são prazerosas ou experimentadas como voluntárias: são intrusivas e indesejadas e causam acentuado sofrimento ou ansiedade na maioria das pessoas. O indivíduo tenta ignorá-las ou suprimi-las (p. ex., evitando os desencadeantes ou usando a supressão do pensamento) ou neutralizá-las com outro pensamento ou ação (p. ex., executando uma compulsão). Compulsões (ou rituais) são comportamentos repetitivos (p. ex., lavar, verificar) ou atos mentais (p. ex., contar, repetir palavras em silêncio) que o indivíduo se sente compelido a executar em resposta a uma obsessão ou de acordo com regras que devem ser aplicadas rigidamente. A maioria das pessoas com TOC tem obsessões [pensamentos] e compulsões [comportamentos]. As compulsões são geralmente executadas em resposta a uma obsessão (p. ex., pensamentos de contaminação levando a rituais de lavagem ou pensamentos de que alguma coisa está incorreta levando à repetição de rituais até parecer “direita” [just right)]. O objetivo é reduzir o sofrimento desencadeado pelas obsessões ou evitar um evento temido (p. ex., ficar doente). Contudo, essas compulsões não estão conectadas de forma realista ao evento temido (p. ex., organizar itens simetricamente para evitar danos a uma pessoa amada) ou são claramente excessivas (p. ex., tomar banho durante horas todos os dias). As compulsões não são executadas por prazer, embora alguns indivíduos experimentem alívio da ansiedade ou sofrimento. O Critério B enfatiza que as obsessões e compulsões devem tomar tempo (p. ex., mais de uma hora por dia) ou causar sofrimento ou prejuízo clinicamente significativos para justificar um diagnóstico de TOC. Esse critério ajuda a distinguir o transtorno dos pensamentos intrusivos ocasionais ou
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
129
comportamentos repetitivos que são comuns na população em geral (p. ex., verificar duas vezes se a porta está trancada). A frequência e a gravidade das obsessões e compulsões variam entre os indivíduos com TOC (p. ex., alguns têm sintomas leves a moderados, ando 1 a 3 horas por dia com obsessões ou executando compulsões, enquanto outros têm pensamentos intrusivos ou compulsões quase constantes que podem ser incapacitantes). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O conteúdo específico das obsessões e compulsões varia entre os indivíduos. Entretanto, certos temas, ou dimensões, são comuns, incluindo os de limpeza (obsessões por contaminação e compulsões por limpeza); simetria (obsessões por simetria e compulsões por repetição, organização e contagem); pensamentos proibidos ou tabus (p. ex., obsessões agressivas, sexuais ou religiosas e compulsões relacionadas); e danos (p. ex., medo de causar danos a si mesmo ou a outros e compulsões de verificação). Algumas pessoas também têm dificuldades em descartar e acumulam objetos como uma consequência de obsessões e compulsões típicas, como o medo de causar danos a outras pessoas. Esses temas ocorrem em diferentes culturas, são relativamente consistentes ao longo do tempo em adultos com o transtorno e podem estar associados a diferentes substratos neurais. É importante observar que os indivíduos com frequência têm sintomas em mais de uma dimensão. As pessoas com TOC experimentam uma gama de respostas afetivas quando confrontadas com situações que desencadeiam obsessões e compulsões. Por exemplo, muitos indivíduos experimentam ansiedade acentuada que pode incluir ataques de pânico recorrentes. Outros relatam fortes sentimentos de nojo. Enquanto executam as compulsões, algumas pessoas relatam uma angustiante sensação de “incompletude” ou inquietação até que as coisas pareçam ou soem “direitas” (just right). É comum que indivíduos com o transtorno evitem pessoas, lugares e coisas que desencadeiam obsessões e compulsões. Por exemplo, indivíduos com preocupações com contaminação podem evitar situações públicas “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
130
(p. ex., restaurantes, banheiros públicos) para reduzir a exposição aos contaminantes temidos; pessoas com pensamentos intrusivos sobre causar danos podem evitar as interações sociais.123 Outros tipos de Transtornos Transtorno Dismórfico Corporal CID-10 A CID-10 não descreve isoladamente o TDC, colocando-a no item que fala sobre Transtorno Hipocondríaco (F45.22). “A característica essencial deste transtorno é uma preocupação persistente com a presença eventual de um ou de vários transtornos somáticos graves e progressivos. Os pacientes manifestam queixas somáticas persistentes ou uma preocupação duradoura com a sua aparência física. Sensações e sinais físicos normais ou triviais são frequentemente interpretados pelo sujeito como anormais ou perturbadores. A atenção do sujeito se concentra em geral em um ou dois órgãos ou sistemas. Existem frequentemente depressão e ansiedade importantes, e que podem justificar um diagnóstico suplementar. Dismorfofobia (corporal) (não-delirante) Hipocondria Neurose hipocondríaca Nosofobia Exclui: dismorfofobia delirante (F22.8) idéias delirantes persistentes sobre o funcionamento ou a forma do corpo (F22.-)
123
DSM-5 Os indivíduos com transtorno dismórfico corporal (anteriormente conhecido como dismorfofobia) são preocupados com um ou mais defeitos ou falhas percebidas em sua aparência física, que acreditam parecer feia, sem atrativos, anormal ou deformada [...]. As falhas percebidas não são observáveis ou parecem apenas leves para outros indivíduos. As preocupações variam desde parecer “sem atrativos” ou “não adequado” até parecer “hediondo” ou “como um monstro”. Podem focar em uma ou mais áreas do corpo, mais comumente a pele (p. ex., percepção de acne, cicatrizes, rugas, palidez), os pelos (p. ex., cabelo “escasso” ou pelo corporal ou facial “excessivo”) ou o nariz (p. ex., o tamanho ou formato). No entanto, qualquer área do corpo pode ser foco de preocupação (p. ex., olhos, dentes, peso, estômago, mamas, pernas, tamanho ou formato do rosto, lábios, queixo, sobrancelhas, genitais). Algumas pessoas são preocupadas com a percepção de assimetria de áreas corporais. As preocupações são intrusivas, indesejadas, tomam tempo (ocorrendo, em média, de 3 a 8 horas por dia) e geralmente são difíceis de resistir ou controlar. Os comportamentos repetitivos ou atos mentais excessivos (p. ex., comparações) são executados em resposta à preocupação [...]. O indivíduo se sente compelido a executar esses comportamentos, os quais não são prazerosos e podem aumentar a ansiedade e a disforia. Eles geralmente tomam tempo e são difíceis de resistir ou controlar. Os comportamentos comuns são comparar a própria aparência com a de outros indivíduos; verificar repetidamente os defeitos percebidos em espelhos ou em outras superfícies refletoras ou examiná-los diretamente; arrumar-se de maneira excessiva
As chaves e os destaques são do professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
131
(p. ex., penteando, barbeando, depilando ou arrancando os pelos); camuflar (p. ex., aplicando maquiagem repetidamente ou cobrindo as áreas em questão com coisas como chapéu, roupas, maquiagem ou cabelo); procurar tranquilização acerca do aspecto das falhas percebidas; tocar as áreas em questão para verificá-las; fazer exercícios ou levantamento de peso em excesso; e procurar procedimentos estéticos. Alguns indivíduos se bronzeiam de forma excessiva (p. ex., para escurecer a pele “pálida” ou diminuir a acne percebida), mudam constantemente de roupa (p. ex., para camuflar os defeitos percebidos) ou compram de maneira compulsiva (p. ex., produtos de beleza). Arrancar a pele compulsivamente com a intenção de melhorar os defeitos percebidos é comum e pode causar lesões cutâneas, infecções ou ruptura de vasos sanguíneos. A preocupação deve causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo [...]; geralmente ambos estão presentes. O transtorno dismórfico corporal deve ser diferenciado de um transtorno alimentar. A dismorfia muscular [vigorexia], uma forma de transtorno dismórfico corporal que ocorre quase exclusivamente no sexo masculino, consiste na preocupação com a ideia de que o próprio corpo é muito pequeno ou insuficientemente magro ou musculoso. Os indivíduos com essa forma de transtorno, na verdade, têm uma aparência corporal normal ou são ainda mais musculosos. Eles também podem ser preocupados com outras áreas do corpo, como a pele ou o cabelo. A maioria (mas não todos) faz dieta, exercícios e/ou levanta pesos excessivamente, às vezes causando danos ao corpo. Alguns usam esteroides anabolizantes perigosos e outras substâncias para tentar deixar seu corpo maior e mais musculoso. O transtorno dismórfico corporal por procuração é uma forma de transtorno dismórfico corporal em que os indivíduos são preocupados com defeitos que eles percebem na aparência de outra pessoa. O insight relativo às crenças do transtorno dismórfico corporal pode variar de bom até ausente/delirante (i.e., crenças delirantes que consistem na completa convicção de que a visão “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
132
que o indivíduo tem da sua aparência é precisa e não distorcida). Em média, o insight é pobre; um terço ou mais dos indivíduos atualmente tem crenças delirantes de transtorno dismórfico corporal. Aqueles com transtorno dismórfico corporal delirante tendem a ter maior morbidade em algumas áreas (suicidalidade), mas isso parece ser justificado por sua tendência a ter sintomas mais graves. [...] Muitos indivíduos com transtorno dismórfico corporal têm ideias ou delírios de referência, acreditando que outras pessoas prestam especial atenção neles ou caçoam deles devido a sua aparência. O transtorno dismórfico corporal está associado a altos níveis de ansiedade, ansiedade social, esquiva social, humor deprimido, neuroticismo e perfeccionismo, bem como a baixa extroversão e baixa autoestima. Muitos indivíduos têm vergonha da sua aparência e do foco excessivo em seu visual e têm relutância em revelar suas preocupações aos outros. A maioria dessas pessoas faz tratamento estético para tentar melhorar seus defeitos percebidos. Tratamento dermatológico e cirurgia são mais comuns, mas qualquer tipo de tratamento (p. ex., dentário, eletrólise) pode ser feito. Às vezes, os indivíduos podem realizar cirurgia em si mesmos. O transtorno dismórfico corporal parece ter uma resposta pobre a tais tratamentos e por vezes piora. Algumas pessoas tomam providências legais ou são violentas com o clínico porque estão insatisfeitas com o resultado estético. O transtorno dismórfico corporal foi associado a disfunção executiva e anormalidades no processamento visual, com uma propensão a analisar e codificar detalhes em vez de aspectos holísticos ou configuracionais dos estímulos visuais. Os indivíduos com esse transtorno tendem a interpretar de forma negativa e ameaçadora expressões faciais ou cenários ambíguos. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Muitos indivíduos com transtorno dismórfico corporal têm ideias ou delírios de referência, acreditando que outras pessoas prestam especial atenção neles ou caçoam deles devido a sua aparência. O transtorno dismórfico corporal está associado a altos níveis de ansiedade, ansiedade social, esquiva social, humor deprimido, “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
133
neuroticismo e perfeccionismo, bem como a baixa extroversão e baixa autoestima. Muitos indivíduos têm vergonha da sua aparência e do foco excessivo em seu visual e têm relutância em revelar suas preocupações aos outros. A maioria dessas pessoas faz tratamento estético para tentar melhorar seus defeitos percebidos. Tratamento dermatológico e cirurgia são mais comuns, mas qualquer tipo de tratamento (p. ex., dentário, eletrólise) pode ser feito. Às vezes, os indivíduos podem realizar cirurgia em si mesmos. O transtorno dismórfico corporal parece ter uma resposta pobre a tais tratamentos e por vezes piora. Algumas pessoas tomam providências legais ou são violentas com o clínico porque estão insatisfeitas com o resultado estético. O transtorno dismórfico corporal foi associado a disfunção executiva e anormalidades no processamento visual, com uma propensão a analisar e codificar detalhes em vez de aspectos holísticos ou configuracionais dos estímulos visuais. Os indivíduos com esse transtorno tendem a interpretar de forma negativa e ameaçadora expressões faciais ou cenários ambíguos. Transtornos Somatoformes ou de Sintomas Somáticos Transtorno de somatização CID-10 DSM-5 Transtorno caracterizado essencialmente pela Indivíduos com transtorno de sintomas presença de sintomas físicos, múltiplos, somáticos geralmente apresentam sintomas recorrentes e variáveis no tempo, persistindo somáticos múltiplos e atuais que provocam ao menos por dois anos. A maioria dos sofrimento ou resultam em perturbação pacientes teve uma longa e complicada história significativa da vida diária (Critério A), embora de contato tanto com a assistência médica às vezes apenas um sintoma grave, mais primária quanto especializada durante as quais comumente dor, esteja presente. Os sintomas muitas investigações negativas ou cirurgias podem ser específicos (p. ex., dor localizada) ou exploratórias sem resultado podem ter sido relativamente inespecíficos (p. ex., fadiga). Por realizadas. vezes representam sensações ou desconfortos Os sintomas podem estar referidos a qualquer corporais normais que geralmente não parte ou sistema do corpo. O curso da doença é significam doença grave. Sintomas somáticos crônico e flutuante, e frequentemente se sem uma explicação médica evidente não são associa a uma alteração do comportamento suficientes para fazer esse diagnóstico. O social, interpessoal e familiar. Quando o sofrimento do indivíduo é autêntico, seja ou não transtorno tem uma duração mais breve (menos explicado em termos médicos. de dois anos) ou quando ele se caracteriza por Os sintomas podem ou não estar associados a sintomas menos evidentes, deve-se fazer o uma outra condição médica. Os diagnósticos de diagnóstico de transtorno somatoforme transtorno de sintomas somáticos e uma doença indiferenciado (F45.1). médica concomitante não são mutuamente “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
134
excludentes e com frequência ocorrem em conjunto. Por exemplo, um indivíduo pode tornar-se gravemente incapacitado por sintomas do transtorno de sintomas somáticos depois de um infarto do miocárdio sem complicações mesmo se o infarto em si não resultar em nenhuma incapacidade. Se outra condição médica ou o alto risco de desenvolver uma estiver presente (p. ex., forte história familiar), os pensamentos, sentimentos e comportamentos associados a essa condição são excessivos (Critério B). Indivíduos com transtorno de sintomas somáticos tendem a manifestar níveis muito elevados de preocupação a respeito de doenças (Critério B). Eles avaliam seus sintomas corporais como indevidamente ameaçadores, nocivos ou problemáticos e com frequência pensam o pior a respeito da própria saúde. Mesmo quando há evidência do contrário, alguns pacientes ainda temem a gravidade médica de seus sintomas. No transtorno de sintomas somáticos grave, as preocupações acerca da saúde podem assumir um papel central na vida do indivíduo, tornando-se um traço da sua identidade e dominando as relações interpessoais. Os indivíduos geralmente sentem angústia, a qual é sobretudo focada em sintomas somáticos e em seu significado. Quando questionados diretamente a respeito de seu sofrimento, alguns o descrevem como associado a outros aspectos de suas vidas, enquanto outros negam qualquer fonte de sofrimento que não os sintomas somáticos. A qualidade de vida relacionada à saúde é com frequência prejudicada, tanto física quanto mentalmente. No transtorno de sintomas somáticos grave, o prejuízo é marcante e, quando persistente, pode levar à invalidez. Há, com frequência, alto nível de utilização de serviços médicos, o que raramente alivia as preocupações do indivíduo. Consequentemente, o paciente pode acabar buscando múltiplos médicos para os mesmos sintomas. Esses indivíduos muitas vezes parecem não responder a intervenções médicas, e novas intervenções podem apenas exacerbar os sintomas presentes. Algumas pessoas com o transtorno parecem incomumente sensíveis aos efeitos colaterais de medicamentos; outras sentem que a avaliação e o tratamento médico foram inadequados. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
135
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Aspectos cognitivos incluem atenção focada em sintomas somáticos, atribuição de sensações corporais normais a doenças físicas (possivelmente com interpretações catastróficas), preocupação a respeito de doenças e medo de que qualquer atividade física possa prejudicar o corpo. Os aspectos comportamentais associados relevantes podem incluir verificações repetidas do corpo à procura de anormalidades, busca reiterada de ajuda e de garantias médicas e evitação de atividades físicas. Esses aspectos comportamentais são mais proeminentes no transtorno de sintomas somáticos grave persistente e geralmente estão associados a pedidos frequentes de ajuda médica para tratar diferentes sintomas somáticos, o que pode levar a consultas médicas nas quais os indivíduos estão tão concentrados em suas preocupações acerca do(s) sintoma(s) somático(s) que não é possível redirecioná-los para outros assuntos. Qualquer garantia recebida do médico no sentido de que os sintomas não são indicativos de doença física grave tende a ser fugaz e/ou é sentida pelos indivíduos como se o médico não estivesse levando a sério seus sintomas. Como o foco em sintomas somáticos é um aspecto essencial do transtorno, indivíduos com transtorno de sintomas somáticos apresentam-se normalmente a serviços de saúde geral em vez de a serviços de saúde mental. A sugestão de encaminhamento a um especialista em saúde mental pode ser recebida com surpresa ou até mesmo recusa franca por indivíduos com o transtorno. Visto que o transtorno de sintomas somáticos está associado a transtornos depressivos, existe um risco maior de suicídio. Não se sabe se o transtorno de sintomas somáticos está associado ao risco de suicídio independentemente da sua associação com transtornos depressivos.124
124
As chaves e os destaques são do professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
136
Transtorno Dissociativo ou Conversivo (Transtornos de Sintomas Neurológicos Funcionais) CID-10 DSM-5 Os transtornos dissociativos ou de conversão Muitos clínicos usam termos alternativos como se caracterizam por uma perda parcial ou “funcional” (referindo-se ao funcionamento completa das funções normais de integração anormal do sistema nervoso central) ou das lembranças, da consciência, da identidade “psicogênico” (referindo-se a uma etiologia e das sensações imediatas, e do controle dos presumida) para descrever os sintomas do movimentos corporais. transtorno conversivo (transtorno de sintomas Os diferentes tipos de transtornos dissociativos neurológicos funcionais). Nele, pode haver um tendem a desaparecer após algumas semanas ou mais sintomas de diversos tipos. Sintomas ou meses, em particular quando sua ocorrência motores incluem fraqueza ou paralisia; se associou a um acontecimento traumático. A movimentos anormais, como tremor ou evolução pode igualmente se fazer para movimentos distônicos; anormalidades da transtornos mais crônicos, em particular marcha; e postura anormal de membro. paralisias e anestesias, quando a ocorrência do Sintomas sensoriais incluem sensação cutânea, transtorno está ligada a problemas ou visão ou audição alteradas, reduzidas ou dificuldades interpessoais insolúveis. No ausentes. Episódios de tremores generalizados ado, estes transtornos eram classificados de membros com aparente prejuízo ou perda de entre diversos tipos de "histeria de conversão". consciência podem assemelhar-se a convulsões ite-se que sejam psicogênicos, dado que epiléticas (também denominadas convulsões ocorrem em relação temporal estreita com psicogênicas ou não epiléticas). Pode haver eventos traumáticos, problemas insolúveis e episódios de ausência de resposta semelhantes a ináveis, ou relações interpessoais difíceis síncope ou coma. Outros sintomas incluem (autodefesa a um trauma). Os sintomas volume da fala reduzido ou ausente traduzem frequentemente a ideia que o sujeito (disfonia/afonia), articulação alterada (disartria), se faz de uma doença física. uma sensação de “bola” ou caroço na garganta O exame médico e os exames complementares (globus) e diplopia. não permitem colocar em evidência um Embora o diagnóstico exija que o sintoma não transtorno físico (em particular neurológico) seja explicado por doença neurológica, ele não conhecido. Por outro lado, dispõe-se de deverá ser feito simplesmente porque os argumentos para pensar que a perda de uma resultados das investigações foram normais ou função é, neste transtorno, a expressão de um porque o sintoma é “bizarro”. É preciso haver conflito ou de uma necessidade psíquica. achados clínicos que demonstrem claramente Os sintomas podem ocorrer em relação incompatibilidade com doença neurológica. A temporal estreita com um "stress" psicológico inconsistência interna no exame é uma maneira e ocorrer frequentemente de modo brusco. O de demonstrar incompatibilidade (i.e., transtorno concerne unicamente quer a uma demonstrando que os sinais físicos provocados perturbação das funções físicas que estão por meio de um método de exame deixam de ser normalmente sob o controle da vontade, quer a positivos quando testados de uma maneira uma perda das sensações. diferente). Exemplos de tais achados de exame Os transtornos que implicam manifestações incluem: dolorosas ou outras sensações físicas • Sinal de Hoover, no qual a fraqueza da complexas que fazem intervir o sistema extensão do quadril retorna à força normal com nervoso autônomo, são classificados entre os flexão do quadril contralateral contra transtornos somatoformes. Há sempre a resistência. possibilidade de ocorrência numa data ulterior • Fraqueza acentuada da flexão plantar do de um transtorno físico ou psiquiátrico grave. tornozelo quando testada no leito em um Inclui-se nessa classificação: indivíduo capaz de caminhar na ponta dos pés. histeria • Achados positivos no teste diagnóstico do histeria de conversão tremor. Nesse teste, um tremor unilateral pode “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
137
reação histérica psicose histérica Acréscimos: 1)“Os doentes obtêm um ganho primário ao manterem os conflitos internos fora da sua consciência e o ganho secundário pelo fato de, ao se encontrarem doentes, conseguirem obter dispensas de obrigações e de situações sociais, ao mesmo tempo que obtêm o apoio de outras pessoas.” (Kaplan & Sadock, 2007) 2) Tipos de transtornos dissociativos: a. amnésia dissociativa – amnésia de eventos traumáticos; b. fuga dissociativa – “o indivíduo repentinamente perde todas suas recordações, inclusive de sua própria identidade. Inesperadamente essa pessoa muda-se de localidade, de cidade ou de estado, assumindo uma outra identidade, função e vida por vários dias. Durante esse período não se lembra de nada de sua vida ada nem tem consciência de que se esqueceu de algo. Durante esse período seu comportamento é compatível com as normas sociais de maneira que ninguém percebe algo errado naquela pessoa, exceto por ser um forasteiro. Vive de forma simples, um pouco recluso, com modéstia. Subitamente recobra toda a memória, excetuando-se o período enquanto viveu a fuga dissociativa. Com o restabelecimento da memória a pessoa recobra sua vida anterior. Raramente esse episódio dura meses: comumente dura dias ou horas.” (www.psicosite.com.br) c. estupor dissociativo – diminuição importante ou ausência de movimentos voluntários e da reatividade normal a estímulos externos (luz, som, tato etc); d. transe ou possessão – outra identidade atribuída a entidades espirituais; e. de movimentos – perda da capacidade de mover uma parte ou a totalidade do membro ou dos membros (afonia, disfonia psicogênicas; torcicolo histérico); f. convulsões – semelhantes àquelas presentes nas crises epilépticas, porém, normalmente
ser identificado como funcional se mudar quando o indivíduo estiver distraído dele. Isso pode ser observado pedindo-se para o paciente imitar o examinador fazendo um movimento rítmico com a mão não afetada: ocorre mudança no tremor de tal forma que ele imita ou “embarca” no ritmo da mão não afetada, ou o tremor funcional é suprimido, ou não mais assume um movimento rítmico simples. • Em ataques que se assemelham a epilepsia ou síncope (ataques não epiléticos “psicogênicos”), a presença de olhos fechados com resistência à abertura ou um eletrencefalograma simultâneo normal (embora isso por si só não exclua todas as formas de epilepsia ou síncope125). • Para sintomas visuais, um campo visual tubular (i.e., visão em túnel). É importante observar que o diagnóstico de transtorno conversivo deverá se basear no quadro clínico geral, e não em um único achado clínico. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Uma série de aspectos associados pode respaldar o diagnóstico de transtorno conversivo. Pode haver história de múltiplos sintomas somáticos semelhantes. A manifestação inicial pode estar associada a estresse ou trauma, tanto de natureza psicológica como física. A relevância etiológica potencial desse estresse ou trauma pode ser sugerida por uma relação temporal próxima. Entretanto, ainda que a avaliação quanto à presença de estresse ou trauma seja importante, o diagnóstico poderá ser feito mesmo se nenhum destes for encontrado. O transtorno conversivo está, muitas vezes, associado a sintomas dissociativos, tais como despersonalização, desrealização e amnésia dissociativa, particularmente no início do quadro sintomático ou durante os ataques. O diagnóstico de transtorno conversivo não requer o julgamento de que os sintomas não sejam intencionalmente produzidos (i.e., não simulados), já que a ausência definitiva de simulação pode não ser discernível de forma confiável. O fenômeno la belle indifférence
125
Síncope - Perda transitória da consciência com recuperação posterior completa. É produzida por irrigação cerebral insuficiente podendo ter causas variadas. Quando se associa a uma arritmia cardíaca grave, pode significar um importante risco de vida para o indivíduo. (Dicionário de Termos Médicos)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
138
sem mordedura da língua, ferimentos de queda, incontinência urinária etc. Além disso, a consciência está preservada ou substituída por um estado de estupor ou transe. g. anestesias ou perda sensorial – cegueira, surdez etc. psicogênica. A perda da sensibilidade pode ser acompanhada de parestesias (formigamentos ou ardências na pela não causadas por estímulos externos).
(i.e., ausência de preocupação acerca da natureza ou das implicações do sintoma)126 tem sido associado ao transtorno conversivo, porém não é específico dele nem deverá ser utilizado para fazer o diagnóstico. Da mesma maneira, o conceito de ganho secundário (i.e., quando os indivíduos obtêm benefícios externos como dinheiro ou isenção de responsabilidades) também não é específico do transtorno conversivo, e, particularmente na presença de evidência concreta de simulação, os diagnósticos que deverão ser considerados incluem transtorno factício ou simulação [...].
