Conceito Maitland
Na década de 60, mais precisamente em 1961 Geoffrey Maitland, Fisioterapeuta Australiano, recebeu um prêmio para estudar na Inglaterra, onde iniciou seus estudos na diferenciação entre a manipulação, preconizada na época por James Cyriax, e a mobilização . Em 1964, foi lançado a 1ª edição do livro Manipulação Vertebral, traduzido mais recentemente para o português em 2002 pela editora Medsi, e em 1968 a 1 ª edição do livro Manipulação Periférica, ainda não traduzido. Ao retornar para Austrália, iniciou a aplicação da abordagem terapêutica através do Raciocínio Clínico (Clinical Reasoning), processo de tomada de decisão, na qual o Fisioterapeuta é um investigador, criando questionamentos objetivos para mais precisamente chegar ao diagnóstico fisioterapêutico. O raciocínio clínico pode ser utilizado de forma hipotético-dedutivo; ou padrão-dedutivo, dependendo da experiência do profissional (Edwards e col. 2004). O Conceito Maitland preconiza que “Manipulação e Mobilização não são como um jogo de golfe” ou seja, independente da habilidade do Fisioterapeuta, as peças articulares só podem ser mobilizadas ou manipuladas nas direções de funcionamento das mesmas; que a avaliação deve ser feita de forma analítica, somando as informações colhidas no exame subjetivo e objetivo para que seja tomada a decisão do procedimento terapêutico (Maitland 1986). A contribuição de Geoffrey Maitland na Terapia Manual, foi classificar os graus de mobilização articular, para que tivessem maior aplicabilidade clínica. Grau I: mobilização de pequena amplitude que não chega na barreira restritiva Grau II: mobilização de grande amplitude que não chega na barreira restritiva Grau III: mobilização de grande amplitude que chega na barreira restritiva Grau IV: mobilização de pequena amplitude que chega na barreira restritiva Grau V: mobilização de pequena amplitude feita em alta velocidade após a barreira restritiva, conhecida como manipulação. Os graus I e II são utilizados em quadros álgicos, enquanto os graus III e IV são utilizados quando a restrição de movimento é o principal fator relacionado ao sintoma.
O Conceito Maitland preconiza 2 formas de aplicação das técnicas ivas articulares: sustentadas ou oscilatórias, que podem ser utilizadas através de movimentos ivos FISIOLÓGICOS e ÓRIOS. A aplicação das mobilizações articulares ivas proporciona ao tecido conjuntivo uma resposta mecânica. Tecidos conjuntivos tais como pele, fáscias, ligamentos, tendões, cápsulas articulares e fáscias musculares são compostos por tecidos extracelulares e celulares distintos, com diferentes curvas de tensão e carga (Lederman 2001). A primeira tarefa do Fisioterapeuta – Investigador, segundo o Conceito Maitland, é utilizar o raciocínio clínico para identificar qual (ais) tecidos estão comprometidos, e a partir dessa decisão, a aplicação da carga: local, duração e amplitude são escolhidos. Princípios Anatômicos e Fisiológicos As mobilizações articulares são realizadas em qualquer articulação sinovial e funcional, respeitando as direções e amplitudes do movimento. Os tipos de superfícies articulares móveis são classificadas como côncavas, convexas ou planas. (Kaltenborn 1971). A movimentação entre articulações côncavoconvexas dependem da peça que se encontra como ponto fixo. Um bom exemplo, é a flexão do joelho em cadeia aberta comparada a cadeia fechada. Na cadeia aberta, o ponto fixo é o fêmur, com superfície articular convexa, também conhecida com peça “macho”, nesse caso o deslizamento e rolamento da superfície da tíbia seguem a mesma direção. Quando a tíbia, superfície côncava, se torna o ponto fixo, o deslizamento ocorre na direção oposta ao rolamento, para que se mantenha a congruência articular. Nas superfícies articulares vertebrais, com exceção da C0-C1 e C1-C2, a direção do deslizamento e rolamento são as mesmas seguindo o movimento fisiológico. Pontos importantes para o Fisioterapeuta ao mobilizar uma articulação: 1. Posicionar a articulação na posição de repouso inicialmente para obter menos resistência dos tecidos conjuntivos. 2. Posicionar-se corretamente, para que sua aplicação seja feita com menor esforço e maior eficiência. 3. Mobilizar respeitando a orientação das superfícies articulares. Nesse caso o conhecimento anatômico é extremamente
necessário, porém não soberano. A individualidade anatômica de cada um precisa ser respeitada 4. Utilizar o grau de mobilização apropriado ao estágio da disfunção 5. Evoluir as mobilizações ivas órias (artrocinemática) e fisiológicas, para movimentos ativos, com qualidade.
Indicações para utilização das Mobilizações Articulares ivas As indicações devem estar relacionadas com a técnica escolhida. A restauração da artrocinemática (movimentos órios) é preconizada na maioria dos casos antes das mobilizações osteocinemáticas (movimento fisiológico) (MacConaill e Basmanjian 1969), exceto em pacientes com prótese articular e lassidão ligamentar. 1. Aumentar o movimento articular ório e fisiológico 2. Diminuir e controlar quadro álgico 3. Diminuir o espasmo muscular protetor (Cuidado! Em pacientes com quadro clínico de instabilidade, diminuir o espasmo muscular na fase aguda seria imprudente)
Contra-indicações e Precauções das Mobilizações Articulares ivas Exceto alguns casos, as contra-indicações são mais relativas que absolutas, principalmente para o Fisioterapeuta experiente. De acordo com Petersen e Foley (2003): 1. Artrite reumática, fase aguda; espondilose cervical com isquemia vértebrobasilar, luxação, articulações com hipermobilidade, espondilolistese, espondilite anquilosante. Evidência de qualquer processo inflamatório na presença dessas patologias é contra-indicação absoluta 2. Enfraquecimento dos ossos, fraturas, malignidade, osteoporose, osteomielite, tuberculose 3. Distúrbios circulatórios, como aneurismas, terapia anti-coagulante, aterosclerose e insuficiência vértebrobasilar da artéria vertebral. (contra– indicação absoluta para as mobilizações grau V). 4. Hérnia de disco com envolvimento neurológico grave. 5. Presença de doenças infecciosas.
6. Gravidez (contra-indicação relativa). Segundo Maitland (1986), se a dor é claramente originada da articulação, não haveria contra-indicação absoluta para sua mobilização, tomando as devidas precauções. 7. Em crianças e adolescentes, graus III a V podem lesionar as placas de crescimento. 8. Na espasticidade, existe uma controvérsia na literatura.
CASO CLÍNICO Exame Subjetivo D1
D2
Homem, 34 anos Canhoto
D1
D2
Qualidade: Peso
“Faca furando”
Freqüência: Intermitente
Intermitente
Intensidade: 5/10 (no momento); 8/10;
0/10; 5/10
0/10 Profundidade: superficial
Profunda
Comp. 24h: piora ao final do dia
À noite, ao acordar
Ativ. Agrav.: sentar no computador >
Sentar no computador > 4h; carregar
3h; após corrida (15-30´);
peso ( > 6kg)
Ativ. Aliv: Deitar > 20`; massagem;
Apoiar o braço, deitar >1´
calor úmido
História Atual •
4 meses atrás após partida de futebol, D1 iniciou branda 2/10 constante 3 dias depois 10/10 dor e rigidez, Ortopedista Rx (diminuição espaço C4-T1) –
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D2 iniciou 4 dias depois após carregar uma TV, ouviu estalo e no dia seguinte dor intensa.
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Fisioterapia convencional 10 sessões sem resultado, medicações s/ efeito. Acupuntura e massagem “relaxante” há 2 semanas transformou o sintoma em intermitente.