Transtorno de dor psicogênica (ou, Dor Somatoforme) CID-10 DSM-5 A queixa predominante é uma dor persistente, Vide Transtorno de Sintomas Somáticos, logo intensa e angustiante, dor esta não explicável a seguir. inteiramente por um processo fisiológico ou um transtorno físico, e ocorrendo num contexto de conflitos emocionais e de problemas psicossociais suficientemente importantes para permitir a conclusão de que os mesmos sejam a causa essencial do transtorno. O resultado é em geral uma maior atenção em e e assistência quer pessoal, quer médica. Uma dor considerada como psicogênica mas ocorrendo no curso de um transtorno depressivo ou de uma esquizofrenia não deve ser aqui classificada. Transtorno Factício (Relacionado aos Transtornos de Sintomas Somáticos) CID-10 DSM-5 Simulação repetida e coerente de sintomas, às A característica essencial do transtorno factício vezes com automutilações com o intuito de é a falsificação de sinais e sintomas médicos ou provocar sinais ou sintomas. A motivação é psicológicos em si mesmo ou em outro obscura e possivelmente de origem interna e associado a fraude identificada. Indivíduos com visa adotar um papel ou um status de doente, e transtorno factício também podem buscar frequentemente se associa a grandes tratamento para si mesmos ou para outro depois transtornos da personalidade e das relações. da indução de lesão ou doença. O diagnóstico requer a demonstração de que o indivíduo está agindo de maneira subreptícia [fraudulenta] para falsear, simular ou causar sinais ou sintomas de doença ou lesão na ausência de recompensas externas óbvias. Os métodos de falsificação de doença podem incluir exagero, fabricação, 126
La belle indifférence – Um exemplo é a pessoa que acaba de ficar cega (cegueira histérica), paralítica ou muda, e reage a essa grave incapacidade com aparente naturalidade”. Tais quadros são indicativos de conversão ou histeria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
139
simulação e indução. Se uma condição médica preexistente estiver presente, o comportamento fraudulento ou a indução de lesão fraudulenta associada à fraude faz outras pessoas verem esses indivíduos (ou outros) como mais doentes ou comprometidos, o que pode levar a intervenções médicas excessivas. Indivíduos com transtorno factício poderiam, por exemplo, relatar sentimentos de depressão e ideias suicidas como consequência da morte de um cônjuge a despeito de essa morte não ser verdadeira ou de o indivíduo não ter um cônjuge; relatar falsamente episódios de sintomas neurológicos (p. ex., convulsões, tonturas ou desmaios); manipular um exame laboratorial (p. ex., acrescentando sangue à urina) para indicar falsamente uma anormalidade; falsificar prontuários médicos para indicar uma doença; ingerir uma substância (p. ex., insulina ou varfarina) para induzir um resultado laboratorial anormal ou uma doença; ou se automutilar ou induzir doença em si mesmos ou em outra pessoa (p. ex., injetando material fecal para produzir um abscesso ou induzir sepse [putrefação]). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno factício autoimposto ou transtorno factício imposto a outro correm o risco de sofrer grande sofrimento psicológico ou prejuízo funcional ao causar danos a si mesmos e a outros. Familiares, amigos e profissionais da saúde também são muitas vezes afetados adversamente por esse comportamento. Transtornos factícios têm semelhanças com transtornos por uso de substância, transtornos alimentares, transtornos do controle de impulsos, transtorno pedofílico e alguns outros transtornos relacionados tanto à persistência do comportamento quanto aos esforços intencionais de ocultar o comportamento perturbado por meio de fraude. Enquanto alguns aspectos dos transtornos factícios representariam comportamento criminoso (p. ex., transtorno factício imposto a outro, no qual as ações do pai ou da mãe representam abuso e maus-tratos a um filho), esse comportamento criminoso e a doença mental não são mutuamente excludentes. O diagnóstico de transtorno factício enfatiza mais a identificação objetiva da falsificação de sinais e sintomas de “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
140
doença do que uma inferência acerca da intenção ou da possível motivação subjacente. Ademais, esses comportamentos, incluindo a indução de lesão ou doença, estão associados a fraude.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
141
Transtornos de Personalidade e Transtornos de Ajustamento Transtornos de personalidade borderline (fronteiriço) CID-10 DSM-5 Transtorno de personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da tendência nítida a agir de modo imprevisível personalidade borderline é um padrão difuso de sem consideração pelas consequências; humor instabilidade das relações interpessoais, da imprevisível e caprichoso; tendência a os autoimagem e de afetos e de impulsividade de cólera e uma incapacidade de controlar os acentuada que surge no começo da vida adulta e comportamentos impulsivos; tendência a está presente em vários contextos. adotar um comportamento briguento e a entrar Indivíduos com o transtorno da personalidade em conflito com os outros, particularmente borderline tentam de tudo para evitar abandono quando os atos impulsivos são contrariados ou real ou imaginado [...]. A percepção de uma censurados. separação ou rejeição iminente ou a perda de Dois tipos podem ser distintos: o tipo estrutura externa podem levar a mudanças impulsivo, caracterizado principalmente por profundas na autoimagem, no afeto, na cognição uma instabilidade emocional e falta de controle e no comportamento. Esses indivíduos são dos impulsos; e o tipo borderline, caracterizado muito sensíveis às circunstâncias ambientais. além disto por perturbações da autoimagem, do Vivenciam medos intensos de abandono e estabelecimento de projetos e das preferências experimentam raiva inadequada mesmo diante pessoais, por uma sensação crônica de de uma separação de curto prazo realística ou vacuidade, por relações interpessoais intensas e quando ocorrem mudanças inevitáveis de planos instáveis e por uma tendência a adotar um (p. ex., desespero repentino em reação ao aviso comportamento autodestrutivo, do clínico de que a consulta acabou; pânico ou compreendendo tentativas de suicídio e gestos fúria quando alguém importante para eles se suicidas. atrasa alguns minutos ou precisa cancelar um compromisso). Esses indivíduos podem achar que esse “abandono” implica que eles são “maus”. Tais medos de abandono têm relação com intolerância a ficar só e necessidade de ter outras pessoas ao redor. Os esforços desesperados para evitar o abandono podem incluir ações impulsivas como automutilação ou comportamentos suicidas, [...]. As pessoas com transtorno da personalidade borderline apresentam um padrão de relacionamentos instável e intenso [...]. Podem idealizar cuidadores ou companheiros potenciais em um primeiro ou segundo encontro, exigir ficar muito tempo juntos e partilhar os detalhes pessoais mais íntimos logo no início de um relacionamento. Entretanto, podem mudar rapidamente da idealização à desvalorização, sentindo que a outra pessoa não se importa o suficiente, não dá o suficiente e não está “presente” o suficiente. Esses indivíduos podem empatizar e cuidar de outros, mas somente com a expectativa de que o outro estará presente quando chamado, em uma espécie de troca para atender às suas próprias necessidades. Estão propensos a mudanças dramáticas e repentinas “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
142
na sua forma de enxergar os outros, que podem ser vistos alternadamente como apoiadores benevolentes ou como punidores cruéis. Tais mudanças, em geral, refletem desilusão com um cuidador cujas qualidades de dedicação haviam sido idealizadas ou cuja rejeição ou abandono era esperado. Pode ocorrer uma perturbação da identidade, caracterizada por instabilidade acentuada e persistente da imagem ou da percepção de si mesmo [...]. Há mudanças súbitas e dramáticas na autoimagem, caracterizadas por metas, valores e aspirações vocacionais inconstantes. Podem ocorrer mudanças súbitas em opiniões e planos sobre carreira profissional, identidade sexual, valores e tipos de amigos. Esses indivíduos podem repentinamente mudar de um papel de suplicantes necessitados de ajuda para o papel de vingadores justos de maus-tratos ados. Embora costumem ter uma autoimagem baseada em serem maus, indivíduos com esse transtorno podem por vezes apresentar sentimentos de que eles mesmos não existem. Tais experiências ocorrem geralmente em situações nas quais o indivíduo sente falta de relações significativas, de cuidado e de apoio. Podem demonstrar um desempenho pior em situações não estruturadas de trabalho ou estudo. Indivíduos com transtorno da personalidade borderline mostram impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente autodestrutivas [...]. Podem apostar, gastar dinheiro de forma irresponsável [prodigalidade], comer compulsivamente, abusar de substâncias, envolver-se em sexo desprotegido ou dirigir de forma imprudente. Apresentam recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento de automutilação [...]. Suicídio ocorre em 8 a 10% de tais indivíduos, sendo que atos de automutilação (p. ex., cortes ou queimaduras) e ameaças e tentativas de suicídio são muito comuns. A ideação suicida recorrente é com frequência a razão pela qual essas pessoas buscam ajuda. Esses atos autodestrutivos são geralmente precipitados por ameaças de separação ou rejeição ou por expectativas de que o indivíduo assuma maiores responsabilidades. A automutilação pode ocorrer durante experiências dissociativas e com frequência traz alívio por reafirmar a capacidade “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
143
do indivíduo de sentir ou por expiar a sensação de ser uma má pessoa. Indivíduos com o transtorno podem demonstrar instabilidade afetiva devido a acentuada reatividade do humor (p. ex., disforia episódica, irritabilidade ou ansiedade intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas raramente com duração de mais do que alguns dias) [...]. O humor disfórico basal dos que têm esse transtorno é amiúde interrompido por períodos de raiva, pânico ou desespero e é raramente aliviado por períodos de bem-estar ou satisfação. Esses episódios podem refletir a extrema reatividade do indivíduo a estresses interpessoais. Indivíduos com o transtorno podem ser perturbados por sentimentos crônicos de vazio [...]. Facilmente entediados, podem estar constantemente buscando algo para fazer. Com frequência expressam raiva inadequada e intensa ou têm dificuldades em controlá-la [...]. Podem demonstrar sarcasmo extremo, amargura persistente ou ter explosões verbais. A raiva é geralmente provocada quando um cuidador ou companheiro é visto como negligente, contido, despreocupado ou como alguém que abandona. Tais expressões de raiva costumam ser seguidas de vergonha e culpa, contribuindo para o sentimento de ter sido mau. Durante períodos de estresse extremo, podem ocorrer ideação paranoide ou sintomas dissociativos transitórios (p. ex., despersonalização) [...], embora sejam, em geral, de gravidade ou duração insuficiente para levar a um diagnóstico adicional. Esses episódios ocorrem mais frequentemente em resposta a um abandono real ou imaginado. Os sintomas tendem a ser ageiros, durando de minutos a horas. O retorno real ou percebido da dedicação do cuidador pode resultar em remissão dos sintomas. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade borderline podem ter um padrão de sabotagem pessoal no momento em que uma meta está para ser atingida (p. ex., abandono da escola logo antes da formatura; regressão grave após conversa sobre os bons rumos da terapia; destruição de um relacionamento bom exatamente quando está claro que ele pode durar). Alguns indivíduos desenvolvem “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
144
sintomas semelhantes à psicose (p. ex., alucinações, distorções da imagem corporal, ideias de referência, fenômenos hipnagógicos) em momentos de estresse. Indivíduos com esse transtorno podem se sentir mais protegidos junto a objetos transicionais (i.e., animal de estimação ou objeto inanimado) do que em relacionamentos interpessoais. Pode ocorrer morte prematura por suicídio em indivíduos com o transtorno, especialmente naqueles em que há ocorrência simultânea de transtornos depressivos ou transtornos por uso de substância. Deficiências físicas podem resultar de comportamentos de abuso autoinfligidos ou de tentativas fracassadas de suicídio. Perdas de emprego recorrentes, interrupção da educação e separação ou divórcio são comuns. Abuso físico e sexual, negligência, conflito hostil e perda parental prematura são mais comuns em histórias de infância daqueles com o transtorno da personalidade borderline. Transtornos comuns de se observar concomitantemente incluem transtornos depressivo e bipolar, transtornos por uso de substância, transtornos alimentares (sobretudo bulimia nervosa), transtorno de estresse pós-traumático e transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. O transtorno da personalidade borderline também ocorre frequentemente com outros transtornos da personalidade. Transtorno de personalidade paranoide (ou paranoica) CID-10 DSM-5 Transtorno da personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da uma sensibilidade excessiva face às personalidade paranoide é um padrão de contrariedades, recusa de perdoar os insultos, desconfiança e suspeita difusa dos outros a caráter desconfiado, tendência a distorcer os ponto de suas motivações serem interpretadas fatos interpretando as ações imparciais ou como malévolas. Esse padrão começa no início amigáveis dos outros como hostis ou de da vida adulta e está presente em contextos desprezo; suspeitas recidivantes [recorrentes], variados. injustificadas, a respeito da fidelidade sexual Indivíduos com esse transtorno creem que do esposo ou do parceiro sexual; e um outras pessoas irão explorá-los, causar-lhes sentimento combativo e obstinado de seus dano ou enganá-los, mesmo sem evidências que próprios direitos. apoiem essa expectativa [...]. Suspeitam, com Pode existir uma superavaliação de sua base em pouca ou nenhuma evidência, de que autoimportância, havendo frequentemente outros estão tramando contra eles e podem autoreferência excessiva. atacá-los de repente, a qualquer momento e sem razão. Costumam achar que foram profunda e irreversivelmente maltratados por outra pessoa ou pessoas, mesmo na ausência de evidências “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
145
objetivas para tal. São preocupados com dúvidas injustificadas acerca da lealdade ou confiança de seus amigos e sócios, cujas ações são examinadas minuciosamente em busca de evidências de intenções hostis [...]. Qualquer desvio percebido da confiança ou lealdade serve de apoio a seus pressupostos subjacentes. Ficam tão surpresos quando um amigo ou sócio demonstra lealdade que não conseguem confiar ou crer nisso. Quando envolvidos em problemas, esperam que amigos e sócios os ataquem ou ignorem. Indivíduos com transtorno da personalidade paranoide relutam em confiar ou tornar-se íntimos de outros, pois temem que as informações que compartilham venham a ser usadas contra eles [...]. Podem recusar responder a perguntas pessoais dizendo que tais informações “não são da conta de ninguém”. Percebem significados ocultos desabonadores e ameaçadores em comentários ou eventos benignos [...]. Por exemplo, um indivíduo com esse transtorno pode interpretar mal um erro honesto de um funcionário de uma loja como uma tentativa deliberada de dar troco a menos ou entender um comentário bem-humorado casual de um colega de trabalho como um ataque sério ao seu caráter. Elogios costumam ser mal interpretados (p. ex., um elogio por uma nova aquisição é mal interpretado como uma crítica de egoísmo; um elogio relativo a um feito é mal interpretado como uma tentativa de coerção a desempenho melhor). Podem entender uma oferta de ajuda como uma crítica por não estarem tendo desempenho suficientemente bom por conta própria. Indivíduos com esse transtorno guardam rancores persistentemente e não se dispõem a perdoar insultos, injúrias ou menosprezo dos quais pensam ter sido alvo [...]. Um leve desrespeito desperta grande hostilidade, sendo que os sentimentos hostis persistem por um bom tempo. Como são constantemente hipervigilantes em relação às intenções prejudiciais de outros, sentem, com frequência, que seu caráter ou reputação foram atacados e que foram de alguma forma desrespeitados. São rápidos no contra-ataque e reagem com raiva aos insultos percebidos [...]. Indivíduos com esse transtorno podem ser patologicamente ciumentos, muitas vezes suspeitando de que o “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
146
cônjuge ou parceiro sexual é infiel sem qualquer justificativa adequada [...]. Podem reunir “evidências” triviais e circunstanciais que apoiem suas crenças de ciúme. Desejam manter controle total das relações íntimas para evitar serem traídos e podem constantemente questionar e desafiar o paradeiro, as ações, as intenções e a fidelidade do cônjuge ou parceiro. O transtorno da personalidade paranoide não deve ser diagnosticado se o padrão de comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos ou outro transtorno psicótico ou se é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma condição neurológica (p. ex., epilepsia do lobo temporal) ou a outra condição médica [...]. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade paranoide são geralmente de difícil convivência e apresentam frequentes problemas nos relacionamentos íntimos. Sua desconfiança e hostilidade excessivas podem se expressar sob a forma de argumentações ostensivas, queixas recorrentes ou, ainda, indiferença calma e aparentemente hostil. Como são hipervigilantes em relação a ameaças potenciais, podem agir de maneira discreta, secreta ou indireta e parecer “frios” e sem sentimentos afetivos. Ainda que possam parecer objetivos, racionais e não emotivos, frequentemente demonstram labilidade afetiva, com predomínio de expressões hostis, inflexíveis e sarcásticas. Sua natureza combativa e desconfiada pode provocar uma resposta hostil em outras pessoas, a qual, então, serve para confirmar suas expectativas originais. Visto que indivíduos com o transtorno carecem de confiança nos outros, apresentam necessidade excessiva de autossuficiência e forte senso de autonomia. Precisam, ainda, de elevado grau de controle sobre as pessoas ao seu redor. Frequentemente são rígidos, críticos em relação aos outros e incapazes de trabalhar em conjunto, embora eles mesmos tenham grande dificuldade de aceitar críticas. Podem culpar os outros por suas próprias deficiências. Devido à rapidez no contra-ataque em resposta às ameaças que percebem ao seu redor, podem ser beligerantes e frequentemente se envolver em “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
147
disputas judiciais. Indivíduos com esse transtorno buscam confirmar suas ideias negativas preconcebidas em relação às pessoas e às situações com as quais se deparam, atribuindo motivações malévolas aos outros, as quais são projeções dos próprios medos. Podem apresentar fantasias irreais e pouco disfarçadas de grandeza, estão frequentemente ligados a questões de poder e posição e tendem a desenvolver estereótipos negativos dos outros, em especial aqueles de grupos populacionais diferentes do seu. Atraídos por formulações simplistas do mundo, costumam se precaver de situações ambíguas. Podem ser vistos como “fanáticos” e formar “cultos” ou grupos muito unidos com outros indivíduos que compartilham seus sistemas paranoides de crença. Especialmente em resposta ao estresse, indivíduos com esse transtorno podem apresentar episódios psicóticos breves (durando de minutos a horas). Em certos casos, o transtorno da personalidade paranoide pode surgir como o antecedente pré-mórbido de transtorno delirante ou esquizofrenia. Indivíduos com transtorno da personalidade paranoide podem desenvolver transtorno depressivo maior e podem estar sob risco aumentado de agorafobia e transtorno obsessivo-compulsivo. Transtornos por uso de álcool e outras substâncias ocorrem com frequência. Os transtornos da personalidade concomitantes mais comuns parecem ser: esquizotípica, esquizoide, narcisista, evitativa e borderline. Transtorno de personalidade esquizoide CID-10 Transtorno da personalidade caracterizado por um retraimento dos contatos sociais, afetivos ou outros, preferência pela fantasia, atividades solitárias e a reserva introspectiva, e uma incapacidade de expressar seus sentimentos e a experimentar prazer.
DSM-5 A característica essencial do transtorno da personalidade esquizoide é um padrão difuso de distanciamento das relações sociais e uma faixa restrita de expressão de emoções em contextos interpessoais. Esse padrão surge no começo da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide demonstram não ter desejo de intimidade, parecem indiferentes a oportunidades de desenvolver relações próximas e não parecem encontrar muita satisfação em fazer parte de uma família ou de outro grupo social [...]. Preferem ficar sozinhos em vez de com outras pessoas. Com frequência parecem
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
148
ser socialmente isolados ou “solitários” e quase sempre optam por atividades ou atempos solitários que não incluem interação com outros [...]. Preferem tarefas mecânicas ou abstratas, como jogos matemáticos ou de computador. Podem ter muito pouco interesse em ter experiências sexuais com outra pessoa [...] e têm prazer em poucas atividades, quando não em nenhuma [...]. Há geralmente uma sensação reduzida de prazer decorrente de experiências sensoriais, corporais ou interpessoais, como caminhar na praia ao fim do dia ou fazer sexo. Esses indivíduos não têm amigos próximos ou confidentes, exceto um possível parente de primeiro grau [...]. Indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide costumam ser indiferentes à apro vação ou à crítica dos outros e não parecem se incomodar com o que os demais podem pensar deles [...]. Podem ar ao largo das sutilezas normais das interações sociais e frequentemente não reagem de forma adequada a gentilezas sociais, de modo que parecem socialmente inaptos ou superficiais e absorvidos em si mesmos. Habitualmente, mostram um exterior “insípido”, sem reatividade emocional visível, e apenas raramente respondem de forma recíproca a gestos ou expressões faciais, como sorrisos ou acenos [...]. Alegam que raramente vivenciam emoções fortes, como raiva e alegria. Costumam mostrar um afeto constrito e parecem frios e distantes. No entanto, naquelas circunstâncias particularmente incomuns em que esses indivíduos ficam pelo menos temporariamente confortáveis em revelar a si mesmos, podem itir ter sentimentos de dor, sobretudo relacionados às interações sociais. O transtorno da personalidade esquizoide não deve ser diagnosticado se o padrão de comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos, outro transtorno psicótico ou transtorno do espectro autista ou se é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma condição médica neurológica (p. ex., epilepsia do lobo temporal) ou a outra condição médica. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide podem ter uma dificuldade particular “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
149
para expressar raiva, mesmo em resposta a provocação direta, o que contribui para a impressão de que carecem de emoção. Suas vidas parecem por vezes sem rumo, e eles podem aparentar estar “à deriva” em relação a seus objetivos. Tais indivíduos frequentemente reagem de forma iva a circunstâncias adversas e apresentam dificuldade em reagir adequadamente a acontecimentos importantes da vida. Devido à falta de habilidades sociais e à ausência de desejo de experiências sexuais, indivíduos com esse transtorno têm poucos amigos, raramente namoram e costumam não casar. O funcionamento profissional pode estar prejudicado, em especial quando há necessidade de envolvimento interpessoal; podem, entretanto, ser bem-sucedidos quando trabalham em condições de isolamento social. Particularmente em resposta a estresse, indivíduos com esse transtorno podem ter vários episódios psicóticos muito breves (com duração de minutos a horas). Em alguns casos, o transtorno da personalidade esquizoide pode surgir como o antecedente pré-mórbido de transtorno delirante ou esquizofrenia. Indivíduos com esse transtorno podem, às vezes, desenvolver transtorno depressivo maior. O transtorno da personalidade esquizoide com frequência ocorre concomitantemente com os transtornos da personalidade esquizotípica, paranoide e evitativa. Transtorno de personalidade esquizotípica CID-10 Transtorno caracterizado por um comportamento excêntrico e por anomalias do pensamento e do afeto que se assemelham àquelas da esquizofrenia, mas não há em nenhum momento da evolução qualquer anomalia esquizofrênica manifesta ou característica. A sintomatologia pode comportar um afeto frio ou inapropriado, anedonia; um comportamento estranho ou excêntrico; uma tendência ao retraimento social; ideias paranoides ou bizarras sem que se apresentem ideias delirantes autênticas; ruminações obsessivas; transtornos do curso do pensamento e perturbações das percepções; períodos transitórios ocasionais quase psicóticos com ilusões intensas, alucinações
DSM-5 A característica essencial do transtorno da personalidade esquizotípica é um padrão difuso de déficits sociais e interpessoais marcado por desconforto agudo e capacidade reduzida para relacionamentos íntimos, bem como por distorções cognitivas ou perceptivas e comportamento excêntrico. Esse padrão surge no começo da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica com frequência apresentam ideias de referência (i.e., interpretações incorretas de incidentes casuais e eventos externos como tendo um sentido particular e incomum especificamente para a pessoa) [...]. Estas devem ser distinguidas de delírios de referência,
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
150
nos quais as crenças são mantidas com convicção delirante. Esses indivíduos podem ser supersticiosos ou preocupados com fenômenos paranormais que fogem das normas de sua subcultura [...]. Podem achar que têm poderes especiais para sentir os eventos antes que ocorram ou para ler os pensamentos alheios. Podem acreditar que exercem controle mágico sobre os outros, o qual pode ser implementado diretamente (p. ex., a crença de que o fato de o cônjuge estar levando o cachorro para ear é consequência direta de, uma hora antes, ter pensado que isso devia ser feito) ou indiretamente, por meio de obediência a rituais mágicos (p. ex., ar três vezes por determinado objeto para evitar uma consequência danosa). Alterações perceptivas podem estar presentes (p. ex., sentir que outra pessoa está presente ou ouvir uma voz murmurando seu nome) [...]. Seu discurso pode (Salvador Dali – 1904-1989) incluir fraseados e construções incomuns ou idiossincrásicas e costuma ser desconexo, digressivo ou vago, embora sem apresentar um real descarrilhamento ou incoerência [...]. Respostas podem ser excessivamente concretas ou abstratas, e palavras e conceitos são, por vezes, aplicados de maneiras pouco habituais (p. ex., o indivíduo pode afirmar que não estava “conversável” no trabalho). Indivíduos com esse transtorno são frequentemente desconfiados e podem apresentar ideias paranoides (p. ex., crer que os colegas de trabalho estão planejando minar sua reputação com o chefe) [...]. Em geral, são incapazes de lidar com os afetos e as minúcias interpessoais que são necessários para relacionamentos bem-sucedidos; assim, com frequência parecem interagir com os outros de forma inadequada, formal ou constrita [...]. Esses indivíduos são geralmente considerados esquisitos ou excêntricos em virtude de maneirismos incomuns, isto é, sua forma desleixada de vestir-se que não “combina” bem e sua falta de atenção às convenções sociais habituais (p. ex., o indivíduo pode evitar contato visual, usar roupas manchadas ou que não servem bem e ser incapaz de participar das provocações e brincadeiras que ocorrem entre colegas de trabalho) [...]. Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica vivenciam os relacionamentos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
auditivas ou outras e ideias pseudodelirantes, ocorrendo em geral sem fator desencadeante exterior. O início do transtorno é difícil de determinar, e sua evolução corresponde em geral àquela de um transtorno da personalidade.
151
interpessoais como problemáticos e sentem desconforto em se relacionar com outras pessoas. Embora possam manifestar infelicidade acerca da falta de relacionamentos, seu comportamento sugere um desejo reduzido de contatos íntimos. Assim, costumam ter poucos ou nenhum amigo próximo ou confidente que não seja parente de primeiro grau [...]. São ansiosos em situações sociais, especialmente aquelas que envolvem pessoas desconhecidas [...]. Irão interagir com outras pessoas quando tiverem de fazer isso, mas preferem não estabelecer interações, pois sentem que são diferentes e que não se enturmam. Sua ansiedade social não diminui facilmente, mesmo quando am mais tempo no local ou conhecem melhor as outras pessoas, visto que a ansiedade tende a estar associada à desconfiança quanto às motivações dos outros. Por exemplo, em um jantar, a pessoa com o transtorno da personalidade esquizotípica não ficará mais relaxada com o ar das horas; pelo contrário: ficará mais tensa e desconfiada. Transtorno da personalidade esquizotípica não deve ser diagnosticado se o padrão de comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos, outro transtorno psicótico ou transtorno do espectro autista [...]. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica costumam buscar tratamento mais para os sintomas associados de ansiedade ou depressão do que para as características do transtorno da personalidade em si. Particularmente em resposta a estresse, indivíduos com o transtorno podem apresentar episódios psicóticos transitórios (com duração de minutos a horas), embora eles geralmente tenham duração insuficiente para indicar um diagnóstico adicional, como transtorno psicótico breve ou transtorno esquizofreniforme. Em alguns casos, podem surgir sintomas psicóticos clinicamente significativos que atendam aos critérios de transtorno psicótico breve, transtorno esquizofreniforme, transtorno delirante ou esquizofrenia. Mais de metade dos indivíduos com o transtorno da personalidade esquizotípica pode ter história de pelo menos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
152
um episódio depressivo maior. De 30 a 50% dos indivíduos diagnosticados com esse transtorno têm um diagnóstico simultâneo de transtorno depressivo maior quando avaliados em um contexto clínico. Existe considerável concomitância de transtornos da personalidade esquizoide, paranoide, evitativa e borderline. Transtorno de personalidade obsessiva-compulsiva (ou anancástica) CID-10 DSM-5 Transtorno da personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da um sentimento de dúvida, perfeccionismo, personalidade obsessivo-compulsiva é uma escrupulosidade, verificações, e preocupação preocupação com ordem, perfeccionismo e com pormenores, obstinação, prudência e controle mental e interpessoal à custa de rigidez excessivas. flexibilidade, abertura e eficiência. Esse padrão O transtorno pode se acompanhar de surge no início da vida adulta e está presente em pensamentos ou de impulsos repetitivos e vários contextos. intrusivos não atingindo a gravidade de um Indivíduos com transtorno da personalidade transtorno obsessivo-compulsivo. obsessivo-compulsiva tentam manter uma sensação de controle por meio de atenção cuidadosa a regras, pequenos detalhes, procedimentos, listas, cronogramas ou forma a ponto de o objetivo principal da atividade ser perdido [...]. São excessivamente cuidadosos e propensos à repetição, prestando extraordinária atenção aos detalhes e conferindo repetidas vezes na busca por possíveis erros. Esquecem o fato de que outras pessoas podem se incomodar muito com os atrasos e as inconveniências que resultam desse comportamento. Por exemplo, quando esses indivíduos esquecem onde colocaram uma lista de coisas a fazer, gastam tempo demais procurando a lista em vez de gastar alguns instantes refazendo-a de memória e ando à execução das tarefas. O tempo é mal alocado, e as tarefas mais importantes são deixadas por último. O perfeccionismo e os padrões elevados de desempenho autoimpostos causam disfunção e sofrimento significativo a esses indivíduos. Podem ficar de tal forma envolvidos em tornar cada detalhe de um projeto absolutamente perfeito que este jamais é concluído [...]. Por exemplo, a conclusão de um relatório escrito é retardada por várias reescritas que tomam tempo, para tudo ficar aquém da “perfeição”. Prazos não são atendidos, e aspectos da vida do indivíduo que não são o foco atual da atividade podem desorganizar-se. Indivíduos com esse transtorno demonstram dedicação excessiva ao trabalho e à “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
153
produtividade, a ponto de excluir atividades de lazer e amizades [...]. Esse comportamento não é explicado por necessidade financeira. Com frequência sentem que não têm tempo para tirar uma tarde ou um fim de semana de folga para viajar ou apenas relaxar. Podem ficar postergando atividades agradáveis, como as férias, de modo que elas podem jamais ocorrer. Quando realmente dedicam algum tempo para lazer ou férias, sentem-se bastante desconfortáveis, a não ser que tenham consigo algum tipo de trabalho de modo a não “desperdiçarem tempo”. Pode haver muita concentração em tarefas domiciliares (p. ex., limpeza excessiva e repetida a ponto de “poder comer direto do chão”). Quando ficam algum tempo com os amigos, é provável que seja em algum tipo de atividade formalmente organizada (p. ex., esportes). atempos e atividades de recreação são levadas como tarefas sérias que exigem organização criteriosa e trabalho duro para serem dominadas. A ênfase recai sobre o desempenho perfeito. Esses indivíduos transformam o jogo e brincadeiras em tarefas estruturadas (p. ex., corrigindo um bebê que não põe os círculos em um cilindro de madeira na ordem correta; dizendo a uma criança para andar de triciclo em linha reta; transformando um esporte qualquer em uma “lição” severa). Indivíduos com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva podem ser excessivamente conscienciosos [cuidadosos], escrupulosos e inflexíveis acerca de assuntos de moralidade, ética ou valores. Podem obrigar-se e obrigar os outros a seguir princípios morais rígidos e padrões muito austeros de desempenho. Podem, ainda, ser críticos impiedosos em relação aos próprios erros. Indivíduos com esse transtorno respeitam autoridade e regras com extrema consideração e insistem em obedecer às regras de forma bastante literal e inflexível. Por exemplo, o indivíduo não irá emprestar uma moeda a um amigo que precisa dela para um telefonema porque ele mesmo não é “do tipo que pede emprestado ou empresta” ou porque seria ruim para o caráter da pessoa. Essas características não devem ser explicadas por identificação cultural ou religiosa do indivíduo. Indivíduos com esse transtorno podem ser incapazes de descartar objetos usados ou sem valor, mesmo “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
154
na ausência de valor sentimental [...]. Frequentemente item ser acumuladores. Consideram o descarte de objetos um desperdício, pois “nunca se sabe quando poderá precisar de alguma coisa” e ficam incomodados se alguém tenta se livrar de coisas que eles guardaram. Seus cônjuges ou parceiros podem se queixar da quantidade de espaço ocupado por peças e revistas antigas, aparelhos estragados e assim por diante. Essas pessoas relutam em delegar tarefas ou em trabalhar em conjunto [...]. De maneira teimosa e injustificada, insistem que tudo precisa ser feito a seu modo e que as pessoas têm de se conformar com sua maneira de fazer as coisas. Com frequência dão instruções bastante detalhadas sobre como tudo deve ser feito (p. ex., só há uma forma de cortar a grama, lavar os pratos, construir uma casa para o cachorro) e ficam surpresos e irritados quando outros sugerem alternativas criativas. Em outras ocasiões, podem rejeitar ofertas de ajuda mesmo quando atrasados no cronograma, pois consideram que ninguém pode fazer as coisas tão bem quanto eles mesmos. Indivíduos com esse transtorno podem ser miseráveis e mesquinhos e manter um padrão de vida bastante inferior ao que podem sustentar, acreditando que os gastos devem ser rigidamente controlados para garantir sustento em catástrofes futuras [...]. O transtorno da personadidade obsessivo-compulsiva caracteriza-se por rigidez e teimosia [...]. Indivíduos com o transtorno estão tão preocupados em realizar as tarefas da única maneira “certa” que enfrentam dificuldades para concordar com as ideias de qualquer outra pessoa. Planejam o futuro nos mínimos detalhes e não se dispõem a avaliar possíveis mudanças. Completamente envolvidos pela própria perspectiva, têm dificuldade de reconhecer os pontos de vista dos outros. Amigos e colegas podem se frustrar por essa rigidez constante. Mesmo quando reconhecem que ceder pode ser interessante para eles mesmos, podem de forma teimosa recusar-se a isso alegando ser este “o princípio da coisa. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Quando regras e procedimentos estabelecidos não ditam a resposta correta, tomar uma decisão pode se tornar um processo demorado e “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
155
desgastante. Indivíduos com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva podem ter tanta dificuldade para decidir as tarefas às quais dar prioridade ou qual a melhor maneira de fazer alguma tarefa específica que podem jamais começar o que quer que seja. Têm propensão ao aborrecimento ou à raiva em situações nas quais não conseguem manter controle do seu ambiente físico ou interpessoal, embora a raiva não costume ser manifestada de forma direta. Por exemplo, o indivíduo pode ficar irritado diante de um serviço insatisfatório em um restaurante, mas, em vez de queixar-se ao gerente, fica ruminando sobre quanto dar de gorjeta. Em outras ocasiões, a raiva pode ser expressa por meio de indignação em relação a um assunto aparentemente insignificante. Indivíduos com esse transtorno podem dar atenção especial a seu estado relativo nas relações de domínio-submissão e podem exibir deferência excessiva a uma autoridade que respeitam e resistência excessiva a uma que não respeitam. Indivíduos com esse transtorno geralmente manifestam afeto de forma altamente controlada ou artificial e podem sentir grande desconforto na presença de outros que se expressam com emoção. As relações cotidianas são sérias e formais, e eles podem parecer sisudos em situações em que outros sorririam e ficariam alegres (p. ex., saudar um namorado no aeroporto). Eles se contêm cuidadosamente até estarem certos de que o que dirão será perfeito. Podem se preocupar com a lógica e com o intelecto e ser intolerantes ao comportamento afetivo dos outros. Com frequência apresentam dificuldades de expressar sentimentos amorosos e raramente fazem elogios. Indivíduos com esse transtorno podem ter dificuldades e sofrimento no trabalho, sobretudo quando confrontados com novas situações que exijam flexibilidade e transigência. Indivíduos com transtornos de ansiedade, inclusive transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de ansiedade social (fobia social) e fobias específicas, bem como transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), têm probabilidade aumentada de apresentar uma perturbação da personalidade que atenda aos critérios do transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva. Mesmo assim, parece “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
156
que a maioria das pessoas com TOC não apresenta um padrão de comportamento que atenda aos critérios para esse transtorno da personalidade. Muitas das características do transtorno da personalidade obsessivocompulsiva sobrepõem-se às características de personalidade “tipo A” (p. ex., preocupação com o trabalho, competitividade, urgência temporal), e estas podem estar presentes em pessoas com risco de infarto do miocárdio. Pode haver associação entre transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva e transtornos bipolar e depressivo e transtornos alimentares. Transtorno de personalidade histriônica CID-10 Transtorno da personalidade caracterizado por uma afetividade superficial e lábil, dramatização, teatralidade, expressão exagerada das emoções, sugestibilidade, egocentrismo, autocomplacência, falta de consideração para com o outro, desejo permanente de ser apreciado e de constituir-se no objeto de atenção e tendência a se sentir facilmente ferido.
DSM-5 A característica essencial do transtorno da personalidade histriônica é a emocionalidade excessiva e difusa e o comportamento de busca de atenção. Esse padrão surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com o transtorno da personalidade histriônica sentem-se desconfortáveis ou não valorizados quando não estão no centro das atenções [...]. Normalmente cheios de vida e dramáticos, tendem a atrair atenção para si mesmos e podem inicialmente fazer novas amizades por seu entusiasmo, abertura aparente ou sedução. Essas qualidades se extinguem, todavia, à medida que esses indivíduos demandam continuadamente ser o centro das atenções. Eles comandam o papel de “vida da festa”. Caso não sejam o centro das atenções, podem fazer algo dramático (p. ex., inventar histórias, criar uma cena) para atrair o foco da atenção para si. Tal necessidade é com frequência aparente em seu comportamento com um clínico (p. ex., elogiar, levar presentes, dar descrições dramáticas de sintomas físicos e psicológicos que são substituídos por novos sintomas a cada consulta). A aparência e o comportamento de indivíduos com esse transtorno são, em geral, sexualmente provocativos ou sedutores de forma inadequada [...]. Esse comportamento é voltado não somente às pessoas por quem o indivíduo tem interesse romântico ou sexual, mas ocorre também em uma grande variedade de relacionamentos sociais, ocupacionais e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
157
profissionais, além do que seria apropriado ao contexto social. A expressão emocional pode ser superficial e rapidamente cambiante [...]. Os indivíduos com o transtorno usam reiteradamente a aparência física para atrair as atenções para si [...]. São excessivamente preocupados em impressionar os outros por meio de sua aparência e dedicam muito tempo, energia e dinheiro a roupas e embelezamento. Podem buscar elogios acerca da aparência e também ficar chateados de forma fácil e excessiva em virtude de algum comentário crítico sobre como estão ou por uma fotografia que porventura considerem não lisonjeira. Esses indivíduos têm um estilo de discurso excessivamente impressionista e carente de detalhes [...]. Opiniões fortes são expressas de forma dramática, mas as razões subjacentes costumam ser vagas e difusas, sem fatos e detalhes de apoio. Por exemplo, um indivíduo com transtorno da personalidade histriônica pode comentar que determinada pessoa é um ser humano maravilhoso, ainda que não consiga oferecer qualquer exemplo específico de boas qualidades que apoiem sua opinião. Indivíduos com esse transtorno são caracterizados pela autodramatização, pela teatralidade e pela expressão exagerada das emoções [...]. Podem envergonhar amigos e conhecidos pela exibição pública excessiva de emoções (p. ex., abraçar conhecidos casuais com entusiasmo demasiado, chorar de forma inconsolável em ocasiões sentimentais de importância menor, ter ataques de raiva repentinos). Suas emoções, no entanto, frequentemente parecem ser ligadas ou desligadas com muita rapidez para serem sentidas em profundidade, o que pode levar os outros a acusá-los de dissimular esses sentimentos. Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica são altamente sugestionáveis [...]. Suas opiniões e sentimentos são facilmente influenciados pelos outros ou por modismos presentes. Podem confiar em demasia, em especial em figuras fortes de autoridade que veem como capazes de solucionar de forma mágica seus problemas. Têm tendência a dar palpites e a adotar convicções rapidamente. Costumam considerar as relações pessoais como mais íntimas do que realmente são, descrevendo quase todos os conhecidos como “meu “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
158
queridíssimo amigo” ou fazendo referência a médicos que encontraram uma ou duas vezes em circunstâncias profissionais por seus primeiros nomes. [...] Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica podem ter dificuldades em alcançar intimidade emocional em relacionamentos românticos ou sexuais. Sem se dar conta disso, costumam desempenhar um papel (p. ex., “vítima” ou “princesa”) em suas relações com os outros. Podem buscar controlar seu parceiro por meio de manipulação emocional ou sedução em um nível, ao mesmo tempo que mostram dependência acentuada deles em outro nível. Indivíduos com esse transtorno geralmente têm relacionamentos difíceis com amigos do mesmo sexo, pois seu estilo interpessoal sexualmente provocativo pode parecer uma ameaça aos relacionamentos afetivos destes. Esses indivíduos podem também afastar os amigos com exigências de atenção constante. Com frequência ficam deprimidos e aborrecidos quando não são o centro das atenções. Podem buscar obstinadamente novidades, estímulos e excitação e ter tendência a entediar-se com a rotina. Não costumam tolerar ou se sentem frustrados por situações envolvendo atraso de gratificação, sendo suas ações costumeiramente voltadas à obtenção de satisfação imediata. Embora com frequência comecem um trabalho ou projeto com muito entusiasmo, seu interesse pode se dissipar rapidamente. Relacionamentos de longa data podem ser negligenciados para dar espaço à excitação de novos relacionamentos. O risco real de suicídio não é conhecido, mas a experiência clínica sugere que esses indivíduos estão sob risco aumentado de gestos e ameaças suicidas que realizam com o intuito de obter atenção e coagir os demais a oferecer melhores cuidados. O transtorno da personalidade histriônica tem sido associado a taxas mais altas de transtorno de sintomas somáticos, transtorno conversivo (transtorno de sintomas neurológicos funcionais) e transtorno depressivo maior. Com frequência, os transtornos da personalidade borderline, narcisista, antissocial e dependente ocorrem de forma concomitante. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
159
Transtorno de personalidade narcisista CID-10 Não consta o tópico.
DSM-5 A característica essencial do transtorno da personalidade narcisista é um padrão difuso de grandiosidade, necessidade de iração e falta de empatia que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com o transtorno têm um sentimento grandioso da própria importância [...]. Superestimam de forma rotineira suas capacidades e exageram suas conquistas, com frequência parecendo pretensiosos e arrogantes. Podem tranquilamente partir do pressuposto de que os outros atribuem o mesmo valor aos seus esforços e podem surpreender-se quando o elogio que esperam e o sentimento que sentem merecer não ocorrem. Comumente implícita nos juízos inflados das próprias conquistas está uma subestimação (desvalorização) das contribuições dos outros. Indivíduos com transtorno da personalidade narcisista estão frequentemente preocupados com fantasias de sucesso ilimitado, poder, brilho, beleza ou amor ideal [...]. Podem ruminar acerca de iração e privilégios “há muito devidos” e comparar-se favoravelmente a pessoas famosas ou privilegiadas. As pessoas com esse transtorno creem ser superiores, especiais ou únicas e esperam que os outros as reconheçam como tal [...]. Podem sentir que são somente compreendidas por outras pessoas especiais ou de condição elevada, e apenas com elas devem se associar, podendo atribuir qualidades como “únicas”, “perfeitas” e “dotadas” àquelas com quem se associam. Indivíduos com esse transtorno acreditam que suas necessidades são especiais e estão além do conhecimento das pessoas comuns. Sua própria autoestima é realçada (i.e., “espelhada”) pelo valor idealizado que conferem àqueles com quem se associam. Tendem a insistir em ser atendidos apenas por pessoas “top” (médico, advogado, cabeleireiro, instrutor) ou em ser afiliados às “melhores” instituições, embora possam desvalorizar as credenciais daqueles que os desapontam. Indivíduos com esse transtorno geralmente exigem iração excessiva [...]. Sua autoestima é quase invariavelmente muito frágil. Podem estar preocupados com o quão bem estão se saindo e o quão favoravelmente os
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
160
outros os consideram. Isso costuma assumir a forma de uma necessidade constante de atenção e iração. Podem esperar que sua chegada seja saudada com grandes comemorações e ficam atônitos quando os outros não cobiçam seus pertences. Podem constantemente buscar elogios, em geral com muita sedução. Fica evidente nesses indivíduos uma sensação de possuir direitos por meio das expectativas irracionais de tratamento especialmente favorável que apresentam [...]. Esperam ser servidos e ficam atônitos ou furiosos quando isso não acontece. Por exemplo, podem supor que não precisam aguardar em filas e que suas prioridades são tão importantes que os outros farão uma deferência a eles, irritando-se depois quando estes não os auxiliam “em seu trabalho tão importante”. Essa sensação de possuir direitos, combinada com falta de sensibilidade aos desejos e necessidades dos outros, pode resultar na exploração consciente ou involuntária de outras pessoas [...]. Esperam receber qualquer coisa que desejarem ou sintam necessitar, independentemente do que isso possa significar para os outros. Por exemplo, esses indivíduos podem esperar uma grande dedicação dos outros e podem explorá-los abusivamente sem dar importância ao impacto que esse fato pode ter em suas vidas. Tendem a formar relações de amizade ou romance somente se a outra pessoa parece possibilitar o avanço de seus propósitos ou, então, incrementar sua autoestima. Costumam usurpar privilégios especiais e recursos extraordinários que creem merecer por serem tão especiais. Indivíduos com o transtorno geralmente apresentam falta de empatia e dificuldade de reconhecer os desejos, as experiências subjetivas e os sentimentos das outras pessoas [...]. Podem pressupor que os outros estão totalmente preocupados com seu bem-estar. Tendem a discutir suas próprias preocupações de forma detalhada e prolongada, ao mesmo tempo que falham em reconhecer que os demais também têm sentimentos e necessidades. Com frequência são desdenhosos e impacientes com outros que falam sobre seus próprios problemas e preocupações. Podem não enxergar o quanto ferem os demais com seus comentários (p. ex., dizer exageradamente a um ex-companheiro “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
161
“Agora estou em um relacionamento para toda a vida!”; alardear a saúde diante de alguém doente). Quando reconhecidos, as necessidades, os desejos ou os sentimentos das outras pessoas são provavelmente encarados de forma depreciativa como sinais de fraqueza ou vulnerabilidade. Aqueles que se relacionam com indivíduos com transtorno da personalidade narcisista costumam encontrar frieza emocional e falta de interesse recíproco. Esses indivíduos tendem a invejar os outros ou a acreditar que estes os invejam [...]. Podem ver com má vontade o sucesso ou os pertences das outras pessoas, sentindo que eles é que são os reais merecedores de tais conquistas, iração ou privilégios. Podem desvalorizar grosseiramente as contribuições dos outros, sobretudo quando essas pessoas receberam reconhecimento ou elogio pelo que realizaram. Comportamentos arrogantes e insolentes caracterizam esses indivíduos; com frequência exibem esnobismo, desdém ou atitudes condescendentes [...]. Por exemplo, um indivíduo com esse transtorno pode se queixar da “grosseria” ou “estupidez” de um garçom desajeitado ou concluir uma avaliação médica com uma apreciação condescendente do médico. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A vulnerabilidade na autoestima torna os indivíduos com transtorno da personalidade narcisista muito sensíveis a “feridas” resultantes de crítica ou derrota. Embora possam não evidenciar isso de forma direta, a crítica pode assustá-los, deixando neles sentimentos de humilhação, degradação, vácuo e vazio. Podem reagir com desdém, fúria ou contra-ataque desafiador. Tais vivências geralmente levam a retraimento social ou a uma aparência de humildade que pode mascarar e proteger a grandiosidade. Relações interpessoais costumam ser afetadas devido a problemas resultantes da crença no merecimento de privilégios, da necessidade de iração e da relativa desconsideração das sensibilidades dos outros. Embora ambição e confiança desmedidas possam levar a grandes conquistas, o desempenho pode ser comprometido pela intolerância a críticas ou derrotas. O desempenho no trabalho às vezes pode ser “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
162
muito baixo, refletindo falta de disposição de se arriscar em situações competitivas ou em outras em que há possibilidade de derrota. Sentimentos persistentes de vergonha ou humilhação e a autocrítica acompanhante podem estar associados a retraimento social, humor deprimido e transtorno depressivo persistente (distimia) ou transtorno depressivo maior. Por sua vez, períodos sustentados de grandiosidade podem estar associados a humor hipomaníaco. O transtorno da personalidade narcisista está ainda associado a anorexia nervosa e transtornos por uso de substância (especialmente relacionados a cocaína). Transtornos da personalidade histriônica, borderline, antissocial e paranoide podem estar associados ao transtorno da personalidade narcisista. Transtorno de personalidade dependente CID-10 Transtorno da personalidade caracterizado por: tendência sistemática a deixar a outrem a tomada de decisões, importantes ou menores; medo de ser abandonado; percepção de si como fraco e incompetente; submissão iva à vontade do outro (por exemplo de pessoas mais idosas) e uma dificuldade de fazer face às exigências da vida cotidiana; falta de energia que se traduz por alteração das funções intelectuais ou perturbação das emoções; tendência frequente a transferir a responsabilidade para outros.
DSM-5 A característica essencial do transtorno da personalidade dependente é uma necessidade difusa e excessiva de ser cuidado que leva a comportamento de submissão e apego e a temores de separação. Esse padrão surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Os comportamentos de dependência e submissão formam-se com o intuito de conseguir cuidado e derivam de uma autopercepção de não ser capaz de funcionar adequadamente sem a ajuda de outros. Indivíduos com o transtorno da personalidade dependente apresentam grande dificuldade em tomar decisões cotidianas (p. ex., a cor de camisa a vestir ou levar ou não o guarda-chuva) sem uma quantidade excessiva de conselhos e reasseguramentos oferecidos por outros [...]. Esses indivíduos tendem a ser ivos e a permitir que outros (frequentemente apenas uma pessoa) tomem a iniciativa e assumam a responsabilidade pela maior parte das principais áreas de suas vidas [...]. Adultos com o transtorno costumam depender de pai ou mãe ou cônjuge para decidir onde morar, o tipo de trabalho a realizar e os vizinhos com quem fazer amizade. Adolescentes com o transtorno podem permitir que seus pais decidam o que devem vestir, com quem fazer amizade, como usar o tempo livre e a escola ou universidade para onde ir. Essa necessidade de que outras pessoas
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
163
assumam a responsabilidade vai além das solicitações de auxílio adequadas à idade ou à situação (p. ex., as necessidades específicas de crianças, idosos e pessoas deficientes). O transtorno da personalidade dependente pode ocorrer em um indivíduo que tenha uma condição ou incapacidade médica grave, mas nesses casos a dificuldade em assumir responsabilidade precisa ir além daquilo que estaria normalmente associado a essa condição ou incapacidade. Como existe o receio de perder apoio ou aprovação, indivíduos com o transtorno da personalidade dependente frequentemente apresentam dificuldade em expressar discordância de outras pessoas, em especial daquelas de quem são dependentes [...]. Eles se sentem tão incapazes de funcionar por conta própria que podem vir a concordar com coisas que consideram erradas apenas para não arriscar perder a ajuda daqueles que procuram para orientação. Não se enfurecem justificadamente com outros de cujo apoio e cuidados necessitam, por medo de se afastar deles. Se as preocupações do indivíduo relativas às consequências de expressar discordância forem realistas (p. ex., medos reais de punição de um cônjuge abusivo), o comportamento não deve ser considerado evidência de transtorno da personalidade dependente. Indivíduos com esse transtorno apresentam dificuldades para iniciar projetos ou fazer coisas de forma independente [...]. Carecem de autoconfiança e acham que precisam de ajuda para iniciar e finalizar tarefas. Podem vir a aguardar os outros para começar algo, pois pensam que, em regra, os outros podem fazer esse algo melhor. Esses indivíduos têm convicção de serem incapazes de funcionar independentemente e apresentam-se como incapazes e como se necessitassem de assistência constante. Entretanto, é provável que funcionem adequadamente caso tenham certeza de que outra pessoa estará supervisionando e aprovando seu trabalho. Pode haver receio de se tornar ou parecer mais competente, pois podem acreditar que isso levará ao abandono. Visto que contam com os outros para lidar com seus problemas, com frequência não aprendem as habilidades para uma vida independente, perpetuando, assim, a dependência. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
164
Indivíduos com transtorno da personalidade dependente podem ir a extremos para conseguir cuidado e apoio de outros, a ponto até de voluntariar-se para tarefas desagradáveis caso esse comportamento possa proporcionar a atenção de que precisam [...]. Estão dispostos a se submeter ao que os outros desejam, mesmo que as demandas não sejam razoáveis. Sua necessidade de manter um vínculo importante resultará frequentemente em relacionamentos desequilibrados ou distorcidos. Essas pessoas podem fazer sacrifícios extraordinários ou tolerar abuso verbal, físico ou sexual. (Deve-se observar que esse comportamento deve ser considerado evidência de transtorno da personalidade dependente apenas quando puder ser claramente estabelecido que existem outras opções para o indivíduo.) Pessoas com esse transtorno sentem-se desconfortáveis ou desamparadas quando sós devido aos temores exagerados de não serem capazes de cuidar de si mesmas [...]. Vão se “grudar” a outros apenas para evitar a solidão, mesmo sem ter interesse ou envolvimento com o que está acontecendo. Ao término de um relacionamento íntimo (p. ex., rompimento com companheiro afetivo, morte de cuidador), indivíduos com transtorno da personalidade dependente podem buscar urgentemente outro relacionamento para obter os cuidados e o apoio de que necessitam [...]. Sua crença de que são incapazes de funcionar na ausência de um relacionamento íntimo motivaos a tornarem-se rápida e indiscriminadamente apegados a outra pessoa. Com frequência preocupam-se com medos de serem abandonados à própria sorte [...]. Veem-se como tão completamente dependentes dos conselhos e da ajuda de uma outra pessoa significativa que se preocupam com a possibilidade de serem abandonados por essa pessoa mesmo quando não há justificativa para esses temores. Para que sejam considerados evidência desse critério, os medos devem ser excessivos e irreais. Por exemplo, um idoso com câncer que se muda para a casa do filho para ser cuidado está demonstrando comportamento dependente adequado, consideradas suas circunstâncias de vida. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
165
dependente com frequência são caracterizados por pessimismo e autoquestionamentos, tendem a subestimar suas capacidades e seus aspectos positivos e podem constantemente referir a si mesmos como “estúpidos”. Encaram críticas e desaprovação como prova de sua desvalia e perdem a fé em si mesmos. Podem buscar superproteção e dominação por parte dos outros. O funcionamento profissional pode ser prejudicado diante da necessidade de iniciativas independentes. Podem evitar cargos de responsabilidade e ficar ansiosos diante de decisões. As relações sociais tendem a ser limitadas àquelas poucas pessoas de quem o indivíduo é dependente. Pode haver risco aumentado de transtornos depressivos, de ansiedade e de adaptação. O transtorno da personalidade dependente costuma ser concomitante com outros transtornos da personalidade, especialmente borderline, evitativa e histriônica. Doença física crônica ou transtorno de ansiedade de separação na infância ou adolescência podem predispor o indivíduo ao desenvolvimento desse transtorno. Transtorno de personalidade dissocial (ou antissocial ou psicopatia ou sociopatia) CID-10 DSM-5 Transtorno de personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da um desprezo das obrigações sociais, falta de personalidade antissocial é um padrão difuso de empatia para com os outros. Há um desvio indiferença e violação dos direitos dos outros, o considerável entre o comportamento e as qual surge na infância ou no início da normas sociais estabelecidas. adolescência e continua na vida adulta. Esse O comportamento não é facilmente modificado padrão também já foi referido como psicopatia, pelas experiências adversas, inclusive pelas sociopatia ou transtorno da personalidade punições. Existe uma baixa tolerância à dissocial. Visto que falsidade e manipulação são frustração e um baixo limiar de descarga da aspectos centrais do transtorno da personalidade agressividade, inclusive da violência. antissocial, pode ser especialmente útil integrar Existe uma tendência a culpar os outros ou a informações adquiridas por meio de avaliações fornecer racionalizações plausíveis para clínicas sistemáticas e informações coletadas de explicar um comportamento que leva o sujeito outras fontes colaterais. a entrar em conflito com a sociedade. Para que esse diagnóstico seja firmado, o indivíduo deve ter no mínimo 18 anos de idade [...] e deve ter apresentado alguns sintomas de transtorno da conduta antes dos 15 anos [...]. O transtorno da conduta envolve um padrão repetitivo e persistente de comportamento no qual os direitos básicos dos outros ou as principais normas ou regras sociais apropriadas à idade são violados. Os comportamentos específicos característicos do transtorno da “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
166
conduta encaixam-se em uma de quatro categorias: agressão a pessoas e animais, destruição de propriedade, fraude ou roubo ou grave violação a regras. O padrão de comportamento antissocial continua até a vida adulta. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial não têm êxito em ajustar-se às normas sociais referentes a comportamento legal [...]. Podem repetidas vezes realizar atos que são motivos de detenção (estando já presos ou não), como destruir propriedade alheia, assediar outras pessoas, roubar ou ter ocupações ilegais. Pessoas com esse transtorno desrespeitam os desejos, direitos ou sentimentos dos outros. Com frequência, enganam e manipulam para obter ganho ou prazer pessoal (p. ex., conseguir dinheiro, sexo ou poder) [...]. Podem mentir reiteradamente, usar nomes falsos, trapacear ou fazer maldades. Um padrão de impulsividade pode ser manifestado por fracasso em fazer planos para o futuro [...]. As decisões são tomadas no calor do momento, sem análise e sem consideração em relação às consequências a si ou aos outros; isso pode levar a mudanças repentinas de emprego, moradia ou relacionamentos. Indivíduos com o transtorno tendem a ser irritáveis e agressivos e podem envolver-se repetidamente em lutas corporais ou cometer atos de agressão física (inclusive espancamento de cônjuge ou filho) [...] (Atos agressivos necessários para defesa própria ou de outra pessoa não são considerados evidência para esse item). Essas pessoas ainda demonstram descaso pela própria segurança ou pela de outros [...]. Isso pode ser visto no comportamento na direção (i.e., velocidade excessiva recorrente, direção sob intoxicação, múltiplos acidentes). Podem se envolver em comportamento sexual ou uso de substância com alto risco de consequências nocivas. Podem negligenciar ou falhar em cuidar de uma criança a ponto de colocá-la em perigo. Indivíduos com o transtorno da personalidade antissocial também tendem a ser reiterada e extremamente irresponsáveis [...]. Comportamento laboral irresponsável pode ser indicado por períodos significativos de desemprego, a despeito de haver oportunidades de trabalho disponíveis, ou por abandono de vários empregos sem um plano realista de obtenção de outro. Pode também haver um “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
167
padrão de repetidas ausências ao trabalho que não são explicadas por doença própria ou de familiar. Irresponsabilidade financeira é indicada por atos como inadimplência, fracasso em sustentar regularmente os filhos ou outros dependentes [também apresentam o padrão pródigo – qual seja, dilapidam seus patrimônios e o dos seus familiares em gastanças]. Indivíduos com o transtorno demonstram pouco remorso pelas consequências de seus atos. Podem ser indiferentes a ter ferido, maltratado ou roubado alguém, racionalizando de modo superficial essas situações (p. ex., “a vida é injusta”, “perdedores merecem perder”). Esses indivíduos podem culpar as vítimas por serem tolas, desamparadas ou merecedoras de seu destino (p. ex., “ele já esperava por isso de qualquer forma”); podem minimizar as consequências danosas de seus atos ou ainda simplesmente demonstrar total indiferença. Em geral, fracassam em compensar ou fazer reparações em razão do seu comportamento. Podem achar que todo mundo deve “ajudar o número um” e que se deve fazer qualquer coisa para evitar ser incomodado. O comportamento antissocial não deve ocorrer exclusivamente durante o curso de esquizofrenia ou transtorno bipolar [...]. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial frequentemente carecem de empatia e tendem a ser insensíveis, cínicos e desdenhosos em relação aos sentimentos, direitos e sofrimentos dos outros. Podem ter autoconceito inflado e arrogante (p. ex., sentem que o trabalho comum cotidiano está abaixo deles ou carecem de uma preocupação real a respeito dos seus problemas do momento ou a respeito de seu futuro) e podem ser excessivamente opiniáticos [teimoso], autoconfiantes ou convencidos. Podem exibir um charme desinibido e superficial e podem ser muito volúveis e verbalmente fluentes (p. ex., usar termos técnicos ou jargão que podem impressionar uma pessoa que desconhece o assunto). Falta de empatia, autoapreciação inflada e charme superficial são aspectos que têm sido comumente incluídos em concepções tradicionais da psicopatia e que podem ser particularmente característicos do transtorno e “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
168
mais preditivos de recidiva em prisões ou ambientes forenses, onde atos criminosos, delinquentes ou agressivos tendem a ser inespecíficos. Esses indivíduos podem, ainda, ser irresponsáveis e exploradores nos seus relacionamentos sexuais. Podem ter história de vários parceiros sexuais e jamais ter mantido um relacionamento monogâmico. Como pais, podem ser irresponsáveis, conforme evidenciado por desnutrição de um filho, doença de um filho resultante de falta de higiene mínima, dependência de vizinhos ou outros familiares para abrigo ou alimento de um filho, fracasso em encontrar um cuidador para um filho pequeno quando está fora de casa ou, ainda, desperdício recorrente do dinheiro necessário para a manutenção doméstica. Esses indivíduos podem ser dispensados do exército de forma desonrosa, fracassar em prover o próprio sustento, empobrecer ou até ficar sem teto ou, ainda, ar muitos anos em institutos penais. São mais propensos a morrer prematuramente de formas violentas (p. ex., suicídio, acidentes, homicídios) do que a população em geral. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial podem também apresentar disforia, incluindo queixas de tensão, incapacidade de tolerar a monotonia e humor deprimido. Podem ter transtornos de ansiedade, transtornos depressivos, transtornos por uso de substância, transtorno de sintomas somáticos, transtorno do jogo e outros transtornos do controle de impulsos associados. Também apresentam com frequência aspectos de personalidade que atendem a critérios de outros transtornos da personalidade, em particular borderline, histriônica e narcisista. A probabilidade de desenvolvimento de transtorno da personalidade antissocial na idade adulta aumenta se o transtorno da conduta do indivíduo teve início na infância (antes dos 10 anos) e se houve também déficit de atenção/hiperatividade associado. Abuso ou negligência infantil, paternidade/maternidade instável ou errática ou disciplina parental inconsistente podem aumentar a probabilidade de o transtorno da conduta evoluir para transtorno da personalidade antissocial.127 127
As chaves foram acrescentadas pelo professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
169
Transtorno Dissociativo de Identidade (anteriormente Transtorno de Personalidade Múltipla) CID-10 DSM-5 Este transtorno está citado na rubrica Outros A característica definidora do transtorno transtornos dissociativos. dissociativo de identidade é a presença de dois ou mais estados de personalidade distintos ou uma experiência de possessão [...]. Entretanto, a manifestação ou dissimulação desses estados de personalidade variam em função da motivação psicológica, do nível de estresse, de conflitos e dinâmicas internas e da resiliência emocional. Períodos longos de perturbação da identidade podem ocorrer quando pressões psicossociais são graves e/ou prolongadas. Em muitos casos de transtorno dissociativo de identidade na forma de possessão, e em uma pequena proporção de formas que não envolvem possessão, as manifestações de identidades alternativas são bastante claras. A maioria dos indivíduos com transtorno dissociativo de identidade que não envolve possessão não exibe abertamente a descontinuidade da identidade por períodos prolongados; apenas uma minoria se apresenta ao atendimento clínico com alternância observável de identidades. Quando estados de personalidade alternados não são observados diretamente, o transtorno pode ser identificado por dois conjuntos de sintomas: 1) alterações ou descontinuidades repentinas no senso de si mesmo e de domínio das próprias ações (Critério A) e 2) amnésias dissociativas recorrentes (Critério B). Sintomas do Critério A estão relacionados a descontinuidades que podem afetar qualquer aspecto do funcionamento de um indivíduo. Indivíduos com transtorno dissociativo de identidade podem relatar o sentimento de teremse tornado subitamente observadores despersonalizados de suas “próprias” falas e ações, e podem sentir-se incapazes de reverter essa situação. Essas pessoas também podem relatar a escuta de vozes (p. ex., a voz de uma criança; a voz de uma entidade espiritual). Em alguns casos, as vozes são vivenciadas como fluxos de pensamentos múltiplos, desconcertantes e independentes, os quais o indivíduo não consegue controlar. Emoções fortes, impulsos e até mesmo a fala ou outras ações podem emergir repentinamente, sem um sentido de domínio ou controle pessoal. Essas emoções e impulsos costumam ser descritos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
170
como ego-distônicos e enigmáticos. Atitudes, opiniões e preferências pessoais (p. ex., acerca de alimentos, atividades, roupas) podem mudar subitamente repetidas vezes. Os indivíduos podem relatar que sentem seus corpos diferentes (p. ex., como uma criança pequena, como o gênero oposto, grandes e musculosos). Alterações no senso de si mesmo e de perda de domínio das próprias ações podem ser acompanhadas por um sentimento de que tais atitudes, emoções e comportamentos – até mesmo o próprio corpo – ‘não são meus’ e/ou ‘não estão sob meu controle’. Embora a maioria dos sintomas do Critério A seja subjetiva, muitas dessas descontinuidades repentinas na fala, no afeto e no comportamento podem ser observadas pela família, por amigos ou pelo clínico. Convulsões não epiléticas e outros sintomas conversivos são proeminentes em algumas apresentações do transtorno dissociativo de identidade, especialmente em contextos não ocidentais. A amnésia dissociativa de indivíduos com transtorno dissociativo de identidade manifestase de três formas principais: como 1) lacunas na memória remota de eventos da vida pessoal (p. ex., períodos da infância ou adolescência; alguns eventos de vida importantes, como a morte de avô/avó, o próprio casamento, dar à luz um filho); 2) lapsos na memória normalmente confiável (p. ex., do que aconteceu hoje, de habilidades bem aprendidas, como as ocupacionais, usar um computador, ler, dirigir); e 3) descoberta de evidências de ações e tarefas cotidianas que eles não lembram terem feito (p. ex., encontrar objetos inexplicáveis em suas sacolas de compras ou entre seus pertences; encontrar escritos ou desenhos incompreensíveis que eles devem ter criado; descobrir ferimentos; ‘voltar a si’ no meio de algo que estava fazendo). Fugas dissociativas, nas quais a pessoa descobre a viagem dissociada, são comuns. Dessa forma, indivíduos com transtorno dissociativo de identidade podem relatar que se encontraram de repente na praia, no trabalho, em uma boate ou em algum lugar em casa (p. ex., no armário, na cama ou no sofá, em um canto) sem lembrar como aí chegaram. A amnésia em indivíduos com transtorno dissociativo de identidade não se limita a eventos estressantes ou traumáticos; “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
171
essas pessoas com frequência também não conseguem recordar os eventos cotidianos. Indivíduos com transtorno dissociativo de identidade variam em termos da consciência e da atitude que têm em relação às suas amnésias. É comum que minimizem seus sintomas amnésicos. Alguns de seus comportamentos amnésicos podem se tornar perceptíveis aos outros – não recordar algo que testemunharam que foi feito ou dito, não lembrar o próprio nome ou não reconhecer o cônjuge, os filhos ou os amigos próximos. A forma de possessão do transtorno dissociativo de identidade manifesta-se, em geral, como comportamentos que surgem como se um ‘espírito’, um ser sobrenatural ou uma entidade externa tivesse assumido o controle, de tal forma que o indivíduo começa a falar e agir de maneira claramente diferente. Por exemplo, o comportamento de uma pessoa pode fazer parecer que sua identidade foi substituída pelo ‘fantasma’ de uma menina que cometeu suicídio na mesma comunidade anos atrás, falando e agindo como se ela ainda estivesse viva. Ou a pessoa pode ser ‘possuída’ por um demônio ou divindade, resultando em uma alteração profunda, e exigindo que a própria pessoa ou um familiar seu seja punido por uma ação do ado, o que é seguido por períodos mais sutis de alteração da identidade. Entretanto, a maioria dos estados de possessão no mundo inteiro é normal, geralmente parte de práticas espirituais e não satisfaz os critérios de transtorno dissociativo de identidade. As identidades que surgem durante o transtorno na forma de possessão apresentam-se de maneira recorrente, são indesejadas e involuntárias, causam sofrimento ou prejuízo clinicamente significativos (Critério C) e não são parte normal de uma prática cultural ou religiosa amplamente aceita (Critério D). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno dissociativo de identidade apresentam-se geralmente com depressão, ansiedade, abuso de substância, automutilação, convulsões não epiléticas ou outros sintomas como comorbidade. Com frequência ocultam, ou não têm consciência completa de, perturbações na consciência, amnésia e outros sintomas dissociativos. Muitos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
172
com o transtorno relatam flash-backs dissociativos durante os quais revivem sensorialmente um evento pregresso como se ele estivesse ocorrendo no presente, em geral com mudança de identidade, perda parcial ou completa de contato com a realidade presente durante o flashback e amnésia subsequente em relação ao conteúdo do flashback. Indivíduos com transtorno dissociativo de identidade comumente relatam múltiplos tipos de maustratos sofridos durante a infância ou a idade adulta. Também podem ser descritas formas que não envolvem maus-tratos, mas que reúnem eventos precoces opressivos na vida, como múltiplos procedimentos médicos prolongados e dolorosos. Automutilação e comportamento suicida são frequentes. Em testes padronizados, esses indivíduos apresentam níveis maiores de suscetibilidade à hipnose e de capacidade dissociativa comparados a outros grupos clínicos e controles sadios. Algumas pessoas sofrem fenômenos ou episódios psicóticos transitórios. Várias regiões do cérebro foram implicadas na fisiopatologia do transtorno dissociativo de identidade, incluindo o córtex orbitofrontal, o hipocampo, o giro parahipocampal e a amígdala. Transtornos do Humor (ou Depressivos, ou ainda, relacionados ao Bipolarismo) Distimia (ou Transtrono Depressivo Persistente) CID-10 DSM-5 Rebaixamento crônico do humor, persistindo A característica essencial do transtorno ao menos por vários anos, mas cuja gravidade depressivo persistente (distimia) é um humor não é suficiente ou na qual os episódios depressivo que ocorre na maior parte do dia, na individuais são muito curtos para responder maioria dos dias, por pelo menos dois anos, ou aos critérios de transtorno depressivo por pelo menos um ano para crianças e recorrente grave, moderado ou leve. adolescentes (Critério A). Esse transtorno representa uma consolidação do transtorno depressivo maior crônico e do transtorno distímico definidos no DSM-4. Depressão maior pode preceder o transtorno depressivo persistente, e episódios depressivos maiores podem ocorrer durante o transtorno depressivo persistente. Os indivíduos cujos sintomas satisfazem os critérios para transtorno depressivo maior por dois anos devem receber diagnóstico de transtorno depressivo persistente, além de transtorno depressivo maior. Os indivíduos com transtorno depressivo persistente descrevem seu humor como triste ou “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
173
“na fossa”. Durante os períodos de humor deprimido, pelo menos dois dos seis sintomas do Critério B estão presentes. Como esses sintomas tornaram-se uma parte tão presente na experiência cotidiana do indivíduo, em particular no caso de início precoce (p. ex., “Sempre fui desse jeito”), eles podem não ser relatados, a menos que diretamente investigados pelo entrevistador. Durante o período de dois anos (um ano para crianças ou adolescentes), qualquer intervalo livre de sinto- mas dura não mais do que dois meses (Critério C). Ciclotimia (ou transtorno ciclotímico) CID-10 Instabilidade persistente do humor que comporta numerosos períodos de depressão ou de leve elação nenhum deles suficientemente grave ou prolongado para responder aos critérios de um transtorno afetivo bipolar ou de um transtorno depressivo recorrente. O transtorno se encontra frequentemente em familiares de pacientes que apresentam um transtorno afetivo bipolar. Algumas pessoas ciclotímicas apresentarão elas próprias ulteriormente um transtorno afetivo bipolar.