História Pregressa •
Acidente Automobilístico 10 anos atrás colar cervical
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Fratura de tíbia - fixador por 3 meses
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S/ história de dor cervical ou nos ombros
História Saúde •
Não fuma; colesterol controlado, nega hipertensão ou diabete
História Familiar •
Mãe - hipertensão controlada, dor na coluna desde de gravidez
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Pai – Falecido Câncer próstata
História Social – casado, 1 filho, atleta de fim-de-semana (corrida, bicicleta) Objetivo: Recuperar a qualidade de vida de antes Avaliação Objetiva Mov. Ativo Cabeça Dor: Extensão (2/4), Inclinação p/ E (3/4) , Flexão completo estiramento > E Restrição Movimento ivo Artrocinemático Central (PA) – C4 e C5 Restrição Movimento ivo Artrocinemático Unilateral – E C4-C5; E C5-C6 Restrição Movimento ivo Fisiológico – Extensão – C4-C5; Inclinação E C4-C5, C5-C6 e C6-C7. Ponto gatilho levantador da escápula E Teste de Slump negativo Teste Neural Nervo Mediano negativo
Teste de Endurance dos Flexores Profundos Cervicais positivo Mov. Ativo da Cintura Escapular Dor – Abdução 85°; retorno da flexão de 95° a 85°; Teste da lata vazia; Mão atrás Daltura de T8, E altura de L3 com dor 5/10. Teste de Kibler ( semi-dinâmico escapular) – falha no posicionamento em 45° e 90°. Teste de estresse Acrômio-clavicular- negativo; Teste de estresse esternoclavicular negativo Restrição Movimento ivo Artrocinemático – Antero-posterior e Inferior diminuído Teste de Locking Maitland- Positivo Teste do Quadrante Maitland – superior Positivo, inferior negativo Diagnóstico Funcional Fisioterapêutico •
Restrição de movimento articular para fechamento em C4-C5
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Alteração funcional da musculatura profunda cervical
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Alteração posicionamento escapular e da Cabeça do úmero (anteriorizada)
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Restrição de movimento articular posterior e inferior Glenoumeral (GU)
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Encurtamento cápsular pósterosuperior ombro, grande dorsal E>D
Tratamento Dia 1 •
PA unilateral C4-C5 para fechamento 2x 40 seg. grau II + 1x 30 seg. grau III
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Mobilização Articular iva Fisiológica escápula E para elevação e rotação lateral
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Deslizamento inferior em posição de repouso da GU 3x 20 seg. grau II
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Exercícios para re-centralização da cabeça do úmero (Mottram 1997; Hess e col., 2000/ 2005, Magarey & Jones 2003)
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Re-educação da posição da cabeça e membro superior na posição sentada utilizando espelho.
O Método Maitland é nomeado Conceito, porque sua abordagem terapêutica engloba outras terapias com a finalidade de restaurar a função. Sua utilização depende de muito treinamento, tanto na formulação de hipóteses diagnósticas quanto para execução de suas técnicas.
Bibliografias: 1. MacConaill MA, Basmanjian JV: Muscles and Movements: A Basis for Human KInesiology. Baltimore, Williams &Wilkins, 1969. 2. Petersen CM, Foley RA: Testes de Movimentos Ativos e ivos. Editora Manole, 2003. 3. Maitland GD: Vertebral Manipulation Buttherworth Heinemann, 1986 (5th edition) 4. Maitland GD: Peripheral Manipulation Buttherworth Heinemann, 1991 (3rd edition) 5. Ledermann E: Fundamentos da Terapia Manual. Editora Manole, 2001 6. Edwards I e col. Clinical Reasoning Strategies in Physical Therapy. Phys Ther. 2004, 84-4: 312-335 7. Mottram SL. Dynamic stability of the scapula. Manual Therapy, 1997 2-3: 123131 8. Hess SA. Functional stability of glenoumeral t. Manual Therapy 2000 5-3: 63-71 9. Magarey ME, Jones MA. Dynamic evaluation and early management of altered motor control around the shoulder complex. Manual Therapy 2003 8-4: 195206. 10. Jull G. Prove it or lose it. Proceedings of 5th biennial conference of Manipulative Therapist Association of Australia. Melbourne, 351-358 11. Kaltenborn FD, Mobilização Manual das Articulações Periféricas, Editora Manole, 2001