DSM-5 O transtorno ciclotímico tem como característica essencial a cronicidade e a oscilação do humor, envolvendo vários períodos de sintomas hipomaníacos e períodos de sintomas depressivos distintos entre si (Critério A). Os sintomas [a princípio] hipomaníacos têm número, gravidade, abrangência ou duração insuficientes para preencher a todos os critérios de um episódio hipomaníaco; e os sintomas depressivos têm número, gravidade, abrangência ou duração insuficientes para preencher a todos os critérios de um episódio depressivo maior. Durante o período inicial de dois anos (um ano para crianças e adolescentes), os sintomas precisam ser persistentes (presentes na maioria dos dias), e qualquer intervalo sem sintomas não pode durar mais do que dois meses (Critério B). O diagnóstico de transtorno ciclotímico é feito somente quando os critérios para episódio depressivo maior, maníaco ou hipomaníaco nunca foram satisfeitos (Critério C). Se um indivíduo com transtorno ciclotímico subsequente (i.e., após os primeiros dois anos em adultos e um ano em crianças e adolescentes) apresenta um episódio depressivo maior, maníaco ou hipomaníaco, o diagnóstico muda para transtorno depressivo maior, transtorno bipolar tipo I, outro transtorno bipolar e transtorno relacionado especificado ou transtorno bipolar e transtorno relacionado não especificado (subclassificado como episódio hipomaníaco sem episódio depressivo maior anterior), respectivamente, e o diagnóstico de transtorno ciclotímico é abandonado.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
174
O diagnóstico de transtorno ciclotímico não é feito se o padrão de mudanças do humor é mais bem explicado por transtorno esquizoafetivo, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno delirante, outro transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico especificado ou transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico não especificado (Critério D), caso em que os sintomas de humor são considerados características associadas ao transtorno psicótico. A perturbação do humor também não deve ser atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento) ou a outra condição médica (p. ex., hipertireoidismo) (Critério E). Embora alguns indivíduos possam funcionar particularmente bem durante certos períodos de hipomania, ao longo do curso prolongado do transtorno deve ocorrer sofrimento ou prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo em consequência da perturbação do humor (Critério F). O prejuízo pode se desenvolver em decorrência de períodos prolongados de mudanças cíclicas do humor, frequentemente imprevisíveis (p. ex., o indivíduo pode ser visto como temperamental, mal-humorado, imprevisível, incoerente ou não confiável). Transtorno Bipolar CID-10 Transtorno caracterizado por dois ou mais episódios nos quais o humor e o nível de atividade do sujeito estão profundamente perturbados, sendo que este distúrbio consiste em algumas ocasiões de uma elevação do humor e aumento da energia e da atividade (hipomania ou mania) e em outras, de um rebaixamento do humor e de redução da energia e da atividade (depressão). [...] Inclui: doença maníaco-depressiva psicose maníaco-depressiva reação maníaco-depressiva Exclui: ciclotimia
DSM-5 Tipo I (Episódio Maníaco) Para diagnosticar transtorno bipolar tipo I, é necessário o preenchimento dos critérios a seguir para um episódio maníaco. O episódio maníaco pode ter sido antecedido ou seguido por episódios hipomaníacos ou depressivos maiores. Episódio Maníaco A. Um período distinto de humor anormal e persistentemente elevado, expansivo ou irritável e aumento anormal e persistente da atividade dirigida a objetivos ou da energia, com duração mínima de uma semana e presente na maior parte do dia, quase todos os dias (ou qualquer duração, se a hospitalização se fizer necessária). B. Durante o período de perturbação do humor e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
175
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual hipomaníaco Episódio atual correspondente à descrição de uma hipomania tendo ocorrido, no ado, ao menos um outro episódio afetivo (hipomaníaco, maníaco, depressivo ou misto). Transtorno afetivo bipolar, episódio atual maníaco sem sintomas psicóticos Episódio atual maníaco correspondente à descrição de um episódio maníaco sem sintomas psicóticos, tendo ocorrido, no ado, ao menos um outro episódio afetivo (hipomaníaco, maníaco, depressivo ou misto). Transtorno afetivo bipolar, episódio atual maníaco com sintomas psicóticos Episódio atual correspondente à descrição de um episódio maníaco com sintomas psicóticos, tendo ocorrido, no ado, ao menos um outro episódio afetivo (hipomaníaco, maníaco, depressivo ou misto). Transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo leve ou moderado Episódio atual correspondente à descrição de um episódio depressivo leve ou moderado128, tendo ocorrido, no ado, ao menos um episódio afetivo hipomaníaco, maníaco ou misto bem comprovado. Transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo grave sem sintomas psicóticos Episódio atual correspondente à descrição de um episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos129, tendo ocorrido, no ado, ao menos um episódio afetivo hipomaníaco, maníaco ou misto bem documentado. Transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo grave com sintomas psicóticos Episódio atual correspondente à descrição de
aumento da energia ou atividade, três (ou mais) dos seguintes sintomas (quatro se o humor é apenas irritável) estão presentes em grau significativo e representam uma mudança notável do comportamento habitual: 1. Autoestima inflada ou grandiosidade. 2. Redução da necessidade de sono (p. ex., sente-se descansado com apenas três horas de sono). 3. Mais loquaz que o habitual ou pressão para continuar falando. 4. Fuga de ideias ou experiência subjetiva de que os pensamentos estão acelerados. 5. Distratibilidade (i.e., a atenção é desviada muito facilmente por estímulos externos insignificantes ou irrelevantes), conforme relatado ou observado. 6. Aumento da atividade dirigida a objetivos (seja socialmente, no trabalho ou escola, seja sexualmente) ou agitação psicomotora (i.e., atividade sem propósito não dirigida a objetivos). 7. Envolvimento excessivo em atividades com elevado potencial para consequências dolorosas (p. ex., envolvimento em surtos desenfreados de compras, indiscrições sexuais ou investimentos financeiros insensatos). C. A perturbação do humor é suficientemente grave a ponto de causar prejuízo acentuado no funcionamento social ou profissional ou para necessitar de hospitalização a fim de prevenir dano a si mesmo ou a outras pessoas, ou existem características psicóticas. D. O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento, outro tratamento) ou a outra condição médica. Nota: Um episódio maníaco completo que surge durante tratamento antidepressivo (p. ex., medicamento, eletroconvulsoterapia), mas que persiste em um nível de sinais e sintomas além do efeito fisiológico desse tratamento, é
128
Leve - Geralmente estão presentes ao menos dois ou três dos sintomas citados anteriormente. O paciente usualmente sofre com a presença destes sintomas mas provavelmente será capaz de desempenhar a maior parte das atividades. Moderado - Geralmente estão presentes quatro ou mais dos sintomas citados anteriormente e o paciente aparentemente tem muita dificuldade para continuar a desempenhar as atividades de rotina. (CID 10). 129 Grave ou Severo - Episódio depressivo onde vários dos sintomas são marcantes e angustiantes, tipicamente a perda da autoestima e ideias de desvalia ou culpa. As ideias e os atos suicidas são comuns e observa-se em geral uma série de sintomas "somáticos". (CID 10)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
176
um episódio depressivo grave com sintomas evidência suficiente para um episódio maníaco psicóticos130, tendo ocorrido, no ado, ao e, portanto, para um diagnóstico de transtorno menos um episódio afetivo hipomaníaco, bipolar tipo I. maníaco ou misto bem comprovado. Episódio Hipomaníaco Transtorno afetivo bipolar, episódio atual A. Um período distinto de humor anormal e persistentemente elevado, expansivo ou irritável misto Ocorrência, no ado, de ao menos um e aumento anormal e persistente da atividade ou episódio afetivo maníaco, hipomaníaco ou energia, com duração de pelo menos quatro dias misto bem documentado, e episódio atual consecutivos e presente na maior parte do dia, caracterizado pela presença simultânea de quase todos os dias. sintomas maníacos e depressivos ou por uma B. Durante o período de perturbação do humor e alternância rápida de sintomas maníacos e aumento da energia e atividade, três (ou mais) depressivos. dos seguintes sintomas (quatro se o humor é Exclui: episódio afetivo misto isolado apenas irritável) persistem, representam uma mudança notável em relação ao comportamento Transtorno afetivo bipolar, atualmente em habitual e estão presentes em grau significativo: (Vide os itens de 1 a 7 do Episódio Maníaco) remissão Ocorrência, no ado, de ao menos um C. O episódio está associado a uma mudança episódio afetivo maníaco, hipomaníaco ou clara no funcionamento que não é característica misto muito bem comprovado, e de ao menos do indivíduo quando assintomático. um outro episódio afetivo (hipomaníaco, D. A perturbação no humor e a mudança no maníaco, depressivo ou misto) mas sem funcionamento são observáveis por outras nenhuma perturbação significativa do humor, pessoas. nem atualmente nem no curso dos últimos E. O episódio não é suficientemente grave a meses. As remissões sob tratamento profilático ponto de causar prejuízo acentuado no devem ser classificadas aqui. funcionamento social ou profissional ou para necessitar de hospitalização. Existindo características psicóticas, por definição, o episódio é maníaco. F. O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento ou outro tratamento). Nota: Um episódio hipomaníaco completo que surge durante tratamento antidepressivo (p. ex., medicamento, eletroconvulsoterapia), mas que persiste em um nível de sinais e sintomas além do efeito fisiológico desse tratamento, é evidência suficiente para um diagnóstico de episódio hipomaníaco. Recomenda-se, porém, cautela para que 1 ou 2 sintomas (principalmente aumento da irritabilidade, nervosismo ou agitação após uso de antidepressivo) não sejam considerados suficientes para o diagnóstico de episódio hipomaníaco nem necessariamente indicativos 130
Episódio depressivo correspondente á descrição de um episódio depressivo grave mas acompanhado de alucinações, ideias delirantes, de uma lentidão psicomotora ou de estupor de uma gravidade tal que todas as atividades sociais normais tornam-se impossíveis; pode existir o risco de morrer por suicídio, de desidratação ou de desnutrição. As alucinações e os delírios podem não corresponder ao caráter dominante do distúrbio afetivo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
177
de uma diátese bipolar. Episódio Depressivo Maior A. Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo período de duas semanas e representam uma mudança em relação ao funcionamento anterior; pelo menos um dos sintomas é (1) humor deprimido ou (2) perda de interesse ou prazer. Nota: Não incluir sintomas que sejam claramente atribuíveis a outra condição médica. 1. Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, conforme indicado por relato subjetivo (p. ex., sente-se triste, vazio ou sem esperança) ou por observação feita por outra pessoa (p. ex., parece choroso). (Nota: Em crianças e adolescentes, pode ser humor irritável.) 2. Acentuada diminuição de interesse ou prazer em todas, ou quase todas, as atividades na maior parte do dia, quase todos os dias (conforme indicado por relato subjetivo ou observação feita por outra pessoa). 3. Perda ou ganho significativo de peso sem estar fazendo dieta (p.ex., mudança de mais de 5% do peso corporal em um mês) ou redução ou aumento no apetite quase todos os dias. (Nota: Em crianças, considerar o insucesso em obter o ganho de peso esperado.) 4.Insônia ou hipersonia quase diária. 5. Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias (observável por outras pessoas; não meramente sensações subjetivas de inquietação ou de estar mais lento). 6. Fadiga ou perda de energia quase todos os dias. 7. Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada (que podem ser delirantes) quase todos os dias (não meramente autorrecriminação ou culpa por estar doente). 8. Capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, ou indecisão quase todos os dias (por relato subjetivo ou observação feita por outra pessoa). 9. Pensamentos recorrentes de morte (não somente medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano específico, tentativa de suicídio ou plano específico para cometer suicídio. B. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
178
social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. C. O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância ou a outra condição médica. Nota: Os Critérios A-C representam um episódio depressivo maior. Esse tipo de episódio é comum no transtorno bipolar tipo I, embora não seja necessário para o diagnóstico desse transtorno. Nota: Respostas a uma perda significativa (p. ex., luto, ruína financeira, perdas por desastre natural, doença médica grave ou incapacidade) podem incluir sentimentos de tristeza intensos, ruminação acerca da perda, insônia, falta de apetite e perda de peso observados no Critério A, que podem se assemelhar a um episódio depressivo. Embora tais sintomas possam ser entendidos ou considerados apropriados à perda, a presença de um episódio depressivo maior, além da resposta normal a uma perda significativa, deve ser também cuidadosamente considerada. Essa decisão exige inevitavelmente exercício do juízo clínico, baseado na história do indivíduo e nas normas culturais para a expressão de sofrimento no contexto de uma perda. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Durante um episódio maníaco, é comum os indivíduos não perceberem que estão doentes ou necessitando de tratamento, resistindo, com veemência, às tentativas de tratamento. Podem mudar a forma de se vestir, a maquiagem ou a aparência pessoal para um estilo com maior apelo sexual ou extravagante. Alguns percebem maior acurácia olfativa, auditiva ou visual. Jogos de azar e comportamentos antissociais podem acompanhar o episódio maníaco. Há pessoas que podem se tornar hostis e fisicamente ameaçadoras a outras e, quando delirantes, podem agredir fisicamente ou suicidar-se. As consequências catastróficas de um episódio maníaco (p. ex., hospitalização involuntária, dificuldades com a justiça, dificuldades financeiras graves) costumam resultar do juízo crítico prejudicado, da perda de insight e da hiperatividade. O humor pode mudar rapidamente para raiva ou depressão. Podem ocorrer sintomas depressivos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
179
durante um episódio maníaco e, quando presentes, durar momentos, horas ou, mais raramente, dias [...]. Tipo II (Episódio Hipomaníaco) A. Foram atendidos os critérios para pelo menos um episódio hipomaníaco (Critérios A-F em “Episódio Hipomaníaco” descritos anteriormente). B. Jamais houve um episódio maníaco. C. A ocorrência do(s) episódio(s) hipomaníaco(s) e depressivo(s) maior(es) não é mais bem explicada por transtorno esquizoafetivo, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno de- lirante, outro transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico especificado ou transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico não especificado. D. Os sintomas de depressão ou a imprevisibilidade causada por alternância frequente entre pe- ríodos de depressão e hipomania causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outra área importante da vida do indivíduo. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Uma característica comum do transtorno bipolar tipo II é a impulsividade, que pode contribuir com tentativas de suicídio e transtornos por uso de substância. A impulsividade pode também se originar de um transtorno da personalidade comórbido, transtorno por uso de substância, transtorno de ansiedade, outro transtorno mental ou uma condição médica. Pode haver níveis aumentados de criatividade em alguns indivíduos com transtorno bipolar. A relação pode ser, no entanto, não linear; isto é, grandes realizações criativas na vida têm sido associadas a formas mais leves de transtorno bipolar, e criatividade superior foi identificada em familiares não afetados. A satisfação que o indivíduo tem com a criatividade aumentada durante episódios hipomaníacos pode contribuir para ambivalência quanto a buscar tratamento ou prejudicar a adesão a ele.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
180
Transtorno Depressivo Maior CID-10 DSM-5 Transtorno depressivo recorrente, episódio Vide item anterior. atual grave sem sintomas psicóticos Transtorno caracterizado pela ocorrência repetida de episódios depressivos, sendo o episódio atual grave, sem sintomas psicóticos, [...] na ausência de qualquer antecedente de mania. Depressão: endógena maior recorrente sem sintomas psicóticos vital recorrente Transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave com sintomas psicóticos Transtorno caracterizado pela ocorrência repetida de episódios depressivos, sendo o episódio atual grave, com sintomas psicóticos, [...] na ausência de qualquer antecedente de mania. Depressão endógena com sintomas psicóticos Episódio recorrente grave (de): depressão: maior com sintomas psicóticos psicótica psicose depressiva: psicogênica reativa Psicose maníaco-depressiva, forma depressiva, com sintomas psicóticos. Transtornos Alimentares Pica CID-10 (Pica do lactente ou da criança) Transtorno caracterizado pelo consumo duradouro de substâncias não-nutritivas (por exemplo, terra, lascas de pintura etc). Pode constituir um comportamento psicopatológico relativamente isolado ou fazer parte de um transtorno psicuquiátrico mais global (tal como o autismo). Um diagnóstico de pica deve ficar reservado às manifestações isoladas. Este comportamento se observa sobretudo em crianças que apresentam retardo mental; na presença de um retardo mental, este último deve constituir o diagnóstico principal.
DSM-5 A característica essencial da pica é a ingestão de uma ou mais substâncias não nutritivas, não alimentares, de forma persistente durante um período mínimo de um mês (Critério A), grave o suficiente para merecer atenção clínica. As substâncias típicas ingeridas tendem a variar com a idade e a disponibilidade e podem incluir papel, sabão, tecido, cabelo, fios, terra, giz, talco, tinta, cola, metal, pedras, carvão vegetal ou mineral, cinzas, detergente ou gelo. O termo não alimentar está incluso porque o diagnóstico de pica não se aplica à ingestão de produtos alimentares com conteúdo nutricional mínimo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
181
Geralmente não há aversão a alimentos em geral. É preciso que a ingestão de substâncias não nutritivas, não alimentares, seja inapropriada ao estágio de desenvolvimento (Critério B) e não parte de uma prática culturalmente aceita (Critério C). Sugere-se uma idade mínima de 2 anos para o diagnóstico de pica, de modo a excluir a exploração de objetos com a boca que acabam por ser ingeridos, normal no desenvolvimento das crianças pequenas. A ingestão de substâncias não nutritivas, não alimentares, pode ser um aspecto associado a outros transtornos mentais (p. ex., deficiência intelectual [transtorno do desenvolvimento intelectual], transtorno do espectro autista, esquizofrenia). Se o comportamento alimentar ocorrer exclusivamente no contexto de outro transtorno mental, então um diagnóstico distinto de pica deverá ser feito apenas se o comportamento alimentar for grave o suficiente a ponto de demandar atenção clínica adicional (Critério D). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Embora deficiências de vitaminas e minerais (p. ex., zinco, ferro) tenham sido descritas em alguns casos, frequentemente nenhuma outra anormalidade biológica é encontrada. Em algumas ocasiões, a pica chega à atenção clínica somente acompanhando complicações médicas gerais (p. ex., problemas intestinais mecânicos; obstrução intestinal, como a que resulta de um bezoar; perfuração intestinal; infecções como toxoplasmose e toxocaríase em decorrência da ingestão de fezes ou sujeira; intoxicação, como pela ingestão de tinta à base de chumbo). Anorexia Nervosa CID-10 Anorexia nervosa é um transtorno caracterizado por perda de peso intencional, induzida e mantida pelo paciente. O transtorno ocorre comumente numa mulher adolescente ou jovem, mas pode igualmente ocorrer num homem adolescente ou jovem, como numa criança próxima à puberdade ou numa mulher de mais idade até na menopausa. A doença está associada a uma psicopatologia específica, compreendendo um medo de engordar e de ter uma silhueta arredondada,
DSM-5 A anorexia nervosa tem três características essenciais: restrição persistente da ingesta calórica; medo intenso de ganhar peso ou de engordar ou comportamento persistente que interfere no ganho de peso; e perturbação na percepção do próprio peso ou da própria forma. O indivíduo mantém um peso corporal abaixo daquele minimamente normal para idade, gênero, trajetória do desenvolvimento e saúde física (Critério A). O peso corporal dessas pessoas com frequência satisfaz esse critério
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
182
depois de uma perda ponderal significativa, porém, entre crianças e adolescentes, pode haver insucesso em obter o ganho de peso esperado ou em manter uma trajetória de desenvolvimento normal (i.e., enquanto cresce em altura) em vez de perda de peso. O Critério A requer que o peso do indivíduo esteja significativamente baixo (i.e., inferior à faixa mínima normal ou, no caso de crianças e adolescentes, inferior à faixa mínima esperada). [...] Indivíduos com esse transtorno exibem geralmente medo intenso de ganhar peso ou de engordar (Critério B). Esse medo intenso de Anorexia Nervosa Atípica Transtornos que apresentam algumas das engordar não costuma ser aliviado pela perda de características da anorexia nervosa mas cujo peso. Na verdade, a preocupação acerca do peso quadro clínico global não justifica tal pode aumentar até mesmo se o peso dimimuir. diagnóstico. Por exemplo, um dos sintomas- Indivíduos mais jovens com anorexia nervosa, chave, tal como um temor acentuado de ser bem como alguns adultos, podem não gordo ou a amenorréia, pode estar ausente na reconhecer ou perceber medo de ganhar peso. presença de uma acentuada perda de peso e de Na ausência de outra explicação para o peso um comportamento para emagrecer. significativamente baixo, podem ser usados, Este diagnóstico não deve ser feito na presença para estabelecer o Critério B, a inferência do de transtornos físicos conhecidos associados à clínico a partir da história fornecida por perda de peso. informantes, dados de observação, achados físicos e laboratoriais ou curso longitudinal indicando seja um medo de ganhar peso, seja comportamentos persistentes relacionados que impeçam o ganho de peso. A vivência e a significância do peso e da forma corporal são distorcidas nesses indivíduos [tipo de dismorfia] (Critério C). Algumas pessoas sentem-se completamente acima do peso. Outras percebem que estão magras, mas ainda assim se preocupam com determinadas partes do corpo, em particular que o abdome, os glúteos e o quadril estão “gordos demais”. Elas podem empregar uma variedade de técnicas para avaliar o tamanho ou o peso de seus corpos, incluindo pesagens frequentes, medição obsessiva de partes do corpo e uso persistente de um espelho para checar áreas percebidas de “gordura”. A estima de indivíduos com anorexia nervosa é altamente dependente de suas percepções da forma e do peso corporal. A perda de peso é, com frequência, vista como uma conquista marcante e um sinal de autodisciplina extraordinária, enquanto o ganho ponderal é percebido como falha de autocontrole inaceitável. Embora alguns indivíduos com esse transtorno talvez “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo) intrusão persistente de uma idéia supervalorizada. Os pacientes se impõem a si mesmos um baixo peso. Existe comumente desnutrição de grau variável que se acompanha de modificações endócrinas e metabólicas secundárias e de perturbações das funções fisiológicas. Os sintomas compreendem uma restrição das escolhas alimentares, a prática excessiva de exercícios físicos, vômitos provocados e a utilização de laxantes, anorexígeros e de diuréticos.
183
reconheçam que estão magros, frequentemente não assumem as graves implicações médicas de seu estado de desnutrição. Geralmente, o indivíduo é levado à atenção profissional por familiares depois de perda de peso marcante (ou insucesso em obter o ganho de peso esperado) ter ocorrido. Se buscam ajuda por si mesmos, costuma ser devido à angústia causada por sequelas somáticas e psicológicas da inanição. É raro uma pessoa com anorexia nervosa queixar-se da perda de peso por si só. Na verdade, indivíduos com anorexia nervosa com frequência carecem de insight ou negam o problema. É, portanto, importante obter informações de familiares ou de outras fontes para avaliar a história da perda de peso e outros aspectos da doença. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A semi-inanição da anorexia nervosa e os comportamentos purgativos às vezes associados a ela podem resultar em condições médicas importantes e potencialmente fatais. O comprometimento nutricional associado a esse transtorno afeta a maioria dos sistemas corporais e pode produzir uma variedade de perturbações. Perturbações fisiológicas, incluindo amenorreia [ausência de período menstrual] e anormalidades nos sinais vitais, são comuns. Enquanto grande parte das perturbações fisiológicas associadas à desnutrição é reversível com reabilitação nutricional, algumas, incluindo a perda de densidade óssea mineral, com frequência não são completamente reversíveis. Comportamentos como vômitos autoinduzidos e uso indevido de laxantes, diuréticos e enemas [introdução de substâncias líquidas ou semilíquidas através do esfíncter anal, com o objetivo de induzir a defecação ou istrar medicamentos] podem causar uma série de distúrbios que levam a achados laboratoriais anormais; entretanto, alguns indivíduos com anorexia nervosa não exibem tais anormalidades. Quando gravemente abaixo do peso, indivíduos com anorexia nervosa apresentam sinais e sintomas depressivos, como humor deprimido, isolamento social, irritabilidade, insônia e diminuição da libido. Na medida em que alguns “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
184
desses aspectos também são observados em indivíduos sem anorexia nervosa, mas significativamente subnutridos, muitos dos aspectos depressivos podem ser secundários às sequelas fisiológicas da semi-inanição, embora também possam ser graves o suficiente para justificar um diagnóstico adicional de transtorno depressivo. Características obsessivo-compulsivas, relacionadas ou não à alimentação, são com frequência proeminentes. A maioria dos indivíduos com anorexia nervosa é centrada na preocupação com os alimentos. Alguns colecionam receitas e estocam comida. Observações de comportamentos associados a outras formas de inanição sugerem que obsessões e compulsões relacionadas à alimentação podem ser exacerbadas por subnutrição. Quando indivíduos com anorexia nervosa exibem obsessões e compulsões não relacionadas a alimentos, forma corporal ou peso, um diagnóstico adicional de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) pode ser justificável. Outros aspectos por vezes associados à anorexia nervosa incluem angústia de alimentar-se publicamente, sentimentos de fracasso, forte desejo por controlar o próprio ambiente, pensamentos inflexíveis, espontaneidade social limitada e expressão emocional excessivamente contida. Comparados a indivíduos com anorexia nervosa do tipo restritiva, os que têm anorexia nervosa do tipo compulsão alimentar purgativa apresentam taxas maiores de impulsividade e tendem a abusar mais de álcool e outras drogas. Um subgrupo de indivíduos com anorexia nervosa exibe níveis excessivos de atividade física. Aumentos na atividade física com frequência precedem a manifestação inicial do transtorno, e, durante o curso da doença, a atividade física mais intensa acelera a perda de peso. Durante o tratamento, talvez seja difícil controlar o excesso de atividade física, prejudicando, assim, a recuperação do peso. Indivíduos com anorexia nervosa podem fazer uso indevido de medicamentos, como, por exemplo, manipular a dosagem para conseguir perder peso ou evitar ganhá-lo. Aqueles com diabetes melito podem omitir ou reduzir as doses de insulina a fim de minimizar o metabolismo de carboidratos. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
185
Bulimia Nervosa CID-10 A bulimia é uma síndrome caracterizada por os repetidos de hiperfagia e uma preocupação excessiva com relação ao controle do peso corporal conduzindo a uma alternância de hiperfagia e vômitos ou uso de purgativos. Este transtorno partilha diversas características psicológicas com a anorexia nervosa, dentre as quais uma preocupação exagerada com a forma e peso corporais. Os vômitos repetidos podem provocar perturbações eletrolíticas e complicações somáticas. Nos antecedentes encontra-se freqüentemente, mas nem sempre, um episódio de anorexia nervosa ocorrido de alguns meses a vários anos antes. Bulimia Nervosa Atípica Transtornos que apresentam algumas características da bulimia nervosa mas cujo quadro clínico global não justifica tal diagnóstico. Por exemplo, pode haver os repetidos de hiperfagia e de uso exagerado de laxativos sem uma alteração significativa de peso ou então a preocupação típica e exagerada com a forma e peso corporais pode estar ausente.
DSM-5 Existem três aspectos essenciais na bulimia nervosa: episódios recorrentes de compulsão alimentar (Critério A), comportamentos compensatórios inapropriados recorrentes para impedir o ganho de peso (Critério B) e autoavaliação indevidamente influenciada pela forma e pelo peso corporais (Critério D). Para se qualificar ao diagnóstico, a compulsão alimentar e os comportamentos compensatórios inapropriados devem ocorrer, em média, no mínimo uma vez por semana por três meses (Critério C). Um “episódio de compulsão alimentar” é definido como a ingestão, em um período de tempo determinado, de uma quantidade de alimento definitivamente maior do que a maioria dos indivíduos comeria em um mesmo período de tempo em circunstâncias semelhantes (Critério A1). O contexto no qual a ingestão ocorre pode afetar a estimativa do clínico quanto à ingestão ser ou não excessiva. Por exemplo, uma quantidade de alimento que seria considerada excessiva para uma refeição típica poderia ser considerada normal durante uma refeição comemorativa ou nas festas de fim de ano. Um “período de tempo determinado” refere-se a um período limitado, normalmente menos de duas horas. Um único episódio de compulsão alimentar não precisa se restringir a um contexto. Por exemplo, um indivíduo pode iniciar um comportamento de compulsão alimentar no restaurante e depois continuar a comer ao voltar para casa. Lanches contínuos de pequenas quantidades de alimento ao longo do dia não seriam considerados compulsão alimentar. Uma ocorrência de consumo excessivo de alimento deve ser acompanhada por uma sensação de falta de controle (Critério A2) para ser considerada um episódio de compulsão alimentar. Um indicador de perda de controle é a incapacidade de abster-se de comer ou de parar de comer depois de começar. Alguns indivíduos descrevem uma qualidade dissociativa durante, ou em seguida a, episódios de compulsão alimentar. O prejuízo no controle associado à compulsão alimentar pode não ser absoluto; por exemplo, um indivíduo pode
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
186
continuar a comer de forma compulsiva enquanto o telefone está tocando, mas vai parar se um amigo ou o cônjuge entrar inesperadamente no recinto. Alguns relatam que seus episódios de compulsão alimentar não são predominantemente caracterizados por um sentimento agudo de perda de controle, e sim por um padrão mais generalizado de ingestão descontrolada. Se relatarem que desistiram de tentar controlar a ingestão, a perda de controle deverá ser considerada presente. A compulsão alimentar também pode ser planejada, em alguns casos. O tipo de alimento consumido durante episódios de compulsão alimentar varia tanto entre diferentes pessoas quanto em um mesmo indivíduo. A compulsão alimentar parece ser caracterizada mais por uma anormalidade na quantidade de alimento consumida do que por uma fissura por um nutriente específico. Entretanto, durante episódios de compulsão alimentar, os indivíduos tendem a consumir alimentos que evitariam em outras circunstâncias. Indivíduos com bulimia nervosa em geral sentem vergonha de seus problemas alimentares e tentam esconder os sintomas. A compulsão alimentar normalmente ocorre em segredo ou da maneira mais discreta possível. Com frequência continua até que o indivíduo esteja desconfortável ou até mesmo dolorosamente cheio. O antecedente mais comum da compulsão alimentar é o afeto negativo. Outros gatilhos incluem fatores de estresse interpessoais; restrições dietéticas; sentimentos negativos relacionados ao peso corporal, à forma do corpo e a alimentos; e tédio. A compulsão alimentar pode minimizar ou aliviar fatores que precipitam o episódio a curto prazo, mas a autoavaliação negativa e a disforia com frequência são as consequências tardias. Outro aspecto essencial da bulimia nervosa é o uso recorrente de comportamentos compensatórios inapropriados para impedir o ganho de peso, conhecidos coletivamente como comportamentos purgativos, ou purgação (Critério B). Muitos indivíduos com bulimia nervosa empregam vários métodos para compensar a compulsão alimentar. Vomitar é o comportamento compensatório inapropriado mais comum. Os efeitos imediatos dos vômitos “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
187
incluem alívio do desconforto físico e redução do medo de ganhar peso. Em alguns casos, vomitar torna-se um objetivo em si, e o indivíduo comerá excessiva e compulsivamente a fim de vomitar, ou vomitará depois de ingerir uma pequena quantidade de alimento. Indivíduos com bulimia nervosa podem usar uma variedade de métodos para induzir o vômito, incluindo o uso dos dedos ou instrumentos para estimular o reflexo do vômito. Geralmente se tornam peritos em induzir vômitos e acabam conseguindo vomitar quando querem. Raramente, consomem xarope de ipeca para induzir o vômito. Outros comportamentos purgativos incluem o uso indevido de laxantes e diuréticos. Uma série de outros métodos compensatórios também pode ser usada em casos raros. Indivíduos com bulimia nervosa podem usar indevidamente enemas após episódios de compulsão alimentar, mas raramente este se trata do único mecanismo compensatório empregado. As pessoas com esse transtorno podem tomar hormônio da tireoide em uma tentativa de evitar o ganho de peso. Aquelas com diabetes melito e bulimia nervosa podem omitir ou diminuir doses de insulina a fim de reduzir a metabolização do alimento consumido durante episódios de compulsão alimentar. Indivíduos com o transtorno, ainda, podem jejuar por um dia ou mais ou se exercitar excessivamente na tentativa de impedir o ganho de peso. O exercício pode ser considerado excessivo quando interfere de maneira significativa em atividades importantes, quando ocorre em horas inapropriadas ou em contextos inapropriados ou quando o indivíduo continua a se exercitar a despeito de uma lesão ou outras complicações médicas. Indivíduos com bulimia nervosa enfatizam de forma excessiva a forma ou o peso do corpo em sua autoavaliação, e esses fatores são extremamente importantes para determinar sua autoestima (Critério D). Eles podem lembrar muito os portadores de anorexia nervosa pelo medo de ganhar peso, pelo desejo de perder peso e pelo nível de insatisfação com o próprio corpo. Entretanto, um diagnóstico de bulimia nervosa não deve ser dado quando a perturbação só ocorrer durante episódios de anorexia nervosa (Critério E). “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
188
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com bulimia nervosa estão geralmente dentro da faixa normal de peso ou com sobre-peso (IMC > 18,5 kg/m2 e < 30 em adultos). O transtorno ocorre, mas é incomum, entre indiví- duos obesos. Entre os episódios de compulsão alimentar, indivíduos com bulimia nervosa costumam restringir seu consumo calórico total e optam, de preferência, por alimentos hipocalóricos (“dietéticos”), ao mesmo tempo que evitam alimentos que percebem como engordantes ou com potencial para desencadear compulsão alimentar. Irregularidade menstrual ou amenorreia ocorrem com frequência em mulheres com bulimia nervosa; não está claro se tais perturbações estão relacionadas a oscilações no peso, a deficiências nutricionais ou a sofrimento emocional. Os distúrbios hidreletrolíticos decorrentes do comportamento purgativo são por vezes graves o suficiente para constituirem problemas clinicamente sérios. Complicações raras, porém fatais, incluem lacerações esofágicas, ruptura gástrica e arritmias cardíacas. Miopatias esqueléticas e cardíacas graves foram relatadas em indivíduos depois do uso repetido de xarope de ipeca para induzir o vômito. Indivíduos que abusam cronicamente de laxantes podem tornar-se dependentes do seu uso para estimular movimentos intestinais. Sintomas gastrintestinais costumam estar associados a bulimia nervosa, e prolapso retal já foi relatado entre indivíduos com esse transtorno. Transtorno de Compulsão Alimentar (ou, Hiperfagia) CID-10 DSM-5 Hiperfagia Associada A Outros Distúrbios A característica essencial do transtorno de Psicológicos compulsão alimentar são episódios recorrentes de compulsão alimentar que devem ocorrer, em Hiperfagia devida a eventos estressantes, tais média, ao menos uma vez por semana durante como lutos, acidentes, partos etc. três meses (Critério D). Um “episódio de Hiperfagia psicogênica. compulsão alimentar” é definido como a ingestão, em um período determinado, de uma quantidade de alimento definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria em um mesmo período sob circunstâncias semelhantes (Critério A1). O contexto em que a ingestão ocorre pode afetar a estimativa do clínico “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
189
quanto à ingestão ser ou não excessiva. Por exemplo, uma quantidade de alimento que seria considerada excessiva para uma refeição típica seria considerada normal durante uma refeição comemorativa ou nas festas de fim de ano. Um “período de tempo determinado” refere-se a um período delimitado, geralmente inferior a duas horas. Não é necessário que um episódio de compulsão alimentar limite-se a um único contexto. Por exemplo, um indivíduo pode começar a comer compulsivamente em um restaurante e depois continuar a comer quando volta para casa. Lanches contínuos em pequenas quantidades de alimento ao longo do dia não seriam considerados compulsão alimentar. Uma ocorrência de consumo excessivo de alimento deve ser acompanhada por uma sensação de falta de controle (Critério A2) para ser considerada um episódio de compulsão alimentar. Um indicador da perda de controle é a incapacidade de evitar comer ou de parar de comer depois de começar. Alguns indivíduos descrevem uma qualidade dissociativa durante, ou depois de, episódios de compulsão alimentar. O prejuízo no controle associado à compulsão alimentar pode não ser absoluto; por exemplo, um indivíduo pode continuar a comer compulsivamente enquanto o telefone está tocando, mas vai parar se um conhecido ou o cônjuge entrar no recinto. Alguns indivíduos relatam que seus episódios de compulsão alimentar não são mais caracterizados por um sentimento agudo de perda de controle, e sim por um padrão mais generalizado de ingestão descontrolada. Se relatarem que desistiram dos esforços para controlar a ingestão, a perda de controle ainda assim pode ser considerada presente. A compulsão alimentar também pode ser planejada, em alguns casos. O tipo de alimento consumido durante episódios de compulsão alimentar varia tanto entre diferentes pessoas quanto em um mesmo indivíduo. A compulsão alimentar parece ser caracterizada mais por uma anormalidade na quantidade de alimento consumida do que pela fissura por um nutriente específico. É preciso que a compulsão alimentar seja caracterizada por sofrimento marcante (Critério C) e pelo menos três dos seguintes aspectos: comer muito mais rapidamente do que o normal; comer até se sentir desconfortavelmente cheio; “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
190
ingerir grandes quantidades de alimento sem estar com sensação física de fome; comer sozinho por vergonha do quanto se come; e sentir-se desgostoso de si mesmo, deprimido ou muito culpado em seguida (Critério B). Indivíduos com transtorno de compulsão alimentar geralmente sentem vergonha de seus problemas alimentares e tentam ocultar os sintomas. A compulsão alimentar ocorre em segredo ou o mais discretamente possível. O antecedente mais comum da compulsão alimentar é o afeto negativo. Outros gatilhos incluem estressores interpessoais; restrições dietéticas; sentimentos negativos relacionados ao peso corporal, à forma do corpo e ao alimento; e tédio. A compulsão alimentar pode minimimizar ou aliviar fatores que precipitaram o episódio a curto prazo, porém a autoavaliação negativa e a disforia com frequência são as consequências tardias. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O transtorno de compulsão alimentar ocorre em indivíduos de peso normal ou com sobrepeso e obesos. O transtorno é consistentemente associado ao sobrepeso e à obesidade em indivíduos que buscam tratamento. Contudo, é distinto da obesidade. A maioria dos indivíduos obesos não se envolve em compulsão alimentar recorrente. Além disso, comparados a indivíduos obesos de peso equivalente sem transtorno de compulsão alimentar, aqueles com o transtorno consomem mais calorias em estudos laboratoriais do comportamento alimentar e têm mais prejuízo funcional, qualidade de vida inferior, mais sofrimento subjetivo e maior comorbidade psiquiátrica.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
191
Transtornos Psicóticos Esquizofrenia (Dados epidemiológicos mostram Esquizofrenia) CID-10 Os transtornos esquizofrênicos se caracterizam em geral por distorções fundamentais e características do pensamento e da percepção, e por afetos inapropriados ou embotados. Usualmente mantém-se clara a consciência e a capacidade intelectual, embora certos déficits cognitivos possam evoluir no curso do tempo. Os fenômenos psicopatológicos mais importantes incluem o eco do pensamento [ouvir o próprio pensamento após ter sido pensado (sonorização) de forma repetida], a imposição ou o roubo do pensamento, a divulgação do pensamento [o paciente tem a nítida sensação de que as pessoas ouvem o que pensa no momento mesmo em que está pensando], a percepção delirante, ideias delirantes de controle, de influência ou de ividade, vozes alucinatórias que comentam ou discutem com o paciente na terceira pessoa, transtornos do pensamento e sintomas negativos. A evolução dos transtornos esquizofrênicos pode ser contínua, episódica com ocorrência de um déficit progressivo ou estável, ou comportar um ou vários episódios seguidos de uma remissão completa ou incompleta. Não se deve fazer um diagnóstico de esquizofrenia quando o quadro clínico comporta sintomas depressivos ou maníacos no primeiro plano, a menos que se possa estabelecer sem equívoco que a ocorrência dos sintomas esquizofrênicos fosse anterior à dos transtornos afetivos. Além disto, não se deve fazer um diagnóstico de esquizofrenia quando existe uma doença cerebral manifesta, intoxicação por droga ou abstinência de droga. [...] Esquizofrenia paranoide (ou, parafrênica) A esquizofrenia paranoide se caracteriza essencialmente pela presença de ideias delirantes relativamente estáveis, frequentemente de perseguição, em geral acompanhadas de alucinações, particularmente auditivas e de perturbações das percepções. As perturbações do afeto, da vontade, da
que cerca de 1% da população mundial sofre de DSM-5 Os sintomas característicos da esquizofrenia envolvem uma gama de disfunções cognitivas, comportamentais e emocionais, mas nenhum sintoma é patognomônico do transtorno. O diagnóstico envolve o reconhecimento de um conjunto de sinais e sintomas associados a um funcionamento profissional ou social prejudicado. Indivíduos com o transtorno apresentarão variações substanciais na maior parte das características, uma vez que a esquizofrenia é uma síndrome clínica heterogênea. Critérios Diagnósticos A. Dois (ou mais) dos itens a seguir, cada um presente por uma quantidade significativa de tempo durante um período de um mês (ou menos, se tratados com sucesso). Pelo menos um deles deve ser (1), (2) ou (3): 1. Delírios. 2. Alucinações. 3.Discurso desorganizado. 4.Comportamento grosseiramente desorganizado ou catatônico. 5.Sintomas negativos (i.e., expressão emocional diminuída ou avolia). B. Por período significativo de tempo desde o aparecimento da perturbação, o nível de funcionamento em uma ou mais áreas importantes do funcionamento, como trabalho, relações interpessoais ou autocuidado, está acentuadamente abaixo do nível alcançado antes do início (ou, quando o início se dá na infância ou na adolescência, incapacidade de atingir o nível esperado de funcionamento interpessoal, acadêmico ou profissional). C. Sinais contínuos de perturbação persistem durante, pelo menos, seis meses. Esse período de seis meses deve incluir no mínimo um mês de sintomas (ou menos, se tratados com sucesso) que precisam satisfazer ao Critério A (i.e., sintomas da fase ativa) e pode incluir períodos de sintomas prodrômicos ou residuais. Durante esses períodos prodrômicos ou residuais, os sinais da perturbação podem ser manifestados apenas por sintomas negativos ou por dois ou mais sintomas listados no Critério A
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
192
linguagem e os sintomas catatônicos, estão presentes em uma forma atenuada (p. ex., ausentes, ou são relativamente discretos. crenças esquisitas, experiências perceptivas incomuns). D. Transtorno esquizoafetivo e transtorno Esquizofrenia hebefrênica Forma de esquizofrenia caracterizada pela depressivo ou transtorno bipolar com presença proeminente de uma perturbação dos características psicóticas são descartados porque afetos; as ideias delirantes e as alucinações são 1) não ocorreram episódios depressivos maiores fugazes e fragmentárias, o comportamento é ou maníacos concomitantemente com os irresponsável e imprevisível; existem sintomas da fase ativa, ou 2) se episódios de frequentemente maneirismos. O afeto é humor ocorreram durante os sintomas da fase superficial e inapropriado. O pensamento é ativa, sua duração total foi breve em relação aos desorganizado e o discurso incoerente. Há uma períodos ativo e residual da doença. tendência ao isolamento social. Geralmente o E. A perturbação não pode ser atribuída aos prognóstico é desfavorável devido ao rápido efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., desenvolvimento de sintomas "negativos", droga de abuso, medicamento) ou a outra particularmente um embotamento do afeto e condição médica. perda da volição. A hebefrenia deveria F. Se há história de transtorno do espectro normalmente ser somente diagnosticada em autista ou de um transtorno da comunicação adolescentes e em adultos jovens. iniciado na infância, o diagnóstico adicional de esquizofrenia é realizado somente se delírios ou alucinações proeminentes, além dos demais Esquizofrenia catatônica A esquizofrenia catatônica é dominada por sintomas exigidos de esquizofrenia, estão distúrbios psicomotores proeminentes que também presentes por pelo menos um mês (ou podem alternar entre extremos tais como menos, se tratados com sucesso). hipercinesia e estupor, ou entre a obediência [...] automática e o negativismo. Atitudes e Características Associadas que Apoiam o posturas a que os pacientes foram compelidos Diagnóstico a tomar podem ser mantidas por longos Indivíduos com esquizofrenia podem exibir períodos. Um padrão marcante da afecção pode afeto inadequado (p. ex., rir na ausência de um ser constituído por episódios de excitação estímulo apropriado); humor disfórico que pode violenta. O fenômeno catatônico pode estar assumir a forma de depressão, ansiedade ou combinado com um estado oniróide com raiva; padrão de sono perturbado (p. ex., sono alucinações cênicas vívidas. durante o dia e atividade durante a noite); e falta de interesse em alimentar-se ou recusa da comida. Despersonalização, desrealização e Esquizofrenia indiferenciada ou atípica Afecções psicóticas que preenchem os critérios preocupações somáticas podem ocorrer e por diagnósticos gerais para a esquizofrenia mas vezes atingem proporções delirantes. Ansiedade que não correspondem a nenhum dos subtipos e fobias são comuns. Déficits cognitivos na incluídos [...], ou que exibam padrões de mais esquizofrenia são comuns e fortemente de um deles sem uma clara predominância de associados a prejuízos profissionais e um conjunto particular de características funcionais. Esses déficits podem incluir diagnósticas. diminuições na memória declarativa, na memória de trabalho, na função da linguagem e em outras funções executivas, bem como Depressão pós-esquizofrênica Episódio depressivo eventualmente prolongado velocidade de processamento mais lenta. que ocorre ao fim de uma afecção Anormalidades no processamento sensorial e na esquizofrênica. Ao menos alguns sintomas capacidade inibitória, bem como redução na esquizofrênicos "positivos" ou "negativos" atenção, são também encontradas. Alguns devem ainda estar presentes mas não dominam indivíduos com esquizofrenia mostram déficits mais o quadro clínico. Este tipo de estado na cognição social, incluindo déficits na depressivo se acompanha de um maior risco de capacidade de inferir as intenções dos outros “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
193
(teoria da mente), podendo atender a eventos ou estímulos irrelevantes e depois interpretá-los como significativos, talvez levando à geração de delírios explanatórios. Esses prejuízos costumam persistir durante a remissão dos sintomas. Alguns indivíduos com psicose podem carecer de insight ou consciência de seu transtorno (i.e., Esquizofrenia residual Estádio crônico da evolução de uma doença anosognosia). Essa falta de insight inclui não esquizofrênica, com uma progressão nítida de perceber os sintomas de esquizofrenia, podendo um estádio precoce para um estádio tardio, o estar presente em todo o curso da doença. Não qual se caracteriza pela presença persistente de perceber a doença costuma ser um sintoma da sintomas "negativos" embora não própria esquizofrenia em vez de uma estratégia forçosamente irreversíveis, tais como lentidão de enfrentamento. É comparável à falta de psicomotora; hipoatividade; embotamento percepção de déficits neurológicos após dano afetivo; ividade e falta de iniciativa; cerebral, chamada de anosognosia. Esse sintoma pobreza da quantidade e do conteúdo do é o mais comum preditor de não adesão ao discurso; pouca comunicação não-verbal tratamento e prevê elevadas taxas de recaída, (expressão facial, contato ocular, modulação da aumento no número de tratamentos voz e gestos), falta de cuidados pessoais e involuntários, funcionamento psicossocial mais desempenho social medíocre. pobre, agressão e um curso mais pobre da doença. Hostilidade e agressão podem estar associadas a Esquizofrenia simples Transtorno caracterizado pela ocorrência esquizofrenia, embora agressão espontânea ou insidiosa e progressiva de excentricidade de aleatória não seja comum. A agressão é mais comportamento, incapacidade de responder às frequente em indivíduos do sexo masculino exigências da sociedade, e um declínio global mais jovens e em pessoas com história anterior do desempenho. Os padrões negativos de violência, não adesão ao tratamento, abuso característicos da esquizofrenia residual (por de substância e impulsividade. Deve-se observar exemplo: embotamento do afeto e perda da que a grande maioria das pessoas com volição) se desenvolvem sem serem precedidos esquizofrenia não é agressiva, sendo, com mais por quaisquer sintomas psicóticos manifestos. frequência, mais vitimizada que aquelas na população em geral. Atualmente não há exames laboratoriais, radiológicos ou testes psicométricos para o transtorno. As diferenças são claras em múltiplas regiões do cérebro entre grupos de pessoas saudáveis e pessoas com esquizofrenia, incluindo evidências de estudos por neuroimagem, neuropatologia e neurofisiologia. Diferenças ficam também evidentes na arquitetura celular, na conectividade da substância branca e no volume da substância cinzenta em uma variedade de regiões, como os córtices pré-frontal e temporal. É observada redução no volume cerebral total, bem como aumento da redução de volume com o envelhecimento. Reduções do volume cerebral com o envelhecimento são mais pronunciadas em pessoas com esquizofrenia do que em indivíduos saudáveis. Por fim, pessoas com a “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo) suicídio. Se o paciente não apresenta mais nenhum sintoma esquizofrênico, deve-se fazer um diagnóstico de episódio depressivo. Se os sintomas esquizofrênicos ainda são aparentes e proeminentes, deve-se manter o diagnóstico da forma clínica apropriada da esquizofrenia.
194
doença parecem diferir daquelas sem o transtorno em índices eletrofisiológicos e de eye-tracking131. Sinais neurológicos leves em indivíduos com esquizofrenia incluem prejuízos na coordenação motora, na integração sensorial e no sequenciamento motor de movimentos complexos, confusão esquerda-direita e desinibição de movimentos associados. Além disso, podem ocorrer anomalias físicas leves da face e dos membros.
131
Eye-tracking – “Rastreamento ocular.” Refere-se ao processo pelo qual os olhos seguem um objeto em movimento, sem rotação da cabeça.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
195 Genética Cientistas identificam genes da esquizofrenia. Descoberta dos genes mais atuantes no distúrbio mental pode levar a melhores diagnósticos e tratamento da doença. "Pesquisadores descobriram que neurônios fabricados com células da pele de paciente com esquizofrenia eram incapazes de processar o oxigênio corretamente" Pesquisadores identificaram centenas de genes capazes de mostrar quem corre mais riscos de desenvolver a doença (Thinkstock). Cientistas anunciaram nesta terça-feira ter identificado os genes mais atuantes na esquizofrenia. Em um estudo que envolveu informação genética de milhares de pacientes com o distúrbio mental e de um grupo de controle saudável, os pesquisadores identificaram centenas de genes capazes de mostrar quem corre mais riscos de desenvolver a doença. A descoberta foi divulgada no periódico Molecular Psychiatry, publicação da revista científica Nature. Saiba mais “Quebramos o código genético da esquizofrenia, identificando muitos dos genes envolvidos e como eles funcionam juntos para provocar a doença", diz Alexander Niculescu, coordenador do estudo, da Escola de Medicina da Universidade de Indiana, em Indianápolis. "Entendendo melhor a base genética e biológica da doença, podemos desenvolver testes e tratamentos melhores." Esses testes poderiam ser usados para determinar se crianças em famílias com casos de esquizofrenia correriam riscos de desenvolver a doença. "Se forem determinados como em risco elevado, essas crianças seriam acompanhadas mais de perto pelos médicos, aconselhadas a evitar estresse,
álcool e drogas, tratados com terapia, suplementos nutricionais (como cápsulas de óleo de peixe com ômega-3) e, inclusive, com ingestão precoce de medicamentos antipsicotrópicos para evitar o desenvolvimento completo da doença", diz Niculescu. Combinações - De acordo com o pesquisador, após identificar os genes relacionados com a esquizofrenia, a equipe testou suas descobertas em outros pacientes fora do grupo de estudos para mostrar que os resultados seriam reproduzíveis e teriam habilidade previsível. Estudos genéticos sobre psiquiatria costumam gerar uma excitação inicial. "Mas depois não são reproduzidos em populações independentes, que são a prova mais importante de que uma descoberta é sólida e real". A equipe também usou dados cerebrais de camundongos que tomaram medicamentos que imitavam a esquizofrenia. "Alguns genes e mecanismos biológicos que identificamos podem ser usados para o desenvolvimento de um novo remédio", disse Niculescu. Eles também podem ser usados para redirecionar drogas normalmente usadas para tratar outros distúrbios. "O ambiente também desempenha um papel. Os genes que identificamos atuam na conectividade cerebral, portanto podem ocasionar mais criatividade em alguns indivíduos ou a doença em outros, variando de acordo com o excesso destas mutações genéticas na combinação errada e um ambiente estressante", diz. (http://veja.abril.com.br/noticia/saude/cientistasidentificam-genes-da-esquizofrenia)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
196
Outros transtornos psicóticos Transtorno Esquizoafetivo CID-10 Trata-se de transtornos episódicos nos quais tanto os sintomas afetivos quanto os esquizofrênicos são proeminentes de tal modo que o episódio da doença não justifica um diagnóstico quer de esquizofrenia quer de episódio depressivo ou maníaco. Outras afecções em que os sintomas afetivos estão superpostos a doença esquizofrênica préexistente ou coexistem ou alternam com transtornos delirantes persistentes de outros tipos, são classificados em F20-F29. Os sintomas psicóticos que não correspondem ao caráter dominante do transtorno afetivo, não justificam um diagnóstico de transtorno esquizoafetivo. Transtorno esquizoafetivo do tipo maníaco Transtorno em que tanto sintomas esquizofrênicos quanto maníacos são proeminentes de tal modo que o episódio da doença não justifica um diagnóstico quer de esquizofrenia quer de episódio maníaco. Esta categoria deveria ser usada tanto para um único episódio, quer para classificar um transtorno recorrente no qual a maioria dos episódios são esquizoafetivos do tipo maníaco. Transtorno esquizoafetivo do tipo depressivo Transtorno em que os sintomas esquizofrênicos e os sintomas depressivos são proeminentes de tal modo que o episódio da doença não justifica o diagnóstico nem de esquizofrenia nem de um episódio depressivo. Esta categoria deve ser utilizada para classificar quer um episódio isolado, quer um transtorno recorrente no qual a maioria dos episódios são esquizoafetivos do tipo depressivo.
DSM-5 O diagnóstico de transtorno esquizoafetivo baseia-se em uma avaliação de um período ininterrupto da doença durante o qual o indivíduo continua a exibir sintomas ativos ou residuais da doença psicótica. Embora não necessariamente, o diagnóstico costuma ser feito durante o período da doença psicótica. Em algum momento durante o período, deve ser satisfeito o Critério A para esquizofrenia. O Critério B (disfunção social) e o F (exclusão de transtorno do espectro do autismo e de outro transtorno da comunicação com início na infância) para esquizofrenia não precisam ser satisfeitos. Além de satisfazer o Critério A para esquizofrenia, há um episódio depressivo maior ou maníaco (Critério A para transtorno esquizoafetivo). Uma vez que é comum a perda de interesse ou prazer na esquizofrenia, para que seja satisfeito o Critério A para transtorno esquizoafetivo, o episódio depressivo maior deve incluir humor deprimido generalizado (i.e., a presença de interesse ou prazer acentuadamente diminuídos não é suficiente). Episódios de depressão ou mania estão presentes na maior parte da duração total da doença (i.e., após atendido o Critério A) (Critério C para transtorno esquizoafetivo). Para separar o transtorno esquizoafetivo de um transtorno depressivo ou transtorno bipolar com características psicóticas, devem estar presentes delírios ou alucinações durante pelo menos duas semanas na ausência de um episódio de humor (depressivo ou maníaco) em algum momento ao longo da duração da doença na vida (Critério B para transtorno esquizoafetivo). Os sintomas não devem ser atribuídos aos efeitos de uma substância ou a outra condição médica (Critério D para transtorno esquizoafetivo). O Critério C para transtorno esquizoafetivo especifica que os sintomas de humor que satisfazem os critérios para episódio depressivo maior ou maníaco devem estar presentes durante a maior parte da duração total das fases ativa e residual da doença. O Critério C exige a avaliação dos sintomas de humor durante todo o curso de uma doença psicótica, o que difere do critério no DSM-4, que exigia apenas uma
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
197
avaliação do período atual da doença. Se os sintomas de humor estão presentes durante apenas um período relativamente curto, o diagnóstico é esquizofrenia, e não transtorno esquizoafetivo. Ao decidir se a apresentação do indivíduo satisfaz o Critério C, o clínico deve revisar a duração total da doença psicótica (i.e., sintomas ativos e residuais) e determinar quando sintomas de humor significativos (não tratados ou precisando de tratamento com antidepressivo e/ou medicamento estabilizador do humor) acompanharam os sintomas psicóticos. Essa determinação demanda informações suficientes da história e juízo clínico. Por exemplo, um indivíduo com história de quatro anos de sintomas ativos e residuais de esquizofrenia desenvolve episódios depressivos e maníacos que, no conjunto, não ocupam mais de um ano na história de quatro anos da doença psicótica. Essa apresentação não satisfaz o Critério C. Além das cinco áreas de domínio dos sintomas identificadas nos critérios diagnósticos, é fundamental a avaliação dos sintomas dos domínios cognição, depressão e mania para que sejam feitas distinções importantes entre os vários transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O funcionamento profissional costuma estar prejudicado, mas não se trata de um critério definidor (diferentemente do que ocorre na esquizofrenia). Contato social e dificuldades com o autocuidado estão associados ao transtorno esquizoafetivo, mas os sintomas negativos podem ser menos graves e menos persistentes do que os encontrados na esquizofrenia. Anosognosia (i.e., insight prejudicado) também é comum no transtorno esquizoafetivo, mas os déficits no insight podem ser menos graves e generalizados do que os da esquizofrenia. Indivíduos com transtorno esquizoafetivo podem ter risco aumentado de desenvolvimento posterior de episódios de transtorno depressivo maior ou transtorno bipolar se os sintomas de humor continuarem após a remissão dos sintomas que satisfazem o Critério A para esquizofrenia. Pode haver transtornos associados ao álcool ou relacionados a outras substâncias. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
198
Não há testes ou medidas biológicas capazes de auxiliar no diagnóstico de transtorno esquizoafetivo. Não está claro se esse transtorno difere da esquizofrenia no que se refere a características associadas como anormalidades cerebrais estruturais ou funcionais, déficits cognitivos ou fatores de risco genéticos. Transtorno delirante CID-10 Transtorno caracterizado pela ocorrência de uma ideia delirante única ou de um conjunto de ideias delirantes aparentadas, em geral persistentes e que por vezes permanecem durante o resto da vida. O conteúdo da ideia ou das ideias delirantes é muito variável. A presença de alucinações auditivas (vozes) manifestas e persistentes, de sintomas esquizofrênicos tais como ideias delirantes de influência e um embotamento nítido dos afetos, e a evidência clara de uma afecção cerebral, são incompatíveis com o diagnóstico. Entretanto, a presença de alucinações auditivas ocorrendo de modo irregular ou transitório, particularmente em pessoas de idade avançada, não elimina este diagnóstico, sob condição de que não se trate de alucinações tipicamente esquizofrênicas e de que elas não dominem o quadro clínico.
DSM-5 A característica essencial do transtorno delirante é a presença de um ou mais delírios que persistem por pelo menos um mês (Critério A). Não é feito o diagnóstico de transtorno delirante se o indivíduo alguma vez teve apresentação de sintomas que satisfaçam o Critério A para esquizofrenia (Critério B). Independentemente do impacto direto dos delírios, prejuízos no funcionamento psicossocial podem estar mais circunscritos que os encontrados em outros transtornos psicóticos como a esquizofrenia, e o comportamento não é claramente bizarro ou esquisito (Critério C). Se ocorrerem episódios de humor concomitantemente com os delírios, sua duração total é breve em relação à duração total dos períodos delirantes (Critério D). Os delírios não podem ser atribuídos aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., cocaína) ou a outra condição médica (p. ex., doença de Alzheimer), não sendo mais bem explicados por outro transtorno mental, como transtorno dismórfico corporal ou transtorno obsessivocompulsivo (Critério E). Além das cinco áreas de domínios de sintomas identificadas nos critérios diagnósticos, é fundamental a avaliação dos sintomas dos domínios cognição, depressão e mania para que sejam feitas distinções importantes entre os vários transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Problemas sociais, conjugais ou profissionais podem ser consequências de crenças ou transtorno delirante. Indivíduos com transtorno delirante podem ser capazes de descrever, de forma factual, que outras pessoas veem suas crenças como irracionais; são incapazes, no entanto, de aceitar isso (i.e., pode existir “insight dos fatos”, mas não um insight
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
199
verdadeiro). Muitos indivíduos desenvolvem humor irritável ou disfórico, que costuma ser compreendido como uma reação às suas crenças delirantes. Raiva e comportamento violento podem ocorrer com os tipos persecutório, ciumento e erotomaníaco. A pessoa pode se envolver em comportamento litigioso ou antagonista (p. ex., envio de centenas de cartas de protesto ao governo). Podem ocorrer dificuldades legais especialmente nos tipos ciumento e erotomaníaco. Transtornos psicóticos agudos e transitórios (ou, Breve) CID-10 DSM-5 Grupo heterogêneo de transtornos A característica essencial do transtorno caracterizados pela ocorrência aguda de psicótico breve consiste em uma perturbação sintomas psicóticos tais como ideias delirantes, que envolve o aparecimento repentino de pelo alucinações, perturbações das percepções e por menos um dos seguintes sintomas psicóticos uma desorganização maciça do comportamento positivos: delírios, alucinações, discurso normal. O termo "agudo" é aqui utilizado para desorganizado (p. ex., descarrilamento ou caracterizar o desenvolvimento crescente de incoerência frequente) ou comportamento um quadro clínico manifestamente patológico psicomotor grosseiramente anormal, incluindo em duas semanas no máximo. Para estes catatonia (Critério A). Início súbito é definido transtornos não há evidência de uma etiologia como uma mudança de um estado não psicótico orgânica. Acompanham-se frequentemente de para um estado claramente psicótico em duas uma perplexidade e de uma confusão, mas as semanas, geralmente sem um pródromo. Um perturbações de orientação no tempo e no episódio da perturbação tem duração mínima de espaço e quanto à pessoa não são um dia, ainda que inferior a um mês, e a pessoa suficientemente constantes ou graves para eventualmente tem um retorno completo ao responder aos critérios de um delirium de nível de funcionamento pré-mórbido (Critério origem orgânica (F05.-). Em geral estes B). A perturbação não é mais bem explicada por transtornos se curam completamente em menos transtorno depressivo ou transtorno bipolar com de poucos meses, frequentemente em algumas características psicóticas, por transtorno semanas ou mesmo dias. Quando o transtorno esquizoafetivo ou por esquizofrenia, nem persiste o diagnóstico deve ser modificado. O atribuível aos efeitos fisiológicos de uma transtorno pode estar associado a um "stress" substância (p. ex., um alucinógeno) ou a outra agudo (os acontecimentos geralmente condição médica (p. ex., hematoma subdural) geradores de "stress" precedem de uma a duas (Critério C). semanas o aparecimento do transtorno). Além das cinco áreas de domínio dos sintomas identificadas nos critérios diagnósticos, a avaliação dos sintomas dos domínios cognição, depressão e mania é fundamental para que sejam feitas distinções importantes entre os vários transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Pessoas com transtorno psicótico breve costumam vivenciar turbulência emocional ou grande confusão. Podem apresentar mudanças “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
200
rápidas de um afeto intenso a outro. Ainda que a perturbação seja breve, o nível de prejuízo pode ser grave, podendo haver necessidade de supervisão para garantir o atendimento às necessidades nutricionais e higiênicas e para que a pessoa fique protegida das consequências de julgamento insatisfatório, prejuízo cognitivo ou atos baseados em delírios. Parece haver risco aumentado de comportamento suicida, particularmente durante o episódio agudo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
201
Transtorno do Neurodesenvolvimento (DSM–5) ou Transtorno Global do Desenvolvimento (CID-10) Autismo CID-10 DSM-5 As características essenciais do transtorno do Autismo Infantil Transtorno global do desenvolvimento espectro autista são prejuízo persistente na caracterizado por comunicação social recíproca e na interação a) um desenvolvimento anormal ou alterado, social (Critério A) e padrões s e manifestado antes da idade de três anos, e repetitivos de comportamento, interesses ou b) apresentando uma perturbação característica atividades (Critério B). Esses sintomas estão do funcionamento em cada um dos três presentes desde o início da infância e limitam domínios seguintes: interações sociais, ou prejudicam o funcionamento diário (Critérios comunicação, comportamento focalizado e C e D). O estágio em que o prejuízo funcional repetitivo. fica evidente irá variar de acordo com Além disso, o transtorno se acompanha características do indivíduo e seu ambiente. comumente de numerosas outras manifestações Características diagnósticas nucleares estão inespecíficas, por exemplo fobias, perturbações evidentes no período do desenvolvimento, mas de sono ou da alimentação, crises de birra ou intervenções, compensações e apoio atual agressividade (auto-agressividade). podem mascarar as dificuldades, pelo menos em Inclui: alguns contextos. Manifestações do transtorno Autismo infantil também variam muito dependendo da gravidade Psicose infantil da condição autista, do nível de Síndrome de Kanner desenvolvimento e da idade cronológica; daí o Transtorno autístico uso do termo espectro. O transtorno do espectro Exclui: autista engloba transtornos antes chamados de psicopatia autista (F84.5) autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno Autismo Atípico Transtorno global do desenvolvimento, global do desenvolvimento sem outra ocorrendo após a idade de três anos ou que não especificação, transtorno desintegrativo da responde a todos os três grupos de critérios infância e transtorno de Asperger. diagnósticos do autismo infantil. Os prejuízos na comunicação e na interação Esta categoria deve ser utilizada para social especificados no Critério A são classificar um desenvolvimento anormal ou pervasivos [gerais, espalhados, difusos] e alterado, aparecendo após a idade de três anos, sustentados. Os diagnósticos são mais válidos e e não apresentando manifestações patológicas confiáveis quando baseados em múltiplas fontes suficientes em um ou dois dos três domínios de informação, incluindo observações do psicopatológicos (interações sociais recíprocas, clínico, história do cuidador e, quando possível, comunicação, comportamentos limitados, autorrelato. Déficits verbais e não verbais na estereotipados ou repetitivos) implicados no comunicação social têm manifestações variadas, autismo infantil; existem sempre anomalias dependendo da idade, do nível intelectual e da características em um ou em vários destes capacidade linguística do indivíduo, bem como domínios. de outros fatores, como história de tratamento e O autismo atípico ocorre habitualmente em apoio atual. Muitos indivíduos têm déficits de crianças que apresentam um retardo mental linguagem, as quais variam de ausência total da profundo ou um transtorno específico grave do fala, ando por atrasos na linguagem, comdesenvolvimento de linguagem do tipo preensão reduzida da fala, fala em eco até receptivo. linguagem explicitamente literal ou afetada. Inclui: Mesmo quando habilidades linguísticas formais Psicose infantil atípica (p. ex., vocabulário, gramática) estão intactas, o “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
202
Retardo mental com características autísticas uso da linguagem para comunicação social Usar código adicional (F70-F79), se recíproca está prejudicado no transtorno do necessário, para identificar o retardo mental. espectro autista. Déficits na reciprocidade socioemocional (i.e., capacidade de envolvimento com outros e compartilhamento de ideias e sentimentos) estão claramente evidentes em crianças pequenas com o transtorno, que podem apresentar pequena ou nenhuma capacidade de iniciar interações sociais e de compartilhar emoções, além de imitação reduzida ou ausente do comportamento de outros. Havendo linguagem, costuma ser unilateral, sem reciprocidade social, usada mais para solicitar ou rotular do que para comentar, compartilhar sentimentos ou conversar. Nos adultos sem deficiência intelectual ou atrasos de linguagem, os déficits na reciprocidade socioemocional podem aparecer mais em dificuldades de processamento e resposta a pistas sociais complexas (p. ex., quando e como entrar em uma conversa, o que não dizer). Adultos que desenvolveram estratégias compensatórias para alguns desafios sociais ainda enfrentam dificuldades em situações novas ou sem apoio, sofrendo com o esforço e a ansiedade para, de forma consciente, calcular o que é socialmente intuitivo para a maioria dos indivíduos. Déficits em comportamentos de comunicação não verbal usados para interações sociais são expressos por uso reduzido, ausente ou atípico de contato visual (relativo a normas culturais), gestos, expressões faciais, orientação corporal ou entonação da fala. Um aspecto precoce do transtorno do espectro autista é a atenção compartilhada prejudicada, conforme manifestado por falta do gesto de apontar, mostrar ou trazer objetos para compartilhar o interesse com outros ou dificuldade para seguir o gesto de apontar ou o olhar indicador de outras pessoas. Os indivíduos podem aprender alguns poucos gestos funcionais, mas seu repertório é menor do que o de outros e costumam fracassar no uso de gestos expressivos com espontaneidade na comunicação. Entre adultos com linguagem fluente, a dificuldade para coordenar a comunicação não verbal com a fala pode ar a impressão de “linguagem corporal” estranha, rígida ou exagerada durante as interações. O prejuízo pode ser relativamente sutil em áreas “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
203
individuais (p. ex., alguém pode ter contato visual relativamente bom ao falar), mas perceptível na integração insatisfatória entre contato visual, gestos, postura corporal, prosódia e expressão facial para a comunicação social. Déficits para desenvolver, manter e compreender as relações devem ser julgados em relação aos padrões relativos a idade, gênero e cultura. Pode haver interesse social ausente, reduzido ou atípico, manifestado por rejeição de outros, ividade ou abordagens inadequadas que pareçam agressivas ou disruptivas. Essas dificuldades são particularmente evidentes em crianças pequenas, em quem costuma existir uma falta de jogo social e imaginação compartilhados (p. ex., brincar de fingir de forma flexível e adequada à idade) e, posteriormente, insistência em brincar seguindo regras muito fixas. Indivíduos mais velhos podem relutar para entender qual o comportamento considerado apropriado em uma situação e não em outra (p. ex., comportamento casual durante uma entrevista de emprego) ou as diversas formas de uso da linguagem para a comunicação (p. ex., ironia, mentirinhas). Pode existir aparente preferência por atividades solitárias ou por interações com pessoas muito mais jovens ou mais velhas. Com frequência, há desejo de estabelecer amizades sem uma ideia completa ou realista do que isso significa (p. ex., amizades unilaterais ou baseadas unicamente em interesses especiais compartilhados). Também é importante considerar o relacionamento com irmãos, colegas de trabalho e cuidadores (em termos de reciprocidade). O transtorno do espectro autista também é definido por padrões s e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (conforme especificado no Critério B) que mostram uma gama de manifestações de acordo com a idade e a capacidade, intervenções e apoios atuais. Comportamentos estereotipados ou repetitivos incluem estereotipias motoras simples (p. ex., abanar as mãos, estalar os dedos), uso repetitivo de objetos (p. ex., girar moedas, enfileirar objetos) e fala repetitiva (p. ex., ecolalia, repetição atrasada ou imediata de palavras ouvidas, uso de “tu” ao referir-se a si mesmo, uso estereotipado de palavras, frases ou “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
204
padrões de prosódia). Adesão excessiva a rotinas e padrões s de comportamento podem ser manifestados por resistência a mudanças (p. ex., sofrimento relativo a mudanças aparentemente pequenas, como embalagem de um alimento favorito; insistência em aderir a regras; rigidez de pensamento) ou por padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (p. ex., perguntas repetitivas, percorrer um perímetro). Interesses altamente limitados e fixos, no transtorno do espectro autista, tendem a ser anormais em intensidade ou foco (p. ex., criança pequena muito apegada a uma a; criança preocupada com aspiradores de pó; adulto que gasta horas escrevendo tabelas com horário). Alguns encantamentos e rotinas podem estar relacionados a uma aparente hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais, manifestada por meio de respostas extremadas a sons e texturas específicos, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, encantamento por luzes ou objetos giratórios e, algumas vezes, aparente indiferença a dor, calor ou frio. Reações extremas ou rituais envolvendo gosto, cheiro, textura ou aparência da comida ou excesso de restrições alimentares são comuns, podendo constituir a forma de apresentação do transtorno do espectro autista. Muitos adultos com transtorno do espectro autista sem deficiência intelectual ou linguística aprendem a suprimir comportamentos repetitivos em público. Interesses especiais podem constituir fonte de prazer e motivação, propiciando vias de educação e emprego mais tarde na vida. Os critérios diagnósticos podem ser satisfeitos quando padrões limitados e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades estiverem claramente presentes na infância ou em algum momento do ado mesmo que os sintomas não estejam mais presentes. O Critério D exige que as características devam ocasionar prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo no presente. O Critério E especifica que os déficits de comunicação social, ainda que algumas vezes acompanhados por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual), não estão alinhados com o nível de desenvolvimento “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
205
individual e que os prejuízos excedem as dificulda- des esperadas com base no nível do desenvolvimento. Instrumentos padronizados de diagnóstico do comportamento, com boas propriedades psicométricas, incluindo entrevistas com cuidadores, questionários e medidas de observação clínica, estão disponíveis e podem aumentar a confiabilidade do diagnóstico ao longo do tempo e entre clínicos. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Muitos indivíduos com transtorno do espectro autista também apresentam comprometimento inte- lectual e/ou da linguagem (p. ex., atraso na fala, compreensão da linguagem aquém da produção). Mesmo aqueles com inteligência média ou alta apresentam um perfil irregular de capacidades. A discrepância entre habilidades funcionais adaptativas e intelectuais costuma ser grande. Déficits motores estão frequentemente presentes, incluindo marcha atípica, falta de coordenação e outros sinais motores anormais (p. ex., caminhar na ponta dos pés). Pode ocorrer autolesão (p. ex., ba- ter a cabeça, morder o punho), e comportamentos disruptivos/desafiadores são mais comuns em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista do que em outros transtornos, incluindo deficiência intelectual. Adolescentes e adultos com transtorno do espectro autista são propensos a ansiedade e depressão. Alguns indivíduos desenvolvem comportamento motor semelhante à catatonia (lentificação e “congelamento” em meio a ação), embora isso tipicamente não costume alcançar a magnitude de um episódio catatônico. É possível, porém, que indivíduos com transtor- no do espectro autista apresentem deterioração acentuada em sintomas motores e um episódio catatônico completo com sintomas como mutismo, posturas atípicas, trejeitos faciais e flexibilidade cérea. O período de risco de catatonia comórbida parece ser maior nos anos de adolescência.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
206
Outras Síndromes Psiquiátricas132 a) Síndrome do Esgotamento ou Estafa Profissional ou Burnout Está síndrome é recente, foi descrita em 1974 pelo psicólogo H.J. Freudenberger. É um sofrimento decorrente do trabalho e cujos sintomas também se manifestam mais durante as atividades laborativas. Caracteriza-se por exaustão emocional, baixa realização pessoal no trabalho e "desumanização" ando a tratar pessoas como objetos. Outras características comuns são: •predominância de sintomas relacionados a exaustão mental e emocional, fadiga e depressão; •ênfase nos sintomas comportamentais e mentais e não nos sintomas físicos; •sintomas do burnout são relacionados ao trabalho; •os sintomas manifestam-se em pessoas "normais" que não sofriam de distúrbios psicopatológicos antes do surgimento da síndrome; •diminuição da efetividade e desempenho no trabalho ocorre por causa de atitudes e comportamentos negativos. As profissões mais vulneráveis ao burnout são são geralmente as que envolvem serviços, tratamento ou educação. Para prevenir a Estafa é preciso evitar excesso de trabalho e valorizar momentos de lazer. É preciso fazer uma distinção entre se o excesso de trabalho gerou sintomas depressivos ou se a depressão tem provocado maior dedicação ao trabalho, como ocorre principalmente com alguns homens. b) Síndrome de Capgras Também conhecida como Delírio de Capgras, Ilusão de Capgras e Paranóia de Capgras, foi descrita pela primeira vez em 1923 no boletim da Sociedade Clínica de Medicina Mental, na França, por Jean Marie Joseph Capgras e Jean Reboul-Lachaux, no artigo entitulado “L`illusion des sosies dans um délire systématisé chronique” (A ilusão dos sósias num delírio sistematizado crônico) e daí em diante a síndrome ou a ser reconhecida com o nome do primeiro autor (Capgras). Caracteriza-se pelo paciente acreditar que um familiar próximo torna-se um impostor, um duplo, a despeito do reconhecimento de sua familiaridade na aparência e na conduta. Em decorrência da ideação delirante, esse “impostor” ou “duplo” possui um caráter persecutório. Tais pacientes podem continuar convivendo com o “impostor” ou “duplo”, apesar de “secretamente saberem” que ele, ou ela, não é a pessoa que se diz ser. Ocorre em ambos os sexos, apesar de inicialmente ter sido descrito apenas em mulheres. O fenômeno de Capgras acompanha a doença de base do paciente, sendo geralmente de origem funcional e menos frequentemente de causas orgânicas. Entre as causas funcionais a mais frequente ainda é a Esquizofrenia, em especial o subtipo paranóide. Mas, os transtornos de humor também ocupam lugar de destaque nas doenças de base para ocorrência da Síndrome de Capgras. Na verdade o percentual em que o Delírio de Capgras ocorre entre psicoses orgânicas é maior que entre transtornos de humor. E os quadros orgânicos podem ser bastante variáveis: traumatismo craniano, deficiência de ácido fólico, alcoolismo, má nutrição, etc., sem que que haja nenhum marcador bioquímico específico. 132
Os relatos dessas síndromes foi adaptado de< http://dicionariodesindromes.blogspot.com.br/>.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
207
Existem ainda muitas explicações psicodinâmicas aplicáveis, dado o fato de que somente ocorre o fenômeno com familiares. Mas, há uma tendência dos artigos mais recentes sobre o tema a tentar encontrar razões biológicas para a ocorrência do fenômeno. c) Síndrome de Diógenes A Síndrome de Diógenes (SD) é uma alteração comportamental que geralmente ocorre entre pessoas idosas, caracterizada pelo isolamento social, pela autonegligência (descuido com o autocuidado, com a higiene pessoal e do lar), pelo comportamento paranoico e pelo colecionismo. Em 1975 esta Síndrome foi descrita e nomeada, uma certa injustiça ao filósofo grego Diógenes de Sínope, também chamado Diógenes "o Cínico" (kynikos, kynon = cachorro). Diógenes acreditava que a virtude não deveria ser uma teoria mas uma ação prática, resultado da própria vivência, assim optou por viver na miséria, habitando um grande barril como lar e carregando à luz do dia uma lanterna acesa em busca de um homem honesto; acreditava que faria bem ao ser humano aprender com o cão: "afinal o cão é capaz de realizar suas funções corporais naturais em público sem constrangimento, um cachorro comerá qualquer coisa, e não fará estardalhaço sobre que lugar dormir. Cachorros vivem o presente sem ansiedade, e não possuem as pretensões da filosofia abstrata. Somando-se ainda a estas virtudes, cachorros aprendem instintivamente quem é amigo e quem é inimigo. Diferente dos humanos que enganam e são enganados uns pelos outros, cães reagem com honestidade frente à verdade." Paradoxalmente, o Cinismo anárquico de Diógenes nada tem em comum com o emprego atual da palavra, assim como a vida despojada de bens de Diógenes nada se assemelha à Síndrome que leva seu nome. Na Síndrome de Diógenes o colecionismo é a tônica, em detrimento do autocuidado. É possível observar desde casos de pessoas que colecionam todo tipo de objetos: recolhendo lixo e todo tipo de objetos inúteis (syllogomania), até animais: já presenciamos um caso de uma senhora que chegou mesmo a recolher, para desespero dos vizinhos, um jumento! d) Síndrome de Estocolmo Trata-se da dependência afetiva que o agredido (sequestrado, refém) a a sofrer do seu agressor. Este fenômeno foi descrito pelo psiquiatra e criminologista Nils Bejerot à propósito do assalto a um banco ocorrido de 23 a 28 de agosto de 1973, em Estocolmo (Suécia), quando os reféns ficaram "amigos" dos criminosos, chegando a colocar-se contra a polícia. e) Síndrome de Fregoli A síndrome caracteriza-se como uma condição na qual a pessoa acredita que um ou mais pessoas que lhe são familiares (conhecidas), usualmente perseguidores, repetidamente modificam sua aparência e am a ocupar outros postos, por exemplo: de médico, carteiro, vendedor, etc. Portanto, para o portador da síndrome justificando como é possível ao seu perseguidor estar nos diversos ambientes dele, disfarçado. É claramente uma ideia delirante de perseguição. Portanto espera-se encontrá-la em pessoas que estejam psicóticas: transtorno delirante persistente e principalmente esquizofrenias. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
208
A síndrome recebeu este nome em homenagem ao ator italiano Leopoldo Fregoli, (1867-1936) capaz de em suas apresentações encenar desde um monólogo até uma ópera, sendo ele o único ator e cantor do espetáculo. Deu origem ao transformismo no teatro, tamanha a sua habilidade para interpretar diversos personagens como ator e cantor. É importante estabelecer um diagnóstico diferencial entre a Síndrome de Fregoli e a Intermetamorfose. Enquanto na primeira as pessoas modificariam apenas sua aparência física, seria um disfarce externo, na Intermetamorfose a transformação seria completa, isto é, também interna, transformando a personalidade também. Vejamos então exemplos concretos dos dois tipos de delírios: 1. Síndrome de Fregoli: se o perseguidor for um parente, um tio, o tio disfarça-se como irmão do portador de Fregoli, mas as características de personalidade continuam sendo do tio. Inclusive o portador do delírio de Fregoli saberá distinguir entre os trejeitos do irmão e como ele estaria se portando agora para justificar seu delírio. 2. Já na Intermetamorfose o paciente acredita que o perseguidor ou também por uma metamorfose interna, transformando-se completamente na outra pessoa: sendo o tio o perseguidor ele teria se transformado fisicamente e psiquicamente no irmão do paciente, ando a ficar absolutamente idêntico, em personalidade e trejeitos ao irmão. Mas de algum modo, o delirante diz que aquele não é originalmente seu irmão, mas sim o seu perseguidor transformado a fim de fazerlhe algum mal. Tanto a Síndrome de Fregoli quanto a Intermetamorfose, a Síndrome de Capgras, a Síndrome de Cotard e até a Síndrome de Clèrambault fazem parte das Síndromes de Má-Identificação (delusional misidentification syndrome). f) Síndrome de Koro A Síndrome de Koro também chamada de Síndrome de Redução Genital, Síndrome de Jinjin Bemar e Síndrome de Suk Yeong (China, Índia, Sudeste asiático). Caracteriza-se pelo medo agudo, ou ansiedade intensa diante da retração normal do pênis (no caso dos homens), da vulva ou dos mamilos (em mulheres). A reação de angústia severa diante da retração normal dos órgãos sexuais advém da crença de que esta retração prosseguirá até que desapareça e provoque a morte do indivíduo, assim por exemplo, em homens, gênero em que é mais comum, os portadores desta síndrome creêm seu pênis continuará retraindo incessantemente, até penetrar de volta à cavidade abdominal, quando isto lhe provocará o óbito. A palavra Koro, proveniente da língua malaia, significa cabeça de tartaruga, uma clara referência à retração que esta é capaz de fazer em direção ao casco, desaparecendo por completo, à semelhança do que os pacientes acometidos pela síndrome crêem que aconteça com a sua genitália. Fatores predisponentes: •exposição ao frio, •coito excessivo, •conflitos interpessoais, •pressões sócio-culturais. O Surgimento da síndrome é súbito. Na tentativa de "tratar-se", as pessoas acometidas pela doença tentam explorar a própria genitália (podendo levar a acidentes), ou solicitam a familiares que o façam, colocam talas para evitar a retração dos genitais, usam remédios fitoterápicos, massagens ou felação. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
209
É possível ainda, distinguir entre a síndrome de Koro Primária e a Secundária: •Primária: até a década de 70 somente era diagnosticada entre pessoas do sudeste asiático. Desde a facilidade de migração entre os povos, a globalização que atinge também as culturas, é possível diagnosticar esta síndrome também em outras regiões do mundo, mas no Koro Primário estará culturalmente sempre relacionado. Por ser um fenômeno cultural, há diversos artigos publicados de "epidemias" desta síndrome em alguns países, com cerca de 200 casos ocorrendo ao mesmo tempo, nestes casos, histeria em massa. •Secundária: relaciona-se a outras doenças pré-existentes como transtornos mentais (de ansiedade, depressão, psicóticos, intoxicações), doenças urológicas, tumores cerebrais, epilepsias. A literatura médica aponta cada vez mais casos em pessoas de culturas distintas do sudeste asiático. g) Síndrome de Lima Trata-se de um conjunto de sintomas desenvolvidos por sequestradores em sua atividade criminosa, nas relações de proximidade e compreensão das necessidades das vítimas, resultando em afeto. Ganhou este nome por tal fato ter sido registrado em 1996, em Lima (Peru), em ataque a embaixada japonesa. h) Síndrome de Münchausen O nome deriva do Barão de Münchausen, o alemão Karl Friederich Hieronymus (1720-1797), que após ter lutado em guerra contra os turcos (1740-1741) voltou relatando suas histórias. Entretanto, o Barão tinha o hábito de modificá-las, mentindo e criando histórias grandiosas e fantasiosas, como por exemplo: •saíra de um poço muito profundo puxando os próprios cabelos; •ficara com seu cavalo sobre a torre de uma igreja e de lá, escalando uma corda, chegara à lua; •vencera todo um exército fantasiado de galinha; •cavalgara numa bala de canhão etc . Quanto à síndrome, é uma condição na qual conscientemente o indivíduo simula doenças, chegando inclusive a agredir-se fisicamente para isto. Geralmente são pessoas inteligentes, conhecedoras das práticas médicas que ao simularem ou provocarem um problema de saúde alcançam seu objetivo: submeter-se a tratamentos médicos, internações e numerosos exames. É importante notar que nesta doença apesar da simulação ser consciente as motivações para tanto são inconscientes. Uma variação desta síndrome é a conhecida por Síndrome de Münchausen por Procuração. Nestes casos ocorre o mesmo que na Síndrome de Münchausen por iniciativa de um adulto a respeito da saúde de um menor, isto é, o portador da síndrome (geralmente um dos genitores) altera a história médica ou adultera exames de uma criança para provocar mais cuidados médicos sobre ela. i) Síndrome de Oslo A Síndrome de Oslo é uma reação psicológica de pessoas ou de grupos vítimas de maus tratos e/ou ameaças a sua integridade física e mental. Nesta síndrome a pessoa ou o grupo vitimizado a a acreditar-se responsável pelos maus tratos que recebe, às vezes até merecedora dos "castigos" que lhe são impostos. A vítima a a achar que merece ser agredida. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
210
Trata-se geralmente de uma defesa: diante de uma situação de agressão ou de ameaça severa, sobre a qual o indivíduo sente-se absolutamente impotente, como mecanismo de defesa, o sujeito a a fantasiar que tem o controle da situação e a depender das suas reações, dos seus gestos, do seu comportamento poderá controlar o agressor, isto é, assim a vítima acredita que se mudar o seu agressor também mudará. Nestes casos, subliminarmente, inconscientemente, a vítima considera pior do que a própria ameaça à integridade física a sensação de impotência diante da iminência de agressão. Da mesma maneira que ocorre com pessoas individualmente, pode ser um mecanismo de defesa grupal, podendo ser a reação de um grupo ou de uma comunidade. Exemplos: mulheres que sofrem violência doméstica, crianças abusadas fisicamente... . j) Síndrome de Stendhal A Síndrome de Stendhal caracteriza-se pelo surgimento súbito de diversos sintomas simultâneos (vivências estranhas, por vezes acompanhadas de sintomas físicos, sensação de profunda emoção, seguida de um leve entorpecimento, desorientação temporo-espacial momentânea, sudorese profusa e desrealização) mediante a exposição do indivíduo à contemplação de uma ou mais obras de arte. k) Síndrome do Duplo Subjetivo Descrita em 1978 por Christodoulou, como uma variante da Síndrome de Capgras. No caso da síndrome do Duplo Subjetivo a pessoa acredita que há um duplo de si mesma, um sósia, que ela mesma pode tê-lo visto (autoscópico) ou não. Portanto, outra pessoa fora transformada em seu sósia. Esta síndrome costuma relacionar-se tanto a Esquizofrenias quanto a transtornos mentais orgânicos. l) Síndrome de Ganser: Apesar de já ter sido classificada entre os transtornos factícios, atualmente pertence aos quadros histéricos dissociativos. A pessoa provoca um quadro psiquiátrico repentino e intenso, com exuberância de sintomas, a ponto de parecer insana: pararrespostas, sonambulismo, dissociação. Contudo, aspectos psicopatológicos conflitantes fazem o diagnóstico diferencial com as psicoses verdadeiras. Foi inicialmente descrita entre presidiários sendo por isto também chamada de "Psicose da prisão".
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
211
Transtornos relacionados ao uso de substâncias Álcool “O álcool compartilha características dos sedativos, hipnóticos e ansiolíticos. (DSM-4) “O etanol (ou o “espírito do vinho”, do latim spiritus vini), cuja fórmula química é C2H5OH, é um líquido incolor encontrado em todas as bebidas alcoólicas. Nem todas as pessoas estão igualmente propensas a se tornar dependentes do álcool. Para que a dependência alcoólica ocorra, é fundamental que haja vulnerabilidade e suscetibilidade à dependência, fomentadas por condições biológicas, psicológicas, sociais e ambientais. Do ponto de vista médico, é relevante o fato de que as enzimas que metabolizam o álcool no organismo diferem de indivíduo para indivíduo, o que se chama vulnerabilidade biológica. [...] O etanol é uma molécula simples que se move facilmente através das membranas celulares, equilibrando-se rapidamente entre o sangue e os tecidos. O nível do álcool no sangue é expresso em miligramas ou gramas de etanol por decilitro (p.ex., 100 mg/dL ou 0,10 g/dL); um nível de 0,02 a 0,03, por exemplo, é o resultado da ingestão de uma a duas doses de bebidas alcoólicas. O organismo, subsequentemente, metaboliza e excreta aproximadamente uma dose por hora. Além do etanol, são encontrados, nas bebidas alcoólicas, outros produtos de sua maturação ou fermentação, como metanol, butanol, aldeídos, ésteres, histaminas, fenóis, ferro, chumbo e cobalto, que são, em grande parte, responsáveis pela diferenciação de sabor entre os tipos de bebidas. Como consequência de sua alta solubilidade em água, o etanol cai rapidamente na corrente sanguínea, de onde é distribuído para a maioria dos órgãos e sistemas. É absorvido pelas membranas mucosas da boca e do esôfago (em pequenas quantidades), do estômago e do intestino grosso (em quantidades moderadas) e pela porção proximal do intestino delgado, local principal de sua absorção e também onde as vitaminas B são essencialmente absorvidas. A taxa de absorção é aumentada quando o esvaziamento gástrico está acelerado, como na ausência de proteínas, gorduras ou carboidratos, que interferem na absorção, além de outros produtos oriundos da fermentação do álcool, na diluição de uma porcentagem moderada de etanol (máximo de 20% do volume) e na presença de gás carbônico (p.ex., champanhe). [...] Apesar do álcool fornecer calorias (uma dose de bebida alcoólica contém 70 a 100 kcal), estas são desprovidas de nutrientes, como minerais, proteínas e vitaminas. O álcool pode, também, interferir na absorção de vitaminas no intestino delgado e diminuir seu armazenamento no fígado com efeitos no folato (ácido fólico), na piridoxina (B6), na tiamina (B1), no ácido nicotínico (niacina, B3) e na vitamina A. Alguns indivíduos metabolizam o álcool melhor que outros. Além disso, é possível que ocorra algum tipo de alteração no sistema biológico devido ao consumo frequente e abusivo do álcool ou ao esgotamento do organismo, fazendo com que uma pessoa que, até então, tolerava bem o álcool e a reagir ao consumo de forma patológica. É importante considerar, também, a quantidade de bebida consumida diariamente por um período prolongado, sendo que a fronteira de “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
212
risco para os homens é aproximadamente 60 g de álcool puro/dia e para as mulheres, de 40 g/dia. Isso significa que uma margem segura deve estar abaixo desses limiares. Todavia, a dependência física, com suas consequências devastadoras, aparece relativamente tarde, geralmente após 4 a 6 anos de consumo regular para o adolescente e após 6 a 8 anos para o adulto.” O uso de baixo risco do álcool Há um padrão de consumo que pode ser considerado de baixo risco, pouco tóxico e, eventualmente, até benéfico à saúde em algumas situações. É o caso do adulto sem nenhuma doença, que bebe até duas doses de vinho por dia, ou dois copos de cerveja, ou uma dose de destilado. Na gravidez, porém, uma dose diária de álcool é suficiente para intoxicar o feto. Nunca se pode perder a vista, porém, que o álcool é uma substância tóxica, qualquer que seja a dose e que, quanto maior for o volume ingerido, mais tóxico ele é. Se a pessoa beber três, quatro doses de vinho num dia, estará expondo seu organismo a um nível de toxicidade que mudará seu padrão de sono e aumentará o risco de hipertensão, por exemplo. Número maior de doses diárias provavelmente vai provocar dependência e outros problemas como doença cardiovascular, acidentes pessoais, etc. (Dr. Ronaldo Laranjeira – Médico Psiquiatra especialista em Alcoolismo) Uso abusivo do álcool A pessoa que abusa de álcool não é necessariamente alcoólatra, ou seja, dependente e faz uso continuado. O critério de abuso existe para caracterizar as pessoas que eventualmente, mas recorrentemente têm problemas por causa dos exagerados consumos de álcool em curtos períodos de tempo. Critérios: para se fazer esse diagnóstico é preciso que o paciente esteja tendo problemas com álcool durante pelo menos 12 meses e ter pelo menos uma das seguintes situações: a) prejuízos significativos no trabalho, escola ou família como faltas ou negligências nos cuidados com os filhos. b) exposição a situações potencialmente perigosas como dirigir ou manipular máquinas perigosas embriagado. c) problemas legais como desacato a autoridades ou superiores. d) persistência no uso de álcool apesar do apelo das pessoas próximas em que se interrompa o uso. Dependência ao álcool Para se fazer o diagnóstico de dependência alcoólica é necessário que o usuário venha tendo problemas decorrentes do uso de álcool durante 12 meses seguidos e preencher pelo menos 3 dos seguintes critérios: a) apresentar tolerância ao álcool -- marcante aumento da quantidade ingerida para produção do mesmo efeito obtido no início ou marcante diminuição dos sintomas de embriaguez ou outros resultantes do consumo de álcool apesar da continua ingestão de álcool. b) sinais de abstinência -- após a interrupção do consumo de álcool a pessoa a a apresentar os seguintes sinais: sudorese excessiva, aceleração do pulso (acima de 100), tremores nas mãos, insônia, náuseas e vômitos, agitação psicomotora, ansiedade, convulsões, alucinações táteis. A reversão desses sinais com a reintrodução do álcool comprova a abstinência. Apesar do álcool "tratar" a abstinência o tratamento de fato é feito com diazepam ou clordiazepóxido dentre outras medicações. c) o dependente de álcool geralmente bebe mais do que planejava beber. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
213
d) persistente desejo de voltar a beber ou incapacidade de interromper o uso. e) emprego de muito tempo para obtenção de bebida ou recuperando-se do efeito. f) persistência na bebida apesar dos problemas e prejuízos gerados como perda do emprego e das relações familiares. Síndrome de Wernicke Korsakoff “[...] é uma complicação potencialmente fatal associada à deficiência de vitamina B1 ou tiamina. Foi descrita como duas entidades distintas – encefalopatia de Wernicke e psicose de Korsakoff. A síndrome é composta por uma tríade de anormalidades clínicas descritas por Wernicke – oftalmoplegia [paralisia dos músculos dos olhos], ataxia e confusão mental. Esses seriam os pilares no diagnóstico da síndrome; porém, a presença de todos esses sintomas não é necessária para o diagnóstico de SWK, sendo mais rotineiramente encontrados sinais isolados (de oftalmoplegia e/ou desorientação e/ou estupor e/ou coma). Os movimentos oculares podem consistir em nistagmo [oscilações rítmicas, repetidas e involuntárias de um ou ambos os olhos conjugadamente, nos sentidos horizontal (de um lado para o outro), vertical (de cima para baixo) ou rotatório (movimentos circulares) que podem dificultar muito a focalização das imagens] 133 ou paralisia do músculo reto lateral e do olhar conjugado. Em casos avançados, pode-se encontrar oftalmoplegia completa. A confusão mental é caracterizada por diminuição do estado de alerta e atenção e alteração senso-perceptual e da memória. Quadros de confabulação são comuns nesse grupo de pacientes. Algumas vezes há progressão para coma. [...]” Síndrome de Marchiava Bignami (ou “degeneração primária do corpo caloso”) A Síndrome de Marchiava Bignami é uma doença mais comumente definida pelos aspectos patológicos que pelos clínicos. A principal alteração é encontrada na porção medial do corpo caloso onde, ao exame de olho nu, vê-se uma diminuição da densidade do tecido, com leve depressão avermelhada ou amarelada, dependendo do tempo da lesão. Do ponto de vista microscópico, observam-se, claramente, zonas de desmielinização com abundância de macrófagos 134, embora não haja alterações inflamatórias. Menos consistentes, lesões de natureza similar são encontradas na porção central das comissuras anterior e posterior e ponte. É uma doença rara, que afeta pessoas mais idosas e, com poucas exceções, todos os pacientes acometidos são dependentes de álcool. Alguns apresentam, no estágio terminal, quadros de estupor e coma, e outros, sintomas compatíveis com quadro de intoxicação crônica e síndrome de abstinência. Em alguns casos, descreveram-se quadros de demência progressiva, com sintomas como disartria, movimentos vagarosos e instáveis, incontinência esfincteriana transitória, hemiparesia135 e afasia. O diagnóstico dessa patologia raramente é feito durante a vida mas, via de regra, na necropsia, por meio de exame anatomopatológico. A ocorrência, em paciente 133
http://www.hospitaldeolhos.com.br/noticia/1255 Os macrófagos são considerados fagócitos profissionais, isto é, células cuja função primária é a de fagocitar partículas, sejam elas restos celulares, partículas inertes ou microorganismos. 135 Hemiparesia - Hemiparesia é a paralisia parcial de um lado do corpo. 134
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
214
dependente de álcool, de sintomas semelhantes à síndrome do lobo frontal, à doença de Alzheimer ou, ainda, de sintomas semelhantes a quadros de tumor na região frontal, mas que remitam espontaneamente, sugere síndrome de Marchiava Bignami, e exames de imagem auxiliarão no diagnóstico. A etiologia e a patologia desse quadro não foram bem esclarecidas até o momento. Síndrome Alcoólica Fetal136
É uma síndrome que reúne vários sinais e sintomas, desde o nascimento, em pessoas filhas de mães que consumiram bebidas alcoólicas durante a gestação. A Síndrome Álcoólica Fetal (SAF) é a maior causa de retardo mental do ocidente e caracteriza-se por déficit de crescimento, dismorfismo facial e evidências de anormalidades no SNC. Os critérios mínimos para o diagnóstico da SAF são: 1.retardo do crescimento pré ou pós-natal; 2.envolvimento do sistema nervoso, atraso do desenvolvimento neuropsicomotor, alterações do QI e do comportamento; 3.dismorfismo facial. Pelo menos dois dos seguintes sinais: •microcefalia, •microftalmia e/ou fissura palpebral pequena •filtro nasal hipoplásico137 com lábio superior fino, •hipoplasia maxilar Abstinência ao álcool (DSM-5) Critérios Diagnósticos A. Cessação (ou redução) do uso pesado e prolongado de álcool. B. Dois (ou mais) dos seguintes sintomas, desenvolvidos no período de algumas horas a alguns dias após a cessação (ou redução) do uso de álcool descrita no Critério A: 1. Hiperatividade autonômica (p. ex., sudorese ou frequência cardíaca maior que 100 bpm). 2. Tremor aumentado nas mãos. 136
http://dicionariodesindromes.blogspot.com.br/2008/10/sindrome-alcoolica-fetal.html Hipoplásico – hipoplasia - É um termo utilizado para designar a diminuição da atividade que leva à formação dos tecidos orgânicos. Com isto ocorre o hipodesenvolvimento de órgãos ou de tecidos, já que as células que os compõem estão presentes em menor número. O órgão afetado se torna mais leve do que o normal, porém os padrões de sua arquitetura não sofrem modificações. São várias as causas que podem levar a esta condição, sendo que a mesma pode afetar uma série de órgãos diferentes. (http://www.saudemedicina.com/hipoplasia/) 137
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
215
3. Insônia. 4. Náusea ou vômitos. 5. Alucinações ou ilusões visuais, táteis ou auditivas transitórias. 6. Agitaçãopsicomotora. 7. Ansiedade. 8. Convulsões tônico-clônicas138 generalizadas. C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância. [...] Os sintomas podem ser aliviados por meio da istração de álcool ou benzodiazepínicos (p. ex., diazepam). Os sintomas de abstinência geralmente começam quando as concentrações sanguíneas de álcool declinam abruptamente (i.e., em 4 a 12 horas) depois que o uso de álcool foi interrompido ou reduzido. Refletindo o metabolismo relativamente rápido do álcool, a intensidade dos sintomas costuma atingir o auge durante o segundo dia de abstinência, e os sintomas tendem a melhorar acentuadamente no quarto ou quinto dia. Após abstinência aguda, entretanto, os sintomas de ansiedade, insônia e disfunção autonômica podem persistir durante um período de até 3 a 6 meses em níveis menores de intensidade. Menos de 10% dos indivíduos que desenvolvem abstinência de álcool chegam a desenvolver sintomas drásticos (p. ex., hiperatividade autonômica grave, tremor, delirium por abstinência de álcool). Convulsões tônico-clônicas ocorrem em menos de 3% das pessoas. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Embora confusão mental e alterações na consciência não sejam critérios para abstinência de álcool, delirium por abstinência de álcool (ver “Delirium” no capítulo “Transtornos Neurocognitivos”) pode ocorrer no caso de abstinência. Assim como é válido para qualquer estado de confusão e agitação independentemente da causa, além de perturbação da consciência e da cognição, o delirium por abstinência pode envolver alucinações visuais, táteis ou (raramente) auditivas (delirium tremens). Quando se desenvolve delirium por abstinência, provavelmente há uma condição médica clinica- mente relevante (p. ex., insuficiência hepática, pneumonia, sangramento gastrintestinal, sequelas de traumatismo craniano, hipoglicemia e desequilíbrio eletrolítico ou estado pósoperatório).
138
Convulsões Tônicas - resultam na contração súbita dos músculos. Essas convulsões são mais comuns durante o sono. Convulsões Clônicas - causam convulsões ou movimentos involuntários em ambos os lados do corpo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
216
Transtornos relacionados à anfetamina e cocaína Anfetaminas – grupo de substâncias [...] que estimulam a formação reticular139 no cérebro e provocam uma liberação da norepinefrina armazenada. O efeito é um estado prolongado de estimulação e alívio dos sintomas de fadiga. [...] A tolerância se desenvolve progressivamente com o uso prolongado até o indivíduo atingir um ponto de exaustão e dormir continuamente por alguns dias. O abuso de anfetaminas pode resultar em dependência e um estado de psicose bem definido. Embora largamente utilizada no ado para perda de peso, alívio da depressão e outras indicações, o uso moderno das anfetaminas é mais circunscrito devido aos seus efeitos adversos. Atualmente, elas são utilizadas principalmente em preparações de ação breve e longa para controlar sintomas do transtorno do déficit de atenção/hiperatividade, e para tratar certos casos de depressão grave ou narcolepsia – mas ainda são usadas pelo exército no tratamento da fadiga. [...] (APA, 2010, p. 76) Cocaína – “A cocaína compartilha características das anfetaminas ou simpaticomiméticos140 de ação similar.” (DSM-4) “A cocaína é um alcaloide (produto extraído das folhas de uma planta chamada Erythroxilon coca encontrada principalmente em países da América do Sul e Central). Também é conhecida como coca, pó dourado, neve ou "senhora". A droga age bloqueando a recaptação dos neurotransmissores dopamina, serotonina e norepinefrina. As propriedades psicoativas da planta da coca foram reconhecidas pelos incas peruanos antes de 4.000 a.C. e na década de 1880 foram investigados os possíveis usos terapêuticos da cocaína. Sigmund Freud observou que a droga funcionava como anestésico tópico”. (APA, 2010, p. 184) “Os Transtornos Relacionados a Substâncias incluem desde transtornos relacionados ao consumo de uma droga de abuso (inclusive álcool), aos efeitos colaterais de um medicamento e à exposição a toxinas. Neste manual (CID 10), o termo substância pode referir-se a uma droga de abuso, um medicamento ou uma toxina. As substâncias discutidas nesta seção são agrupadas em 11 classes: álcool anfetamina ou simpaticomiméticos de ação similar cafeína 139
Formação reticular - parte do tronco cerebral (ou tronco encefálico) que está envolvida em ações como os ciclos de sono, o despertar e a filtragem de estímulos sensoriais, para distinguir os estímulos relevantes dos estímulos irrelevantes. A sua principal função é ativar o córtex cerebral. 140 SNP Autônomo Simpático e SNP Autônomo Parassimpático - O SNP autônomo (SNPA) é dividido em dois ramos: simpático e parassimpático, que se distinguem tanto pela estrutura quanto pela função. Enquanto os gânglios da via simpática localizam-se ao lado da medula espinal, distantes do órgão efetuador, os gânglios das vias parassimpáticas estão longe do sistema nervoso central e próximos ou mesmo dentro do órgão efetuador. As fibras nervosas simpáticas e parassimpáticas inervam os mesmos órgãos, mas trabalham em oposição. Enquanto um dos ramos estimula determinado órgão, o outro o inibe. Essa ação antagônica mantém o funcionamento equilibrado dos órgãos internos. O SNPA simpático, de modo geral, estimula ações que mobilizam energia, permitindo ao organismo responder a situações de estresse. Por exemplo, o SNPA simpático é responsável pela aceleração dos batimentos cardíacos, pelo aumento da pressão sanguínea, pelo aumento da concentração de açúcar no sangue e pela ativação do metabolismo geral do corpo. Já o SNPA parassimpático estimula principalmente atividades relaxantes, como a redução do ritmo cardíaco e da pressão sanguínea, entre outras. (http://www.webciencia.com/11_29snp.htm)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
217
canabinóides cocaína alucinógenos inalantes nicotina opióides fenciclidina (P) ou arilciclo-hexilaminas de ação similar e sedativos hipnóticos ou ansiolíticos [...] Muitos medicamentos vendidos com ou sem prescrição médica também podem causar Transtornos Relacionados a Substâncias. Os sintomas com frequência estão relacionados à dosagem do medicamento e habitualmente desaparecem com a redução da dosagem ou suspensão do medicamento. Entretanto, às vezes pode haver uma reação idiossincrática a uma única dose. Os medicamentos capazes de causar Transtornos Relacionados a Substâncias incluem (mas não se limitam a) anestésicos e analgésicos, agentes anticolinérgicos141, anticonvulsivantes, antihistamínicos, medicamentos anti-hipertensivos e cardiovasculares, antimicrobianos, antiparkinsonianos, agentes quimioterápicos, corticosteroides, medicamentos gastrintestinais, relaxantes musculares, anti-inflamatórios não-esteroides, outros medicamentos vendidos sem prescrição, antidepressivos[...]. A exposição a uma ampla faixa de outras substâncias químicas também pode levar ao desenvolvimento de um Transtorno Relacionado a Substância. As substâncias tóxicas capazes de causar Transtornos Relacionados a Substâncias incluem (mas não se limitam a) metais pesados (por ex., chumbo ou alumínio), raticidas contendo estricnina, pesticidas contendo inibidores da acetilcolinesterase, gases nervosos, etileno glicol (anticongelante), monóxido e dióxido de carbono. As substâncias voláteis (por ex., combustíveis, tintas) são classificadas como "inalantes" (ver p. 157), quando usadas com fins de intoxicação e são consideradas "toxinas", se a exposição é acidental ou faz parte de um envenenamento intencional. Prejuízos na cognição ou no humor são os
141
Anticolinérgicos - diz-se das substâncias antagonistas da ação de fibras nervosas parassimpáticas que liberam acetilcolina. Ou seja, que inibem a produção da acetilcolina. [...] Estes medicamentos tem utilidade terapêutica no tratamento da Síndrome de Parkinson e como antiespasmódico. Foram usados durante a Segunda Guerra Mundial por organismos militares, que viram neles um "soro da verdade", pois na aplicação parenteral levam a um estado torporoso, com especial tendência à sugestibilidade, liberando barreiras conscientes de defesa. [...] Absorvido em quantidades maiores do que a dose terapêutica, o produto provoca alterações mentais como alucinações e delírios, com duração de 48 horas. Consumido junto com outras drogas, como inalantes e maconha, o efeito pode durar mais tempo ainda, iniciando pela sensação de "barato" na cabeça ou no corpo todo, seguida de alterações na percepção de cores/sons, terminando com sensações de estranheza, medo, confusão mental, ideias de perseguição, dificuldades de memória síndrome que adota a forma de um surto psicótico agudo. O potencial de dependência parece elevado, com alta toxicidade, evoluindo para alterações crônicas. Os delírios e alucinações dependem bastante da personalidade da pessoa e de sua condição. As drogas anticolinérgicas são capazes de produzir muitos efeitos periféricos. Assim, as pupilas ficam muito dilatadas, a boca seca e o coração dispara. Os intestinos ficam paralisados - tanto que são usados medicamentosamente como antidiarréicos - e a bexiga fica "preguiçosa" ou há retenção de urina. Os anticolinérgicos podem produzir, em doses altas, grande elevação da temperatura - que chega, às vezes, até a 40-41 graus. Nestes casos, não muito comuns, a pessoa apresenta-se com a pele muito seca e quente com vermelhidão principalmente no rosto e pescoço. Esta temperatura elevada pode provocar convulsões. São, por isto, bastante perigosas. Existem pessoas que, também, descrevem ter "engolido a língua" e quase se sufocarem por causa disto. Ainda, em casos de dosagem elevada, o número de batimentos do coração sobe exageradamente, podendo chegar acima de 150 batimentos por minutos. Estas drogas não desenvolvem tolerância no organismo e não há descrição de síndrome de abstinência após a parada de um uso contínuo. (http://www.imesc.sp.gov.br)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
218
sintomas mais comuns associados com substâncias tóxicas, embora ansiedade, alucinações, delírios ou convulsões também possam ocorrer. Os sintomas em geral desaparecem quando o indivíduo deixa de expor-se à substância, mas sua resolução pode levar de semanas a meses e exigir tratamento. Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - intoxicação aguda Estado consequente ao uso de uma substância psicoativa e compreendendo perturbações da consciência, das faculdades cognitivas, da percepção, do afeto ou do comportamento, ou de outras funções e respostas psicofisiológicas. As perturbações estão na relação direta dos efeitos farmacológicos agudos da substância consumida, e desaparecem com o tempo, com cura completa, salvo nos casos onde surgiram lesões orgânicas ou outras complicações. Entre as complicações, podem-se citar: traumatismo, aspiração de vômito, delirium, coma, convulsões e outras complicações médicas. A natureza destas complicações depende da categoria farmacológica da substância consumida assim como de seu modo de istração. [...] As complicações podem ser físicas (por exemplo, hepatite consequente a injeções de droga pela própria pessoa) ou psíquicas (por exemplo, episódios depressivos secundários a grande consumo de álcool). Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome de dependência Conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga [“fissura”], à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas consequências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de abstinência física. A síndrome de dependência pode dizer respeito a uma substância psicoativa específica (por exemplo, o fumo, o álcool ou o diazepam), a uma categoria de substâncias psicoativas (por exemplo, substâncias opiáceas) ou a um conjunto mais vasto de substâncias farmacologicamente diferentes. Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome [estado] de abstinência A característica essencial da Abstinência de Cocaína é a presença de uma síndrome característica de abstinência, que se desenvolve dentro de algumas horas a alguns dias após a cessação (ou redução) do uso pesado e prolongado de cocaína [...]. A síndrome de abstinência caracteriza-se pelo desenvolvimento de um humor disfórico acompanhado por duas ou mais das seguintes alterações fisiológicas: fadiga, sonhos vívidos e desagradáveis, insônia ou hipersonia, maior apetite e retardo ou agitação psicomotora. Anedonia e premência pela droga também podem estar presentes, mas não fazem parte dos critérios de diagnóstico. Esses sintomas causam um sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo [...]. Os sintomas não devem ser decorrência de uma condição médica geral e nem ser melhor explicados por outro transtorno mental [...]. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
219
Os sintomas agudos de abstinência frequentemente são vistos após períodos de uso repetitivo de altas doses e caracterizam-se por sensações intensas e desagradáveis de lassidão [cansaço, fadiga] e depressão, geralmente exigindo vários dias de repouso e recuperação. Sintomas depressivos com ideação ou comportamento suicida podem ocorrer e geralmente são os problemas mais sérios vistos durante a "aterrissagem" ou outras formas de Abstinência de Cocaína. Uma parcela considerável dos indivíduos com Dependência de Cocaína apresenta poucos ou nenhum sintoma de abstinência evidente ao cessar o uso da substância. Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome de abstinência com delirium Estado no qual a síndrome de abstinência tal como definida [tópico acima] se complica com a ocorrência de delirium, segundo os critérios [deste manual]. Este estado pode igualmente comportar convulsões. Quando fatores orgânicos também estão considerados na sua etiologia, a afecção deve ser classificada [como Outro delirium – ou seja, delirium de etiologia mista]. Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - transtorno psicótico Conjunto de fenômenos psicóticos que ocorrem durante ou imediatamente após o consumo de uma substância psicoativa, mas que não podem ser explicados inteiramente com base numa intoxicação aguda e que não participam também do quadro de uma síndrome de abstinência. O estado se caracteriza pela presença de alucinações (tipicamente auditivas, mas frequentemente polissensoriais), de distorção das percepções, de ideias delirantes (frequentemente do tipo paranoide ou persecutório), de perturbações psicomotoras (agitação ou estupor) e de afetos anormais, podendo ir de um medo intenso ao êxtase. O sensório não está habitualmente comprometido, mas pode existir um certo grau de obnubilação da consciência embora possa estar presente a confusão mas esta não é grave. Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome amnésica Síndrome dominada pela presença de transtornos crônicos importantes da memória (fatos recentes e antigos). A memória imediata está habitualmente preservada e a memória dos fatos recentes está tipicamente mais perturbada que a memória remota. Habitualmente existem perturbações manifestas da orientação temporal e da cronologia dos acontecimentos, assim como ocorrem dificuldades de aprender informações novas. A síndrome pode apresentar confabulação intensa, mas esta pode não estar presente em todos os casos. As outras funções cognitivas estão em geral relativamente bem preservadas e os déficits amnésicos são desproporcionais a outros distúrbios. Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - transtorno psicótico residual ou de instalação tardia Transtorno no qual as modificações, induzidas pelo álcool ou por substâncias psicoativas, da cognição, do afeto, da personalidade, ou do comportamento persistem além do período durante o qual podem ser considerados como um efeito direto da substância. A ocorrência da perturbação deve estar diretamente ligada ao consumo de uma substância psicoativa. Os casos nos quais as primeiras manifestações ocorrem nitidamente mais tarde que o (s) episódio(s) de utilização da droga só deverão ser codificados neste caractere onde existam evidências que permitam atribuir sem equívoco as manifestações ao efeito residual da substância. Os "flashbacks" podem ser “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
220
diferenciados de um estado psicótico, em parte porque são episódicos e frequentemente de muito curta duração, e em parte porque eles reproduzem experiências anteriores ligadas ao álcool ou às substâncias psicoativas.142
142
Texto adaptado da CID-10.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
221
Transtornos relacionados à cannabis e alucinógenos Maconha - São as flores e folhas secas da planta CANNABIS SATIVA, também conhecida como Cânhamo verdadeiro. Os cigarros são chamados de: erva, pacau, baseado, charão, fininho ou finório. Contém várias substâncias que têm efeitos cerebrais, a mais conhecida sendo o delta-9tetrahidrocanabinol (D -9-THC,THC). Também contém substâncias que não agem no cérebro, como o alcatrão. Outras preparações da CANNABIS são o haxixe, ganja e charas. Os efeitos variam se a droga é fumada ou tomada, e dependem da quantidade usada. Com doses baixas há euforia (sensação de bem-estar) e risos, quando em grupo, ou há relaxamento e sonolência, se está sozinho. A memória fica prejudicada e a pessoa não consegue executar tarefas múltiplas. Há aceleração do tempo subjetivo, fazendo minutos parecerem horas, e confusão entre ado, presente e futuro. Os sentidos ficam aguçados, mas o indivíduo tem menor equilíbrio e força muscular. Os olhos ficam vermelhos (congestão da conjuntiva), a boca seca, e aumenta a vontade de comer doces. O pulso fica acelerado, e a pressão pode diminuir quando a pessoa fica em pé, causando tontura. Com doses mais altas iniciam os delírios (desorientação, confusão, raciocínio incoerente, medo, ilusões), alucinações (perceber algo quando não há estímulo) e despersonalização (sente que não é mais ele mesmo), que podem atingir um nível de psicose tóxica. Nestes estágios de intoxicação a pessoa pode sentir-se muito mal, mostrar-se agitada e confusa, caracterizando a má viagem. Sem referir os problemas de comportamento já citados, é conhecido que: •fumar maconha traz os mesmos problemas que fumar cigarro de tabaco: bronquite, asma, faringite, enfisema e câncer; •há maior risco de sofrer acidentes de trânsito; •diminui a imunidade, aumentando a chance de ocorrerem infecções; •se for usada durante a gravidez, existe a possibilidade de prejudicar o feto. A dependência pode ocorrer por uso repetido, durante bastante tempo. Pode haver tolerância (precisa usar maior quantidade de droga para sentir os mesmos efeitos de antes), de forma que a pessoa a a fazer uso diário da droga, no entanto, a suspensão abrupta do uso não produz sintomas físicos. O dependente se afasta da família, do trabalho e do lazer, para ficar usando a droga. Alguns podem perder o interesse por cuidar de sua saúde ou higiene.143 Pesquisas recentes demonstram que pessoas geneticamente predispostas à esquizofrenia, e que utilizam a maconha cronicamente, correm um risco muito maior de desenvolverem esse tipo de psicose. (vide: Genetic predisposition to schizophrenia associated with increased use of cannabis. http://www.nature.com/mp/journal/vaop/ncurrent/full/mp201451a.html) Canabidiol Sem efeito psicoativo, o canabidiol (CDB) é uma substância canabinoide existente na folha da Cannabis Sativa, a planta da maconha. De acordo com pesquisadores, não causa efeitos psicoativos ou dependência. O elemento possui estrutura química com grande potencial terapêutico neurológico, ou seja, pode ter ação ansiolítica, que diminui a ansiedade, antipsicótica, neuroprotetora, anti-inflamatória, antiepilética e agir nos distúrbios do sono. 143
http://psicoativas.ufcspa.edu.br/maconha.html
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
222
Pesquisadores defenderam a reclassificação do canabidiol por parte da Anvisa. Segundo eles, o uso medicinal da substância tem efeitos positivos relevantes em pacientes com autismo, esclerose múltipla, dores neuropáticas, câncer, epilepsia, mal de Parkinson e não causa efeitos psicoativos ou dependência.144 Abstinência à Cannabis (DSM-5) Critérios diangósticos A. Cessação do uso pesado e prolongado de Cannabis (i.e., normalmente uso diário ou quase diário durante um período mínimo de alguns meses). B. Três (ou mais) dos seguintes sinais e sintomas, desenvolvidos no prazo de aproximadamente uma semana após o Critério A: 1. Irritabilidade, raiva ou agressividade. 2. Nervosismo ou ansiedade. 3. Dificuldade em dormir (insônia, sonhos perturbadores). 4. Apetite reduzido ou perda de peso. 5. Inquietação. 6. Humor deprimido. 7. Pelo menos um dos seguintes sintomas físicos causa desconforto significativo: dor abdominal, tremor, sudorese, febre, calafrios ou cefaleia. C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional, ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância. A característica essencial da abstinência de Cannabis é a presença de uma síndrome de abstinência típica que se desenvolve após a cessação ou redução substancial do uso pesado e prolongado da substância. Além dos sintomas do Critério B, podem-se também observar os seguintes no período pós-abstinência: fadiga, bocejos, dificuldade de concentração, períodos de rebote de aumento no apetite e hipersonia que se seguem a períodos iniciais de perda de apetite e insônia. Para o diagnóstico, os sintomas de abstinência devem causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério C). Muitos usuários de Cannabis relatam fumá-la ou consumir outras substâncias para aliviar os sintomas de abstinência, e muitos relatam que os sintomas de abstinência tornam difícil o abandono do hábito e contribuem para a recaída. Os sintomas em geral não são suficientemente graves a ponto de exigir atenção médica, mas estratégias medicamentosas ou comportamentais podem ajudar a aliviar os sintomas e melhorar o prognóstico dos indivíduos que estão tentando abandonar o hábito. A abstinência de Cannabis é habitualmente observada em pessoas que buscam tratamento para uso da substância e também em usuários crônicos de Cannabis que não buscam tratamento. Entre os indivíduos que a consomem regularmente durante um período de suas vidas, até um terço relata ter sofrido abstinência. Entre adultos e adolescentes sob tratamento ou usuários crônicos, 50 a 95% relatam abstinência de Cannabis. Esses achados indicam que a abstinência da substância ocorre em um substancial subgrupo de usuários regulares de Cannabis que tentam abandonar o hábito. 144
Fonte: http://www.ebc.com.br/noticias/saude/2015/01/entenda-o-que-e-o-canabidiol
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
223
Alucinógenos São substâncias capazes de produzirem um efeito sensorial (visual, auditivo, olfativo, gustativo ou tátil) na ausência de um estímulo real. Por produzirem alterações na percepção, cognição e humor os alucinógenos são chamados de drogas psicodélicas (do grego, significando “que manifesta a mente”). Os alucinógenos são um grupo de compostos heterogêneos, muitos dos quais de ocorrência natural; outros são produzidos sinteticamente. Muitos alucinógenos são estruturalmente semelhantes a um dos diversos neurotransmissores, o que pode ser usado como forma de categorização. Por exemplo, alucinógenos semelhantes à serotonina incluem as indolalquilaminas, exemplificadas pela dietilamida do ácido lisérgico (LSD), [...]; alucinógenos semelhantes às catecolaminas incluem as feniletilaminas e seus derivados, tais como a mescalina, [...]. Ambas as classes em geral produzem alucinações visuais por sua atividade em subtipos de receptores de serotonina. [...] (APA, 2010, p. 55) Os transtornos psíquicos ocasionados pelo uso da maconha e de alucinógenos foram descritos no item anterior.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
224
Transtornos relacionados à cafeína, nicotina e inalantes Cafeína – “A cafeína também chamada metil-xantina, derivada das xantinas, está presente em plantas amplamente distribuídas nas várias regiões geográficas. Ela é encontrada nos grãos de café, folhas de chá e de mate, nas sementes de cacau e em várias partes do guaraná. Devido ao consumo generalizado dessa substância, conclui-se que ela é a droga mais utilizada no mundo. Um copo de café contém aproximadamente 85mg de cafeína. A cafeína possui efeitos terapêuticos importantes como dilatação dos brônquios, estimulação do coração e aumento da excreção urinária. No cérebro, ela alivia dores de cabeça. Ela possui também efeitos prejudiciais, provoca aumento da secreção gástrica, agravando sintomas de gastrite e úlcera. A droga também possui efeitos psicoestimulantes. Em doses moderadas (85 a 250mg), os usuários relatam uma sensação de bem estar, melhora de atenção e pensamento. Porém em doses elevadas (acima de 250mg), surgem efeitos de nervosismo, inquietação, insônia e tremores. Doses muito altas podem produzir convulsões, delírios e aumento da frequência cardíaca. A cafeína é metabolizada pelo fígado e eliminada pela urina. O uso crônico dessa substância (350mg ao dia) provoca dependência física e tolerância à droga. Na retirada da droga pode aparecer uma síndrome de abstinência caracterizada por dores de cabeça, nervosismo, irritação, ansiedade e insônia.” (http://www.unifesp.br/dpsicobio/drogas/cafe.htm) “A cafeína também pode causar dependência física. Muitas pessoas que param de consumi-la podem sentir os sintomas desagradáveis devido ao seu consumo, tais como: fortes dores de cabeça, náuseas e problemas estomacais. Entretanto, ser dependente de cafeína não significa necessariamente um dano à saúde, pois muitas pessoas vivem uma vida perfeitamente saudável com pequenas doses diárias desta substância. Porém, quando seu consumo é elevado, ela pode aumentar seriamente o nível de estresse diário. De forma geral, reduzir a ingestão de cafeína é uma atitude bastante benéfica quando estamos atravessando um período estressante, pois, como já vimos acima, ela atua como estimulante, e isso, inevitavelmente, eleva o nível de estresse, que por sua vez, é o desencadeador de uma série de doenças.” (http://www.todabiologia.com/saude/cafeina.htm) Abstinência à cafeína (DSM-5) A característica essencial da abstinência de cafeína é a presença de uma síndrome de abstinência típica que se desenvolve após a interrupção (ou redução substancial) abrupta da ingestão diária prolongada de cafeína. A síndrome de abstinência de cafeína é indicada por três ou mais dos seguintes: cefaleia; fadiga ou sonolência acentuadas; humor disfórico, humor deprimido ou irritabilidade; dificuldade de concentração; e sintomas gripais (náusea, vômitos, dor/rigidez muscular). A síndrome de abstinência causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Os sintomas não devem estar associados aos efeitos fisiológicos de outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental. A cefaleia é a característica típica da abstinência de cafeína e pode ser difusa, de desenvolvimento gradual, latejante e sensível ao movimento. Contudo, outros sintomas de abstinência de cafeína podem ocorrer na ausência de cefaleia. A cafeína é a substância comportamentalmente ativa mais “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
225
amplamente usada no mundo e está presente em diversos tipos de bebidas (p. ex., café, chá, mate, refrigerantes, refrescos, bebidas energéticas), alimentos, complementos energéticos, medicamentos e suplementos alimentares. Como sua ingestão costuma estar integrada a hábitos sociais e a rituais diários (p. ex., pausa para o cafezinho, chá da tarde), alguns consumidores podem não estar cientes de sua dependência física da substância, e, por isso, os sintomas de abstinência podem ser inesperados e atribuídos erroneamente a outras causas (p. ex., gripe, enxaqueca). Além disso, os sintomas de abstinência de cafeína podem ocorrer quando o indivíduo precisa abster-se de alimentos e bebidas antes de procedimentos médicos ou quando perde uma dose habitual da substância devido a uma mudança na rotina (p. ex., durante viagens, fins de semana). A probabilidade e a gravidade da abstinência de cafeína geralmente aumentam como resultado da dose diária regular da substância. Contudo, há grande variação de uma pessoa para outra e em um mesmo indivíduo em diferentes episódios quanto a incidência, gravidade e duração dos sintomas de abstinência. Os sintomas de abstinência podem ocorrer após a interrupção abrupta de doses crônicas relativamente baixas da substância (i.e., 100 mg). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Demonstrou-se que a abstinência de cafeína está associada a comprometimento do desempenho comportamental e cognitivo (p. ex., atenção sustentada). Estudos eletrencefalográficos demonstraram que os sintomas de abstinência estão significativamente associados a aumentos na atividade teta e diminuições na atividade beta-2. Redução na motivação para trabalhar e diminuição na sociabilidade também foram relatadas durante a abstinência de cafeína. Documentou-se, ainda, aumento do uso de analgésicos durante a abstinência da substância. Nicotina - O tabaco é uma planta cujo nome científico é Nicotiana tabacum, da qual é extraída uma substância de efeito estimulante chamada nicotina. Além desta, o tabaco possui mais de 4.700 substâncias tóxicas, dentre elas o monóxido de carbono, amônia, cetonas, formaldeído e partículas de nicotina e alcatrão. O tabaco começou a ser utilizado aproximadamente no ano 1000 a.C., nas sociedades indígenas da América Central, em rituais mágico-religiosos, com o objetivo de purificar, contemplar, proteger e fortalecer os ímpetos guerreiros. A planta chegou ao Brasil provavelmente pela migração de tribos tupis-guaranis. Hoje, apesar dos males que o hábito de fumar provoca, a nicotina é uma das drogas mais consumidas no mundo. Quando o fumante dá uma tragada, a nicotina é absorvida pelos pulmões, chegando ao cérebro aproximadamente em nove segundos. Os principais efeitos da nicotina no sistema nervoso central consistem em: elevação leve no humor (estimulação) e diminuição do apetite. A nicotina produz um pequeno aumento na frequência dos batimentos cardíacos, na pressão arterial, no ritmo respiratório e na atividade motora. Quando uma pessoa fuma um cigarro, a nicotina é imediatamente distribuída pelos tecidos. No sistema digestivo, provoca diminuição da contração do estômago, dificultando a digestão. O uso intenso e constante de cigarros aumenta a probabilidade de ocorrência de algumas doenças, como: pneumonia, câncer (pulmão, laringe, faringe, esôfago, boca, estômago), infarto de miocárdio, bronquite crônica, enfisema pulmonar, derrame cerebral e úlcera digestiva. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
226
A nicotina é um psicotrópico que gera dependência, por isso, o tabagismo é classificado pelo Código Internacional de Doenças (CID-10) como um transtorno mental e de comportamento pelo uso da substância. No sistema digestivo, provoca diminuição da contração do estômago, dificultando a digestão. Além disso, estimula no aparelho gastrointestinal a produção de ácido clorídrico, o que pode causar úlcera gástrica. Essa droga, no organismo, aumenta a liberação de catecolaminas, as quais são responsáveis pela vasoconstricção, hipertensão arterial e aumento da frequência cardíaca. A nicotina juntamente com o monóxido de carbono, provoca diversas doenças cardiovasculares, como: infarto, acidente vascular cerebral e morte-súbita. Também desencadeia a liberação de substâncias quimiotaxias145 no pulmão, o que estimula um processo de destruição da elastina (proteína responsável pela expansão e contração do pulmão), provocando o enfisema pulmonar. Abstinência ao tabaco (DSM-5) Os sintomas de abstinência prejudicam a capacidade de interromper o uso de tabaco. Os sintomas após a abstinência de tabaco devem-se, em grande parte, à privação de nicotina. Os sintomas são muito mais intensos entre indivíduos que fumam cigarros ou formas não fumáveis de tabaco do que entre aqueles que usam medicamentos com nicotina. A diferença na intensidade dos sintomas provavelmente se deve ao início mais rápido e aos níveis mais altos de nicotina com o fumo de cigarros. A abstinência de tabaco é comum entre usuários diários da substância que interrompem ou reduzem o hábito, mas também pode ocorrer entre usuários não diários. Em geral, a frequência cardíaca se reduz em 5 a 12 batimentos por minuto nos primeiros dias após a interrupção do tabagismo, e o peso aumenta em média 2 a 3 quilos ao longo do primeiro ano após a interrupção do tabagismo. A abstinência de tabaco pode produzir alterações no humor e prejuízo do funcionamento clinicamente significativos. Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A fissura por consumir alimentos doces ou açucarados e o comprometimento do desempenho em tarefas que exigem alerta estão associados à abstinência de tabaco. A abstinência pode aumentar constipação [resfriados com secreção], tosse, tontura, sonhos/pesadelos, náusea e dor de garganta. O tabagismo aumenta o metabolismo de vários medicamentos usados para tratar transtornos mentais; portanto, sua interrupção pode aumentar os níveis sanguíneos desses medicamentos, o que pode produzir resultados clinicamente significativos. Esse efeito parece ser devido não à nicotina, e sim a outros compostos presentes no tabaco.
145
Quimiotaxia - Reação de movimento orientado e obrigatório de organismos móveis, desencadeada e mantida por uma substância química, que se efetua na sua direção (quimiotaxia positiva) ou em direção oposta (quimiotaxia negativa).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
227
146
(http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/conteudo/index.php?id_conteudo=11287&rastro=I
NFORMA%C3%87%C3%95ES+SOBRE+DROGAS/Tipos+de+drogas/Tabaco)
146
A doença de Buerger (tromboangeíte obliterante) é a obstrução das artérias e das veias de pequeno e de médio calibre, por uma inflamação causada pelo hábito de fumar.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
228
Inalantes e solventes - A palavra solvente significa substância capaz de dissolver coisas, e inalante é toda substância que pode ser inalada, isto é, introduzida no organismo através da aspiração pelo nariz ou pela boca. Em geral, todo solvente é uma substância altamente volátil, ou seja, evapora-se naturalmente, por esse motivo pode ser facilmente inalado. Outra característica dos solventes ou inalantes é que muitos deles (mas não todos) são inflamáveis. Um número enorme de produtos comerciais, como esmaltes, colas, tintas, tíneres, propelentes, gasolina, removedores, vernizes etc., contém esses solventes. Eles podem ser aspirados de forma involuntária (por exemplo, trabalhadores de indústrias de sapatos ou de oficinas de pintura, o dia inteiro expostos ao ar contaminado por essas substâncias) ou voluntariamente (por exemplo, crianças em situação de rua que cheiram cola de sapateiro, o menino que cheira em casa acetona ou esmalte, ou o estudante que cheira o corretivo Carbex etc.). Todos esses solventes ou inalantes são substâncias pertencentes a um grupo químico chamado de hidrocarbonetos, como o tolueno, xilol, n-hexano, acetato de etila, tricloroetileno etc [...]. Um produto muito conhecido no Brasil é o “cheirinho” ou “loló”, também conhecido como “cheirinho da loló”. Trata-se de um preparado clandestino à base de clorofórmio e éter147, utilizado somente para fins de abuso. Mas já se sabe que, quando esses “fabricantes” não encontram uma daquelas duas substâncias, eles misturam qualquer outra coisa em substituição. Assim, em relação ao “cheirinho da loló” não se conhece bem sua composição, o que complica quando se tem casos de intoxicação aguda por essa mistura. É importante chamar a atenção para o lança-perfume. Esse nome designa inicialmente aquele líquido que vem em tubos e que se usa no carnaval. À base de cloreto de etila ou cloretila, é proibida sua fabricação no Brasil e só aparece nas ocasiões de carnaval, contrabandeada de outros países sul-americanos. Mas cada vez mais o nome lança-perfume é também utilizado para designar o “cheirinho da loló”. Os solventes começam a ser utilizados como droga de abuso por volta de 1960 nos Estados Unidos. No Brasil, o uso de solventes aparece no período de 1965-1970. O clorofórmio e o éter chegaram a servir como drogas de abuso em outros tempos e depois seu uso foi praticamente abandonado. No Brasil, o hábito voltou com os lança-perfumes trazidos da Argentina. O clorofórmio é conhecido desde 1847 como anestésico, mas foi abandonado porque
147
O éter e o clorofórmio são anestésicos de uso medicinal.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
229
surgiram anestésicos mais eficientes e seguros. Assim também ocorreu com o éter. Há referências ao abuso do éter como substituto do álcool durante a Segunda Guerra Mundial na Alemanha. Por volta de 1960, os lança-perfumes, que eram feitos de Cloreto de Etila, começaram a ser aspirados para dar sensação de torpor, tontura e euforia. O Quelene, anestésico local, formava par com o lança-perfume e era empregado fora das épocas de carnaval, quando a disponibilidade dos lança-perfumes era menor. Por volta de 1965, o governo brasileiro proibiu a fabricação dos lançaperfumes e do Quelene. Contudo, começou a surgir referências ao retorno do uso de lançaperfumes, só que como um produto à base de clorofórmio e éter. Assim como ocorre com o álcool, os solventes são substâncias que têm efeito bifásico, ou seja, causam uma excitação inicial, seguida por depressão do funcionamento cerebral, que dependerá da dose inalada. Após a inalação, os solventes alcançam os alvéolos e capilares pulmonares e são distribuídos pelas membranas lipídicas do organismo. O pico plasmático é atingido entre 15 a 30 minutos. O metabolismo é variável: nitratos e hidrocarbonetos aromáticos são metabolizados pelo sistema hepático microssomal. Alguns solventes possuem metabólitos ativos mais potentes que a substância inicial. A eliminação pode ser renal ou pulmonar. Praticamente todos os inalantes, com exceção dos nitritos, produzem efeitos prazerosos e depressores do Sistema nervoso central. O Tolueno, substância encontrada em produtos como tintas, colas e removedores, parece agir ativando o sistema dopaminérgico. Este sistema neural se relaciona à dependência. É responsável pela sensação de prazer associada ao consumo da droga, bem como a outros comportamentos naturalmente gratificantes como comer, fazer sexo e saciar a sede. Por outro lado, os Nitritos, conhecidos também como “poppers” e atualmente fabricados com a finalidade de limpeza de roupas e utensílios e desodorização de ambientes, produz o efeito de dilatação e relaxamento dos vasos sanguíneos e são utilizados como droga de abuso para melhor o desempenho sexual. O início dos efeitos, após a aspiração, é bastante rápido – de segundos a minutos no máximo – e em 15 a 40 minutos já desaparecem. Assim, o usuário repete as aspirações várias vezes para que as sensações durem mais tempo. Os efeitos dos solventes vão desde uma estimulação inicial até depressão, podendo também surgir processos alucinatórios. Vários autores dizem que os efeitos dos solventes (quaisquer que sejam) lembram os do álcool, entretanto, este não produz alucinações, fato bem descrito para os solventes. Entre os efeitos, o predominante é a depressão, principalmente a do funcionamento cerebral. De acordo com o aparecimento desses efeitos, após inalação de solventes, foram divididos em quatro fases: Primeira fase: a chamada fase de excitação, que é a desejada, pois a pessoa fica eufórica, aparentemente excitada, sentindo tonturas e tendo perturbações auditivas e visuais. Mas podem também aparecer náuseas, espirros, tosse, muita salivação e as faces podem ficar avermelhadas. Segunda fase: a depressão do cérebro começa a predominar, ficando a pessoa confusa, desorientada, com a voz meio pastosa, visão embaçada, perda do autocontrole, dor de cabeça, palidez; ela começa a ver ou a ouvir coisas. Terceira fase: a depressão aprofunda-se com redução acentuada do estado de alerta, incoordenação ocular (a pessoa não consegue mais fixar os olhos nos objetos), incoordenação motora com marcha vacilante, fala “enrolada”, reflexos deprimidos, podendo ocorrer processos alucinatórios evidentes. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
230
Quarta fase: depressão tardia, que pode chegar à inconsciência, queda da pressão, sonhos estranhos, podendo ainda a pessoa apresentar surtos de convulsões (“ataques”). Essa fase ocorre com frequência entre aqueles “cheiradores” que usam saco plástico e, após certo tempo, já não conseguem afastá-lo do nariz e, assim, a intoxicação torna-se muito perigosa, podendo mesmo levar ao coma e à morte. Finalmente, sabe-se que a aspiração repetida, crônica, dos solventes pode levar à destruição de neurônios (células cerebrais), causando lesões irreversíveis no cérebro. Além disso, pessoas que usam solventes cronicamente apresentam-se apáticas, têm dificuldade de concentração e déficit de memória. Os solventes praticamente não agridem outros órgãos, a não ser o cérebro. Entretanto, existe um fenômeno produzido pelos solventes que pode ser muito perigoso. Estes tornam o coração humano mais sensível a uma substância que o nosso corpo fabrica, a adrenalina, que faz o número de batimentos cardíacos aumentar. A adrenalina é liberada toda vez que temos de exercer um esforço extra, como, correr, praticar certos esportes etc. Assim, se uma pessoa inala um solvente e logo depois faz esforço físico, seu coração pode sofrer, pois ele está muito sensível à adrenalina liberada por causa do esforço. A literatura médica já cita vários casos de morte por arritmia cardíaca (batidas irregulares do coração), principalmente de adolescentes. Os solventes quando inalados cronicamente podem levar a lesões da medula óssea, dos rins, do fígado e dos nervos periféricos que controlam os músculos. Por exemplo, verificou-se, em outros países, que em fábricas de sapatos ou oficinas de pintura, os operários, com o tempo, acabavam por apresentar doenças renais e hepáticas. Em decorrência disso, nesses países ou a vigorar uma rigorosa legislação sobre as condições de ventilação dessas fábricas, e o Brasil também tem leis a respeito. Em alguns casos, principalmente quando existe no solvente uma impureza, o benzeno, mesmo em pequenas quantidades, pode levar à diminuição de produção de glóbulos brancos e vermelhos pelo organismo. Um dos solventes mais utilizados nas nossas colas é o n-hexano. Essa substância é muito tóxica para os nervos periféricos, produzindo degeneração progressiva, a ponto de causar transtornos no andar (as pessoas acabam andando com dificuldade, o chamado “andar de pato”), podendo até chegar à paralisia. Há casos de usuários crônicos que, após alguns anos, só podiam se locomover em cadeira de rodas. Outras razões associadas a mortes provocadas por inalantes são: sufocamento – acidentes com o uso de saco plástico, pois no momento da inalação a pessoa coloca o saco plástico na cabeça e pode se sufocar; quedas – os solventes provocam vertigens e tonturas, podendo levar a quedas e atropelamentos, devido à incoordenação motora e ao prejuízo de reflexos. A dependência entre aqueles que abusam cronicamente de solventes é comum, sendo os componentes psíquicos da dependência os mais evidentes, tais como desejo de usar a substância, perda de outros interesses que não seja o solvente. A síndrome de abstinência, embora de pouca intensidade, está presente na interrupção abrupta do uso dessas drogas, sendo comum ansiedade, agitação, tremores, cãibras nas pernas e insônia. Pode surgir tolerância à substância, embora não tão dramática em relação a outras drogas (como as anfetaminas, que os dependentes am a tomar doses 50-70 vezes maiores que as iniciais). Dependendo da pessoa e do solvente, a tolerância instala-se ao fim de um a dois meses. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
231
O consumo de solventes durante a gestação aumenta os riscos de prematuridade, morte pré-natal, anormalidades no crescimento e quadros semelhantes à síndrome alcoólica fetal (microcefalia, malformações faciais, cardiovasculares, ósseas e renais). Não há informações definitivas a respeito do potencial carcinogênico dos solventes sobre os seres humanos. (http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/conteudo/index.php?id_conteudo=11289&rastro=INF ORMA%C3%87%C3%95ES+SOBRE+DROGAS/Tipos+de+drogas/Solventes+ou+Inalantes)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
232
Bibliografia utilizada e indicada 1. AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION (APA). Dicionário de psicologia. Porto Alegre/RS: Artmed, 2010. 2. AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5). 5 ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. 3. BARLOW, D. H.; DURAND, V.M. Psicopatologia: uma abordagem integrada. São Paulo: Cengage Learning, 2010. 4. BLEULER, E. Psiquiatria. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1985. 5. BUENO, J.R.; NARDI, A.E. (Org.). Diagnóstico e tratamento em psiquiatria. Rio de Janeiro: Medsi, 2000. 6. CASTRO, L. Psicologia: 500 questões com gabarito comentado. 2 ed. Rio de Janeiro. Elsevier, 2006 7. CHENIAUX, E. Manual de psicopatologia. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. 8. COLEMAN, J.C. Distúrbios psicológicos e a vida contemporânea. 2 ed. São Paulo: Pioneira Editora, 1993. 9. DALGALARRONDO, P. 2 ed. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. 10. DAVIDOFF, L.L. Introdução à psicologia. São Paulo: Makron Books, 2001. 11. DORON, R.; PAROT, F. Dicionário de psicologia. São Paulo: Ática, 2006. 12. DORSCH, F et al. Dicionário de psicologia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. 13. EY, H. et al. Manual de psiquiatria. 5 ed. ver. atual. São Paulo: Masson, [s.d.]. 14. GABBARD, G. O. Psiquiatria psicodinâmica na prática clínica. 4 ed. Porto Alegre/RS, 2006. 15. GANGUILHEM, G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990. 16. JASPERS, K. Psicopatologia Geral: psicologia compreensiva, explicativa e fenomenológica. Vols. 1 e 2. Rio de Janeiro: Atheneu, 1987. 17. KAPLAN, H.I.; SADOCK, B.J. 3 ed. Compêndio de psiquiatria dinâmica. Porto Alegre/RS: Artes Médicas, 1984. 18. LAPLANCHE, J.; PONTALIS, J. Vocabulário de psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 1986. 19. MINISTÉRIO FRANCÊS DA CULTURA. Dicionário enciclopédico da psicologia. Lisboa (Portugal): Edições Texto & Grafia, 2005. 20. NUNES FILHO, E. P. et al. Psiquiatria e saúde mental: conceitos clínicos e terapêuticos fundamentais. São Paulo: Atheneu, 2000. 21. O’DONOHUE, W. et al. Transtornos de personalidade: em direção ao DSM-5. São Paulo: Roca, 2010. 22. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS). Classificação estatística internacional das doenças e problemas relacionados à saúde (CID-10). 9 ed. rev. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2003. 23. PAIM, I. Curso de psicopatologia. 11 ed. São Paulo: EPU, 1993. 24. ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. “[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
233
25. SZASZ, T. Ideologia e doença mental: ensaios sobre a desumanização psiquiátrica do Homem. 2 ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980. 26. TALBOTT, J. et al. Tratado de psiquiatria. Porto Alegre, RS: Artes Médicas, 1992.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)